JUSTIFICATIVA Texto a ser submetido ao Prêmio VivaLeitura 2014 PROJETO LIVRO VIVO: RELATO DA EXPERIÊNCIA RUMO A UMA BIBLIOTECA VIVA Muitas iniciativas já foram realizadas na Biblioteca Pública Municipal João Palma da Silva, da cidade de Canoas, Rio Grande do Sul. Desde a sua fundação, em 25 de outubro de 1966, há um trabalho sistemático, parte dele bem documentado, de concepção e de realização de ações e de eventos que tenham potencial para trazer ao espaço do equipamento cultural os moradores de Canoas, aproximando-os aos livros e às palavras. No seu aniversário de 40 anos, em outubro de 2006, consta no material comemorativo a missão da Biblioteca João Palma da Silva, que para o contexto deste documento vale a transcrição: atuar como biblioteca viva, dinâmica, de frequência livre, como centro ativo de informação, cultura e lazer, assegurando o acesso ao conhecimento e colaborando para o desenvolvimento da criticidade e criatividade da comunidade como um todo. É consenso sobre as dificuldades existentes em nosso país de atender minimamente a esses objetivos elencados acima e a outros mais. O conceito e as atividades necessárias para transformar, no pior caso, conforme o professor Luís Milanesi (1983), um museu de livros por mostrar coleção morta, praticamente inútil (...) depósitos quase sempre mal cuidados, entregues ao mau humor de funcionários públicos que, por falta de um mínimo de habilitação, abrem e fecham portas e assinalam os empréstimos (p. 63) em uma biblioteca viva, dinâmica representam um grande desafio para todos os atores sociais envolvidos com o livro, com a leitura, com os leitores e com a literatura. Na Biblioteca Pública de Canoas, nos últimos dez anos, houve diversas tentativas documentadas de aprimorar os serviços e o atendimento de forma a mobilizar os funcionários, os gestores e a população em torno da ideia chave de uma biblioteca modelo que seja viva e dinâmica, que incentive, facilite e crie pertinência ao acesso a 1
informações. Para além da concepção de um centro de referência cultural para a coletividade, preservando memórias e registros locais e globais, há um esforço de transformar o equipamento cultural em espaço para além da pesquisa e do lazer, associando cultura e biblioteca com um importante jogo de (auto)-descobertas e produção de novos sentidos. Novamente, conforme Luís Milanesi: a biblioteca não pode ser algo distante da população como um posto médico que ela procura quando tem dor. Ela deve ser um local de encontro e discussão, um espaço onde é possível aproximar-se do conhecimento registrado e onde se discute criticamente esse conhecimento. No entanto, esses registros devem ter alguma relação com a coletividade, ou que ela consiga relacionar a sua vida com a informação disponível. Caso contrário, teremos acervos inúteis. Ou enciclopédias para estudante copiar verbete. (p. 93). Com a criação da Secretaria Municipal da Cultura, em 2009, a Biblioteca foi transferida para o prédio atual, compartilhando o espaço com a Secretaria. O trabalho sistemático de concepção e realização de diversos projetos, que já estava sendo realizado, tomou ainda maior relevância com a regulamentação, como lei municipal, do Plano Municipal do Livro, Leitura e Literatura (PMLLL), em 21 de outubro de 2010 (Canoas foi o primeiro município do Brasil a elaborar e aprovar o PMLLL). O desejo de modernizar e transformar cada vez mais a Biblioteca em um centro de atividades culturais da cidade, com o clímax na Feira do Livro de Canoas (segunda mais importante estado do Rio Grande do Sul), já foi bastante materializado, mas ainda está em construção. O mesmo ocorre com a meta de transformar a Biblioteca Municipal em um centro gestor efetivo e eficiente de uma rede cujos vértices são compostos pelos seguintes equipamentos: quatro bibliotecas das quatro subprefeituras do município, cinco bibliopraças, dois biblioparques, um núcleo Pró-Ler, 15 Pontos de Leitura e cinco Pontos de Cultura, com suas respectivas bibliotecas comunitárias. A iniciativa que melhor representa esses esforços transformadores para uma biblioteca viva e dinâmica corresponde ao projeto Livro Vivo, 2
seja pela sua concepção, seja pelos resultados obtidos e seja pelos desdobramentos a serem realizados em 2015. OBJETIVOS O Projeto Livro Vivo foi concebido de forma a articular as diversas manifestações culturais e artísticas tendo como o centro o espaço físico da biblioteca, o livro e a palavra. O objetivo do projeto sempre foi alcançar a missão da biblioteca, transcrita na seção anterior, transformando-a em um equipamento vivo, pulsante e dinâmico. O projeto buscou oferecer ações integradas que transformaram o livro em um objeto mágico de sedução, encantamento e transformação dos sujeitos leitores e participantes das atividades. A bibliotecária e educadora colombiana Silvia Castrillón (2011) nos ofereceu uma meta mais específica para o conceito de livro vivo e biblioteca viva, a saber: bibliotecas que fomentem o interesse e o gosto pela leitura que permitam a descoberta do valor que ela tem como meio de busca de sentido, como referência de si mesmo no mundo e para o reconhecimento do outro. Bibliotecas onde a leitura não seja concebida como uma forma de passar o tempo, de se divertir, mas como algo imprescindível para um projeto de vida que pretenda superar uma sobrevivência cotidiana. Um lugar em que a leitura, segundo palavras de Pierre Bourdieu (1997, p. 38-40), permita o pensamento pensante, o pensamento lento, contra o fast thinking imposto pelos meios de comunicação de massa. (p. 38). METODOLOGIA A partir de uma escolha pautada que começasse pelo livro e que fosse para além do conteúdo impresso, foi elaborado uma seleção de atividades que pudessem trazer diversos públicos ao espaço da Biblioteca João Palma da Silva. Além disso, de forma conjunta com a Secretaria da Comunicação, foi elaborada uma identidade visual para o projeto de forma a deixar explícita a meta principal das atividades: a surpresa da descoberta do caráter vivo dos livros a partir de leituras, debates, saraus, contações de histórias e apresentações teatrais, ou seja, o livro em suas diversas linguagens artísticas. 3
Sobre o processo de escolha das atividades, além da Biblioteca, foram envolvidos dois setores da Secretaria, saber: o Departamento de Linguagens Artísticas e o Departamento de Cidadania Cultural. A partir de uma temática selecionada as ações foram realizadas. Para ilustrar dois exemplos. Para o tema sobre identidade, foi trabalhado o poeta Fernando Pessoa a partir de um monólogo (Eu, Pessoa e outros Eus), que antecedeu uma palestra com uma professora de literatura sobre o livro O Guardador de Rebanhos. Para um trabalho de sensibilização dos recursos da palavra, considerando o público infantil, foi escolhido um livro recente da escritora gaúcha Paula Teitelbaum (Palavra Vai, Palavra Vem) lido pela autora e adaptado para o teatro por duas atrizes. Conjugado a todos os eventos, uma equipe da Biblioteca convidava a todos os participantes para uma visita guiada aos espaços do equipamento, seguida por um convite para novo sócios. 4
AVALIAÇÃO O sucesso do projeto pode ser constatado pela frequência de público às ações e pelo desdobramento. No total foram 98 eventos, com a participação de 5.827 pessoas. Número que nos impressionou e que não esperávamos. Vale ressaltar, como um retorno positivo, a ocorrência de uma solicitação espontânea de estudantes do Ensino Médio: palestras direcionadas aos livros obrigatórios do processo seletivo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Os encontros foram realizados, trabalhando os seguintes autores: Nelson Rodrigues, Murilo Rubião, Machado de Assis, Lya Luft e Gregório de Matos. 5