Como chamar as pessoas que têm deficiência? (2013)

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ROMEU KAZUMI SASSAKI 1 Como chamar as pessoas que têm deficiência? (2013) Há 10 anos, a Revista da Sociedade Brasileira de Ostomizados publicou um dos mais importante artigos a respeito da discussão sobre a nomenclatura a ser utilizada ao tratarmos das pessoas com deficiência, de autoria do Prof. Romeu Kazumi Sassaki. A importância desse artigo deve-se à abordagem histórica elaborada pelo Prof. Romeu, que situa a discussão dentro dos movimentos de luta das pessoas com deficiência, mostrando que é uma questão que vai além dos eufemismos do discurso "politicamente correto". O Prof. Romeu acaba de rever o artigo para incluir a discussão dessa última década. É com prazer que publicamos, nos artigos do Diversa, a atualização desse relevante trabalho. Em todas as épocas e localidades, a pergunta que não quer calar-se tem sido esta, com alguma variação: Qual é o termo correto - portador de deficiência, pessoa portadora de deficiência ou portador de necessidades especiais? Responder esta pergunta tão simples é simplesmente trabalhoso, por incrível que possa parecer. Comecemos por deixar bem claro que jamais houve ou haverá um único termo correto, válido definitivamente em todos os tempos e espaços, ou seja, latitudinal e longitudinalmente. A razão disto reside no fato de que a cada época são utilizados termos cujo significado seja compatível com os valores vigentes em cada sociedade enquanto esta evolui em seu relacionamento com as pessoas que possuem este ou aquele tipo de deficiência. Percorramos, mesmo que superficialmente, a trajetória dos termos utilizados ao longo da história da atenção às pessoas com deficiência, no Brasil. 1 Romeu Kazumi Sassaki é consultor de educação inclusiva, ativista em direitos da pessoa com deficiência e autor do livro Inclusão: Construindo uma sociedade para todos. SASSAKI, Romeu Kazumi. Como chamar as pessoas que têm deficiência? Revista da Sociedade Brasileira de Ostomizados, ano I, n. 1, 1 sem. 2003, p.8-11. [Texto atualizado em 2013] Instituto Rodrigo Mendes. Licença Creative Commons BY-NC-ND 2.5. A cópia, distribuição e transmissão dessa obra são livres, sob as seguintes condições: Você deve creditar a obra como de autoria de Romeu Kazumi Sassaki e licenciada pelo Instituto Rodrigo Mendes; é vedado o uso para fins comerciais; é vedada a alteração, transformação ou criação em cima dessa obra, a não ser com autorização expressa do licenciante.

ÉPOCA TERMOS E SIGNIFICADOS VALOR DA PESSOA No começo da história, durante séculos. Romances, nomes de instituições, leis, mídia e outros meios mencionavam os inválidos. Exemplos: A reabilitação profissional visa a proporcionar aos beneficiários inválidos... (Decreto federal nº 60.501, de 14/3/67, dando nova redação ao Decreto nº 48.959-A, de 19/9/60). os inválidos. O termo significava indivíduos sem valor. Em pleno século 20, ainda se utilizava este termo, embora já sem nenhum sentido pejorativo. Outro exemplo: Inválidos insatisfeitos com lei relativa aos ambulantes (Diário Popular, 21/4/76). Aquele que tinha deficiência era tido como socialmente inútil, um peso morto para a sociedade, um fardo para a família, alguém sem valor profissional. Outros exemplos: Servidor inválido pode voltar (Folha de S. Paulo, 20/7/82). Os cegos e o inválido (IstoÉ, 7/7/99). Século 20 até 1960. Derivativo para incapacitados (Shopping News, Coluna Radioamadorismo, 1973). Escolas para crianças incapazes (Shopping News, 13/12/64). Após a I e a II Guerras Mundiais, a mídia usava o termo assim: A guerra produziu incapacitados, Os incapacitados agora exigem reabilitação física. os incapacitados. O termo significava, de início, indivíduos sem capacidade e, mais tarde, evoluiu e passou a significar indivíduos com capacidade residual. Durante várias décadas, era comum o uso deste termo para designar pessoas com deficiência de qualquer idade. Uma variação foi o termo os incapazes, que significava indivíduos que não são capazes de fazer algumas coisas por causa da deficiência que tinham. Foi um avanço a sociedade reconhecer que a pessoa com deficiência poderia ter capacidade residual, mesmo que reduzida. Mas, ao mesmo tempo, considerava-se que a deficiência, qualquer que fosse o tipo, eliminava ou reduzia a capacidade da pessoa em todos os aspectos: físico, psicológico, social, profissional etc. ÉPOCA TERMOS E SIGNIFICADOS VALOR DA PESSOA

De 1960 até 1980. Crianças defeituosas na Grã- Bretanha tem educação especial (Shopping News, 31/8/65). No final da década de 50, foi fundada a Associação de Assistência à Criança Defeituosa AACD (hoje denominada Associação de Assistência à Criança Deficiente). Na década de 50 surgiram as primeiras unidades da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais - Apae. os defeituosos. O termo significava indivíduos com deformidade (principalmente física). os deficientes. Este termo significava indivíduos com deficiência física, intelectual, auditiva, psicossocial, visual ou múltipla, que os levava a executar as funções básicas de vida (andar, sentar-se, correr, escrever, tomar banho etc.) de uma forma diferente daquela como as pessoas sem deficiência faziam. E isto começou a ser aceito pela sociedade. os excepcionais. O termo significava indivíduos com deficiência intelectual. A sociedade passou a utilizar estes três termos, que focalizam as deficiências em si sem reforçar o que as pessoas não conseguiam fazer como a maioria. Simultaneamente, difundia-se o movimento em defesa dos direitos das "pessoas superdotadas" (expressão substituída por pessoas com altas habilidades ou pessoas com indícios de altas habilidades ). O movimento mostrou que o termo os excepcionais não poderia referir-se exclusivamente aos que tinham deficiência intelectual, pois as pessoas com altas habilidades (superdotação) também são excepcionais por estarem na outra ponta da curva da inteligência humana. De 1981 até 1987. Por pressão das organizações de pessoas com deficiência, a ONU deu o nome de Ano Internacional das Pessoas Deficientes ao ano de 1981. E o mundo achou difícil começar a dizer ou escrever pessoas deficientes. O impacto desta terminologia foi profundo e ajudou a melhorar a imagem destas pessoas. pessoas deficientes. Pela primeira vez em todo o mundo, o substantivo deficientes (como em os deficientes ) passou a ser utilizado como adjetivo, sendo-lhe acrescentado o substantivo pessoas. A partir de 1981, nunca mais se utilizou a palavra indivíduos para se referir às pessoas com deficiência. Foi atribuído o valor pessoas àqueles que tinham deficiência, igualando-os em direitos e dignidade à maioria dos membros de qualquer sociedade ou país. A Organização Mundial de Saúde (OMS) lançou em 1980 a Classificação Internacional de Impedimentos, Deficiências e Incapacidades, mostrando que estas três dimensões existem simultaneamente em cada pessoa com deficiência.

ÉPOCA TERMOS E SIGNIFICADOS VALOR DA PESSOA De 1988 até 1993. Alguns líderes de organizações de pessoas com deficiência contestaram o termo pessoa deficiente alegando que ele sinaliza que a pessoa inteira é deficiente, o que era inaceitável para eles. pessoas portadoras de deficiência. Termo que, utilizado somente em países de língua portuguesa, foi proposto para substituir o termo pessoas deficientes. Pela lei do menor esforço, logo reduziram este termo para portadores de deficiência. O portar uma deficiência passou a ser um valor agregado à pessoa. A deficiência passou a ser um detalhe da pessoa. O termo foi adotado nas Constituições federal e estaduais e em todas as leis e políticas pertinentes ao campo das deficiências. Conselhos, coordenadorias e associações passaram a incluir o termo em seus nomes formais. De 1990 até hoje. O art. 5 da Resolução CNE/CEB n 2, de 11/9/01, explica que as necessidades especiais decorrem de três situações, uma das quais envolvendo dificuldades vinculadas a deficiências e dificuldades não-vinculadas a uma causa orgânica. pessoas com necessidades especiais. O termo surgiu primeiramente para substituir deficiência por necessidades especiais. daí a expressão portadores de necessidades especiais. Depois, esse termo passou a ter significado próprio sem substituir o nome pessoas com deficiência. De início, necessidades especiais representava apenas um novo termo. Depois, com a vigência da Resolução n 2, o termo necessidades especiais passou a ser um valor agregado tanto à pessoa com deficiência quanto a outras pessoas. Mesma época acima. Surgiram expressões como crianças especiais, alunos especiais, pacientes especiais e assim por diante numa tentativa de amenizar a contundência da palavra deficientes. pessoas especiais. O termo apareceu como uma forma reduzida da expressão pessoas com necessidades especiais, constituindo um eufemismo dificilmente aceitável para designar um segmento populacional. O adjetivo especiais permanece como uma simples palavra, sem agregar valor diferenciado às pessoas com deficiência. O especial não é qualificativo exclusivo das pessoas que têm deficiência, pois ele se aplica a qualquer pessoa. Em junho de 1994. A Declaração de Salamanca preconiza a educação inclusiva para todos, tenham ou não uma deficiência. pessoas com deficiência e pessoas sem deficiência, quando tiverem necessidades educacionais especiais e se encontrarem segregadas, têm o direito de fazer parte das escolas inclusivas e da sociedade inclusiva. O valor agregado às pessoas é o de elas fazerem parte do grande segmento dos excluídos que, com o seu poder pessoal, exigem sua inclusão em todos os aspectos da vida da sociedade. Trata-se do empoderamento.

ÉPOCA TERMOS E SIGNIFICADOS VALOR DA PESSOA Em maio de 2002. O Frei Betto escreveu no jornal O Estado de S.Paulo um artigo em que propõe o termo portadores de direitos especiais e a sigla PODE. Alega o proponente que o substantivo deficientes e o adjetivo deficientes encerram o significado de falha ou imperfeição enquanto que a sigla PODE exprime capacidade. O artigo, ou parte dele, foi reproduzido em revistas especializadas em assuntos de deficiência. De 1990 até hoje e além. A década de 90 e a primeira década do século 21 e do Terceiro Milênio estão sendo marcadas por eventos mundiais, liderados por organizações de pessoas com deficiência. A relação de documentos produzidos nesses eventos pode ser vista no final deste artigo. portadores de direitos especiais. O termo e a sigla apresentam problemas que inviabilizam a sua adoção em substituição a qualquer outro termo para designar pessoas que têm deficiência. O termo portadores já vem sendo questionado por sua alusão a carregadores, pessoas que portam (levam) uma deficiência. O termo direitos especiais é contraditório porque as pessoas com deficiência exigem equiparação de direitos e não direitos especiais. E mesmo que defendessem direitos especiais, o nome portadores de direitos especiais não poderia ser exclusivo das pessoas com deficiência, pois qualquer outro grupo vulnerável pode reivindicar direitos especiais. pessoas com deficiência passa a ser o termo preferido por um número cada vez maior de adeptos, boa parte dos quais é constituída por pessoas com deficiência que, no maior evento ( Encontrão ) das organizações de pessoas com deficiência, realizado no Recife em 2000, conclamaram o público a adotar este termo. Elas esclareceram que não são portadoras de deficiência e que não querem ser chamadas com tal nome. Não há valor a ser agregado com a adoção deste termo, por motivos expostos na coluna ao lado e nesta. A sigla PODE, apesar de lembrar capacidade, apresenta problemas de uso: 1) Imaginem a mídia e outros autores escrevendo ou falando assim: Os Podes de Osasco terão audiência com o Prefeito..., A Pode Maria de Souza manifestou-se a favor..., A sugestão de José Maurício, que é um Pode, pode ser aprovada hoje... 2) Pelas normas brasileiras de grafia de siglas, a sigla PODE precisa ser grafada Pode. Norma: Toda sigla com mais de 3 letras, pronunciada como se fosse uma palavra, deve ser grafada em caixa baixa com exceção da letra inicial. Os valores agregados às pessoas com deficiência são: 1) o do empoderamento [uso do poder pessoal para fazer escolhas, tomar decisões e assumir o controle da situação de cada um] e 2) o da responsabilidade de contribuir com seus talentos para mudar a sociedade rumo à inclusão de todas as pessoas, com ou sem deficiência.

Os movimentos mundiais de pessoas com deficiência, incluindo os do Brasil, estão debatendo o nome pelo qual elas desejam ser chamadas. Mundialmente, já fecharam a questão: querem ser chamadas de pessoas com deficiência em todos os idiomas. E esse termo faz parte do texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotado pela ONU em 13/12/06, ratificado, com equivalência de emenda constitucional, através do Decreto Legislativo n. 186, de 9/7/08, do Congresso Nacional; e foi promulgado através do Decreto n. 6.949, de 25/8/09. Eis os princípios básicos para os movimentos terem chegado ao nome pessoas com deficiência : 1. Não esconder ou camuflar a deficiência; 2. Não aceitar o consolo da falsa ideia de que todo mundo tem deficiência; 3. Mostrar com dignidade a realidade da deficiência; 4. Valorizar as diferenças e necessidades decorrentes da deficiência; 5. Combater eufemismos (que tentam diluir as diferenças), tais como pessoas com capacidades especiais, pessoas com eficiências diferentes, pessoas com habilidades diferenciadas, pessoas deficientes, "pessoas com disfunção funcional", pessoas especiais, é desnecessário discutir a questão das deficiências porque todos nós somos imperfeitos, não se preocupem, agiremos como avestruzes com a cabeça dentro da areia (i.é, aceitaremos vocês sem olhar para as suas deficiências ); 6. Defender a igualdade entre as pessoas com deficiência e as demais pessoas em termos de direitos e dignidade, o que exige a equiparação de oportunidades para pessoas com deficiência, atendendo às diferenças individuais e necessidades especiais, que não devem ser ignoradas; 7. Identificar nas diferenças todos os direitos que lhes são pertinentes e a partir daí encontrar medidas específicas para o Estado e a sociedade diminuírem ou eliminarem as restrições de participação (dificuldades ou incapacidades causadas pelos ambientes humano e físico contra as pessoas com deficiência). Conclusão A tendência é no sentido de parar de dizer ou escrever a palavra portadora (como substantivo e como adjetivo). A condição de ter uma deficiência faz parte da pessoa e esta pessoa não porta sua deficiência. Ela tem uma deficiência. Tanto o verbo portar como o substantivo ou o adjetivo portadora não se aplicam a uma condição inata ou adquirida que faz parte da pessoa. Por

exemplo, não dizemos e nem escrevemos que certa pessoa é portadora de olhos verdes ou pele morena. Uma pessoa só porta algo que ela possa não portar, deliberada ou casualmente. Por exemplo, uma pessoa pode portar um guarda-chuva se houver necessidade e deixá-lo em algum lugar por esquecimento ou por assim decidir. Não se pode fazer isto com uma deficiência, é claro. A quase totalidade dos documentos, a seguir mencionados, foi escrita e aprovada por organizações de pessoas com deficiência que, nos debates para a elaboração do texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, chegaram ao consenso quanto a adotar a expressão pessoas com deficiência em todas as suas manifestações orais ou escritas. Documentos do Sistema ONU 1990 Declaração Mundial sobre Educação para Todos (Unesco). 1993 Normas sobre a Equiparação de Oportunidades para Pessoas com Deficiência (ONU). 1993 Inclusão Plena e Positiva de Pessoas com Deficiência em Todos os Aspectos da Sociedade (ONU). 1994 Declaração de Salamanca e Linhas de Ação sobre Educação para Necessidades Especiais (Unesco). 2001 Classificação Internacional de Funcionalidade, Deficiência e Saúde (OMS), [que substituiu a Classificação Internacional de Impedimentos, Deficiências e Incapacidades, de 1980]. 2004 Declaração de Montreal sobre Deficiência Intelectual (OMS-Opas). 2004 Declaração sobre o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência (OIT). 2006 Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e Protocolo }Facultativo à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU), [adotados em 13/12/06 pela Assembleia Geral da ONU; ratificados e incorporados à Constituição do Brasil através do Decreto Legislativo 186, de 9/7/2008, e promulgados pelo Decreto 6.949, de 25/8/2009]. 2011 - Relatório Mundial sobre a Deficiência (OMS).

Documentos de outros organismos mundiais 1983 Declaração de Cave Hill. 1991 Declaração de Harare. 1992 Declaração de Vancouver. 1993 Declaração de Santiago. 1993 Declaração de Maastricht. 1993 Declaração de Manágua. 1999 Carta para o Terceiro Milênio. 1999 Declaração de Washington. 1999 Convenção Interamericana para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência [conhecida como a Convenção da Guatemala]. 2000 Declaração de Pequim. 2000 Declaração de Manchester sobre Educação Inclusiva. 2002 Declaração Internacional de Montreal sobre Inclusão. 2002 Declaração de Madri. 2002 Declaração de Sapporo. 2002 Declaração de Caracas. 2003 Declaração de Kochi. 2003 Declaração de Quito. 2004 Declaração de Montreal sobre Deficiência Intelectual. 2005 Aliança Global sobre Educação Inclusiva. 2006 Declaração da Década das Américas pelos Direitos e pela Dignidade das Pessoas com Deficiência (2006-2016). 2008 Carta de Santos. 2009 Declaração de Kampala. 2011 Declaração de Durban.