A importância da ultrassonografia na endometriose de septo retovaginal e do fundo de saco posterior

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Artigo de Revisão A importância da ultrassonografia na endometriose de septo retovaginal e do fundo de saco posterior The importance of ultrasound in the rectovaginal septum and posterior cul-de-sac endometriosis Fábio M Bernardi 1, Francisco Mauad Filho 1,2, Wellington P Martins 1, 2 Estima-se que a endometriose chega a atingir 15% das mulheres em idade fértil, sendo o principal sintoma a dor pélvica, que pode se apresentar das mais diversas formas. O seu diagnóstico ainda representa um grande desafio em virtude da sua semelhança com outras condições patológicas, ginecológicas ou não. A ultrassonografia tem sido considerada como exame complementar de primeira linha para o diagnóstico dessa patologia. Duas modalidades de ultrassonografia foram revisadas com base nos últimos estudos publicados, a fim de se fazer diagnóstico de endometriose de septo retovaginal e do fundo de saco posterior. A ultrassonografia endovaginal continua sendo a de primeira escolha por ser simples, barata, de baixo custo e de fácil execução. Os principais achados encontrados nessa modalidade foram imagens hipoecóicas, espiculadas ou não, não compressíveis, localizadas no fundo de saco posterior ou no septo retovaginal. Já a ultrassonografia retal endoscópica apresenta maior sensibilidade e especificidade quando se necessita de avaliação de quais camadas do reto ou do sigmóide ou do septo retovaginal estão acometidas. Entretanto apresenta a desvantagem de necessitar de preparo intestinal e de ser considerada mais invasiva. Todavia, sua superioridade na avaliação do grau de acometimento do reto e do sigmóide é indiscutível. Palavras-chave: Ultrassonografia; Endometriose; Septo Retovaginal. 1- Escola de Ultrassonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto (EURP) 2- Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) Recebido em 14/12/2010, aceito para publicação em 30/12/2010. Correspondências para Dr. Fábio M. Bernardi. Clínica Bernardi Assistência à Mulher Av. Angélica, 2466-25º andar Higienópolis - São Paulo - SP E-mail: lererbos@hotmail.com Fone: (11) 3159-2880 Abstract Endometriosis presents increasingly important due to the estimate that up to 15% of women of childbearing age can present it. The main symptom is pelvic pain, and shall present itself in many different ways. The diagnosis still represents a great challenge because of its similarity to other pathological conditions, gynecological or not. Ultrasonography has been regarded as firstline supplementary examination for the diagnosis of this pathology. Two types of ultrasonography were reviewed based on recent published studies, in order to make the diagnosis of endometriosis of the rectovaginal septum and the posterior culde-sac. The transvaginal ultrasound remains the first choice because it is simple, fast, low cost and easy implementation. The main findings of this modality were hypoechoic, spiculated or not, non-compressible images, located at the Douglas Pouch or rectovaginal septum. Rectal endoscopic ultrasonography has greater sensitivity and specificity when needs assessment which layers of the sigmoid colon or rectum or the rectovaginal septum are affected. However it presents the need for bowel preparation and is considered more invasive. Thus, its superiority in evaluating the degree of involvement of the rectum and sigmoid is indisputable. Keywords: Ultrasonography; Endometriosis; Rectovaginal Septum.

186 Introdução A definição de endometriose é a presença de tecido endometrial funcional fora da cavidade uterina. Sua importância vem crescendo, pois se sabe que até 15% das mulheres em idade reprodutiva podem ter diferentes graus da doença 1. O bloqueio do fundo de saco de Douglas pela endometriose foi descrito pela primeira vez por Sampson, em 1922 2. Três teorias são aceitas para sua histogênese: menstruação retrógrada que resulta na implantação metastática de tecido endometrial na superfície peritoneal, diferenciação metaplásica de superfícies serosas ou restos mullerianos e a teoria da indução de mesênquima indiferenciado 3. A maioria das pacientes é assintomática, sendo a infertilidade muitas vezes o primeiro sintoma a aparecer 3. Entretanto, os ciclos subseqüentes de sangramento e reação fibrótica podem causar o principal sintoma da endometriose: a dor pélvica, que pode se apresentar das mais diversas formas, como dispareunia, dismenorréia, disúria e disquesia 1, 4. O diagnóstico da endometriose ainda representa um grande desafio, em virtude da sua similaridade com outras condições benignas e malignas, ginecológicas ou não 5. O atraso no diagnóstico em tempo superior a 8 anos do início dos sintomas confere forte impacto econômico e social 1. A base para fazer diagnóstico de desordens ginecológicas consiste na adequada realização da anamnese e do exame físico. Para confirmar ou afastar um diagnóstico o clínico geralmente adiciona um exame de imagem à suspeita clínica 6. A ultrassonografia, em particular a endovaginal, é hoje em dia a primeira escolha e tem revolucionado o manejo ambulatorial. Melhores resoluções de imagem e experiência do examinador no uso do aparelho têm aumentado a acurácia no diagnóstico da maioria das desordens ginecológicas 7. No entanto, a endometriose permanece um grande desafio, mas recentes avanços na área da ecografia, que tem permitido a detecção dos implantes endometriais são encorajadores 8. Em ordem decrescente de freqüência a endometriose se apresenta em ovários, ligamentos uterinos, superfícies serosas, fundo de saco, tubas uterinas, reto, sigmóide e bexiga 9. Vários estudos comprovaram a alta sensibilidade e especificidade da ultrassonografia endovaginal na detecção de endometriomas de ovário, mas tem sido questionada quanto a sua habilidade na detecção de lesões peritoneais 8. Nesses casos, dois exames adicionais podem ser necessários: ultrassonografia endoscópica retal e ressonância nuclear magnética 10. O objetivo dessa revisão é avaliar a importância da ultrassonografia na detecção da endometriose do septo retovaginal e fundo de saco posterior, através de suas características clínicas e ecográficas em associação. Avaliação clínica Achados clínicos de endometriose profunda não são específicos. Macicez localizada dos ligamentos útero-sacros ou do fundo de saco posterior é comum. Nodulações ou espessamentos do septo reto-vaginal e ligamentos podem ser palpáveis. Os órgãos pélvicos podem encontrar-se fixos ou desviados. O exame físico deve ser realizado no período menstrual precoce, devido à maior probabilidade de encontrar lesões maiores 11. Na endometriose profunda, o sintoma mais freqüente é a dor pélvica crônica, que pode se apresentar de diversas formas, como dispareunia, disúria e disquesia. A característica essencial a todas estas formas clínicas é seu padrão mensal e cíclico de se apresentar. Em pacientes com queixas suspeitas de endometriose profunda, nodulações devem ser procuradas. O sinal essencial é que a palpação destas lesões se apresenta como dor idêntica à da dispareunia de profundidade que o paciente descreve 10. O toque bi manu al é considerado como positivo para endometriose na presença das seguintes alterações: nodulação palpável no fundo de saco ou ligamento útero-sacro e/ou expansão cística palpável nas topografias avaliadas 1. Durante o exame especular, a presença de lesões azuladas em fundo de saco ou parede vaginal indica um diagnóstico da endometriose 10. No entanto, a maioria das mulheres com endometriose pode ter resultados normais ou inespecíficos de exame físico, e a laparoscopia freqüentemente é necessária para o diagnóstico definitivo 11. Ultrassonografia endovaginal Apesar de a laparoscopia ser considerada o padrão ouro para diagnóstico de endometriose, quando esta é única e exclusiva do septo retovaginal, pode ocorrer bloqueio completo do fundo de saco posterior e dessa forma ser invisível à laparoscopia. A ultrassonografia transvaginal é simples, barata, rápida e menos invasiva que outros métodos de imagem, além de ser capaz de distinguir camadas do intestino e do septo que possam estar acometidas em virtude de sua excelente resolução para estruturas próximas 12, 13. Hensen et al. em seu estudo retrospectivo selecionou 25 pacientes com diagnóstico laparoscópico de endometriose do septo retovaginal e do fundo de saco posterior, encontrou alguns aspectos mais prevalentes nas características ultra-

187 sonográficas da doença 4. Os principais achados foram: uma ou mais formações sólidas hipoecóicas no septo retovaginal, espiculadas, não comprimíveis com a sonda e continham vascularização mínima à análise Doppler de amplitude. A maior parte das lesões se encontrava na serosa do reto e sigmóide, freqüentemente abaulando a submucosa. A quase invariabilidade da característica sólida da imagem vai de acordo com outros métodos de imagem como Ressonância Nuclear Magnética e condiz com a característica fibrótica da doença 4. Hudelist et al. selecionou pacientes com algia pélvica crônica, cujos ginecologistas assistentes suspeitavam de endometriose e comparou a eficácia do diagnóstico de endometriose através do exame clínico e da ultrassonografia endovaginal 1. A técnica do exame proposta pelos autores consistia em três inserções consecutivas da sonda. A primeira foi direcionada ao fórnice vaginal posterior e retirada lentamente para acessar o fundo de saco de Douglas, os ligamentos útero-sacros, a bexiga e a vagina. Na sequência a sonda foi reintroduzida para avaliar útero e anexos nos planos sagitais e transversais. Finalmente a sonda foi introduzida além do intróito e movendo-se para cima foi capaz de avaliar as camadas das paredes do reto 1. Dessa forma ele considerou o espessamento ou a nodularidade hipoecóica da parede vaginal positiva para envolvimento vaginal. Da mesma forma, o septo retovaginal, definido como a área entre o reto e a vagina a partir do intróito até a inserção do lábio posterior do colo, também foi considerado acometido quando também apresentava uma nodularidade hipoecóica ou cística. Finalmente a obliteração do fundo de saco posterior foi considerada completa quando útero, anexos e retossigmóide estavam aderidos com a ausência do limite peritoneal; e incompleta quando se via parcialmente os limites do peritônio 1. Ultrassonografia retal endoscópica A ultrassonografia retal endoscópica tem se mostrado como uma técnica eficaz para obtenção de imagens, intervenções e terapias para uma grande variedade de doenças do trato gastrointestinal e extra-intestinais, incluindo lesões do colo, reto e septo reto-vaginal 14. A ultrassonografia retal endoscópica é confiável na avaliação de endometriose do septo retovaginal e permite o diagnóstico da infiltração da parede intestinal. Essa informação é essencial, porque tem um efeito direto na técnica cirúrgica que será empregada para a exérese da lesão 10. Em 2003 Bazot et al. 13 publicou um estudo prospectivo comparando o valor diagnóstico da ultrassonografia transvaginal com a ecografia retal endoscópica. Eles selecionaram 40 pacientes com quadro clínico sugestivo de endometriose e realizaram ambos os exames previamente ao tratamento cirúrgico. A técnica empregada consistia em preparo intestinal prévio com enema seguido de introdução da sonda até o nível do sigmóide e realizando movimentos para cima e para baixo antes de realizar a instilação de soro fisiológico na luz intestinal. Desta forma foi possível avaliar acometimento dos ligamentos úterossacros, da vagina e do reto e o envolvimento de diferentes camadas da parede colo-retal. Obliteração do fundo de saco posterior e a presença de líquido livre na pelve foram registradas. A endometriose pélvica foi definida pela presença de um nódulo ou massa hipoecóica, com ou sem contornos regulares 13. Houve dois estudos recentes que sugeriram que a ultrassonografia retal endoscópica pode ter um importante papel na investigação de envolvimento do reto-sigmóide em pacientes com endometriose. No passado essa técnica não era usada de rotina para esse fim (Bhutani 2007). Delpy et al. 15 tentou estabelecer o valor da ultrassonografia retal endoscópica no diagnóstico de envolvimento da parede retal por endometriose. Um estudo prospectivo foi realizado em 30 pacientes que apresentavam suspeita clínica de acometimento do septo reto-vaginal e revelou que até 88% apresentavam acometimento do septo reto-vaginal e 33% de acometimento dos ligamentos útero-sacros. A sensibilidade e a especificidade do exame encontraram-se elevadas, girando valores em torno de 96 e 100%, respectivamente 15. Considerações finais A característica da sintomatologia da endometriose é a dor cíclica associada com a menstruação. Entretanto na maioria dos casos a dor era presente de forma intermitente ou constante e não associada ao fluxo menstrual. Essa natureza não cíclica da dor no fundo de saco posterior pode explicar o porquê de ela ser geralmente mal diagnosticada. A ultrassonografia transvaginal mostra em todos os casos analisados uma ou mais massas hipoecóicas localizadas no fundo de saco posterior. As massas são sólidas, na sua maioria espiculadas e não compressíveis e apresentam um padrão de vascularização mínimo ao Doppler de amplitude. As lesões se localizam na serosa do retossigmóide, geralmente se espalhando para a submucosa. Na maioria dos casos a mucosa está intacta, demonstrando a natureza de implantação da doença. Apesar das características ecográficas serem bem

188 específicas, é sempre importante excluir carcinoma de reto ou metástases peritoneais. Apesar de a ressonância nuclear magnética ser capaz de diagnosticar todos os focos de endometriose, a ultrassonografia permanece a modalidade de avaliação inicial obrigatória devida ao acesso simples, imediato e de baixo custo. O diagnóstico de endometriomas e de endometriose de bexiga também são possíveis com a utilização da ecografia. Entretanto, em pacientes com dismenorréia crônica, dispareunia, suspeita clínica de endometriose profunda ou achados ecográficos inconclusivos a ressonância irá identificara melhor modalidade de diagnóstico por imagem que definirá a localização e a extensão da doença. Uma boa avaliação préoperatória é essencial para o sucesso do tratamento, devido à grande dificuldade técnica da realização desses procedimentos, incluindo o encaminhamento dessas pacientes a centros de abordagem multidisciplinar 5. A ultrassonografia transvaginal é hoje a modalidade de escolha para a investigação de mulheres com dor pélvica crônica. As pacientes agora podem ser investigadas na admissão e decisões podem ser tomadas para o tratamento. Com boa experiência, algumas desordens ginecológicas comuns podem ser diagnosticadas com acurácia, facilitando a triagem para protocolos de manejo apropriados. Em mulheres com dor pélvica crônica, a identificação de endometriose profunda e de peritônio tem sido um grande desafio por muitos anos. Recentes avanços na tecnologia da ultrassonografia e na experiência do examinador têm permitido aos ginecologistas utilizarem fortes e fracas evidências ecográficas a favor ou contra a suspeita clínica. O uso da ultrassonografia endoscópica transretal e sonovaginografia podem aumentar a habilidade do exame para detectar depósitos endometrióticos. Essa abordagem permite selecionar melhor pacientes para intervenção cirúrgica ou tratamento conservador 8. A ultrassonografia endoscópica trans-retal é uma técnica muito versátil que continua a ser útil para uma variedade de condições do cólon e do reto 14. Alguns autores sugerem que a ultrassonografia transvaginal e a endoscópica trans-retal possuem acurácia similar para o diagnóstico de endometrioses posteriores. A via transvaginal é o método de primeira escolha para a avaliação, logo que permite uma exploração extensa da pelve e é melhor tolerado pela paciente. Radiologistas devem primeiro se familiarizar com este método, reservando a indicação de endossonografia trans-retal aos casos em que há imagens suspeitas, ou nos pré-operatórios 13. Certamente, a informação obtida tanto na via transvaginal, quanto na endoscópica trans-retal tem suas limitações, e análises adicionais como enema baritado, colonoscopia e ressonância podem ser necessárias, especialmente nos casos em que há uma importância na avaliação da extensão pré-operatória da lesão. No entanto, a ultrassonografia transvaginal é simples e menos invasiva que outros exames, não requerendo preparo intestinal e raramente as pacientes se queixam de dor ou desconforto 16. Estudos prospectivos são necessários para uma melhor avaliação da importância de cada método empregado no diagnóstico dessa importante patologia que vem apresentando crescentes incidências nas clínicas ginecológicas. Referências 1. Hudelist G, Oberwinkler KH, Singer CF, Tuttlies F, Rauter G, Ritter O, et al. Combination of transvaginal sonography and clinical examination for preoperative diagnosis of pelvic endometriosis. Hum Reprod 2009; 24(5): 1018-1024. 2. Sampson J. Intestinal adenoma of endometrial type. Archives of Surgery 1922; 5(217-280. 3. Levy AD, Shaw JC, Sobin LH. Secondary tumors and tumorlike lesions of the peritoneal cavity: imaging features with pathologic correlation. Radiographics 2009; 29(2): 347-373. 4. Hensen JH, Puylaert JB. 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