VARIAÇÃO LINGUÍSTICA EM UM LIVRO DIDÁTICO E OS PCN

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Transcrição:

ISSN: 1981-3031 VARIAÇÃO LINGUÍSTICA EM UM LIVRO DIDÁTICO E OS PCN Maria Luédna Ferreira de Melo luedyna@hotmail.com RESUMO: O objetivo deste trabalho é descrever os resultados de uma pesquisa realizada em 2010 com um livro didático mais usado pelas escolas municipais de Maceió em que se buscou investigar como era realizado o trabalho de produção textual com variação linguística no LD, bem como a comparação com as orientações dos PCN. O trabalho tem como fundamentação teórica autores da sociolinguística variacionista, bem como os PCN de português. A investigação foi realizada por meio da análise documental, tendo com base os PCN, bem como livro didático de português (doravante LDP), utilizado em turmas de 3ª série (4 ano) do ensino fundamental por escolas da rede pública de ensino de Maceió. Ressalvamos que a maioria do trabalho com variação linguística do livro analisado refere-se a questões de formalidade e informalidade no uso de grafias ou fala oral e observamos ainda uma inadequação nos usos dos termos. Em nenhum momento há indicação do que seja variação linguística nem no livro do aluno nem no do professor. Portanto, à indicação dos PCN de que o preconceito linguístico deve ser enfrentado na escola como objetivo de uma educação de respeito linguístico não é posto em prática pelo Livro didático. Palavras - chave: Livro didático, Variação linguística, PCN. Introdução Numa perspectiva geral, o presente trabalho se iniciou numa pesquisa sobre produção textual e os PCN. Nesse caso específico, vamos nos deter a descrever e analisar as propostas de atividades destinadas à produção de textos orais e escritos com relação às questões de variação linguística, pois é constatado que ainda persistem práticas impróprias e irrelevantes para a produção textual no que se refere à variação linguística; que não condizem com as mais modernas concepções de língua. A investigação foi realizada por meio da análise documental, tendo com base os PCN, bem como livro didático de português (doravante LDP), utilizado em turmas de 3ª série (4 ano) do ensino fundamental por escolas da rede pública de ensino de Maceió. O LDP selecionado foi o Projeto Pitanguá Português 4 ano (antiga 3ª série). Reinaldo (2005) indica que as orientações que aparecem nos PCN como dominante são encaminhamentos na perspectiva sociointeracionista. Essa característica pode ser

2 percebida na preocupação relativa aos elementos característicos das diferentes situações comunicativas e ao gênero textual correspondente a determinada situação. Para exemplificar o modelo teórico adotado na obra, mostramos uma passagem do documento que autenticam esse fato, como no fragmento descrito pelos PCN (1997, p. 33) que diz respeito a um dos objetivos gerais para o ensino fundamental que indica que o ensino de Língua Portuguesa deverá organizar-se de modo que os alunos sejam capazes de: utilizar diferentes registros, inclusive os mais formais da variedade lingüística valorizada socialmente, sabendo adequá-los às circunstâncias da situação comunicativa de que participam. 1. Variação linguística no LDP Os PCN (1997, p. 26) afirmam que no Brasil a Língua Portuguesa possui muitas variedades dialetais e que, portanto identificam-se geográfica e socialmente as pessoas pela maneira como falam. O documento admite que há muitos preconceitos decorrentes do valor social relativo que é atribuído aos diferentes modos de falar: é muito comum se considerarem as variedades lingüísticas de menor prestígio como inferiores ou erradas. O documento ainda é categórico ao advertir que o problema do preconceito linguístico que é difundido na sociedade no que concerne aos diferentes modos de falar pode e deve ser constantemente combatido na escola, como parte do objetivo educacional que seja mais aberto, em prol de uma educação que realmente respeite à diferença. E ainda acrescenta que para atingir esse objetivo e do mesmo modo para poder ensinar Língua Portuguesa, a instituição escolar necessita livrar-se de alguns mitos que são: [...] o de que existe uma única forma certa de falar a que se parece com a escrita e o de que a escrita é o espelho da fala e, sendo assim, seria preciso consertar a fala do aluno para evitar que ele escreva errado. Essas duas crenças produziram uma prática de mutilação cultural que, além de desvalorizar a forma de falar do aluno, tratando sua comunidade como se fosse formada por incapazes, denota desconhecimento de que a escrita de uma língua não corresponde inteiramente a nenhum de seus dialetos, por mais prestígio que um deles tenha em um dado momento histórico. (PCN, 1997, p. 26) Com relação ao tema, há no LD 06 possíveis ocorrências de trabalho com o tema variedade linguística sempre na parte denominada Estudo da Língua. Nessa seção se trabalha as características da linguagem oral como a informalidade, as gírias, as expressões populares. Além disso, esse trabalho tem afinidade com as indicações dos PCN com relação aos diferentes usos da linguagem dependendo de quem fala com quem fala e do que se fala. Uma

3 dessas ocorrências, que abrange exclusivamente o assunto, ocorre na primeira parte da unidade 2, sendo o tema trabalhado nessa unidade designado: Registros informal e formal, linguagens oral e escrita, variedades rural e urbana. O texto trabalhado na unidade foi Sopa de Pedras em que o personagem principal é Pedro Malasarte personagem frequente nos contos populares. 1. 1. O que se trabalha nas seções propostas de Estudo da língua Na unidade 3 Árvores, na segunda parte na seção Estudo da língua o tema é palavras e expressões pouco usadas, o texto base para exploração da seção é Cajueiro pequenino de Juvenal Galeno. Na exploração das atividades espera-se que os alunos percebam algumas características, como as que muitas palavras e expressões não são de uso cotidiano, algumas não são mais usadas, que há frases inversas, a pessoa gramatical é o tu, etc. A intenção é propiciar uma reflexão sobre estilos e recursos literários frequentes em nossa literatura para que os alunos comecem a tentar superar dificuldades que provavelmente encontrarão pela frente em textos futuros, ou que os afastarão, pelo medo, do exercício da leitura (MODERNA, 2006, p. 77). No manual do professor é indicado outros casos conhecidos como as frases do Hino nacional. Na unidade 05 na mesma seção o tema trabalhado é Registro formal e informal recursos expressivos, em que há atividades sobre o texto O vizinho, nesse texto é empregado varias gírias. Nessa unidade há citação de uso do emprego formal e informal, os alunos são incitados a explicar o significado das gírias empregadas no texto. Já noutra atividade (2ª) o aluno tem de discernir sobre a situação apresentada no texto se é formal ou informal. Na mesma questão ao se indagar se substituísse as gírias estudadas na questão 1 por expressões mais formais, o diálogo pareceria mais ou menos verdadeiro. Segundo o manual do professor espera-se que o aluno perceba que a substituição das gírias por expressões mais formais tornaria o diálogo menos natural, menos espontâneo, o que é importante. Ao sugerir que o aluno imagine que a situação tivesse ocorrido entre o garoto perguntar a respeito do vizinho ao síndico do prédio, que seria um homem muito sério e formal, a pergunta é se no diálogo entre eles haveria o emprego de gírias. Nesse caso espera-se que o aluno perceba que não (manual do professor, p. 114). Ainda nessa mesma questão o aluno deve concluir em quais situações é adequado empregar gírias em um texto oral ou escrito. As recomendações do manual são de que o aluno

4 perceba que é adequado empregar gírias em um texto oral ou escrito em situações informais. Essas indicações e outras citadas no manual são importantes, principalmente quando afirma que o emprego de gírias pode ocorrer tanto na fala como na escrita, claro em situações informais. Na unidade 07 o Estudo da Língua tem como tema Linguagem formal e informal, pessoas do discurso, conjugação verbal. É apresentada ao aluno frases usada no texto Tato, o pintor de palhaços. A frase usada na atividade foi Tato foi prum canto, apreciar. Há explicação é que a grafia da palavra reproduz a pronuncia do oral. Depois se questiona ao aluno qual seria a grafia convencional da palavra (prum), e se o uso dessa forma, ao ser aplicado na escrita, provoca um efeito de informalidade ou formalidade, e por fim pede que o aluno encontre no texto outros exemplos desse mesmo recurso de linguagem. 1.2. Trabalho específico com o tema Como pudemos observar na exposição acima, a maioria do trabalho com variação linguística refere-se a questões de formalidade e informalidade no uso de grafias ou fala oral. A única unidade que realmente trata da questão é na segunda unidade, na seção Estudo da língua denominada Registros informal e formal, linguagens oral e escrita, variedades rural e urbana. Contudo, notamos uma inadequação nos usos dos termos, pois ao se falar em variação linguística, não se pode limitar a uma única variante (no LD a rural). Até porque o próprio tema da seção indicaria a variedade rural e urbana, não uma só e em termos chulos. Até mesmo no uso do termo para indicar essa variante ocorre um preconceito que em vez de alerta os alunos ao respeito dessa variação o levará a discriminação. Vejamos a abordagem: IMAGEM IX: abordagem com variação linguística FONTE: MODERNA, 2005, P. 39.

5 Como podemos ver nas indicações ao professor a questão da variedade rural é denominada como Variante caipira em registro informal em contraposição a variante informal urbana. Até ai tudo bem, entretanto, logo em sequência explica que o aluno pode responder que como a história é de matutos, tudo se passa entre matutos, o que não deixa de ser uma boa hipótese. Como o termo matuto em nosso meio é utilizado em sentido depressivo para menosprezar as pessoas, o LD poderia usar outra denominação. Esse termo matuto usado no LD é retomado noutra questão na mesma unidade na 4ª atividade IMAGEM X: descrição do gênero conto FONTE: MODERNA, 2005, p. 40. O LDP poderia utilizar outras denominações como variante rural, a qual se denominou no tema da seção, uma pessoa de um meio campestre, ou de qualquer outro meio, pois a variação ocorre em todos os meios, sejam rurais, sejam urbanos. Outra questão é que não se falar que a variante urbana também sofre variação, desse modo, o aluno tem uma concepção errônea de variação a considerando por vezes como falar errado. Outra questão do LD pede que o aluno transcreva do texto exemplos que ele perceba como típicos da linguagem falada espontânea, sem formalidades. No entanto, percebe-se que o tratamento dado ao tema é genérico, pois a variação linguística não ocorre somente no meio rural, mas também no meio urbano ou em qualquer outro ambiente. Bagno (2007, p. 76) garante que cada variante linguística recebe avaliações diferentes nas relações sociais e essas avaliações que vão das mais estigmatizadas as mais prestigiadas têm a ver com as avaliações sociais que são lançadas sobre os falantes de determinada variedade. Para o citado autor devemos tratar os fenômenos de variação e mudança na educação em língua materna de modo a reconhecer que a escola é o lugar de interseção inevitável entre o saber erudito-científico e o senso comum, e que isso deve ser empregado em favor do/a estudante e da formação de sua cidadania. (idem, p. 78). Deve-se, portanto, considerar os dois pontos de vista, o científico e o do senso comum para favorecer a reflexão em analisar a realidade social e linguística dos falantes, como meio de garantir sua participação na sociedade de forma plena, sendo respeitados seus direitos e deveres. Em nenhum momento há indicação do que seja variação linguística nem no LD do

6 aluno nem no do professor. Portanto, à indicação dos PCN de que o preconceito deve ser enfrentado na escola como objetivo de uma educação de respeito linguístico não é posto em prática pelo LD. Está descrito nos objetivos gerais dos PCN que os alunos devem conhecer e respeitar as diferentes variedades linguísticas do português falado. Apesar da pretensão ser boa deve se levar em conta que o profissional que vai lidar com esse LD muitas vezes não sabe realmente o que é variação linguística, muitas vezes por não terem uma base teórica sobre o assunto e o LD não explica com termos técnicos os conceitos, nem mesmo no LD do professor essas informações são bem explicitadas. Há uma boa vontade, mas a falta de uma base teórica consistente e, sobretudo, a confusão no emprego dos termos e dos conceitos prejudicam muito o trabalho que se faz nessas obras em torno dos fenômenos de variação e mudança. (BAGNO, 2007, p. 119) Assim, o que prejudica o tratamento que se dá ao tema variação linguística é muitas vezes o não conhecimento do assunto. Como pontos positivos o LD está em sintonia com as propostas mais avançadas de educação em língua materna por contemplar o tema; apresenta uma variante rural, não se limitando as variedades urbanas. Outro ponto é que no LD do professor é explicado que um falante de uma dada variante rural pode usar registros mais formais ou menos formais e que as variantes (estilísticas, regionais e sociais) podem, em geral, se apresentar em registros com graus variados de formalidade. Porém, a abordagem ainda é incompleta com relação às questões de variações linguísticas, pois se trata mais de formalidade ou informalidade. O aluno deve ser levado a compreender diferentes usos que se pode fazer da fala, da nossa língua dependendo da situação comunicativa. Assim é possível que Uma mesma pessoa ora utilize a gíria, ora um falar técnico (o pedagoguês, o economês ), ora uma linguagem mais popular e coloquial, ora um jeito mais formal de dizer, dependendo do lugar social que ocupa e do grupo no qual a interação verbal ocorrer [...] (PCN, 1997, p.22) É necessário fazer uma ponderação com relação às diferenças dialetais no Brasil como Bortoni-Ricardo e Delttoni (2001, p. 82) explicam ao afirmar que: Na sociedade brasileira, as diferenças lingüísticas não assumiram valores sociosimbólicos associados à etnicidade. Dito de outra maneira, a estratificação sociolingüística no Brasil não se dá em função de fronteiras étnicas, exceto no caso das minorias bilíngües. Segundo pesquisas realizadas por essas autoras verificasse que nas nossas salas de

7 aula a co-ocorrência de variedades linguísticas não precisa ser fundamentalmente conflitiva. Em outras palavras O uso do português popular em sala de aula, que em muitos casos é motivo de discriminação e desvalorização de seus usuários, é um problema que pode ser bem administrado por professores, quando desenvolvem estratégias, intuitivas ou intencionais, de ajustamento das crianças falantes dessa variedade à cultura escolar. (idem, p. 83) De acordo com os PCN a questão não é falar certo ou falar errado, mas saber qual forma de fala utilizar, conforme a situação comunicativa. Mas sabemos que há uma forte pressão em torno de um suposto falar correto em detrimento a fala cotidiana do aluno. Por isso, segundo Antunes (2007, p. 15/16): Há pressões sociais em torno do ideal de um falar correto, supostamente mais perfeito e prova de superioridade intelectual e cognitiva. Quando se sai da escola, se sai muito mais confuso, com uma visão de língua deturpada, reduzida e falseada, terreno muito propício à gestação de preconceitos e de simplismos incabíveis. Travaglia (2003, p. 23,) afirma que a língua é de importância fundamental para que a comunicação entre os homens se exerça de maneira competente, conveniente. É ai que o autor afirma que Uma educação linguística é necessária, importante e fundamental para as pessoas viverem bem em uma sociedade e na cultura que se veicula por uma língua e configura essa língua por meio de um trabalho sócio-histórico-ideológico que estabelece tanto os recursos da língua como as regularidades a serem usadas para comunicar quanto os significados/sentidos que cada recurso é capaz de pôr em jogo em uma interação comunicativa. (grifos da autora) Já de acordo com Bagno (2007) o que deve haver é uma reeducação sociolinguística já que essa é uma proposta de pedagogia da variação linguística que leva em conta as conquistas das ciências da linguagem, mas, também, as dinâmicas sociais e culturais em que a língua está envolvida. Bagno é defensor desse trabalho de reeducação sociolinguística dos alunos pelos professores de língua portuguesa, e aqui incluiríamos os professores dos anos iniciais; o que significa que os profissionais devem aproveitar o tempo e o espaço que têm na escola para formar cidadãos conscientes das relações sociais que mantêm e empregam por intermédio da linguagem. Esse trabalho de reorganização dos saberes linguísticos não tem relação com a correção de ERRO, nem com a substituição de uma variedade por outra. Isso implica

8 segundo o autor para a professora: fazer os alunos reconhecer que são possuidores de uma língua plena e funcional. De forma a levá-los a tomar consciência da escala de valores que é atribuída a cada variedade, garantindo o acesso desses sujeitos a outras formas de falar e de escrever, ampliando o seu repertorio comunicativo. Além disso, devem-se conscientizar os alunos de que a língua pode ser utilizada como meio de promoção social, de coação ou discriminação. Precisa-se, desse modo, trabalhar para a inclusão plena deles na cultura letrada, e por fim promover o reconhecimento da diversidade linguística como uma riqueza de nossa cultura. Portanto, fazer referência a existência de variedade linguística não quer dizer que o aluno vá respeitá-la. Se o trabalho não for consistente e não abordar o preconceito que se tem com relação a essas variedades, especialmente as mais estigmatizadas, o trabalho não vai passar de recomendação da proposta dos PCN. O trabalho com a variação apresentada no LDP necessita de uma reflexão mais cautelosa e como afirma Dionísio (2005) ao analisar alguns LD de uma reflexão até mais humana. Isso exige todo um trabalho que demanda tempo para que aja conscientização, especialmente das crianças, o que envolve debates, progressos e retrocessos e uma mudança nos próprios cursos de graduação, especialmente de Pedagogia, entretanto, não é oferecido nenhuma disciplina específica sobre o tema. Uma prática que se constata nas aulas quando o tema é variação linguística é de pedir que o aluno passe determinado texto de uma variante para outra, essa prática é explicada por Antunes (2007, p. 108), já que [...] Essa tarefa esconde pretensões que podem ferir os princípios da sociolinguística [...] O comando de passar para outra norma, no contexto escolar, já traz embutida a ideia de que a outra é melhor [...] o que vai reforçar todos aqueles mitos a favor da hegemonia de uma norma sobre as outras. Essa prática é improdutiva, pois a variação linguística usada em cada região é uma característica que marca a identificação cultural do grupo que faz uso dessa variedade; portanto, querer mudar, alterar, ou substituir os padrões da fala por outro que se julga melhor, mais bonito ou mais culto é tirar o que é de mais original de determinado grupo, o que acabaria descaracterizando suas marcas pessoais de expressão. A escola precisa desenvolver a capacidade dos alunos para acolher as diferenças e não se prestar a reforçar o preconceito e a estigmatização linguística. Cabe ressaltar que não estamos propondo uma troca ou substituição de uma

9 variedade por outra, mas defendemos um trabalho consciente sobre o tema em sala de aula que combine a cultura linguística da comunidade que a criança faz parte e a tradição linguística da escola. Pois, quando há um conflito sociolinguístico as desvantagens são maiores para as crianças portadoras de uma cultura não prestigiada na sociedade, já que no Brasil, a língua portuguesa possui muitas variedades dialetais, sendo possível identificasse geográfica e socialmente as pessoas como falam, mas: Há muitos preconceitos decorrentes do valor social relativo que é atribuído aos diferentes modos de falar: é muito comum se considerarem as variedades lingüísticas de menor prestígio como inferiores ou erradas. A escola não pensa sobre os modelos sociolinguísticos da comunidade nem leva em consideração para se auxiliar dos exemplares que estão disponíveis na cultura local. Bortoni- Ricardo e Delttoni (2001, p. 102) evidenciam que a instituição escolar necessita tornar-se culturalmente sensível para lidar convenientemente com a mudança linguística e cultural de nossas crianças. As formas de por em prática a pedagogia culturalmente sensível são múltiplas e as autoras citam algumas como: Aproveitar as experiências e vivencias que as crianças trazem consigo, reproduzindo padrões interacionais que lhes são familiares; respeitarlhes as peculiaridades; desenvolver recursos que façam a distinção entre eventos de oralidade e de letramento; implementar estratégias de envolvimento, permitindo que a criança fale, ratificando-a como falante legítimo; incentivá-la a manifestar-se, fornecendo-lhe modelos de estilos monitorados da língua e mostrando-lhe como, quando e porque usar esses estilos. A escola tem de acolher a diversidade de cultura que temos, de modo geral, e especificamente da variedade linguística tornando-a operacional, precisamos ainda conscientiza-se de que as diversidades sociolinguísticas correspondem a desigualdades sociais. Esse intuito demanda tempo e trabalho para atingir o objetivo de uma verdadeira educação e como afirma Bagno (2007) de uma reeducação sociolinguística.

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