O USO DA PERSPECTIVA MATEMÁTICA E O DOMÍNIO DO ESPAÇO REAL E IMAGINÁRIO



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Transcrição:

O USO DA PERSPECTIVA MATEMÁTICA E O DOMÍNIO DO ESPAÇO REAL E IMAGINÁRIO Madalena Grimaldi de Carvalho UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro Escola de Belas Artes arqgrimaldi@uol.com.br Glaucia Augusto Fonseca UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro - Escola de Belas Artes PUC Rio Pontifícia Universidade Católica Faculdade de Arquitetura UGF Universidade Gama Filho Faculdade de Arquitetura METODISTA do Rio Faculdade de Arquitetura glauciaaugusto@gmail.com RESUMO Este artigo faz um estudo sobre o ensino da perspectiva, cujo desenho corresponde a uma das mais significativas técnicas de representação tridimensional do espaço através de um desenho bidimensional. É certo que a descoberta do traçado da perspectiva matemática, na época do renascimento, foi um grande avanço, porém, com o advento da tecnologia computacional, as metodologias de ensino precisam ser reavaliadas, a fim de formar profissionais capazes de dominar as novas ferramentas de construção e ao mesmo tempo, pensar tridimensionalmente ao traçar o espaço real ou imaginário. Palavras-chave: Percepção espacial, Raciocínio espacial, Desenho, Perspectiva. INTRODUÇÃO O processo criativo deve produzir uma obra que detenha desenho, harmonia e beleza. Estas qualidades também estão presentes na criação matemática. 1 Antes de iniciarmos o desenvolvimento deste trabalho, cabem alguns esclarecimentos sobre a evolução do conceito de perspectiva. Ainda que o método geométrico de construção só tenha sido desenvolvido plenamente na época do renascimento, o ser humano sempre utilizou os suportes artísticos como meio de expressão. Os gregos possuíam alguma noção do fenômeno perspectivo e suas pinturas produziam uma razoável ilusão de profundidade, recorrendo ao uso de linhas inclinadas, redução do tamanho das figuras em segundo plano e jogos de claros e escuros. Por volta de 300 AC, o matemático grego Euclides de Alexandria propôs a noção de cone de visão e anos mais tarde, o matemático e filósofo árabe Alhazen definiu a base ótica da perspectiva, demonstrando que a luz se projeta, em forma cônica, no olho humano. 1 Kline, M. (1953). Mathematics in Western Cultura. Oxford: Oxford University Press. New York, 1977, pag. 523-525.

Grande parte desse conhecimento teórico se perdeu no período medieval. Nessa época, utilizavam a sobreposição de imagens para representar as distâncias e os objetos e personagens possuíam uma escala, de acordo com seu valor espiritual ou temático. Somente, em meados do século XV (no período da história do Renascimento conhecido como Quatrocento), a perspectiva foi profundamente estudada. A resposta veio pela aplicação de conhecimentos de geometria e álgebra. Ao pensarmos em matemática, muitas vezes a dissociamos de outras ciências que não estejam intimamente ligadas às áreas das ciências exatas, mas a construção correta, em perspectiva, surgiu dos estudos matemáticos e trouxe uma nova maneira de representar a realidade, desta vez com maior precisão e de surpreendente nível qualitativo. A matemática foi utilizada para representar, de forma fidedigna, objetos tridimensionais. O arquiteto Filippo Brunelleschi desenvolveu uma demonstração da perspectiva por meio de um dispositivo óptico, representando, em escala, os objetos e mantendo a proporção entre seu tamanho real. Pouco tempo depois, quase todos os artistas florentinos utilizaram-se da perspectiva geométrica em suas pinturas, para retratar uma cena única de forma coerente. Muitos empregavam o recurso de pisos em xadrez, apesar de esses pisos serem historicamente incoerentes. Essa marcação, que se tornou recorrente na arte do Quatrocento, obedecia a regras geométricas e ajudavam o artista a posicionar os objetos no espaço, passando a ser um novo método compositivo. Outros artistas trouxeram importantes contribuições, como Leonardo da Vinci, que utilizava aspectos da geometria e da proporção na formação e construção de um quadro. Ele observou que a aparência dos objetos mudava, à medida que a distância entre objeto e observador aumentava. Desta forma, as linhas que delimitavam a silhueta do objeto, se tornavam menos distintas em grandes distâncias. Figura 1: Construção geométrica de uma perspectiva. Gravura por Henricus Hondius Essa evolução do traçado da perspectiva fundamenta sua metodologia de ensino e sua definição nos dias atuais, como: a projeção em uma superfície bidimensional de um determinado fenômeno tridimensional. Para ser representada na forma de um desenho (conjunto de linhas, formas e

superfícies) deve ser aplicado mecanismos gráficos estudados pela Geometria descritiva, os quais permitem uma reprodução precisa ou analítica da realidade tridimensional. 2 MÉTODOS UTILIZADOS EM SALA DE AULA O interesse, no aprimoramento de uma nova metodologia, surgiu ao observar os alunos da Escola de Belas Artes na UFRJ. Ensinamos os métodos tradicionais, na construção de perspectivas, como o processo das visuais e dominantes e o processo dos pontos medidores, com o auxílio de tabelas, onde o estudante se utiliza de medidas pré-estabelecidas, que garantem uma construção gráfica correta. Nesse caso, notamos que a utilização de tabelas favorece o processo mecânico; contudo, pouco ajuda na compreensão do conceito e, conseqüentemente, no domínio do espaço tridimensional. Constatamos ainda, que essa discrepância entre o domínio do método e do espaço torna-se ainda mais palpável quando trabalhamos com a construção da sombra, parâmetro medido matematicamente, que muda de acordo com a orientação angular da luz. Os exercícios em questão são montados com complexidade crescente: oferecemos as vistas ortográficas (superior, lateral e frontal) de objetos ou espaços cotados. A partir dessas informações, o estudante tem que construir a perspectiva, utilizando um dos processos gráficos ensinados. Porém, nossa prática em sala de aula tem mostrado que, determinados estudantes sabem construir desenhos em perspectiva de acordo com um procedimento, mas não sabem realmente o que estão fazendo, apenas seguem uma receita de construção. Perspectiva com um ponto de fuga: Processo dos Pontos Medidores, quadro de frente. Também conhecido como Processo das 3 Escalas. Perspectiva com dois pontos de fuga: Processo dos Pontos Medidores. Dispensa a construção da vista superior na mesma escala da construção da perspectiva. Perspectiva com dois pontos de fuga: Processo das Visuais e Dominantes. Necessita do desenho da vista superior. Figura 2: Tipos de perspectivas desenvolvidas com os alunos no método tradicional 2 http://pt.wikipedia.org/wiki/rivethead

Ao analisarmos os resultados dos exercícios verificamos que quando a forma da volumetria foge da convencional, muitos não conseguem ler vistas ortográficas (desenhos bidimensionais) fornecidas e visualizar o desenho em três dimensões, não compreendendo corretamente a volumetria da peça a ser construída. Verificamos assim que, alguns de nossos alunos são meramente cumpridores de processos gráficos, não possuindo domínio da visualização e da representação de conceitos geométricos, tão fundamentais para o entendimento do espaço. No decorrer da nossa disciplina, buscamos que o aluno vá descobrindo, através do raciocínio lógico, a relação imagem visual / imagem espacial, e comece a perceber o espaço tridimensional a partir da representação bidimensional. Para alguns, esse salto de compreensão entre a transformação de uma imagem visual mental, em uma imagem representada, incide de forma quase imediata. Para outros, essa evolução só acontece através de um adequado desenvolvimento perceptivo do espaço, ou seja, do processo de formação de imagens visuais. Para tanto, estimulamos a construção de croquis e trabalhamos com fotos onde eles procuram as fugas e começam a entender as relações entre o espaço percebido e interpretado pelo indivíduo. O aluno precisa compreender as regras matemáticas para representação do desenho, necessita preparar o campo da percepção visual e o seu raciocínio lógico, para que através das representações bidimensionais consiga fazer a leitura do desenho e processe essas representações de modo a interpretá-las tridimensionalmente. Figura 3: Perspectivas desenvolvidas com o auxílio do computador Numa tentativa de melhorar a compreensão tridimensional introduzimos o uso do computador, que oferece inúmeras possibilidades para a representação gráfica. Ressaltamos, porém, que a

aplicação de determinados softwares não favorecem a compreensão da lógica tridimensional, distanciando-se, ainda mais, do entendimento do conceito, embora, em muito, melhore a qualidade gráfica das imagens apresentadas. No caso, o software escolhido tem sido o SketchUp. Essa escolha foi por motivos operacionais e de falta de tempo para desenvolver programas mais complexos. O SketchUp possui comandos simples e de fácil interatividade, que trabalham diretamente sobre a terceira dimensão. Nesta etapa, percebemos que alguns alunos conseguem inter-relacionar o conhecimento do método com o resultado obtido no computador. Compreendem os conceitos de altura e variação da posição do observador e como o seu deslocamento interfere na escolha da visualização do objeto. Aplicam a sombra, estudam sua variação angular e podem, ainda, trabalhar texturas e cores rapidamente. Acreditamos que a perspectiva deve ser ensinada como uma representação do espaço que vai além de um simples recurso gráfico, transcendendo o nosso universo visual. O domínio da sua construção e da visualização é de fundamental importância na construção e exploração do conceito matemático, permitindo controlar a representação de um objeto ou de um determinado ambiente. A PERSPECTIVA COMO MEDIAÇÃO ENTRE O ESPAÇO REAL E O ESPAÇO IMAGINÁRIO A importância dos números e das operações é evidente pelo uso que lhes dão em nosso cotidiano. Porém não é suficiente ensinar os conteúdos que tenham uso evidente. A Matemática é um bem cultural; a cultura, entre outras coisas tem produzido Matemática e Geometria é parte desse evidente bem cultural. No que a Matemática se refere, a escola deve esta custosa produção cultura 3 Acreditamos que o aspecto científico na formação das pessoas é de grande importância, porque possibilita a saída do senso comum, na busca de uma nova consciência essencialmente experimental. Aprender não significa somente fixar na memória, nem dar expressão verbal e própria ao que se fixou na memória. Esse é o grande desafio que nos impomos a ensinar o tradicional método de perspectiva, seja usando esquadros ou no computador, não de forma decorada, mas realmente compreendida, para que nossos alunos possam além de saber resolver qualquer problema por raciocínio lógico, sair do senso comum e extrapolar no mundo da imaginação. A construção da perspectiva está inscrita na sua definição tradicional, ou seja, a representação da imagem como ela é percebida pelo ser humano. Desenha-se conforme as convenções: definimos a localização e a altura do observador, o ângulo de visão deste e determinamos as fugas para onde convergem linhas paralelas, criando a idéia do tridimensional numa superfície bidimensional. 3 Porras Marta. Revista Novedades Educativas Nº 88. Centro de Publicaciones Educativas y Material Didáctico. Buenos Aires. 1998. p. 24.

Construímos o ambiente real estático como um todo, que se identifica com a impressão visual percebida pelo observador. Porém, podemos acrescentar características subjetivas na montagem do espaço, para tanto, é preciso ter pleno domínio do seu traçado, para então construir um espaço imaginário. Esse tipo de representação onde a perspectiva é ilusória e extrapola a mera tentativa de representar o espaço, pode ser observada em artistas como M. C. Escher, que utiliza, em seus trabalhos, importantes conceitos matemáticos, desenvolvendo, com impressionante maestria, a noção de infinito. Figura 4: M. C. Escher. Répteis, 1943. Figura 5: M. C. Escher. Desenhando-se, 1948. Em sua obra, Escher mostra o conflito da representação espacial em um plano bidimensional. O artista investiga criticamente as leis da perspectiva, utilizadas desde a Renascença, para a representação do espaço e encontra novas leis que ilustra nas suas gravuras, criando uma espécie de ilusão, onde podemos observar o conflito espaço-superfície e figuras impossíveis. A obra de Escher fascina particularmente àqueles que lidam com Geometria. Outros artistas que merecem ser citados são René Magritte e Rob Gonsalves que seguem a mesma linha, usando uma realidade que só existe na imaginação e que desafia as leis da perspectiva e da compreensão visual. O desenho em perspectiva não pode se resumir a um ato totalmente mecânico de localizar observador, ângulo visual, linha do horizonte, linha de terra e pontos de fugas e adequar o tipo de processo ao objeto que se queira retratar. Desenhar em perspectiva é fazer surgir um novo espaço, proporcionando uma maravilhosa sensação de criação, a liberação do imaginário que se confunde com a ansiedade do criar e do representar. Esse deve ser o princípio, dominar os elementos e os métodos, sejam eles manuais ou com o uso do computador, para poder trabalhar, não só o espaço real, mas também o espaço imaginário.

Constatamos ainda que, os métodos gráficos tradicionais de construção em perspectiva são, geralmente, esquecidos pelos estudantes, após alguns meses. O desinteresse é percebido em áreas diversificadas. A representação tridimensional utilizando meios mais modernos, como a computação gráfica, tem permitido verificar que os estudantes se sentem mais estimulados, despertando maior curiosidade e criatividade do que somente com a aplicação dos processos tradicionais. Figura 6: René Magritte Passeios de Euclides, 1953. Figura 7: Rob Gonsalves Casa na árvore no outono, 1966. A realidade virtual cria situações inusitadas, onde até mesmo se pode passear por dentro das próprias imagens, um universo de fantasia, criado pelo homem com o auxílio da máquina, uma parceria muito presente atualmente. Assim, as imagens em perspectiva se apresentam sob aspectos diferenciados conforme sua intenção representativa, determinada pelo meio de criação e pela intenção do seu criador. Através desse recurso, pode-se criar e recriar imagens e ambientes. O seu domínio permite manipular realidades, fazendo surgir aspectos que desafiam a compreensão, determinando relações entre a expressão do pensamento, da realidade e das ilusões. CONSIDERAÇÕES FINAIS A perspectiva matemática estabeleceu regras e princípios normativos, que fizeram expandir, no mundo das artes, o controle do espaço. O domínio permitiu ultrapassar a compreensão do espaço real para um espaço imaginário, que extrapola o entendimento da nossa visão. Contudo, essa capacidade de representação só acontece quando dominamos os conceitos e os métodos de construção. Percebemos, na prática diária de sala de aula, que muitos trabalham, de forma

mecânica, as fórmulas e procedimentos gráficos para a resolução de exercícios de perspectiva, sem o pleno domínio do que estão realizando. Além disso, em pleno boom dos computadores, é preciso repensar a metodologia de ensino da perspectiva. Não nos parece possível não introduzir os meios digitais na formação de profissionais. Não queremos dizer com isso, que não se devem ensinar os métodos tradicionais de construção da perspectiva cônica. Acreditamos, porém, que esse processo tem que fazer parte da carga teórica da disciplina, servindo para o entendimento do traçado e devendo ser exemplificado e construído em exercícios práticos que estimulem a compreensão e o raciocínio. Nossa experiência tem mostrado que os alunos que não conseguem construir a mão quando se deparam com os recursos tecnológicos conseguem compreender melhor a peça e começam a ter uma visão espacial para expressar e explorar a realidade tridimensional aplicada num software gráfico. Ou ainda, aqueles que compreendem a lógica da representação tridimensional num espaço bidimensional apresentam ganhos significativos aliando seu conhecimento com as facilidades que os programas digitais oferecem. Nossa busca é compreender, como os alunos, dentro do contexto didático-pedagógico, processam as inter-relações entre a visualização e a representação de formas geométricas, envolvendo as mídias computacionais e os métodos tradicionais de ensino. O grande desafio que nos impomos é o de contribuir com metodologias didáticas que possibilitem aos alunos ter a capacidade de articular os conhecimentos adquiridos estimulando sempre o raciocínio para resolução de questões tridimensionais tanto do mundo real quanto do imaginário. REFERÊNCIAS CHING, Francis D. K.; Dicionário visual de arquitetura; São Paulo: Editora Martins Fontes, 2000. EMMER M. (1991) La pertfezione visible. Roma: Theoria ed ESCHER, M. C. The magic of M.C.Escher; London: Thames & Hudson, 2002. GOMBRICH, E. H.; Arte e Ilusão: um estudo da psicologia da representação pictórica; São Paulo: Martins Fontes, 1995. KLINE, M. (1953). Mathematics in Western Cultura. Oxford: Oxford University Press. New York, 1977, pag. 523-525. MONTENEGRO, Gildo A.; A perspectiva dos profissionais: sombras, insolação, axonometria; São Paulo: Edgard Blucher, 2001. PORRAS Marta. Revista Novedades Educativas Nº 88. Centro de Publicaciones Educativas y Material Didáctico. Buenos Aires. 1998. p. 24. ZUCCOTTI, Giovanna M.; A perspectiva como mediação entre o espaço da realidade e o espaço matemático; Itália: Celid, março, 1983. SITES: http://pt.wikipedia.org/wiki/rivethead www.educacaopublica.rj.gov.br/.../mat05.htm