ANÁLISE DE BLOCOS DE CONCRETO ARMADO SOBRE DUAS ESTACAS COM CÁLICE EMBUTIDO

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Transcrição:

ANÁLISE DE BLOCOS DE CONCRETO ARMADO SOBRE DUAS ESTACAS COM CÁLICE EMBUTIDO ANÁLISE DE BLOCOS DE CONCRETO ARMADO SOBRE DUAS ESTACAS COM CÁLICE EMBUTIDO Rodrigo Barros José Samuel Giongo Departamento de Engenharia de Estruturas, EESC-USP, Av. Trabalhador São-carlense, 4, CEP 3-9, São Carlos, SP, Brasil, e-mails: barrosrn@sc.usp.br, jsgiongo@sc.usp.br Resumo Neste trabalho é estudado o comportamento de blocos de concreto armado sobre duas estacas com cálice embutido, empregado na ligação pilar-fundação de estruturas de concreto pré-moldado. Foi desenvolvida análise numérica tridimensional utilizando programa baseado no método dos elementos finitos (MEF), em que foi considerada a nãolinearidade física dos materiais. Nos blocos estudados variaram-se o tipo de conformação das paredes do cálice, a espessura da parede e o ângulo de inclinação das bielas. Os resultados indicam um fluxo de tensões na região compreendida entre o fundo do cálice e o fundo do bloco, e formação de biela comprimida a partir do encontro do pilar com o bloco. Por meio das tensões nas barras da armadura principal, foi possível obter a força no tirante e na biela comprimida antes da ruína dos modelos. Constatou-se que os blocos com ângulo da biela igual a 4º e º apresentaram comportamentos distintos em relação às configurações e espessuras das paredes do cálice. O dimensionamento dos blocos, por sua vez, baseou-se nos modelos de bielas e tirantes. Palavras-chave: blocos sobre estacas, cálice de fundação embutido, modelo de bielas, tirantes. Introdução A escolha do tipo de fundação a ser utilizado numa obra depende essencialmente de parâmetros técnicos e econômicos que devem ser avaliados pelo engenheiro responsável pelo projeto. Diversos parâmetros a respeito do solo, como estratificação do terreno, situações topográficas, intensidade das ações, disposição das edificações limítrofes, bem como os tipos de fundação possíveis de serem realizados, são importantes para que se obtenha a melhor solução em termos da fundação a ser adotada. Quando as camadas superiores do terreno não são capazes de resistir às ações, é necessário recorrer a camadas mais profundas do solo, usando, portanto, fundações profundas. Dentre as diversas soluções disponíveis, o emprego de estacas de concreto armado é uma das mais difundidas no meio técnico, podendo ser dimensionadas considerando apenas sua resistência de ponta ou com o uso de atrito lateral, dependendo da situação. O uso desse tipo de solução, porém, requer um novo elemento estrutural capaz de realizar a ligação entre os pilares e as estacas. Tal elemento é conhecido como bloco de coroamento, bloco de fundação ou mesmo bloco sobre estacas. Segundo a ABNT NBR 8:3, blocos são estruturas de volume usadas para transmitir às estacas as cargas de fundação. O surgimento de novas tecnologias, assim como o avanço na indústria da construção civil, atinge diretamente os processos construtivos no que diz respeito ao tempo de construção, aumento da produtividade e redução de desperdício. Nesse cenário, o uso do concreto pré-moldado se torna cada vez mais disseminado no meio técnico, por atender a essas novas exigências. Os blocos sobre estacas são peças importantes quando da ligação do pilar pré-moldado com a fundação. Dentre as possíveis formas de ligação desses elementos destaca-se o uso de blocos de fundação com cálice ou colarinho por apresentarem relativa facilidade de construção e possibilidade de ajuste e de transmissão de momentos dos pilares para as estacas. O cálice é a parte do bloco que recebe o pilar pré-moldado, funcionando como um encaixe entre esses elementos, e suas paredes podem ser lisas ou rugosas. O pilar fica em contato com o cálice num trecho denominado comprimento de embutimento,. Nesse tipo de ligação, emb três situações de cálices são admitidas, conforme Figura : totalmente externo ao bloco, parcialmente embutido ou totalmente embutido no bloco. Minerva, (): -7

BARROS & GIONGO Figura Bloco de fundações com cálice externo, parcialmente embutido e totalmente embutido. O uso cada vez mais frequente de elementos prémoldados em estruturas usuais exige que os engenheiros tenham conhecimento técnico e prático a respeito do assunto. No caso de elementos pré-moldados, há ainda vasta lacuna a ser preenchida com pesquisas e experimentos. Para as análises realizadas neste trabalho, utilizaramse resultados provenientes de modelos teóricos e analíticos, assim como resultados obtidos por meio de modelos numéricos utilizando programa computacional baseado no método dos elementos finitos (MEF). Nesses modelos foram consideradas as não linearidades físicas do concreto e das barras de aço das armaduras. Outras informações podem ser obtidas em Barros (9). Modelo de Bielas e Tirantes O modelo de bielas e tirantes baseia-se na analogia de treliça clássica introduzida no início do século por Ritter & Mörsch, na qual a viga de concreto armado fissurada é associada a uma treliça de banzos paralelos. Após anos de estudos, o modelo evoluiu, obtendo-se então a treliça generalizada de Mörsch, na qual os banzos superior e inferior não são paralelos nem a inclinação das bielas é constante e igual a 4º ao longo de toda a viga. Porém, a idéia básica da treliça clássica de que a viga se comporta como uma treliça continua válida. O modelo de bielas e tirantes é uma representação discreta do fluxo de tensões num determinado elemento estrutural. A estrutura inicial é representada por uma estrutura equivalente composta por barras comprimidas e tracionadas, interligadas por meio de nós. As barras comprimidas recebem o nome de biela e devem absorver o fluxo de tensões de compressão, sendo normalmente representadas por linhas contínuas. As barras tracionadas recebem o nome de tirante e devem absorver o fluxo de tensões de tração existentes no elemento, sendo representadas por linhas contínuas. Em elementos de concreto armado, as bielas representam as regiões de concreto que estão submetidas à compressão, enquanto os tirantes representam as barras de aço submetidas à tração. Eventualmente, podem ser previstos tirantes de concreto em alguns elementos estruturais desde que a tensão máxima não ultrapasse a resistência à tração do material. Blocos Sobre Duas Estacas com Cálice Embutido As simulações numéricas foram feitas via método dos elementos finitos, por meio do programa computacional DIANA, versão 9., registrada para o Departamento de Engenharia de Estruturas da Escola de Engenharia de São Carlos (USP). Foram estudados blocos sobre duas estacas com cálice embutido, utilizado na ligação com pilar pré-moldado. As condições de contorno bem como as ações que atuam no bloco procuraram reproduzir uma situação próxima da real existente em projetos. As propriedades mecânicas dos materiais utilizados nos modelos foram obtidas por meio das normas ABNT NBR 8:3 e ABNT NBR 748:7. A análise numérica teve por objetivo avaliar o comportamento do bloco sobre duas estacas com cálice embutido, no que diz respeito às curvas do tipo força versus deslocamentos. Parâmetros analisados Os parâmetros escolhidos para serem analisados nas simulações numéricas foram os seguintes: o ângulo de inclinação da biela comprimida, a espessura da parede lateral do cálice e a conformação das paredes do cálice. Os ângulos adotados para a biela de compressão foram iguais a 4º e º. A escolha desses valores se deu em função das recomendações de Blévot & Frémy (97). Tratando da espessura das paredes laterais do cálice, foram adotados os valores de cm e cm. Por conta da ausência de informações específicas na bibliografia a respeito de cálice embutido, optou-se por utilizar as recomendações de Leonhardt & Mönnig (978) e da ABNT NBR 9:98 para cálice externo. A conformação das paredes internas do cálice também foi considerada, sendo avaliados cálices com paredes rugosas ou lisas. Minerva, (): -7

ANÁLISE DE BLOCOS DE CONCRETO ARMADO SOBRE DUAS ESTACAS COM CÁLICE EMBUTIDO 3 Modelos analisados numericamente A nomenclatura adotada para os modelos foi idealizada a partir dos seguintes parâmetros: conformação das paredes do cálice, altura total do bloco (função do comprimento de embutimento, ), ângulo de inclinação da biela emb comprimida e espessura da parede lateral do cálice. Para compreender melhor a nomenclatura adotada, utilizam-se os exemplos a seguir. O modelo BLH7A4_ representa o bloco com conformação lisa das paredes, altura do bloco de 7 cm, ângulo de inclinação da biela igual a 4º e espessura da parede igual a cm. Já o modelo BRHA_ representa o bloco com conformação das paredes rugosas, altura do bloco de cm, ângulo de inclinação da biela igual a º e espessura da parede igual a cm. A Tabela reproduz os modelos estudados. Os blocos foram dimensionados segundo recomendações de Blévot & Frémy (97), da ABNT NBR 9:98 e da ABNT NBR 8:3, na determinação do arranjo das barras das armaduras. Como o objetivo da análise em questão é estudar o comportamento do bloco com cálice embutido, optou-se por não variar a geometria dos pilares e das estacas nos modelos analisados. A Tabela apresenta as propriedades geométricas dos quatro grupos de blocos analisados. Os pilares e estacas são de seção quadrada com medida dos lados igual a 3 cm. As paredes laterais possuem dois valores de espessura: cm e cm. Além disso, entre o pilar e o cálice há uma folga de cm em cada face, que posteriormente é ocupada pelo graute, resultando assim nos valores de B Ly. As barras das armaduras principais do tirante foram dimensionadas para não escoarem. Os pilares e as estacas tiveram concretos com resistência à compressão maior do que as resistências do concreto dos blocos e das vigas. Esse procedimento teve o intuito de evitar a ruína dos modelos no pilar ou na estaca. A Tabela 3 apresenta a configuração das barras das armaduras adotadas nos modelos. O valor da resistência característica ao escoamento foi igual a MPa, enquanto o módulo de elasticidade foi de GPa. A Tabela 4, por sua vez, apresenta os valores das propriedades mecânicas dos concretos utilizados nos modelos, sendo que f ck é a resistência característica à compressão do concreto, f ct,m é a resistência média à tração do concreto e E cs é o módulo de elasticidade secante do concreto. Tabela Modelos analisados numericamente. Nomenclatura Ângulo Espessura Interface BLH7A4_ BRHA4_ BLH7A4_ BRHA4_ 4º Lisa Rugosa Lisa Rugosa BLH7A_ BRHA_ BLH7A_ BRHA_ º Lisa Rugosa Lisa Rugosa Tabela Propriedades geométricas dos modelos analisados. Blocos Dimensão da estaca (cm) Dimensão do pilar (cm) B Lx (cm) B Ly (cm)? emb (cm) Altura (cm) BLH7A4 3x3 3x3 7/8 4 7 BLH7A 3x3 3x3 7/8 4 7 BRHA4 3x3 3x3 8 7/8 3 BRHA 3x3 3x3 7/8 3 B Lx eb Ly são os comprimentos dos blocos nas direções xey,respectivamente. Minerva, (): -7

4 BARROS & GIONGO Tabela 3 s de aço das armaduras dos modelos analisados. Blocos BLH7A4 BLH7A BRHA4 BRHA Armadura longitudinal Ø mm Ø mm Ø mm Ø mm Estribo vertical Ø,3 c/ Ø,3 c/, Ø,3 c/3, Ø,3 c/, Estribo horizontal 4Ø,3 c/ 4Ø,3 c/ 4Ø,3 c/ 4Ø,3 c/ Ashp 3Ø,3 c/ 3Ø,3 c/ 3Ø,3 c/ 3Ø,3 c/ Ashs 4Ø,3 c/ 4Ø,3 c/ 4Ø,3 c/ 4Ø,3 c/ Asvp Ø,3 c/ Ø,3 c/ Ø,3 c/ Ø,3 c/ Asvs 4Ø,3 c/8 4Ø,3 c/8 4Ø,3 c/8 4Ø,3 c/8 Armadura de punção 4Ø,3 c/8 4Ø,3 c/8 4Ø,3 c/8 4Ø,3 c/8 Armadura de costura Ø,3 c/ Ø,3 c/, Ø,3 c/3, Ø,3 c/, Armadura do pilar Ø, mm Ø, mm Ø, mm Ø, mm Armadura da estaca 8Ø, mm 8Ø, mm 8Ø, mm 8Ø, mm Tabela 4 Propriedades mecânicas dos concretos. Propriedades f ck (MPa) f ct,m (MPa) E cs (MPa) Bloco, 38 Pilar 4,7 338 Estaca 4,7 338 Graute 4,7 338 Elementos finitos utilizados Os elementos finitos utilizados na simulação numérica foram os disponíveis na biblioteca de elementos do DIANA. Para a modelagem do concreto das estacas, do pilar e do bloco, foi utilizado elemento sólido CH. O elemento finito CH é um elemento isoparamétrico com nós e função aproximadora quadrática para os deslocamentos. Cada nó apresenta três graus de liberdade, que são os deslocamentos nas direções x, y e z. A Figura apresenta o elemento CH e a função aproximadora para os deslocamentos. Para modelagem das barras de aço das armaduras foram utilizados elementos chamados de reinforcements. Esses elementos não possuem nós e funcionam como enrijecedores dos elementos finitos aos quais estão conectados, também conhecidos como mother elements. Os reinforcements não possuem graus de liberdade, porém têm seu comportamento habilitado na direção axial da barra. Nessa situação, a aderência entre o aço e o concreto é considerada perfeita. Para a simulação do atrito existente entre o pilar e o graute e entre o graute e o bloco, foram utilizados elementos de interface. O elemento finito de interface utilizado foi o CQ48I, que é plano, quadrilateral com função aproximadora quadrática em deslocamentos, recomendado em análises tridimensionais. A escolha desse elemento se deu em função do elemento finito CH utilizado na modelagem do concreto, já que ambos possuem oito nós em cada face. A Figura 4 apresenta o CQ48I. A utilização dos elementos de interface foi feita apenas nos blocos cujas paredes do cálice apresentavam configuração lisa. Na situação de paredes rugosas, alguns pesquisadores como Canha (4) e Delalibera (9) verificaram que, quando ocorre chave de cisalhamento, pode-se considerar que essa ligação apresenta comportamento monolítico. De acordo com o manual do DIANA, a interação entre duas interfaces de uma estrutura pode ser descrita por um comportamento de fricção entre essas partes. O modelo de fricção de Coulomb, semelhante ao modelo Minerva, (): -7

ANÁLISE DE BLOCOS DE CONCRETO ARMADO SOBRE DUAS ESTACAS COM CÁLICE EMBUTIDO modificado de Mohr-Coulomb descrito em Chen (98), pode ser utilizado para descrever esse comportamento. De acordo com Chen (98), valores usuais para ângulo interno de atrito φ estão em torno de 37º. Entretanto, esse valor resulta numa resistência à tração de cerca de % do valor da resistência à compressão, valor este comprovadamente alto para os concretos atuais. Dessa maneira, adotou-se um ângulo interno de atrito φ igual a 3º, cuja tangente resulta em, e o valor da resistência característica à tração do concreto foi considerado de acordo com as recomendações da ABNT NBR 8:3. O valor da coesão foi calculado pela expressão (), em que f c é a resistência característica à compressão do concreto e φ é o ângulo interno de atrito. A Figura 4a apresenta os elementos de interface aplicados na região do encontro do pilar com o bloco, enquanto a Figura 4b apresenta o modelo BRHA_. c ' fc sen cos () As Figuras a, b, c e d apresentam as barras das armaduras discretizadas no DIANA. 9 8 7 9 8 7 3 4 u( i,, )=a +a +a +a 3 +a 4 +a +a +a 7 +a 8 +a 9 +a +a +a +a 3 +a 4 +a +a +a +a +a 7 8 9 Figura Elemento CH com função aproximadora em deslocamentos. u z u y u x z y 8 9 x 7 4 4 3 3 Tipologia Deslocamentos Figura 3 Elemento CQ48I (DIANA, ). IS88 CQ48 HE CH Bloco Estaca e pilar Graute Placa metálica Figura 4 Região de interface entre o pilar e o graute, e malha de elementos finitos do modelo BRHA_. Minerva, (): -7

BARROS & GIONGO (c) (d) Figura s das armaduras discretizadas no DIANA. Análise dos Resultados Como esperado, os blocos com ângulo de inclinação das bielas igual a º apresentaram maior rigidez quando comparados aos blocos com inclinação de 4º. Constatouse também que, de modo geral, os blocos com inclinação igual a º apresentaram valor de força última superior aos blocos de 4º, que, por sua vez, apresentaram deslocamentos maiores. Essa tendência de comportamento foi verificada tanto para os blocos com conformação das paredes do cálice rugosa como para os blocos com conformação das paredes lisa, e pode ser verificado nas Figuras e 7 por meio das curvas força versus deslocamento. Os deslocamentos máximos foram obtidos na região central da face inferior do bloco. Observa-se ainda que, independente da conformação das paredes do cálice e sem presença de viga de travamento, a força última foi superior nos blocos com espessura da parede igual a cm quando comparados aos blocos cuja espessura da parede era igual a cm. Esse resultado mostra que nem sempre blocos com grandes dimensões implicam blocos com maior capacidade resistente, e podem ser vistos na Figura 8. É possível ainda obter algumas informações dos blocos comparando-se valores de força última para diferentes inclinações da biela. Por meio da Figura 9 observa-se que, para o ângulo da biela igual a 4º, a curva força versus deslocamento do bloco com conformação da parede lisa apresenta a mesma tendência de comportamento do bloco com conformação da parede rugosa. Comportamento semelhante é observado nos blocos com espessura da parede igual a cm e cm. Quando a inclinação da biela é igual a º, observa-se que os blocos com conformação da parede rugosa apresentam valores de força última superior aos blocos com conformação da parede lisa, diferentemente do comportamento apresentado anteriormente nos blocos com inclinação da biela igual a 4º. Esse comportamento também se repete independente da espessura da parede do cálice, como pode ser observado na Figura. Com o intuito de encontrar um valor representativo para a força atuante no tirante, optou-se por verificar os valores de tensão em cada uma das seis barras utilizadas como armadura principal na seção onde atua o maior valor de tensão, isto é, próximo ao meio do bloco. As Figuras a apresentam a distribuição de tensões normais nas seis barras da armadura principal do tirante. Observa-se, por meio dessas figuras, que na seção próxima ao meio do bloco os maiores valores de tensão não ocorrem nas barras 3 e 4 no centro da seção, mas sim nas barras intermediárias (barras e ), conforme Figura. Esse comportamento foi verificado em todos os modelos, exceto no BRHA_. Minerva, (): -7

ANÁLISE DE BLOCOS DE CONCRETO ARMADO SOBRE DUAS ESTACAS COM CÁLICE EMBUTIDO 7 Força (kn) 3 8 4 Bloco com parede rugosa, e = cm BRHA4_ BRHA_ 3 8 4 Bloco com parede rugosa, e = cm BRHA4_ BRHA_ Figura Blocos com parede rugosa. Força (kn) 3 8 4 Bloco com parede lisa, e = cm BLH7A4_ BLH7A_ 3 8 4 Bloco com parede lisa, e = cm BLH7A4_ BLH7A_ Figura 7 Blocos com parede lisa. Força (kn) 3 8 4 Bloco com parede rugosa BRHA4_ BRHA4_ BRHA_ BRHA_ 3 8 4 Bloco com parede lisa BLH7A4_ BLH7A_ BLH7A4_ BLH7A_ Figura 8 Blocos com espessura igual a cm e cm. Força (kn) 3 8 4 Bloco com biela igual a 4º, e=cm 3 8 4 Bloco com biela igual a 4º, e=cm BLH7A4_ BRHA4_ BLH7A4_ BRHA4_ Figura 9 Blocos com inclinação da biela igual a 4º. Minerva, (): -7

8 BARROS & GIONGO Força (kn) 3 8 4 Bloco com biela igual a º, e=cm 3 8 4 Bloco com biela igual a º, e=cm BLH7A_ BRHA_ BLH7A_ BRHA_ Figura Blocos com inclinação da biela igual a º. 3 4 494 48 443 47 39 3 34 3 89 3 38 8 3 9 83.8 8. 3. Figura s da armadura principal do tirante. Seção do modelo BLH7A4_ Seção do modelo BLH7A4_ 34 39 47 477 39 34 8 3 47 477 3 8 Figura Tensão nas barras da armadura principal dos modelos BLH7A4_ e BLH7A4_. Seção do modelo BLH7A_ Seção do modelo BLH7A_ 9 434 48 48 433 9 3 43 38 38 43 3 Figura 3 Tensão nas barras da armadura principal dos modelos BLH7A_ e BLH7A_. Minerva, (): -7

ANÁLISE DE BLOCOS DE CONCRETO ARMADO SOBRE DUAS ESTACAS COM CÁLICE EMBUTIDO 9 Seção do modelo BRHA4_ Seção do modelo BRHA4_ 9 4 3 349 4 9 33 43 43 33 Figura 4 Tensão nas barras da armadura principal dos modelos BRHA4_ e BRHA4_. Seção do modelo BRHA_ Seção do modelo BRHA_ 337 39 39 338 49 49 99 99 3 44 43 Figura Tensão nas barras da armadura principal dos modelos BRHA_ e BRHA_. Com os valores de tensão normal em cada barra é possível obter um valor médio para a tensão nas barras da armadura principal do tirante, a partir do qual, multiplicando-se pelo valor da área dessas barras, podese encontrar o valor da força resultante R st atuante em cada um dos modelos. Com o valor da força R st e da força última atuante no pilar, por meio do polígono de forças é possível encontrar o valor da força de compressão R cb atuante nas bielas de compressão. Também é possível chegar ao valor das tensões nodais no encontro do bloco com o pilar e do bloco com as estacas. A Tabela apresenta os valores das forças nas barras da armadura principal e na biela comprimida, bem como as tensões no encontro do bloco com o pilar e do bloco com as estacas. Esses valores foram calculados por meio do modelo de bielas e tirantes, no último passo de carregamento. Considerações Finais Os resultados indicaram que em todos os modelos a formação da biela se inicia a partir do encontro do pilar com o bloco. Entretanto, por tratar-se de resultados numéricos, recomenda-se a realização de ensaios experimentais para comprovar esse comportamento. Verificou-se que os blocos com inclinação da biela de compressão igual a 4º apresentaram a mesma tendência de comportamento, independente da espessura e da configuração das paredes do cálice. Tabela Força última e tensões nodais nos modelos analisados Modelo Força R st (kn) Força R cb (kn) σ cb,p (MPa) σ cb,e (MPa) BLH7A4_ 78 44 38,7 9,3 BLH7A4_ 7 394 3, 8, BLH7A_ 4 74,94,47 BLH7A_ 8 4 38, 9, BRHA4_ 77 9 4,7,3 BRHA4_ 8 339 34, 7,33 BRHA_ 98 34 33,4,77 BRHA_ 48 7,39 3,9 Minerva, (): -7

7 BARROS & GIONGO Em contrapartida, os blocos com inclinação igual a º tiveram comportamento distintos em relação à configuração e à espessura das paredes do cálice. Os blocos com parede rugosa apresentaram-se mais rígidos e tiveram força última superior à dos blocos com parede lisa. Os resultados indicaram ainda a existência de grande fluxo de tensões na região sob o fundo do cálice e o fundo do bloco. Deve-se, portanto, atentar para a verificação dessa região durante a fase de projeto, a fim de evitar a ruína do bloco por punção. Com os diagramas de tensões das barras da armadura principal, foi possível calcular a força atuante no tirante. Combinando esse valor com a força proveniente do pilar, obteve-se a força atuante na biela de compressão, assim como as tensões nas regiões nodais. Agradecimentos Os autores agradecem ao Departamento de Engenharia de Estruturas da Escola de Engenharia de São Carlos e ao CNPq pelos auxílios concedidos durante a realização deste trabalho. Referências Bibliográficas ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNI- CAS. NBR 8:3: Projeto de estruturas de concreto Procedimento. Rio de Janeiro, 4. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNI- CAS. NBR 748:7: Aço destinado a armaduras para estruturas de concreto armado Especificação. Rio de Janeiro, 7. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNI- CAS. NBR 9:98: Projeto e execução de estruturas de concreto pré-moldado. Rio de Janeiro, 98. BARROS, R. Análise de blocos de concreto armado sobre duas estacas com cálice totalmente embutido mediante presença de viga de travamento. 9. Dissertação de (Mestrado) Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos. BLÉVOT, J.; FRÉM, R. Semelles sur piex. Analles d Institut Techique du Bâtiment et des Travaux Publics, Paris, v., n. 3, p. 3-9, fev. 97. CANHA, R. M. F. Estudo teórico-experimental da ligação pilar-fundação por meio de cálice em estruturas de concreto pré-moldado. 4. Tese (Doutorado) Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos. CHEN, W. F. Plasticity in reinforced concrete. New ork: McGraqw-Hill Book Company, 98. 474 p. DELALIBERA, R. G. Análise numérica e experimental de blocos sobre duas estacas com cálice embutido utilizado na ligação pilar-fundação. 9. Relatório de Pósdoutorado FAPESP (em fase de elaboração) EESC, Universidade de São Paulo, São Carlos. DIANA Finite Element Analysis. User s manual release 9, Element Library. Delft, Netherland: TNO DIANA,. LEONHARDT, F.; MÖNNIG, E. Construções de concreto. Rio de Janeiro: Interciência, 978. v. -4. Minerva, (): -7