Proposta alternativa para a crise do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle

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Transcrição:

Proposta alternativa para a crise do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle 1

(Versão preliminar de 15/12/2013) 1. Introdução Ao longo do ano de 2013 a comissão dos Três Segmentos da UNIRIO realizou uma série de debates sobre a EBSERH e estudos sobre a situação do Hospital Universitário, trazendo para a nossa universidade profissionais de variadas áreas que compartilharam seus conhecimentos e suas experiências. No bojo do processo de debate a respeito da adesão à EBSERH em nossa universidade, infelizmente, não foram apresentados dois documentos imprescindíveis para compreender a relação com a empresa, uma análise conjunta demandaria: uma minuta do contrato a ser assinado entre a UNIRIO e a empresa e a resolução de adesão proposta pela reitoria ao CONSUNI. Ao observamos, por exemplo, a pauta do CONSUNI proposta pela reitoria, percebe-se que a linguagem usada é de confiança excessiva em uma caixa branca, sem a preocupação de criar mecanismos que garantam e assegurem os interesses da universidade. Pode ser dito que nem o plano nem os contratos já elaborados pela empresa têm por base o mundo real. Fala-se na perspectiva que a EBSERH se consolide ; na possibilidade da empresa garantir as condições do hospital até sua implantação efetiva ; sem garantias. Fala-se ainda, de forma genérica, em compromisso com as tradições acadêmicas, garantidas pelas instâncias universitárias. O problema é que nada disso é reconhecido nem pela lei, nem pelo regimento da EBSERH, que não prevê a intervenção dos conselhos universitários em nenhum momento, somente para aprovar o contrato e entregar o HU à empresa. Além da própria estrutura da empresa como prevista na lei violar a Constituição Federal de 1988 (CF/88), esse formato de contrato é um verdadeiro ataque à autonomia universitária. Vejamos, ponto a ponto, os problemas da resolução 2

e do contrato: Está sendo submetida ao CONSUNI a aprovação proposta de adesão à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, mas não exige-se que todos os contratos e planos de reestruturação dos hospitais - componentes essenciais para essa apreciação -, sejam analisados pelo CONSUNI; Não foram apresentados, como matéria do CONSUNI divulgada, nem resolução, nem contrato, nem os anexos, nem o cronograma, muito menos as metas de desempenho ; 2.A questão da autonomia A adesão à EBSERH faz com que a universidade perca a capacidade de gerir seus próprios hospitais. Afinal, segundo o regimento interno da empresa, todos os cargos da diretoria executiva são de livre nomeação (artigos 7 e 13). Nem mesmo o superintendente é obrigado a ser selecionado entre os professores do quadro permanente da universidade contratante. O Conselho de Administração é todo formado a partir de indicações do governo, à exceção de dois cargos reservados, respectivamente, à ANDIFES e aos funcionários da empresa. A estes dois últimos é vedada, pelo regimento interno da EBSERH, a participação em votações relativas aos planos de cargos e salários dos funcionários da empresa. As outras gerências serão selecionadas por um comitê integrado pela EBSERH e pelo superintendente, sem qualquer menção aí à necessidade de vínculo com a instituição de ensino da qual o hospital faz parte. Ao se debruçar sobre os problemas do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle a comissão desenvolveu a proposta a seguir, que contém as linhas gerais para enfrentar a atual crise de administração do Hospital. A proposta a seguir encontra suas bases no princípio da autonomia universitária e na defesa de um modelo de administração que mantenha a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, sem considerar a possibilidade de cessão do H.U. para 3

uma empresa que, em sua essência, prevê a mercantilização da saúde. O eixo fundamental dessa proposta se apoia no princípio constitucional da autonomia universitária conforme expressa no artigo 208 da Constituição Federal. Com vistas a realizar um debate profundo e responsável, este documento se estrutura em duas etapas, a saber: análise da crise no HUGG e a proposta alternativa. 3.Análise da crise do Hospital Universitário O desmonte administrativo dos Hospitais Universitários é operado em diversos níveis e alguns merecem nossa especial atenção. Desde de a Lei nº 12.550, de 15 de dezembro de 2011, que cria a EBSERH, a interlocução dos diretores de hospitais com o MEC muda de figura, deixa de ser a Coordenação Geral dos Hospitais Universitários (CGHU) e passa a ser a EBSERH. Por meio da Portaria nº 447, de 24 de maio de 2013, a EBSERH, portanto, passa a ser responsável pela certificação dos Hospitais universitários. Esse conjunto de atos interfere diretamente na autonomia universitária, uma vez que esta fica ameaçada pelas pressões que a Empresa já exerce sobre as universidades. É mister também considerar que a mudança de denominação para empresa não é meramente nominal. Trata-se, como dizem seus defensores, de uma empresa pública de direito privado. O problema não é apenas sua legislação prever a possibilidade de relações diretas com o mercado. O cerne da questão é que, sendo empresa, mantida com recursos do MEC e do Ministério da Saúde, está sujeita a mesma escassez de recursos que assola os hospitais universitários. Se o governo federal não atende as necessidades dos hospitais, porque atenderá as da EBSERH? A resposta está na escolha desta figura jurídica: Empresa. Ela estará livre para obter outros recursos, recursos privados - diriam os defensores menos precavidos das parcerias público privadas. Mas ainda não estamos no cerne do problema. O problema da Empresa é que ela precisará lucrar para se manter, precisará explorar 4

lucrativamente a saúde pública. A EBSERH consiste, pois, em mais um projeto de flexibilização e reforma do Estado de transferência da responsabilidade à iniciativa privada de gerir a saúde e a educação públicas. Sob o argumento da eficiência do regime celetista, a UNIRIO renúncia à administração de seu hospital, expondo seus usuários à lógica da oferta e da procura que marca a atividade econômica de toda empresa, mesmo pública. É sabido que uma gestão rigorosa e comprometida com os princípios republicanos tem condições de enfrentar as ofensivas do mercado, sem ter de abrir mão das conquistas obtidas através do Regime Jurídico Único. Para tal, não faltam atores sociais dispostos a fortalecer a luta por concurso público e melhores condições de trabalho na universidade pública. É o caso dos Fóruns de Saúde, do Ministério Público Federal, da Defensoria Pública da União, do Tribunal de Contas da União e das entidades de base da comunidade universitária. Um olhar mais acurado para as relações da EBSERH com o mercado permite inferirmos que essas relações impactarão no ensino, na pesquisa e na extensão universitárias. Esse aspecto da relação direta com o mercado na pesquisa e no ensino está explicitado no estatuto e no regimento da empresa, que cria uma equipe de governança dentro do Hospital Universitário. Daí a Universidade perder a gestão da vida acadêmica dentro do hospital. Por um lado, o governo promove, como pano de fundo para a privatização, o discurso da incompetência dos servidores públicos na administração dos Hospitais universitário. Por outro, promete a esses mesmos servidores públicos lugares na administração da EBSERH. Os perigos da crise gerada pela EBSERH na UNIRIO já podem ser verificados, uma vez que, até o momento, não veio ao conhecimento da universidade nenhum ato administrativo determinando o fechamento de setores ou suspensão de serviços. Pois os servidores públicos, se tivessem esse ato em suas mãos, poderiam evocar a Lei 5

8112 no que concerne à omissão de atendimento. As fusões de enfermarias que se deram no HUGG, recentemente, resultaram em junção das equipes, com mesmos recursos, porém em um espaço reduzido. O que comprova que o gesto consiste apenas em retaliação ao movimento que reivindica maior debate em torno da EBSERH, tendo em vista que consistiu apenas em redução de leitos e de atendimentos. O modelo de gestão acoplado a EBSERH se trata de privatização disfarçada de modernização e, sob o argumento de uma gestão menos burocratizada, mais ágil e eficiente, se esconde a ausência de controle social. Com a mudança no regime de trabalho do servidor público de Regime jurídico Único para CLT voltam à cena os empregos por indicação, que permitem a ineficiência e o clientelismo. O HUGG se encontra hoje com uma dívida de aproximadamente R$11.000.000,00, conforme as informações prestadas pelo diretor do HUGG aos conselheiros da UNIRIO. Esse endividamento do Hospital está relacionado a pelo menos dois fatores: a redução de recursos para os HU's e também a complexificação das atividades do Hospital, pois um hospital que cumpre melhor sua finalidade custa mais. Melhorar a qualidade dos HU por meio de incremento orçamentário está em choque com o modelo de flexibilização do Estado. O governo quer um hospital mais barato, uma educação mais barata, mesmo sacrificando qualidade e abrangência, pois assim segue a cartilha do Banco Mundial, centrada na redução dos gastos com a área social, de modo a gerar superávit primário para garantir taxas de crescimento econômico que não são acompanhadas de melhoria na qualidade de vida da população. Assim, o Hospital torna-se um negócio lucrativo para o empresariado que atua por meio de subsidiárias. A EBSERH, como vemos, não soluciona a crise do Hospital, mas aprofunda as contradições. Não soluciona o problema dos extra-quadros; não dá garantia de mais recursos; retrocede no modelo de gestão e fere a autonomia universitária garantida 6

pelo artigo 207 da Constituição de 1988. 4.Pontos centrais para um hospital escola fortalecido e integrado 1 4.1. Informação e pesquisa A integração operacional, assistencial e acadêmica do hospital universitário tem em sua raiz um forte aporte de tecnologia de informação, na informatização de prontuários. Prontuários eletrônicos constituem, adicionalmente, bases de informações clínicas que podem tornar mais ágeis as pesquisas e sistematizar, com rápido acesso, um grande volume de informações. Hoje, para diversos tipos de pesquisa, é necessário ter um penoso trabalho de busca em meio a arquivos de papel. Isso sem falar nos benefícios para ensino e assistência. Existe enorme dificuldade tanto para os alunos quanto para os profissionais de saúde acessarem o histórico completo de um paciente. A área de tecnologia de informação no HUGG ainda é praticamente inexistente, sendo o registro de dados habitualmente realizado em papel. Uma opção possível seria estruturá-la a partir de concursos públicos vinculados a carreira de Tecnólogo prevista no Plano de Carreiras do Ministério da Ciência e Tecnologia. Seria uma oportunidade para o desenvolvimento de sistemas próprios, adequados ao perfil de gestão integrada da assistência, ensino e pesquisa dos Hospitais Universitários. Em conjunto com iniciativas já feitas no SUS, também seria uma oportunidade para a participação do curso de Sistemas de Informação nessa área do hospital universitário. 4.2. A questão da administração do HUGG 1 Texto referenciado na Proposta de fortalecimento dos HU s produzida pela ADUFRJ e apresentada aos Conselhos superiores da UFRJ. Adaptamos para o contexto da Unirio incluindo as informações do HUGG 7

Estimativas diversas têm situado a logística entendida como operações de aquisição e distribuição de insumos- como responsável por 10 a 15% dos gastos da saúde (Healthcare Financial Management Organization, 2005), destacando essa área como um dos mais importantes focos para ganhos de eficiência na gestão de sistemas e serviços de saúde. Várias iniciativas de profissionalização e aprimoramento de processos são essenciais para o sucesso do Hospital Universitário da UNIRIO. Primeiramente, é necessário fortalecer a área administrativa do hospital. Hoje, o hospital conta apenas com 1 administrador e 36 assistentes administrativos concursados, com mais 116 assistentes administrativos extra-quadro, que poderiam ser substituídos por Tecnólogos Analistas de gestão da carreira do MCT ou por gestores concursados do MPOG. Haveria evidente ganho de escala com compras compartilhadas, mas outras iniciativas de fortalecimento da gestão da cadeia de suprimentos modernização dos almoxarifados com controle de materiais por Identificação por Rádio Frequência (RFID), processos mais modernos de gestão de estoques, equipe com forte conhecimento do mercado de matérias médicohospitalares, além de controle de práticas anticompetitivas e transparência nos processos de aquisição - seriam essenciais. Diante da crescente demanda por profissionais qualificadas para a área de saúde, o setor de compras e almoxarifado poderia ainda compor campo de estágio para a Escola de Administração Pública. 4.3. Farmácia: concepção própria por se tratar de hospitais de ensino e pesquisa. A Farmácia hospitalar em unidades de ensino e pesquisa em saúde tem como função não só promover inovações na gestão da assistência 8

farmacêutica, a exemplo da distribuição por dose unitária individualizada, como atuar como polo diferenciado de farmacovigilância, na fase póscomercialização imediata de produtos farmacêuticos novos. Muitos desses produtos tendem a ser inicialmente utilizados em hospitais de ponta, o que também pode favorecer a condução de estudos de farmacoeconomia. Isso inclusive vai na direção da pretensão publicamente declarada do Instituto Biomédico de oferecer um novo curso de farmácia. 4.4 Núcleo de inteligência de engenharia A manutenção predial e de equipamentos do HUGG é completamente terceirizada. Entretanto, inexiste um setor de engenharia clinica que possa não apenas viabilizar um parque de equipamentos diferenciado, como também contribuir para inovações nesta área. Grande parte dos desenvolvimentos tecnológicos na área de equipamentos na atualidade é viabilizado mediante parceiras entre usuários e produtores de equipamentos. Assim, a criação de um núcleo de inteligência em engenharia- com interfaces com a engenharia biomédica e parcerias com outros Centros e Institutos da UNIRIO (Instituto Biomédico, CCJP, CCET, etc), além de outras universidades - pode criar um patamar de excelência operacional com oportunidade de produção de inovações que precisa ser valorizado. Parcerias internas com a Faculdade de Engenharia poderiam ser estudadas para potencializar a capacidade de inovação e sinergia com a Universidade. 9

5.Orçamento, recursos humanos e gestão 2 É essencial que se faça um estudo detalhado das necessidades profissionais do HUGG. Hoje, nos discursos proferidos pela direção, o que fica aparente é um total desconhecimento do tamanho do problema colocado, não havendo qualquer diagnóstico técnico feito de maneira adequada. No caso da UNIRIO, a existência de um grande hospital geral (com capacidade potencial de 210 leitos), com inúmeras especialidades, evidencia a importância de se pensar os setores como um todo. Para enfrentar a crise do Hospital Gaffrée e Guinle é necessário construir soluções autônomas para os problemas que envolvem orçamento, recursos humanos, endividamento e gestão do Hospital. Para tanto, a comissão dos Três segmentos propõe algumas linhas de ação que podem se compatibilizar e se aperfeiçoar com outras ideias advindas dos conselheiros e do corpo técnico do HUGG. Para resolver a crise do HUGG são necessárias ações a curto, médio e longo prazo. Portanto, a implementação dessa proposta deve ser acompanhada por uma comissão de conselheiros que relatará aos egrégios conselhos os problemas, desafios e perspectivas em jogo. Sendo assim, a proposta ora apresentada possui como preliminar a constituição de Comissão de Gestão da Crise, com a presença do Ministério Público Federal, da Defensoria Pública da União e dos três segmentos que compõem a comunidade universitária. 2 Texto referenciado na Proposta de fortalecimento dos HU s produzida pela ADUFRJ e apresentada aos Conselhos superiores da UFRJ. Adaptamos para o contexto da Unirio incluindo as informações do HUGG 10

Tabela 1: Quadro comparativo indicadores de pessoal em hospitais de ensino UNIRIO**** Hospitais de ensino UFRJ***** Hospitais de ensino em São Paulo* Tipo de hospital Geral Geral EspecializadO Geral Especializado Nome do hospital** HUGG HUCFF ME IPPMG IPUB HC HD HE HF nº de leitos 210 (74 ativos) 250 77 69 193 215 308 331 218 nº de funcionários 979 3242 468 690 337 2922 1795 2376 1108 nº de medicos 384 514 115 126 32 536 286 291 171 relação funcionário/leito 4.7 / 13.2 (dos ativos) 13,0 6,1 10,0 1,7 13,6 5,8 7,2 5,1 relação médico/leito 1.82 / 5.1 (dos ativos) 2,1 1,5 1,8 0,2 2,5 0,9 0,9 0,8 relação 3,3 2,5 3,5 0,5 enfermagem/leito*** 1.5 / 4.2 *Zucchi & Bittar (2002) ** no estudo de Zucchi e Bittar (2002) os nomes dos hospitais foram omitidos *** soma total de enfermeiros, técnicos de enfermagem e auxiliares de enfermagem **** DATASUS (6/12/13). Média de leitos ativos da obtida dividindo-se o número de diárias pelo número de dias. ***** dados da Comissão de Diagnósticos dos Hospitais Universitários da UFRJ Todos os hospitais estudados por Zuchi e Bittar (2002) são de grande porte e possuem corpo clínico fechado, tal como nos hospitais da UFRJ e no HUGG. Os hospitais HC e HD mencionados no referido trabalho são hospitais públicos de nível secundário de atenção à saúde, portanto não são de tão alta complexidade como nosso HU. Vale lembrar que a relação funcionários por leito tende sempre a aumentar com a complexidade do hospital. HE e HF são ambos hospitais públicos, no entanto especializados em cardiologia. Sendo assim nos interessa comparar os números do HUGG com os de HUCFF, HC e HD, não se podendo incluir os hospitais especializados. Conforme podemos verificar na tabela 1, a relação funcionário por leito e médico por leito do HUGG é equivalente à de HD, se considerarmos os 210 leitos que a direção declara ao DATASUS estarem disponíveis. Entretanto, quando passamos a analisar o que realmente funciona, vemos que a relação funcionário/leito do HUGG é a maior de todos os hospitais analisados, só perdendo para HC, enquanto a relação médico/leito é desproporcionalmente mais elevada. O que fica claro é que, ao menos formalmente, existem profissionais o bastante para manter um número maior de leitos do que os que estão sendo disponibilizados atualmente. Quando falamos de médicos, esse fato torna-se mais claro ainda, havendo médicos o bastante para reabrir quase que a totalidade dos leitos do HUGG, apesar de faltarem de maneira relativamente maior, outros profissionais. Se estes 11

profissionais não estão presentes de fato no dia a dia do hospital, resta questionar à direção o motivo de tal problema. Os números com os quais trabalhamos para analisar os indicadores médios de pessoal no HUGG incluem os funcionários extra-quadro, tornando clara a necessidade de realizarmos concurso público. Um grande problema dos indicadores utilizados é considerar majoritariamente leitos, mas não procedimentos tecnológicos que demandem maior quantidade de mão e obra. Ao contrário do que poderia esperar-se, novas tecnologias frequentemente demandam maior mão de obra, apesar de gerarem uma redução no custo de diagnóstico e tratamento posteriormente. Na análise dos funcionários extraquadros, temos que hoje 201 bolsistas e 483 não-estatutários que constam sem tipo no sistema, correspondendo a dois terços da força de trabalho do HUGG. Análises adicionais já realizadas dos dados disponíveis sobre pessoal indicam que, como nas unidades de saúde municipais e federais do Ministério da Saúde (MS) do Rio de Janeiro, o HUGG apresenta alto índice de terceirização de serviços, o que tende a gerar considerável aumento no custeio relativamente a unidades de saúde que não apresentam esse quadro, tais como o HUCFF da UFRJ. Setores estratégicos são hoje compostos integralmente por funcionários extraquadros. Várias categorias profissionais atuantes no HUGG não configuram quadros previstos para servidores públicos das carreiras da Saúde e Educação, mas poderiam ser contratados no âmbito do quadro de Tecnólogos do Ministério de Ciência e Tecnologia ou do Quadro de Gestores do MPOG. Assim, o equacionamento do problema da falta de pessoal, isoladamente, não resolverá o problema de reposicionamento estratégico do Hospital Universitário da UNIRIO, independentemente da atuação da EBSERH. Na dimensão de gestão de pessoas, nunca é demais lembrar que entre os elementos essenciais para a gestão bem sucedidas de pessoas, em especial quando se trata de organizações profissionais com alto grau de autonomia decisória, como as organizações de saúde (Mintzberg, 1993) incluem projetos desafiadores, mais que metas de desempenho operacional. 12

5.Tratando de estrutura e financiamento Em 2011, a previsão de dotação orçamentária para HUGG era de R$55 milhões, em comparação com R$127 milhões para o HUCFF, já extremamente subfinanciado. Há claramente um problema de subfinanciamento gravíssimo no HUGG. Basta dizer que o orçamento do Hospital Municipal Souza Aguiar, que em si já padece de subfinanciamento, é superior ao do HUCFF, que recebe mais do que o dobro do HUGG. Quando realizamos a comparação com o orçamento dos hospitais do Ministério da Saúde no Rio de Janeiro, vemos que o mesmo é bem mais mais generoso. 6.Algumas questões práticas a) Orçamento I. Respeito ao percentual destinado aos hospitais, com base no REHUF; II. Garantia de orçamento proporcional ao dos hospitais federais; III. Repactuação do SUS; IV. Apresentação de documento da reitoria da UNIRIO à ANDIFES buscando parceiros para pressionar o governo federal por concursos públicos e demais verbas; V. Investimento técnico para melhoria do sistema de compras e abastecimento do HUGG, com contratações de profissionais de novas carreiras, VI. Repasse emergencial pela UNIRIO dos recursos necessários para reabertura das enfermarias e das matrículas. b) Recursos Humanos I. A exemplo do que ocorreu na UFRJ, exigir do MEC as vagas RJU de 13

servidores e professores necessárias ao funcionamento do hospital; II. Nomeação imediata dos aprovados no concurso público realizado em 2010, privilegiando as necessidades do Hospital; c) Endividamento do HUGG I. Dar publicidade sobre a unidade orçamentária do Hospital; II. Realização de auditoria; III. Promover um amplo debate das possibilidades de negociação do Déficit; d) Gestão do Hospital I. Recuperação do Conselho Gestor do Hospital, extinto por ato administrativo; II. Reestabelecido o conselho gestor, este deve assumir interinamente a direção do hospital; III. Convocação de eleições para diretor do Hospital. 14