Hemofilias congênitas: conceitos, herança e aspectos clínicos Margareth Castro Ozelo Hemocentro UNICAMP 2013
Sumário Definições e epidemiologia Estrutura e mutações FVIII e FIX Hereditariedade Diagnóstico de portadoras Aspectos gerais das hemofilias Classificação, diagnóstico, quadro clínico Complicações Crônicas - Artropatias, Infecções e Inibidores
Coagulação XII HMWK Pré-calicreína Superfície XI XIa Ca IX via intrínseca TTPa (R) Ca/PL VIII IXa X FT + VII FT-VII FT-VIIa VIIIa Ca/PL Ca Ca/PL via extrínseca TPAP (RNI) Xa Fibrina estável XIII XIIIa Ca Fibrina V Va Ca/PL Trombina Protrombina Fibrinogênio via final comum
Hemofilia Herança ligada ao cromossomo X Incidência igual independente da etnia Hemofilia A: def. fator VIII (70-85%) 1: 5.000 a 10.000 nascimentos masculinos Hemofilia B: def. fator IX (15-30%) 1: 30.000 nascimentos masculinos gene fator VIII e fator IX - cromossomo X 30% casos mutações de novo Mannucci and Tuddenham. NEJM, 2001 Jun; 344:1773-9.
Hemofilia: hereditariedade XY XX H Mãe portadora XX X H Y XX H XY
Hemofilia: hereditariedade X H Y XX Pai hemofílico XX H XY XX H XY
Hemofilia: hereditariedade XY XX H? XX Mutação de novo XX XY XX X H Y
Fator VIII Gene FVIII RNAm Proteína Gene FVIII: braço longo do cromossomo X (Xq28); 186kb, 26 éxons RNAm: 9 kb Proteína: 2351 amino ácidos (domínios: A1, A2, A3, B, C1 e C2)
Fator VIII PCA FX FIXa 336 Proteína FIIa FX 372 FIIa PCA 740 FVW 1670-1684 PCA 2009-2018 FVW PCA 562 Cadeia pesada FIIa FX 1689 Cadeia leve fosfolipídeos 2303-2332 Heterodímeros do FVIII sítios de clivagem pela proteína C ativada (PCA) e pelos FX, FIXa e FIIa sítio ligação ao FvW: resíduos 1670-1684 sítio de ligação aos fosfolipídeos: resíduos 2303-2332
Mutações no gene FVIII Hemofilia A: mutações no gene do FVIII que resultem na deficiência ou alteração funcional do FVIII > 2100 mutações são descritas (HAMSTeRS 2012) http://hadb.org.uk/ mutações de ponto, deleções e inserções inversão: íntron 22 (40-50% dos casos de HA grave) íntron 1 (1-5% dos casos de HA grave)
Mutação INV22 no gene FVIII Baseado em ilustração de Lalich et al. Nat Genet 5:236, 1993
Mutação INV1 no gene FVIII Baseado em ilustração de Bagnall et al, Blood, 2002
Fator IX Gene FIX RNAm Proteína Gene FIX: braço longo do cromossomo X (Xq27); 33.5 Kb, 8 éxons RNAm: 2.8 Kb Proteína: 415 amino ácidos FIX: dependente da -carboxilação da vitamina K
Mutações no gene FIX Hemofilia B: mutações no gene do FIX que resultem na deficiência ou alteração funcional do FIX. >1100 mutações descritas Hemophilia B Mutation Database http://www.factorix.org/ mutações de ponto envolvendo troca de CG para TG ou CA mutação na região promotora: hemofilia B Leyden
Mutações no gene FIX Hemofilia B Leyden: mutações na região promotora do gene do FIX A partir da puberdade, ligação de elemento responsivo a andrógenos na região promotora permite a produção de alguns transcritos 40 to 9 Overlapping HNF-4 Receptor andrógenos Veltkamp, et al. Scand J Haematol. 1970;7(2):82-90 Reitsma et al. Blood. 1988 Sep;72(3):1074-6
Portadoras do gene da hemofilia Normalmente assintomáticas 35% apresentam FVIII ou FIX < valores de referência Portadoras sintomáticas - possíveis mecanismos envolvidos: Inativação do cromossomo X (lyonização) Alteração numérica ou estrutural do cromossomo X (ex. Sd Turner) Homozygose ou dupla heterozigose para hemofilia Portadoras sintomáticas de hemofilia A Associação com DVW tipo N Podem responder ao uso DDAVP Winikoff & Lee. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2010 Pavlova et al. J Thromb Haemost. 2009
Determinação do status de portadora do gene da hemofilia Determinação da mutação envolvida Análise de linkage para identificação do alelo afetado: Análise de polimorfismos intra-gênicos (SNPs, repetições) presentes em heterozigose nos familiares Tecnicamente mais simples que detecção da mutação direta Requer análise de vários membros da mesma família Depende da presença de heterozigose em mulheres Frequência de heterozigose para os marcadores varia entre as populações
Polimorfismos mais usados no gene do fator VIII
Polimorfismos mais usados no gene do fator IX
Determinação do status de portadora do gene da hemofilia F8 intron 13 F8 intron 22 1 2 1 2 2 2 1 2 2 2 1 2 Homem com HA Portadora gene HA 2 2 1 1? 2 2
Hemofilia: Diagnóstico Hemograma Tempo sangramento TP/AP TTPa TTPa 50% FVIII:C ou FIX:C FVW e/ou RiCof Normal Normal Normal Normal Normal
Hemofilia: Classificação Quadro clínico x atividade FVIII:C ou FIX:C Classificação Fator:C Características clínicas HA Incidência* HB Grave 1 % sangramentos espontâneos desde infância hemartroses espontâneas frequentes Moderada 1-5% hemorragia secundária pequenos traumas hemartrose espontânea pouco frequentes 70 % 15 % 50 % 30 % Leve 5-40% hemorragia secundária a traumas e cirurgias 15 % 20 % 1 UI/mL = 100% = 100 UI/dL (VN: 50 a 150% ou 0,5 a 1,5 UI/mL) * Wintrobe s Clinical Hematology, 10 th ed
Hemofilia: Manifestações clínicas Período neonatal (até 1 ano de idade) Sangramento: 10-50% pacientes Hemorragia intracraniana (HIC): 1-4% Lesões iatrogênicas frequentes punção venosa Após 1 ano Sangramento de partes moles (marcha) Hemartroses e hematomas musculares ( atividade física) Adultos Hemartroses (sangramentos articulares) e hematomas Hemofílicos leve e moderado: diagnóstico pode ser tardio
Complicações Agudas: Episódios Hemorrágicos 90% sistema músculo-esquelético 80% articulares joelho cotovelo tornozelo quadril ombro punho 20% musculares 10% outras regiões
Complicações Agudas: Episódios Hemorrágicos Episódios hemorrágicos Hemartroses em joelho, cotovelo, tornozelo: > 80% dos sangramentos
Hemofilia: Complicações Crônicas Infecciosas transfusionais Artropatia Hemofílica Inibidores
Complicações Crônicas: Infecções Transfusionais Infecções transmitidas por derivados do sangue HIV Hepatite C Hepatite B: vacinar! Outros: Hepatite A (vacinar), Parvovírus B19, doenças emergentes: Creutzfeldt-Jakob ( doença da vaca louca )
Complicações Crônicas: Artropatia hemofílica Hemartroses repetidas Hipertrofia da sinóvia Lesão da cartilagem Lesão óssea Artropatia hemofílica
Complicações Crônicas: Artropatia hemofílica Hemartrose neutrófilos e macrófagos Neoformação vascular Deposição de hemossiderina Hipertrofia e Hiperplasia sinovial alteração sinovial e destruição da cartilagem articular Artropatia crônica Adaptado de Silva et al WFH 2004
Complicações Crônicas: Artropatia hemofílica hemartrose sinovite deformidades incapacitantes rigidez articular + hipotrofia muscular
Inibidores Complicações Crônicas: Aloanticorpos neutralizadores da atividade coagulante dos fatores da coagulação anti-fviii ou anti-fix ~ 30% HA grave 3-5% HB grave Inibidores Aparece após tratamento de reposição com concentrado de fator Inibidores não aumentam o risco de sangramento, mas o controle da hemostasia é mais difícil
Impacto dos inibidores Falha dos tratamentos habituais Dificuldade do controle da hemostasia Aumento da morbidade / mortalidade Dificuldade na realização de cirurgias eletivas Problemas específicos relacionados aos inibidores FIX (reações anafiláticas)
Referências Srivastava A, et al. Treatment Guidelines Working Group on Behalf of The World Federation Of Hemophilia. Guidelines for the management of hemophilia. Haemophilia. 2013 Jan;19(1):e1-47. Carcao MD. The diagnosis and management of congenital hemophilia. Semin Thromb Hemost. 2012 Oct;38(7):727-34. Berntorp E, Shapiro AD. Modern haemophilia care. Lancet. 2012 Apr 14;379(9824):1447-56. Pavlova A, Brondke H, Müsebeck J, et al. Molecular mechanisms underlying hemophilia A phenotype in seven females. J Thromb Haemost. 2009 Jun;7(6):976-82. Mannucci PM, Tuddenham EG. The hemophilias--from royal genes to gene therapy. N Engl J Med. 2001 Jun 7;344(23):1773-9.