ASPECTOS DA VIOLÊNCIA NA ADOLESCÊNCIA: REFLEXÕES PSICANALÍTICAS SOBRE O JOVEM EM CONFLITO COM A LEI JOICY ANNE SILVA ESPECIALISTA EM PSICOLOGIA CLÍNICA PSICANALÍTICA/UEL MESTRANDA EM PSICOLOGIA/UNESP
SINASE (Sistema Nacional de Atendimento Socieducativo) -conjunto ordenado de princípios, regras, critérios que envolvem a execução de medidas socieducativas no país; -fundamentos para se constituir uma política pública específica, a Política da Socioeducação.
Medida socioeducativa: contribuição para a inclusão social e o desenvolvimento socioeconômico do adolescente e sua família): 1- responsabilização do adolescente quanto às consequências lesivas do ato infracional, incentivando a reparação; 2-integração social do adolescente e a garantia de seus direitos individuais e sociais por meio do PIA; 3-desaprovação da conduta infracional, efetivando as disposições da sentença como parâmetro máximo de privação de liberdade ou restrição de direitos, observados os limites previstos em lei.
Os planos de atendimento socioeducativo deverão, obrigatoriamente prever ações articuladas nas áreas de educação, saúde, assistência social, cultura, capacitação para o trabalho e esporte, interrompendo a trajetória do ato infracional. PIA (plano individual de atendimento): instrumento de previsão, registro e gestão das atividades a serem desenvolvidas com o adolescente. -encaminhamentos e a execução das medidas devem levar em conta o perfil do adolescente subjetividade ; - fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários no processo socioeducativo
Momento atual: prestes a elaborar o plano decenal de atendimento socioeducativo, o documento de diretrizes e bases, encerra que a socioeducação é imprescindível como política pública específica para resgatar a imensa dívida histórica da sociedade brasileira com a população adolescente (vítima principal dos altos índices de violência) e como contribuição à edificação de uma sociedade justa que zela por seus adolescentes.
As causas da violência, como as desigualdades sociais, o racismo, a concentração de renda e a dificuldade ao acesso a políticas públicas, não se resolvem com a adoção de leis penais mais severas e sim através de medidas capazes de romper com a banalização da violência e seu ciclo perverso.
-LA (Liberdade Assistida) de acordo com o ECA, consiste na medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente no sentido de sua promoção social e de sua família, inserindo-os se necessário, em programas da assistência social, acompanhar a situação escolar do adolescente, diligenciar no sentido de sua profissionalização e sua inserção no mercado de trabalho. -Porém, se os vínculos com a vida, com a dignidade não são resgatados, o trabalho socioeducativo torna-se difícil ou impossível.
A meu ver, a medida de Liberdade Assistida (LA) constitui-se em um mecanismo importante desta política, pois permite o contato direto com o adolescente nos encontros que são estabelecidos semanais com o mesmo. Ali, o jovem tem condição de protagonizar o relato de sua vida, de suas experiências conflitivas e de ser auxiliado em suas dificuldades. Esta aproximação propicia uma experiência rica de um encontro onde talvez o adolescente nunca pudesse ter tido antes a oportunidade de ser ouvido sem discriminação, sem um olhar estigmatizador sobre ele. E, para o técnico que o acompanha, a responsabilidade de concretizar uma escuta sincera, sem receios, aberta ao mundo que se constitui a sua frente. Sempre incentivando e valorizando a narrativa dos mesmos, podendo ali ser um espaço potencial para a humanização e a criatividade do adolescente
Maurício Knobel (1997) relata que algumas atitudes violentas dos adolescentes podem ser compreendidas como manifestações de estados depressivos característicos da Síndrome da Adolescência Normal. Os sintomas anti-sociais dos delinquentes passam a ser entendidos como sinais de esperança que orienta o indivíduo a recuperar aquilo que ele perdeu.(privação)- sinal de esperança que o orienta. (Winnicott) Descarga intempestiva, através de atuações, daquilo que o psiquismo não suporta devido uma falha no processo de simbolização. (Freud-Bion)
Destacamos a importância, enquanto instituição que atende adolescentes em situação de risco social através do trabalho socioeducativo, de exercermos um trabalho que ofereça um espaço referencial e reorganizador para esses jovens, onde encontre um lugar para a livre expressão de sua subjetividade sem esperar deles ideais propostos por nós, por suas famílias e sociedade e que, possam entender como ele e a comunidade se organiza, participando ativamente na elaboração dos combinados e no seu processo socioeducativo.
V. é um adolescente em medida socioeducativa de L.A. Tem 16 anos e desde os 10 anos de idade vive constantes evasões de sua casa. Quando veio para a primeira entrevista dizia estar casado, com um filho de 2 anos e sua esposa(22 anos) estava grávida. V dizia que queria construir sua vida, que havia sido pego com drogas, que estava procurando emprego para ter condições de viver com sua família. Durante os atendimentos queixava-se da dificuldade de conseguir trabalho, em pagar o aluguel. A aparência suja, maltratad me chamava atenção. Até que V. compareceu para me pedir para eu mudar o dia e o horário de seus atendimentos pois iria começar a trabalhar. Veio com o cabelo cortado e com o rosto mais suave. Penso que isso era resultado da manifestação de alguma esperança. Prosseguindo com os atendimentos, V saiu do trabalho e sem dinheiro teve que sair da casa onde estava morando com a mulher, filho, e seus irmãos. Em um certo dia, compareceu a instituição pedindo abrigamento. Levamos para a casa de passagem onde não permaneceu nem 24h. Teve uma discussão com a esposa e rompeu seu relacionamento. Fiquei com muita raiva dele não ter ficado no abrigo, porém estava tentando entender o meu sentimento. Após este episódio o adolescente apresentava-se bastante desmotivado, com falas depressivas, que estava vivendo para ajudar seus irmãos, que desde que havia decidido sair deste mundo as pessoas que falaram que o ajudariam viraram as costas para ele. Comecei a conversar com V sobre suas perdas e seu movimento destrutivo. No penúltimo atendimento ele veio falando que havia arrumado um emprego e estava morando com a mãe, porém a contragosto do padrasto tenho que arrumar meu canto, ela decidiu ficar com ele. Seu patrão foi até o socioeducativo me levar uma declaração de trabalho de V. Comecei a trabalhar com ele os ganhos de ser tolerante, de trabalhar, de como sua aparência estava diferente etc. No último atendimento, V compareceu em um dia anterior ao agendado porque havia chovido e quando chove não tem como ele trabalhar na colocação das lâminas. Disse que aproveitou para vir e que lembrou-se de que eu não estaria presente na quarta. Reclamou do trabalho mas disse que estava bom e ao final disse: Você se lembra como eu era antes? Se eu fosse daquele jeito eu não estaria lá.