Excertos da publicação: 1. Considerações sobre o controle de constitucionalidade. 1.1 Exposições preliminares

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Transcrição:

Excertos da publicação: PEREIRA, Rodrigo Paixão. Alguns aspectos da abstrativização do controle difuso de constitucionalidade. 2008. Monografia (Trabalho Acadêmico apresentado à Escola Superior Verbo Jurídico conclusão de curso de pós-graduação) Escola Superior Verbo Jurídico, Porto Alegre, 2008. 1. Considerações sobre o controle de constitucionalidade 1.1 Exposições preliminares A ordem constitucional em um Estado Democrático de Direito carece de proteção e, para tanto, o legislador constituinte originário ocupou-se em criar um mecanismo capaz de controlar as leis e os atos, de forma que as normas do ordenamento jurídico encontrem e se mantenham em compatibilidade com a Constituição Federal que ocupa, por sua vez, o mais alto grau hierárquico nesta pirâmide normativa. Esta idéia de proteção não pode ser dissociada do conceito de rigidez da Constituição. Isto importa em dizer que a norma constitucional não pode ser alterada sem que antes se preencha uma série de requisitos e solenidades diversas daquelas necessárias para que modifique norma de caráter infraconstitucional. Assim, pois, surge a noção de que estando a Constituição no cume do ordenamento jurídico, constitui ela mesma o alicerce de validade para as demais espécies normativas que compõe o sistema jurídico. Dito isto, fica claro que qualquer lei ou ato normativo que contrarie, macule ou ofenda a Constituição deve ser detectado, buscando-se, a partir daí o restabelecimento da ordem subvertida. É então através do sistema de controle de constitucionalidade de leis e atos que se realiza a aludida detecção da irregularidade e afirma-se a respeito de sua inconstitucionalidade.

Vale dizer que os atos normativos ao nascerem, gozam de presunção (relativa) de constitucionalidade. Porém, ao verificar-se a incompatibilidade com os ditames constitucionais podem ter sua invalidade declarada, deixando de ser aplicado no caso concreto, através do chamado controle incidental. Noutro plano, por assim dizer, pode ainda ser o ato normativo irregular extirpado do ordenamento jurídico, consequência atingida por meio do controle concentrado de constitucionalidade. 1.2 Modelos e sistemas de controle de constitucionalidade A doutrina, de forma geral, aponta que o controle de constitucionalidade pode ser político ou jurisdicional. No controle político órgãos distintos dos demais poderes, em geral constituídos especialmente para este fim, realizam a tarefa de defender a supremacia da constituição. A França, por exemplo, possui o denominado Conselho Constitucional, órgão que se aloca fora da estrutura dos demais poderes. Tal modelo não é adotado no Brasil. O controle jurisdicional, por sua vez, se caracteriza pela realização do exame de compatibilidade dos atos normativos com a Constituição Federal através dos órgãos integrantes do Poder Judiciário, tanto por meio de um único órgão (controle concentrado), como por qualquer juiz ou tribunal (controle difuso). Em relação ao momento em que é exercido o controle de constitucionalidade pode ser classificado em preventivo ou repressivo. Em sua modalidade preventiva, o controle é exercido pelo Poder Legislativo ou pelo Poder Executivo, no curso do processo legislativo. Segundo Tavares (2008, p. 224) por parte do legislativo tal análise se dá quando os projetos de lei ou propostas de emendas são levados ao crivo das Comissões de Constituição e Justiça e, por parte do Executivo quando, ainda no processo de elaboração das leis, os projetos são submetidos à sanção ou veto do Presidente da República.

O controle repressivo ou a posteriori, é efetuado após o ingresso da lei ou do ato no ordenamento e, indubitavelmente, é exercido pelo Poder Judiciário, seja na via concentrada, seja na via difusa. Discussão se apresenta a respeito do exercício de tal modalidade de controle pelos demais Poderes, eis que alguns autores entendem que este pode ser também realizado pelo Legislativo e pelo Executivo. Nesse sentido leciona Tavares (2008, p. 225), verbis: O controle repressivo pode ser exercido igualmente pelo Poder Legislativo, pelo Poder Executivo ou pelo próprio Judiciário. O Poder Legislativo exerce o controle repressivo da constitucionalidade com base no art. 49, V, da Constituição, que prevê a competência do Congresso Nacional para sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa. Também a análise das medidas provisórias pelo Congresso Nacional, com base no art. 62, pode-se considerar um controle repressivo. Da mesma forma, o controle realizado com supedâneo co conhecido art. 52, X (competência do Senado Federal para suspender leis declaradas inconstitucionais pelo S.T.F. em sede de controle difuso-concreto). O Poder Executivo, devendo pautar-se pela regulamentação legal em toda a sua atividade, sempre que detectar qualquer desvio deverá corrigi-lo imediatamente. Assim, o autocontrole do Poder Executivo e a possibilidade de anular os atos eivados de ilegalidade (lato sensu) conferem ao Executivo, também, um controle repressivo da constitucionalidade. Aliás, é o entendimento sumulado pelo próprio Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a Administração pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que o tornam ilegais. O Poder Judiciário é responsável, como se sabe, por responder aos conflitos intersubjetivos (casos concretos) para solucioná-los à luz da Constituição. Mais recentemente (no Brasil desde a E.C. n. 16, de 1.965), tem recebido poderes para, em abstrato, analisar a constitucionalidade de atos normativos. Em relação aos sistemas, é de se dizer que a tese mais aceita é a de que o Brasil adota a forma mista 1, híbrida, de controle de constitucionalidade de leis e atos, onde convivem dois modelos distintos, quais sejam, o modelo difuso por via de exceção ou de defesa e o modelo concentrado, também denominado de abstrato. O modelo de controle difuso foi adotado pela na Constituição da República de 1891, notadamente, por influência da Suprema Corte Americana que em caso emblemático Madison versus Marbury -, afirmou que é próprio da atividade jurisdicional a interpretação e aplicação da lei. Destarte, havendo incompatibilidade 1 Para Tavares (2008, p. 226) o modelo brasileiro seria combinado e não misto.

entre essa e a Constituição Federal o juiz deverá aplicar a última, posto que superior a qualquer outra norma. O sistema difuso permite que qualquer juiz ou tribunal (inclusive de ofício) ao examinar as demandas em que jurisdiciona, conheça e afaste, no caso concreto, a aplicação da norma que entender inconstitucional. O controle, pois, é exercido de forma incidental e a inconstitucionalidade não se afigura como o mérito do feito, carecendo, porém, de análise para o adequado enfrentamento da questão, sob pena de aplicação de norma incompatível com a Constituição à questão posta em causa. Este reconhecimento de inconstitucionalidade junto aos tribunais deve observar a regra contida no art. 97 da Constituição Federal que consagra o princípio da reserva de plenário. Eis o teor da norma: Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público. Em regra, o desrespeito à reserva de plenário ocasiona a nulidade absoluta da decisão colegiada emanada do órgão fracionário. Entretanto, este preceito vem sendo mitigado pelo próprio STF que entende ser desnecessária a observância do art. 97 da Carta Republicana quando já exista decisão do órgão especial ou pleno do Tribunal, ou da própria Suprema Corte. Nesse sentido: INCONSTITUCIONALIDADE - INCIDENTE - DESLOCAMENTO DO PROCESSO PARA O ÓRGÃO ESPECIAL OU PARA O PLENO - DESNECESSIDADE. Versando a controvérsia sobre ato normativo já declarado inconstitucional pelo guardião maior da Carta Política da Republica - o Supremo Tribunal Federal - descabe o deslocamento previsto no artigo 97 do referido Diploma maior. O julgamento de plano pelo órgão fracionado homenageia não só a racionalidade, como também implica interpretação teleológica do artigo 97 em comento, evitando a burocratização dos atos judiciais no que nefasta ao princípio da economia e da celeridade. A razão de ser do preceito esta na necessidade de evitar-se que órgãos fracionados apreciem, pela vez primeira, a pecha de inconstitucionalidade arguida em relação a um certo ato normativo. AI- AgR 168149 / RS RIO GRANDE DO SUL. AG. REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO. Julgamento: 26/06/1995. Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA Este entendimento acabou positivado pela Lei nº. 9.756, de 17/12/98 que, acrescentando parágrafo único ao art. 481 do Código de Processo Civil, formatou:

Art. 481. Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão. Frise-se, outrossim, que para os fins de reconhecer a constitucionalidade, ou seja, afastar a arguição de inconstitucionalidade, é prescindível a observância da regra prevista no art. 97 da CF. No que toca aos efeitos produzidos em sede de controle difuso de constitucionalidade, cumpre dizer que serão inter partes e ex tunc. Convém lembrar que nesta seara de controle está a se tratar de um exame de questão prejudicial, em um caso concreto, onde as sentenças, regra geral, somente possuem força vinculante entre as partes envolvidas. Decisões do STF em sede de controle difuso, contudo, já concederam, ainda que de forma excepcional, eficácia ex nunc a esta espécie de decisão. O caso paradigma sobre esta situação excepcional foi o RE nº. 197.917, conhecido como caso de Mira Estrela, oportunidade em que o STF determinou a redução do número de vereadores daquele Município, determinando que a decisão somente viesse a atingir a legislatura seguinte. Como já mencionado alhures, a decisão adotada no sistema difuso não possui o condão de obrigar terceiros não integrantes da relação jurídica de direito processual onde se debate a questão. Nada obstante, seria um contrassenso permitir que uma norma inconstitucional permanecesse em vigor no ordenamento jurídico em função da limitação dos efeitos da decisão em relação às partes. O mecanismo adotado pela Constituição para conferir efeito erga omnes às decisões definitivas do STF em sede de controle difuso foi inscrito em seu no art. 52, X, que assim reza:

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: X - suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal; Deverá, pois, o Senado Federal ser comunicado a respeito do teor da decisão para que se manifeste acerca da suspensão daquela lei declarada viciada 2. Desde que aquela Casa Legislativa suspenda a execução da lei ou ato atacado de forma incidental, a referida suspensão terá efeitos contra todos. A doutrina se divide acerca da eficácia temporal dos efeitos da suspensão da norma pelo Senado. Defende-se que caso seja levada a efeito a suspensão pela Câmara Alta, pouco coerente seria conferir efeito ex nunc a medida, eis que muito embora seja nomeada como suspensão, trata-se de verdadeira extração da norma viciada do ordenamento. Desta sorte, impossível admitir que norma eivada de inconstitucionalidade produza efeitos, impondo-se a concessão de efeito ex tunc a providência. Com efeito, a regra do art. 52, X da CF é pouquíssimo observada, razão pela qual acabou quase por se tornar inócua. Em função disto, o Supremo Tribunal Federal tem adotado medidas de expansão da autoridade de suas decisões mesmo em sede de controle difuso, onde repise-se, o efeito seria somente extensivo às partes integrantes da lide. Acerca dessas inovações e seu enfrentamento tratar-se-á no capítulo específico sobre o fenômeno da abstrativização do controle difuso de constitucionalidade. Conjuntamente ao controle difuso igualmente vigora no Brasil o sistema de controle concentrado de constitucionalidade. 2 Segundo entendimento do STF, o Senado Federal não está obrigado a suspender a execução de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva. Trata-se de discricionariedade política, tendo o Senado total liberdade para cumprir o art. 52, X da Constituição. Cf. Lenza (2007, p. 182).

O controle concentrado, também denominado controle abstrato ou por via de ação, desenvolve-se em um processo objetivo, onde não existem partes litigantes. Segundo lição de Almeida (2005, p. 49/50) essa modalidade de controle tem como finalidade a proteção do próprio ordenamento jurídico como um todo e não busca resolver controvérsias concretas. Desta forma, uma vez reconhecida e declarada a inconstitucionalidade nesta seara de controle, a norma vergastada será ceifada do ordenamento jurídico pátrio. No controle abstrato, o exame da constitucionalidade da lei ou do ato impugnado fica concentrado no Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, que decidirá a questão em única e última instância. O controle em tese poderá ser submetido ao Supremo Tribunal Federal, por intermédio das seguintes vias: ação direta de inconstitucionalidade, ação direta de inconstitucionalidade por omissão, ação declaratória de constitucionalidade e arguição de descumprimento de preceito fundamental. No que toca a legitimação para a propositura das ações, a Carta Magna, em seu art. 103, bem como o inciso I do art. 2º da Lei 9.882/1999, arrolam os autorizados a impugnar lei ou ato normativo: Constituição Federal Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal; VI - o Procurador-Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

VIII - partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. 1º - O Procurador-Geral da República deverá ser previamente ouvido nas ações de inconstitucionalidade e em todos os processos de competência do Supremo Tribunal Federal. 2º - Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias. 3º - Quando o Supremo Tribunal Federal apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado- Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado. Lei 9.882/1.999 Art. 2 o Podem propor argüição de descumprimento de preceito fundamental: I - os legitimados para a ação direta de inconstitucionalidade; Relativamente aos efeitos conferidos às decisões exaradas neste âmbito de controle, o 2º do art. 102, da CF (com redação determinada pela EC nº. 45, de 2004), bem como o 3º do art. 10 da Lei 9.882/99, determinam que a ação direta de inconstitucionalidade, a ação declaratória de constitucionalidade e a arguição de descumprimento de preceito fundamental terão efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Como se observa, enquanto que em sede de controle difuso o efeito da decisão se resume a atingir as partes envolvidas na questão proposta (ao menos em tese), no controle concentrado de constitucionalidade os efeitos são erga omnes (salvo a representação interventiva) 3, afetando todas as hipóteses em que exista a incidência da lei atacada, visto que não estará aquele órgão analisando uma situação específica, mas sim, a lei abstratamente considerada. 3 Segundo Tavares (2008, p.227)

O desacatamento das decisões do STF que tenham caráter vinculante autoriza o manejo da Reclamação, importante instrumento processual previsto no art. 102, I, l da Constituição Federal, verbis: Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões; A respeito do tema, importante salientar o entendimento da Corte Suprema sobre o momento apropriado para o manejo da Reclamação que restou externado na súmula de nº. 734 daquele Tribunal: Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal. Em relação aos legitimados para a propositura desse instrumento já se manifestou o STF: QUESTÃO DE ORDEM. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. JULGAMENTO DE MÉRITO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 28 DA LEI 9868/99: CONSTITUCIONALIDADE. EFICÁCIA VINCULANTE DA DECISÃO. REFLEXOS. RECLAMAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. 1. É constitucional lei ordinária que define como de eficácia vinculante os julgamentos definitivos de mérito proferidos pelo Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucionalidade (Lei 9868/99, artigo 28, parágrafo único). 2. Para efeito de controle abstrato de constitucionalidade de lei ou ato normativo, há similitude substancial de objetos nas ações declaratória de constitucionalidade e direta de inconstitucionalidade. Enquanto a primeira destina-se à aferição positiva de constitucionalidade a segunda traz pretensão negativa. Espécies de fiscalização objetiva que, em ambas, traduzem manifestação definitiva do Tribunal quanto à conformação da norma com a Constituição Federal. 3. A eficácia vinculante da ação declaratória de constitucionalidade, fixada pelo 2º do artigo 102 da Carta da República, não se distingue, em essência, dos efeitos das decisões de mérito proferidas nas ações diretas de inconstitucionalidade. 4. Reclamação. Reconhecimento de legitimidade ativa ad causam de todos que comprovem prejuízo oriundo de decisões dos órgãos do Poder Judiciário, bem como da Administração Pública de todos os níveis, contrárias ao julgado do Tribunal. Ampliação do conceito de parte interessada (Lei 8038/90, artigo 13). Reflexos processuais da eficácia vinculante do acórdão a ser preservado. 5. Apreciado o mérito da ADI 1662- SP (DJ de 30.08.01), está o Município legitimado para propor reclamação. Agravo regimental provido. Rcl-AgR 1880 / SP - SÃO PAULO AG. REG. NA

RECLAMAÇÃO. Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA. Julgamento: 07/11/2002. Órgão Julgador: Tribunal Pleno (Grifou-se) Insta salientar que a Reclamação também poderá ser utilizada toda vez que houver desacatamento de súmula vinculante do STF, órgão que poderá, julgando procedente os termos da petição, anular o ato administrativo ou ainda cassar a decisão judicial que afronte a disposição do verbete. Tal disposição se encontra alocada no art. 103 A, 3º da Constituição Federal: Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. De outra banda, convém anotar que a Reclamação não é admissível quando se tratar de não observância de súmula persuasiva ou ainda de orientação jurisprudencial do STF. Nesse sentido manifestou-se a Suprema Corte: CONSTITUCIONAL. RECLAMAÇÃO. ALEGADA VIOLAÇÃO DA AUTORIDADE DE ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL SUMULADA. SÚMULA DA JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NÃO CABIMENTO. DECISÃO QUE NEGA SEGUIMENTO À RECLAMAÇÃO (ART. 161, PAR. ÚN., DO RISTF). AGRAVO REGIMENTAL. A reclamação constitucional (art. 102, I, l da Constituição) não é meio de uniformização de jurisprudência. Tampouco serve como sucedâneo de recurso ou medida judicial eventualmente cabíveis para reformar decisão judicial. Não cabe reclamação constitucional por alegada violação de entendimento jurisprudencial, independentemente de ele estar consolidado na Súmula da Jurisprudência Dominante do Supremo Tribunal Federal ("Súmula Tradicional"). Hipótese na qual a orientação sumulada tida por ofendida não era vinculante, nos termos do art. 103-A, 3º da Constituição. Agravo regimental conhecido, mas ao qual se nega provimento. Rcl-AgR 6135 / SP - SÃO PAULO. AG. REG.NA RECLAMAÇÃO. Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA. Julgamento: 28/08/2008. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. (Grifou-se)

Ao tratar-se do tema específico da abstrativização, será demonstrado que este entendimento já foi relativizado pelo próprio Supremo Tribunal Federal. Em linhas gerais, são as considerações necessárias a se fazer sobre controle de constitucionalidade, tema que será de importante entendimento para as considerações que serão feitas nos próximos capítulos.