REFLEXÕES SOBRE O TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR

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Transcrição:

Resumo REFLEXÕES SOBRE O TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE NO CONTEXTO ESCOLAR Diana Maria Pereira Cardoso O presente artigo aborda sobre o que os professores, sujeitos da pesquisa, pensam a respeito do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, trazendo para discussão a complexidade da avaliação diagnóstica do TDAH, os cuidados e os critérios a serem adotados no processo, a importância do professor como uma das fontes indispensáveis para subsidiar o profissional envolvido na avaliação diagnóstica. Contudo, o artigo aborda também a relevância de expandir as discussões e questionamentos sobre a manifestação dos sintomas do TDAH, os prejuízos que causam ao aluno com TDAH no contexto escolar e a necessidade de políticas públicas que possam garantir o atendimento educacional especializado, a partir do reconhecimento das necessidades educacionais desses alunos. Palavras - chave: comportamento desatento, comportamento hiperativo e comportamento impulsivo. Este artigo é um recorte da pesquisa de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFBA que teve como título: A concepção dos professores diante do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade em contexto escolar: um estudo de caso, defendida em maio de 2007. Os 40 professores que participaram da pesquisa lecionam nas classes de educação infantil, ensino fundamental e ensino médio em escolas públicas e / ou particulares da cidade de Salvador, participantes dos cursos ministrados pela autora sobre o TDAH, entre o 2º. semestre de 2005 e o 1º. semestre de 2006. O referencial teórico foi construído concomitantemente com a coleta dos dados, pois a cada curso ministrado o referencial teórico foi se ampliando a partir das fontes bibliográficas consultadas. A análise do conteúdo foi o método utilizado para analisar as respostas obtidas através do questionário aplicado aos professores. A autora que subsidiou essa escolha foi Bardin (1977). Como este artigo trata de um recorte, tem como objetivo apresentar os resultados obtidos sobre a concepção do professor em relação ao TDAH, quanto à identificação e caracterização do comportamento desatento, hiperativo e impulsivo dos alunos em sala de aula, bem como, fomentar discussões a respeito da complexidade da avaliação diagnóstica do TDAH e inserir reflexões sobre a necessidade de oferta de atendimento educacional especializado que possa atender as necessidades educacionais dos alunos que apresentam esse transtorno. Autores como Mattos (2003), Arruda (2006), Bonet (2008), Barkley (2008) dentre outros pesquisadores abordam que o TDAH costuma manifestar na infância, podendo perdurar durante toda a vida do indivíduo além de causar prejuízo no convívio social, familiar e escolar 2344

em decorrência dos sintomas estarem relacionados com a desatenção, hiperatividade e impulsividade, ou a combinação dos três sintomas. Segundo Condemarin et al (2006), as crianças que apresentam o TDAH tendem a mostrar um rendimento escolar instável e a fracassar na escola, independentemente de suas habilidades. Em geral quando isso acontece o TDAH está associado a transtornos de aprendizagem que, infelizmente, nem sempre são detectados, provavelmente, pela falta de conhecimento dos professores. Após análise dos dados ficou constatado a tendência dos professores em atribuir o que percebem em seus alunos na escola como sendo características de comportamento desatento, hiperativo e impulsivo. Os professores tendem também a atribuir esse comportamento inadequado do aluno a causas familiares, emocionais e sociais. Ficou evidenciada também a importância de se fomentar uma discussão sobre o modelo de gestão do ensino e sobre a metodologia adotada pelo professor em sala de aula. Além do desconhecimento sobre o transtorno, foi observado semelhança na caracterização do comportamento desatento, hiperativo e impulsivo, com o critério de diagnóstico publicado pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSM IV. O estudo confirmou a necessidade do profissional, responsável pela avaliação, dialogar com o professor e buscar também outras fontes de informações sobre o comportamento do aluno com suspeita do transtorno, que possam complementar e contribuir com a avaliação diagnóstica. Tradicionalmente e historicamente as duas áreas: saúde e educação não dialogavam, mesmo havendo dentro do ambiente escolar aluno considerado problema. Hoje essa realidade já vem sendo discutida. Há um livro denominado Saúde Mental na Escola, organizado por profissionais da saúde, que reúne uma série de estudos que comprovam a necessidade da união das duas áreas no sentido de minimizar os problemas enfrentados pela maioria das escolas brasileiras e oportunizar melhor qualidade de vida ao aluno que sofre os prejuízos causados pelos transtornos mentais. Ao questionar os professores sobre a presença de alunos com TDAH, em sala de aula, 36 (90%) afirmaram ter alunos com esse transtorno, 03 (7,5%) disseram não ter certeza e apenas 01 (2,5%) professor negou possuir aluno com esse tipo de transtorno em sala de aula, conforme gráfico a seguir. Opinião dos professores sobre a presença de alunos com TDAH 100 90% 80 60 40 20 0 7,5% 2,5% Sim Não tem certeza Não 2345

Analisando os 90% dos professores que afirmaram ter alunos com esse transtorno, nos leva a pensar na possibilidade de esses alunos estarem sendo rotulados como portadores do TDAH, em decorrência do olhar preconceituoso e precipitado, pois os professores não mencionaram terem recebido um diagnóstico de um profissional habilitado para tal. O quadro seguinte revela que dos 27 professores que lecionam no ensino fundamental, 25 afirmaram possuir alunos com esse transtorno, 01 disse não ter certeza e também apenas 01 disse não possuir aluno com TDAH em sala de aula. Da mesma forma que os professores do ensino fundamental afirmaram a presença de alunos com TDAH, nesse nível de ensino, autores como: Phelan (2005), Antunes (2001), Mattos (2003), Wajnsztejn R. e Wajnsztejn A (2000), abordam também a presença e intensidade dos sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade no ensino fundamental. NÍVEIS DE ENSINO E ALUNOS COM SUPOSTO DIAGNÓSTICO DE TDAH SIM NÃO TEM NÃO CERTEZA Educação infantil 04 01 Ensino fundamental 25 01 01 Educação infantil e Ensino fundamental 02 Ensino fundamental e Ensino médio 05 01 TOTAL 36 03 01 A explicação para esse fato pode estar relacionada ao grau de tolerância dos professores para apreciarem a agitação, desatenção e impulsividade nas crianças que atingem a idade dos 7 aos 8 anos, isto é, o que antes era visto como uma gracinha se torna um incômodo para o professor. Convém alertar que os comportamentos desatento, hiperativo e impulsivo não são exclusivos do TDAH, podendo estar presente na indisciplina escolar, problema presente nas escolas que merece também a atenção especial dos professores. Quando não se tem clareza sobre o TDAH fica difícil distinguir o transtorno da indisciplina. Lembrando Antunes (2001, p. 15), [...] nem todo caso de desatenção, agitação, descontrole emocional, impulsividade e excitação é necessariamente caso de TDAH. Apesar de ser complexo fazer a avaliação diagnóstica do TDAH, não há dúvidas sobre a existência do transtorno e dos prejuízos causados por ele. Desse modo, é importante que o diagnóstico aconteça na infância e é preciso que o professor tenha conhecimento sobre o assunto, por ser este profissional uma das fontes de informações consultadas para coleta de dados dos sintomas apresentados por uma criança que se suponha ter o transtorno. Entretanto, chegar ao diagnóstico de TDAH é um desafio para os especialistas, desse modo, é necessária a composição de uma equipe interdisciplinar, envolvendo as seguintes especialidades: neuropsicologia, fonoaudiologia, psicologia, psicopedagogia, pedagogo (professor), psiquiatria, pediatria. Outro desafio é obter a melhor maneira para definir os prejuízos e os critérios exatos dos sintomas para definição do TDAH (CONNERS, 2009). Quanto à concepção dos professores sobre a desatenção, foi percebida a falta de atenção como sendo um déficit e não no sentido da atenção seletiva, dividida e sustentada estarem 2346

prejudicadas, o que revela desconhecimento sobre o assunto. Para Barkley (2002), Goldstein S. e Goldstein M. (2003), é um equívoco pensar que a desatenção se trata de um déficit e não de uma dificuldade em administrar e sustentar a atenção até o fim de uma tarefa, sem que demonstre interesse ou se sinta motivado por outra coisa. Em outras palavras, a dificuldade está em não conseguir selecionar e administrar o seu foco em um só objeto. A criança que tem o TDAH acaba prestando atenção a tudo que a cerca, entretanto, podemos encontrar crianças que tenham dificuldade para focar a atenção, sem que apresentem o TDAH. No momento em que os professores responderam: deixa de prestar atenção e se dispersa muito fácil, nos leva a refletir sobre o grau de dificuldade e complexidade exigido pela tarefa escolar, pois a desatenção também poderá se manifestar em resposta a algo que ainda o aluno não dá conta, provavelmente, em decorrência de a tarefa estar além da sua condição acadêmica. Assim sendo, cabe ao professor oferecer aos alunos atividades prazerosas que desenvolvam as atenções seletiva, dividida e sustentada, no entanto, será um grande desafio para o professor e exigirá dele uma formação permanente e um trabalho interdisciplinar, dialogando com outras ciências. Quando, em sala de aula, o aluno não se interessa pelo conteúdo abordado, a tendência é ficar desatento ou disperso. Na medida em que o conteúdo revela um grau maior de complexidade, torna-se mais difícil para o aluno compreendê-lo e o confronto com o sentimento de impotência poderá gerar dispersão como mecanismo de defesa para evitar que sinta ansiedade, angústia e tenha pensamento depreciativo em relação a si próprio. Como foi visto no estudo, os professores relacionaram o comportamento desatento com as dificuldades de aprendizagem. Contudo, não podemos generalizar e achar que toda criança desatenta terá dificuldade para aprender, pois ser desatento não significa ser incapaz para aprender, embora saibamos que a capacidade de prestar atenção é necessária para o processo de aprendizagem e para que isso aconteça, é preciso que a criança tenha interesse e se sinta motivada pelas aulas. A motivação é importante para que aconteça o processo ensino e aprendizagem. Não foi por acaso que os professores atribuíram como resposta, o desinteresse, a falta de participação nas tarefas e desejo para concluir as atividades. Talvez, o que eles precisam é se conscientizar de que o aluno deva se sentir motivado para não fazer exercícios de outros professores durante a aula. E, se tratando do aluno com TDAH, a criatividade e a inovação das aulas devem acontecer em dose dupla. Como foi constatado na pesquisa, observar os sinais que caracterizam o comportamento desatento em sala de aula não revelou ser uma tarefa difícil para o professor, no entanto, é importante que este profissional não se limite, apenas, em apontar se o aluno fica ou não desatento na sala de aula. É preciso que ele procure saber do aluno que sentimentos ele tem em relação às aulas e às tarefas, conhecer os pontos fortes e fracos dele para que possa oferecer atividades que atendam as suas necessidades, como propor atividades em sala de aula que valorizem os tipos de atenção dividida, seletiva e sustentada é sem dúvida um desafio a ser conquistado pelo professor diariamente. Porém, não existem modelos prontos, é importante que o professor reconheça a individualidade de cada aluno e conquiste sua atenção com atividades e aulas prazerosas. É preciso investigar que estímulos externos e internos possam estar influenciando na dificuldade para poder estabelecer prioridades, organizar, traçar metas e objetivos a alcançar. É nessa direção que o processo ensino e aprendizagem deverão acontecer. 2347

Em relação ao comportamento hiperativo, o estudo constatou que os professores caracterizam a hiperatividade como excesso de agitação corporal e inquietação mental, porém esses sinais não são suficientes para confirmar a presença de um quadro neurobiológico como o do TDAH, pois há outros fatores abordados na literatura que contribuem para um comportamento hiperativo: sobrecarga de estresse em decorrência da estimulação exagerada, dificuldade sensorial ou má condição de saúde, efeitos colaterais por uso de medicamento, falta de motivação pela aula ou atividade, estágio do desenvolvimento da criança, práxis pedagógica inapropriada às necessidades do aluno, angústia, sentimento de frustração e de menos valia, dentre outros. Apesar de a hiperatividade representar excesso de agitação, os professores trouxeram a dificuldade em trabalhar em equipe ou em dupla e a dificuldade para brincar ou se envolver nas atividades escolares. Desse modo, as descrições podem ser encaradas como sendo impactos sociais causados pelo comportamento hiperativo em sala de aula. As manifestações do comportamento impulsivo foram vistas como reações atitudinais ocorridas pela impossibilidade de ter o auto controle dos seus atos e emoções, provavelmente isso acontece porque a internalização do discurso acontece tardiamente nas crianças hiperativas como foi salientado por Lopes (2004). Pelas expressões utilizadas, foi notória a relação estabelecida entre a impulsividade e a indisciplina escolar, embora pareça ter uma relação com a definição de impulsividade trazida por Vasconcellos (2000), exige-se uma análise mais aprofundada, pois no DSM IV a hiperatividade é associada à impulsividade. Os resultados obtidos reforçam que além de complexo e nebuloso, o processo de avaliação diagnóstica do TDAH exige cautela e conhecimento dos professores sobre o transtorno para não serem preconceituosos rotulando os alunos ou fazerem encaminhamentos precipitados, mas colaborarem dando informações importantes sobre a criança. Para isso, o professor deverá expandir seu conhecimento sobre o transtorno, promover o desenvolvimento de discussões sobre a pratica pedagógica adotada nas escolas, repensar sobre as exigências das escolas em relação ao comportamento do aluno e ficar atento para as mensagens que o aluno esteja transmitindo através da dificuldade em prestar atenção, excesso de atividade motora e a impulsividade. O estudo revelou também a relevância para abrir espaços para novos questionamentos sobre o comportamento das crianças em idade escolar e para a discussão da estrutura escolar, o estilo de gestão adotado pela escola, estratégias pedagógicas que possam auxiliar o aluno com esse transtorno nas suas necessidades educacionais específicas. Para Mattos (2003), o professor que se propõe a trabalhar com o aluno que apresenta o TDAH deverá estar aberto para modificar, quando for necessário, suas estratégias de ensino, ajustando-as ao estilo de aprendizagem e às necessidades da criança, e de promover atividades que possam despertar o seu interesse pela aula. Apesar das inúmeras dicas de intervenção publicadas na literatura sobre o assunto, é importante que, antes de aplicá-las, o professor analise a realidade da sua sala de aula e o contexto na qual a situação desagradável ocorre. Não há técnicas ou abordagens pedagógicas milagrosas que façam desaparecer o TDAH, mas sim que melhorem o nível de atenção do aluno para que o processo de escolarização possa se desenvolver e as interações sociais possam ser facilitados. Apesar de o Decreto nº. 6.094/2007 estabelecer, entre as diretrizes do compromisso todos pela educação, a garantia do acesso e permanência no ensino regular e o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, fortalecendo a inclusão educacional nas escolas públicas, na prática, as necessidades educacionais especiais dos alunos que 2348

apresentam transtorno de atenção e hiperatividade não são reconhecidas nem atendidas pelo atendimento educacional especializado. As Diretrizes Operacionais da Educação Especial para o Atendimento Educacional Especializado - AEE na Educação Básica regulamentadas pelo Decreto nº. 6.571, de 18 de setembro de 2008, consideram como sendo público-alvo para receber o atendimento educacional especializado apenas os alunos com deficiência de natureza física, intelectual ou sensorial, alunos com transtornos globais do desenvolvimento (autismo clássico, Síndrome de Asperger, Síndrome de Rett, transtornos desintegrativos da infância e transtornos invasivos sem outra especificação) e, por fim, alunos com altas habilidades/superdotação. O não reconhecimento das necessidades educacionais dos alunos hiperativos e desatentos também se repetiu na Resolução Nº 4, de 2 de outubro de 2009 que Institui Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade Educação Especial a ser oferecido através das salas de recursos multifuncionais ou em centros de atendimento educacional especializado. Porém, vale lembrar que antes de elaborar as Diretrizes Operacionais da Educação Especial para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica havia em 2008 um documento denominado: Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) em que reconhecia como transtornos funcionais específicos as necessidades educacionais especiais dos alunos que apresentavam dislexia, disortografia, disgrafia, discalculia, transtorno de atenção e hiperatividade. Com base nessa breve análise dos fundamentos legais sobre o público alvo do atendimento educacional especializado, percebemos que não há uma legislação específica que reconheça e assegure o atendimento educacional aos alunos que têm necessidades educacionais especiais em decorrência do TDAH, cabendo, portanto, ao professor aprofundar mais sobre o transtorno, pois as evidencias científicas constataram a presença de déficits da função executiva na pessoa com Transtorno Global do Desenvolvimento - TGD, especialmente no autismo e também na pessoa com TDAH. Neste sentido, autores como Belisário Filho (2010), menciona algumas características dos Transtornos Globais do Desenvolvimento, presentes de forma mais típica no autismo, são semelhantes aos déficits da função executiva presentes nas pessoas que possuem lesões dos lobos frontais. Em neuropsicologia, o córtex pré-frontal é responsável pelo autocontrole e comportamento inibitório das funções executivas. Quando o lobo frontal, sede das funções psicológicas superiores, está comprometido, o indivíduo tem dificuldade de diferenciar a atenção para aquilo que deseja fazer, planejar as estratégias, organizar os meios e os passos para atingir o objetivo almejado e controlar a impulsividade e a hiperatividade para não perder o foco, deixando de alcançar a finalidade (LOPES, 2004). Foi buscando o conhecimento e lutando contra a invisibilidade acumulada durante décadas que hoje, os autistas vem ganhando visibilidade através da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, leis, diretrizes, portarias, decretos que fundamentam a inclusão e normatizam o serviço de Atendimento Educacional Especializado oferecido pelos Centros ou pelas Salas de Recursos Multifuncionais do estado da Bahia. O mesmo tem que ocorrer com os alunos que apresentam o TDAH, pois sofrem invisibilidade e ausência de oferta de programa educacional que compreenda e atenda as necessidades educacionais desses alunos. De modo a dar continuidade ao estudo, não é possível deixar de questionar porque as necessidades do aluno com TDAH não são atendidas pela política nacional de educação 2349

especial, se em ambos transtornos, TDAH E TGD, apresentam comprometimento nas funções executivas e prejuízos na aprendizagem. Enfim, porque no autismo as necessidades educacionais são reconhecidas e no TDAH não? Referências: ANTUNES, Celso. Miopia da atenção: problemas de atenção e hiperatividade em sala de aula. São Paulo: Editora Salesiana, 2001. ARRUDA, Marco A. Levados da Breca: um guia sobre crianças e adolescentes com Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Ribeirão Preto: Instituto Glia Cognição e Desenvolvimento, 2006. BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Trad. Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70, 1977. BARKLEY, Russel A. Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH): guia completo e autorizado para os pais, professores e profissionais da saúde. Trad. Luís Sergio Roizman. Porto Alegre: Artmed, 2002. Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade: manual para diagnóstico e tratamento. Trad. Ronaldo Cataldo Costa. 3ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 2008. BRASIL. MEC/ SEESP. Decreto nº. 6.571, de 18 de setembro de 2008. Diretrizes Operacionais da Educação Especial para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica. Legislação Específica. Brasília, 2008. Disponível em <WWW.portal.mec.gov.br>. Acesso em 03 out.2010. BRASIL. MEC /SEESP. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília, 2008. Disponível em: Disponível em http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/diretrizes.pdf. Acesso em: 03 out. 2010. BRASIL, MEC /SEESP. Decreto nº. 6.094/2007, de 24 de abril de 2007. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007.Legislação Específica. 2350

Brasília, 2008. Disponível em: Disponível em <WWW.portal.mec.gov.br>. Acesso em 03 out.2010. BRASIL, MEC/SEESP. Resolução Nº 4, DE 2 de outubro de 2009. Disponível em http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb004_09.pdf. Acesso em 07/07/2010 BELISÁRIO Júnior, José F., Cunha Patrícia Cunha. A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar: transtornos globais do desenvolvimento. Brasília : Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial ; [Fortaleza] : Universidade Federal do Ceará, 2010. BONET, Camañes Trinidad. Aprendendo com crianças hiperativas: um desafio educativo. Trad. Guillermo Matias Gumucio. São Paulo: Cengage Learning, 2008. CARDOSO, Diana Maria Pereira. A concepção dos professores diante do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade em contexto escolar: um estudo de caso. 2007. 135 f. il. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Federal da Bahia, Salvador. CONDEMARÍN, Mabel; GOROSTEGUI, María Elena; MILICIC, Neva. Transtorno de déficit de atenção: estratégias para o diagnóstico e a intervenção psicoeducativa. Trad. Magda Lopes. São Paulo. Planeta do Brasil, 2006. CONNERS, C. Keith. Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade: as mais recentes estratégias de avaliação e tratamento. Trad. Marina Fodra. 3ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. Critérios diagnósticos do DSM-IV: referência rápida. Trad. Dayse Batista. Porto Alegre: Artmed, 1995. GOLDSTEIN, Sam., GOLDSTEIN, Michael. Hiperatividade: como desenvolver a capacidade de atenção da criança. 9. ed. Campinas: Papirus, 2003. LOPES, João A..A Hiperactividade. Coimbra: Editora Quarteto, 2004. MATTOS, Paulo. No mundo da lua: perguntas e respostas sobre transtorno do déficit de atenção com hiperatividade em crianças, adolescentes e adultos. São Paulo: Lemos Editorial, 2003. PHELAN, Thomas W. TDA/TDAH Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. São Paulo: M. Books do Brasil, 2005. VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Disciplina: construção da disciplina consciente e interativa em sala de aula e na escola. São Paulo: Libertad, 2000. WAJNSZTEJN, Rubens; WAJNSZTEJN Alessandra Bernardes Caturani Dificuldade de atenção e memorização na infância e na adolescência. São Paulo: SBJ Produções, 2000. 2351