Artigo publicado nos Anais do VI CÍRCULO DE ESTUDOS LINGÜÍSTICOS DO SUL. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis-SC, novembro de 2004.

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Transcrição:

1 Artigo publicado nos Anais do VI CÍRCULO DE ESTUDOS LINGÜÍSTICOS DO SUL. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis-SC, novembro de 2004. ABORDAGENS DE ENSINO DE GRAMÁTICA NO NÍVEL MÉDIO Ruth Ceccon BARREIROS (Unioeste-Cascavel-PR ) ABSTRACT: This paper discusses about grammar teaching at high school. Theories point out several causes for difficulties that students have during their grammar learning, however, it is important to discuss teaching methodological procedures, the aim of didactic book on this context, but do not forget aspects of the teacher s formation. KEYWORDS: Grammar; high school; teaching. 0. Introdução No texto desta comunicação estamos (re)visitando o assunto: o ensino de gramática. Os estudos estão vinculados ao projeto de pesquisa: Investigação sobre as abordagens de ensino da gramática no Ensino Médio. Esta temática tem sido motivo de muitas discussões nos meios acadêmicos, contudo não há um consenso entre teóricos e professores sobre um método eficaz, dado aos inúmeros fatores que envolvem esse aprendizado. Em geral, o ensino da gramática é visto com um fim em si mesmo, não acrescentando ao educando maiores informações lingüísticas. Neste sentido, acreditamos que inferirmos sobre os possíveis caminhos que poderiam levar o aluno a apropriar-se desses conhecimentos já não é suficiente, mas se faz necessário discutirmos os procedimentos metodológicos que estão sendo utilizados em sala de aula, o papel do livro didático nesse contexto, sem deixar de considerar aspectos da formação do professor. Nossas reflexões estão voltadas para o processo do ensino da gramática no primeiro ano do nível médio, do período noturno, em duas escolas públicas da cidade de Cascavel-PR. O critério de escolha das escolas teve por base àquelas que apresentavam um número maior de turmas de ensino médio. Os objetivos que norteiam esta pesquisa são: a) identificar as concepções de linguagem e gramática presente no Ensino Médio; b) definir as concepções de linguagem e gramática manifesta no livro didático e no discurso do professor de Ensino Médio; c)delimitar a formação do professor de gramática do Ensino Médio. Quanto à metodologia de pesquisa ressaltamos que, nesta primeira fase, foram realizadas leituras de textos referentes ao ensino de língua materna, gramática, concepções de língua e formação de professores. Para a segunda fase, ainda não concluída, estão previstas as análises dos dados observados em aulas de gramática bem como do livro didático, material de apoio e as entrevistas realizadas com os professores. Partimos do princípio de que as pesquisas relativas ao período fundamental são em maior quantidade e que, portanto, o período escolar de ensino médio ainda carece de estudos. Esta pesquisa possibilitar-nos-á ampliarmos os conhecimentos acerca do ensino de gramática e quiçá seus resultados poderão contribuir com sugestões de encaminhamentos metodológicos, não apenas para o nível médio, mas também, para a formação dos alunos de graduação do Curso de Letras. Ressaltamos

2 que os resultados ora apresentados são parciais, referentes à primeira fase da pesquisa. 1. A primeira fase da pesquisa: reflexões teóricas Em estudos encontramos três concepções de língua(gem), as quais estão diretamente relacionadas ao momento histórico-social. Na primeira delas, a língua(gem) como expressão do pensamento prima por uma linguagem articulada e organizada e está ligada a gramática normativa. Esta concepção esteve presente no ensino de língua durante muito tempo na história escolar do Brasil e até, por volta dos anos 60, atendeu adequadamente ao ensino de língua materna, uma vez que tinha como público maior, a classe privilegiada usuária da norma culta padrão. A partir da década de 60 as camadas populares conquistam seu espaço nas escolas, sobretudo na pública, e fez-se necessária uma mudança no processo de ensino. Um novo momento histórico, uma nova concepção de linguagem: a linguagem como instrumento de comunicação. Nesta nova fase não se trata mais saber a respeito da língua e sim desenvolver a habilidade de expressão e compreensão de mensagem. Nos anos seguintes uma nova realidade social, aliada à ineficiência do ensino de língua portuguesa, requer uma terceira concepção: a linguagem como processo de interação, a língua como forma viva de expressão e interação humana, por sua produção de efeitos de sentido entre interlocutores, em uma dada situação de comunicação e em um contexto sócio-histórico e ideológico. Estudos recentes apontam-na como a concepção ideal, contudo, é possível inferir que está concepção ainda não está presente no ensino de língua de forma homogênea, uma vez que as dificuldades apresentadas por alunos de todos os graus de ensino no uso da língua tanto oral quanto escrita, persiste. Analisamos, também, as concepções de gramática e seu ensino, sob a perspectiva de que o estudo da gramática deve servir como apoio para o ensino de língua e não como método único. Os PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS (PCNs), bem como o Currículo Básico expõem concepções e abordagens diferentes sobre a Gramática, estes materiais, portanto passaram a ser estudados com atenção e avaliados sob uma perspectiva crítica. No Currículo Básico, a concepção é de que a Gramática ainda é conservadora e, em conseqüência o estudo da língua torna-se descontextualizado o que causa o fracasso do domínio da língua, o material tece crítica ao livro didático, pressupondo que este tem uma visão redutora da língua, desta forma, também os temas sociais são permeados de máscaras, pois o ensino não parte da realidade do aluno. Já os PCNs, consideram diversos aspectos como base de reflexões, dentre os quais merece destaque a leitura e produção de texto e a análise lingüística que visam o conhecimento da língua, as variedades e sua aplicabilidade para, posteriormente, estar colocando em prática formas de expressão coerentes conscientes e de efeito. De acordo com um dos teóricos pesquisados, TRAVAGLIA (1996), não existe apenas uma concepção de linguagem, mas várias que perpassam o ensino da língua. O autor alerta para o fato de que falar uma variedade não padrão não significa falar incorreto, mas expõe que na pretensão de eliminar os comportamentos indesejáveis, o processo de aprendizagem deve acontecer por meio da observação, mensuração e reduplicação.. Com base em Vigotsky, o autor supracitado menciona ser importante explicar as funções humanas superiores, enfatizando as origens sociais da linguagem e do pensamento. O mesmo autor, expõe questões fundamentais para o ensino de gramática, como por exemplo, é preciso refletir sobre as várias respostas que podem ser dadas mediante ao questionamento: para que se dá aula de português aos falantes nativos? Assegura que pode ser para desenvolver a competência comunicativa e empregá-la adequadamente em diversas situações; é importante para a capacidade formativa que possibilita a compreensão e produção; para a capacidade

3 transformativa que permite modificações para diversos fins e a capacidade qualitativa para determinar a tipologia do texto. Por isso, é necessário preparar os alunos para identificar variadas situações interativas e comunicativas. Dentre os conceitos de gramática, o principal é de que a gramática é essencialmente um conjunto de regras, e essa noção pode ser caracterizada segundo TRAVAGLIA (1996) pelas gramáticas: a) normativa, conjunto de regras que devem ser seguidas falar e escrever corretamente e são relativamente explícitas; b) a descritiva que se preocupa em descrever, explicar as línguas tais como elas são faladas bem como tornar conhecidas de forma explícita as regras de fato utilizadas pelos falantes. Preocupa-se em ir além da constatação de que essas formas existem e que elas são utilizadas por pessoas de diferentes grupos sociais ou em situações diferentes. O critério de correção em vez de lingüístico é social; c) a internalizada tratase de um conjunto de regras que o falante domina. Supõe que há um conhecimento específico em sua mente que garante estabilidade e este conhecimento é fundamental de dois tipos: lexical e sintático semântico, o primeiro designa a capacidade de empregar palavras adequadas, e o segundo é responsável pela distribuição de palavras para o sentido. Assim, e sob a perspectiva de teóricos e pesquisadores, ensinar gramática é importante bem como é avaliar o modo como vem sendo ensinada. Este ensino, deve ter por objetivo levar o aluno a apropriar-se do maior mais amplo conhecimento, mesmo que este implique regras e a escola deve proporcionar ao aluno acesso aos diversos bens culturais da sociedade, principalmente, um amplo conhecimento da Língua Materna, cerne de toda manifestação do indivíduo e para isso faz-se necessário adequar a nova concepção de língua(gem) às práticas e material didático utilizado em sala de aula. É preciso destacar que os teóricos da linguagem, até então estudados, são de consenso que um projeto de ensino será bem sucedido se, com urgência, tivermos uma concepção clara do que seja uma língua e um ser humano, pois a concepção de sujeito varia de acordo com a concepção de língua. Sugerem que as gramáticas sejam utilizadas de forma reflexiva e interacionista. As atividades relacionadas às gramáticas devem considerar o conhecimento que o aluno já tem, bem como capacitá-lo a reconhecer a língua padrão, porém é fundamental que o aluno também conheça e reflita quanto às incoerências que ela apresenta, isso exige do professor um amplo domínio da língua e suas variações. Esta primeira etapa possibilitou-nos conhecer e refletir as concepções de língua e de gramática, compreendendo as suas variações. Percebemos a respeito da língua(gem) e gramática que ambas não são sistemas prontos e acabados e sim um fenômeno social de interação verbal. 2. O espaço da pesquisa Suspeitávamos que iríamos encontrar uma certa resistência por parte dos professores para permitirem as observações e responderem as questões sobre o ensino de gramática, porém nos defrontamos com uma barreira maior que a esperada. Percebemos uma certa inibição e receio por parte deles por ocasião das observações, bem como para responderem as perguntas. Para a maioria é sempre constrangedor que alguém queira descrever seus métodos, analisar suas diretrizes e comparar seus discursos e práticas, confrontando com teorias acadêmicas às quais são instrumentos, muitas vezes, de poder intimidador. Sobre isto, Neves (2002, p.230) pontua: Pensemos bem no que significam, para os professores desses níveis, as pesquisas que a universidade faz. Em primeiro lugar, elas são fonte de intimidação... Nos anos 90, Neves (in TRAVAGLIA, 1996, p.101), em pesquisa similar, voltada para o ensino fundamental e médio, chegou à conclusão que o ensino de gramática era, primordialmente prescritivo, baseado na gramática normativa e tinha

4 como objetivo primeiro apresentar a forma correta e boa que deveria ser imitada para uma adequada expressão do pensamento e a maior parte das aulas era gasta na repetição dos mesmos tópicos gramaticais. Nas observações realizadas, percebemos que a maior parte dos professores prioriza a gramática normativa como parte principal de suas aulas, e, em geral, vigora a concepção de linguagem como expressão do pensamento em que estão presentes os exercícios mecânicos e descontextualizados. É possível inferir que isto de deve, em parte,à formação escolar e universitária recebida. Nos primeiros contatos com professores de língua materna, por meio de entrevista informal, questionados quanto ao uso da gramática ensinada em sala de aula, alegaram que é para escrever melhor ; para falar corretamente ; para ter maior conhecimento da sua língua materna ou ainda, para cumprir o programa de conteúdos previstos. Esses pontos de vista deixam claro que a insistência no ensino da gramática é para preparar o aluno de forma a enfrentar os obstáculos da sociedade, a qual impõe a necessidade de uma gramática normativa, embora mencionem que tentam metodologias diferentes, e os livros didáticos usados inovam no estudo dos tópicos gramaticais. Os discursos dos professores, relativos à importância do ensino da gramática, dá-nos um panorama de como a linguagem está sendo vista e trabalhada em sala de aula. Quanto às primeiras impressões acerca do livro didático, Língua e Literatura, de Faraco e Moura, o qual é utilizado pelas turmas pesquisadas, não foi difícil encontrarmos exercícios inovadores. Contudo, ao observarmos as atividades em sala de aula, tendo o livro didático como apoio, os exercícios de gramática, em geral, continuam pautados na gramática tradicional, não se configurando a metodologia diferenciada como pretendem os professores. Embora o intuito seja trabalhar a gramática descritiva e interativa, com base em novas propostas de ensino, há a persistência da gramática normativa, pela forma como os conteúdos são apresentados pelo professor, da mesma forma constatada por Neves em 1990. Desde a década passada as discussões e pesquisas sobre o tema são muitas. Novas abordagens sobre a língua e a linguagem surgem como forma de problematizar e sugerir mudanças no cotidiano escolar quanto ao ensino de gramáticas nos níveis fundamental e médio. Entre as diversas discussões firmadas, discute-se a necessidade e até a relevância de se ensinar a língua padrão na escola. Com o discurso de respeito aos vários dialetos, o lingüista Marcos Bagno (2000, p.19) defende a posição bastante questionada de que o ensino deve partir da língua(gem) utilizada pelo aluno, pois, a forma como o ensino da língua materna é proposto, ainda hoje, implica em fatores de distorções ideológicas. A tradição gramatical ainda se apóia em dois pilares que foram reduzidos a pó pela ciência moderna, senão em todos os campos da atividade humana, pelo menos no tocante ao estabelecimento das verdades que compõem o conhecimento cientifico: o poder e a autoridade. De posição mais moderada, Sírio Possenti (1996, p.17), em sua obra Por que (não) ensinar gramática na escola, argumenta: Talvez deva repetir que adoto sem qualquer dúvida o princípio (quase evidente) de que o objetivo da escola é ensinar o português padrão, ou seja, talvez mais exatamente, o de criar condições para que ele seja aprendido. Ao nosso ver, é preciso reconhecer os dialetos e tê-los como ponto de partida para os trabalhos pedagógicos com a língua portuguesa em sala de aula, contudo, isso requer dos professores bem como dos órgãos oficiais de ensino um repensar nas concepções de língua e sujeito vigentes assim como uma adequação dos materiais didáticos utilizados e melhor formação para os professores.

5 Essas reflexões levaram-nos a perceber a falta de estímulo, por parte dos professores, decorrente da desconsideração dos órgãos estatais, no que se refere à inovação curricular, tendo em vista que os professores não participam, muitas vezes, das discussões dos programas de ensino e, tampouco, recebem algum tipo de auxílio pedagógico para melhor utilizar os materiais didáticos. Não se viabiliza a aplicação das novas teorias, o que poderia ser feito por meio de cursos de formação continuada. Neste sentido, Roxane Rojo (2000, p.30), chama a atenção para a construção de currículos (evidenciando o de Língua Portuguesa) os quais prescindem da escola, do município e do estado. A autora sugere que as práticas educativas em sala de aula, devem ser baseadas em currículos plurais adequados as diversas realidades, necessitam de elaboração de materiais didáticos e a formação inicial e continuada de professores que reverenciem tais práticas. Ou seja: Esta proposta de organização curricular exige dos órgãos educacionais estatais providências no sentido de uma efetiva reorganização da formação inicial e contínua dos professores, que inclua revisões curriculares dos Cursos de Letras e das disciplinas de prática de ensino. Assim, os estudos preliminares desta pesquisa, em observações dos discursos e práticas escolares, possibilitaram perceber a falta de projetos que colaborem na formação continuada dos professores de língua portuguesa, tendo em vista a realidade do ensino de gramática nos anos que antecedem o curso superior. Ressaltando-se a necessidade de não apenas sinalizar novas opções metodológicas para o ensino de gramática como faz os PCNs, mas de possibilitar a prática de tais proposições. Vale lembrar que o trabalho encontra-se em fase de construção, logo, não é possível falarmos em conclusões, mas em hipóteses. Uma delas é de que as propostas apresentadas pelos teóricos, como, por exemplo, Travaglia, Possenti, Ilari, Matêncio, Bastos, Britto, Geraldi dentre outros, estão, ainda, distantes do ideal de ensino de gramática, tendo em vista as dificuldades apresentadas por alunos de todos os graus de ensino na lida com a linguagem oral e escrita. RESUMO: Este trabalho trata do ensino da gramática no nível médio. Teorias apontam para inúmeras causas das dificuldades encontradas pelos alunos na apropriação dos conhecimentos gramaticais, contudo, faz-se necessário discutirmos os procedimentos metodológicos deste ensino, o papel do livro didático nesse contexto, sem deixar de considerar aspectos da formação do professor. PALAVRAS-CHAVE: Ensino; gramática; nível médio. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BASTOS, N.B. (org.) Língua portuguesa:história, perspectivas, ensino. São Paulo:Educ, 1998. BRASIL, Secretaria do Ensino Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: apresentação dos temas Transversais. Brasília: MEC/SEF, 1998. BRITO, Eliana Vianna (org.). PCNs de língua portuguesa: a prática em sala de aula. São Paulo: Arte & Ciência, 2001. BRITTO, Percival L. A sombra do caos: ensino de língua x tradição gramatical.campinas-sp: Mercado das Letras, 1997. GERALDI, João Wanderlei. O texto na sala de aula. São Paulo: Editora Ática, 1997. --------------Portos de passagem.são Paulo:Martins Fontes, 1997.

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