Capítulo Suporte Básico de Vida 5 Pediátrico

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Transcrição:

Capítulo Suporte Básico de Vida 5 Pediátrico 1. OBJETIVOS No final desta unidade modular os formandos deverão ser capazes de: Compreender as particularidades anatómicas e fisiológicas das crianças que justificam adaptações de procedimentos base de Suporte Básico de Vida. Identificar as principais causas da paragem cárdio-respiratória na idade pediátrica. Listar e descrever as técnicas de reanimação na criança de acordo com o algoritmo; Listar e descrever os passos para colocar a vítima em PLS; Reconhecer a obstrução da via aérea na criança; Listar e descrever a sequência de procedimentos adequada á desobstrução da via aérea, de acordo com o grupo etário. 1

2. INTRODUÇÂO A criança tem características anatómicas e fisiológicas particulares pelo que é necessário adaptar os procedimentos de suporte básico de vida a essas mesmas características. Os princípios gerais são os mesmos que os do adulto mas com várias diferenças. Todas as estruturas anatómicas são mais frágeis pelo que todas as manobras têm que ser feitas com mais suavidade para não causar traumatismos na criança. A criança está particularmente sujeita a situações de obstrução anatómica da via aérea, dado que a via aérea tem menor diâmetro e colapsa com facilidade. A língua, de dimensões relativas maiores, também mais facilmente causa obstrução da via aérea. A frequência cardíaca nas crianças é mais elevada que nos adultos e a manutenção de uma circulação adequada está muito dependente da frequência cardíaca, isto é, só pelo facto de apresentar uma frequência cardíaca baixa a criança pode apresentar sinais de insuficiência circulatória. Como veremos mais adiante, face a uma frequência cardíaca baixa e sinais de má perfusão periférica é necessário tratar como se de ausência de sinais de circulação se tratasse. A criança está também predisposta a desenvolver com maior facilidade processos de hipotermia quando exposta, pelo que o controlo da sua temperatura deverá ser um aspeto a ter em atenção, evitando exposições prolongadas e tentando manter o ambiente onde se encontra aquecido. 3. SUPORTE BÁSICO DE VIDA EM PEDIATRIA O conceito de Suporte Básico de Vida Pediátrico pressupõe um conjunto de procedimentos encadeados com o objetivo de fornecer oxigénio ao cérebro e coração, sem recurso a equipamentos diferenciados, até que o suporte avançado de vida possa ser instituído. Definições de Grupos Etários Do ponto de vista do SBV pediátrico definem-se 3 grupos etários: - O Neonato - nas primeiras horas de vida; - O lactente até ao ano de idade; - A criança de 1 ano até á puberdade; O SBV em recém-nascidos nas primeiras horas de vida tem algumas particularidades que devem ser do conhecimento de todos os que podem estar envolvidos no seu cuidado, desde o momento do parto. Este campo particular do SBV pediátrico deve, portanto, ser do conhecimento dos profissionais de saúde. Após as primeiras horas de vida as diferenças de procedimentos devem ser baseadas no tamanho da criança, mais do que na idade. 2

A diferença entre uma criança de 10 meses e de 18 meses é pequena. É possível que uma criança de 20 meses ou mesmo 2 anos tenho um tamanho mais apropriado à aplicação das manobras de SBV recomendadas para o lactente. A partir da adolescência, que corresponde ao final da infância, devem ser utilizados os algoritmos do adulto. Ao contrário do que acontece no algoritmo de SBV do Adulto, em que a sequência das ações (30 compressões para 2 insuflações ou 30:2) é comum a todos os reanimadores - profissionais de saúde ou não - a sequência das ações no SBV Pediátrico difere de acordo com o número de reanimadores e com a formação/preparação base destes. A forma mais simples, para o utilizador comum e que aprendeu SBV, será adaptar o algoritmo de SBV do adulto à vítima em idade pediátrica, pois é preferível que faça algum SBV do que nenhum. 3.1. Etapas e Procedimentos O SBV inclui as seguintes etapas: Avaliação inicial; Manutenção de via aérea permeável; Compressões torácicas e ventilação com ar expirado. A sequência de procedimentos, após a avaliação inicial, segue as etapas ABC, com as iniciais a resultarem dos termos ingleses Airway, Breathing e Circulation: A Via Aérea B Ventilação C Circulação Como em qualquer outra situação, deve começar por avaliar as condições de segurança antes de abordar a criança. Como referido anteriormente, o conceito de SBV implica que seja praticado sem recurso a qualquer equipamento específico. A utilização de algum equipamento para permeabilizar a via aérea (exemplo: tubo orofaríngeo) ou de máscara facial para insuflação com ar expirado (exemplo: máscara de bolso) implica a designação de SBV com adjuvantes de via aérea. Posicionamento da vítima e do reanimador As manobras de SBV devem ser executadas com a vítima em decúbito dorsal, no chão ou num plano duro. Se a criança se encontrar, por exemplo, numa cama, as manobras de SBV, nomeadamente as compressões torácicas, não serão eficazes uma vez que a força exercida será absorvida pelas molas ou espuma do próprio colchão. Se a criança se encontrar em decúbito ventral, se possível, deve ser rodada em bloco, isto é, mantendo o alinhamento da cabeça, pescoço e tronco. O reanimador deve posicionar-se junto da vítima para que, se for necessário, possa fazer insuflações e compressões sem ter que fazer grandes deslocações. 3

3.1.2. Sequências de Ações A avaliação inicial consiste em: Avaliar as condições de segurança no local; Avaliar se a vítima responde; Depois de assegurar que estão garantidas as condições de segurança, aproxime-se da criança avalie se esta responde, perguntando em voz alta Estás bem? Sentes-te bem?, enquanto a estimula batendo suavemente nos ombros. Tratando-se de uma criança de uma criança pequena não a deve abanar, estimule-a mexendo nas mão e/ou nos pés ao mesmo tempo que chama em voz alta. Fig. 5.2. Avaliação da resposta.. Se a criança responder, se mexer ou cumprir instruções que lhe são dadas, como abrir os olhos ou apertar a mão, deixá-la na posição em que está, ou na que ela pretender adotar e ir pedir ajuda se necessário, reavaliando-a frequentemente. Se a criança não responder, e se estiver sozinho, peça ajuda gritando em voz alta Preciso de ajuda tenho aqui uma criança desmaiada!. Não abandone a vítima e prossiga a avaliação. Se estiver alguém consigo, informe o reanimador 2 e prossiga a avaliação. A etapa seguinte é a via aérea - A aérea. Também nas crianças inconscientes, o relaxamento do palato mole e da epiglote pode causar obstrução da via Assim é importante proceder à permeabilização da via aérea: Desaperte a roupa da criança e exponha o tórax; Se visualizar corpos estranhos na boca (comida, objetos, secreções) deve removê-los. Não deve perder tempo a inspecionar a cavidade oral; Coloque a palma de uma mão na testa da vítima e os dedos indicador e médio da outra mão no bordo da mandíbula; 4

Permeabilize a via aérea efetuando simultaneamente a extensão da cabeça (inclinação da cabeça para trás) e elevação do maxilar inferior (mento ou queixo). Fig. 5.3. Abertura da via aérea No latente, em decúbito dorsal, a cabeça fica habitualmente fletida em relação ao pescoço. Deve efetuar apenas uma ligeira extensão da cabeça de forma a obter uma posição neutra, isto é, a face do lactente fica paralela ao plano onde se encontra deitado. Deve ter muito cuidado para não pressionar os tecidos moles abaixo do queixo, pois pode causar obstrução da via aérea. Após ter efetuado a permeabilização da via aérea, passe à avaliação da existência de Ventilação (respiração) B. Para verificar se ventila normalmente deve manter a permeabilidade da via aérea, aproximar a sua face da face da criança olhando para o tórax e: VER - se existem movimentos torácicos; OUVIR - se existem ruídos de saída de ar pela boca ou nariz da vítima; SENTIR - na sua face se há saída de ar pela boca ou nariz da vítima; Deverá Ver, Ouvir e Sentir (VOS) até 10 segundos. Se a criança respira normalmente e não há evidência de trauma, coloque-a em posição de recuperação, peça ajuda e reavalie periodicamente se mantém ventilação adequada. Fig. 5.5. Pesquisa de respiração normal (VOS). 5

A posição de recuperação usada nas crianças obedece aos mesmos princípios da PLS do adulto e pode ser usada a mesma técnica. Nos latentes sugere-se a colocação em decúbito lateral, usando uma almofada ou um lençol dobrado, colocado por trás, a nível das costas, para manter a posição estável. Fig. 5.5. Posição de Recuperação / Posição Lateral de Segurança. Se a criança não respira normalmente mantenha a permeabilidade da via aérea e inicie a ventilação com ar expirado, efetuando 5 insuflações. Cada insuflação de ar deve ser feita durante 1-1,5 segundos com um volume de ar apenas suficiente para causar uma expansão torácica visível e após cada insuflação Na criança (do 1º ano de vida até aos sinais de puberdade) utilizar a técnica de ventilação boca-a-boca ou boca máscara, tal como descrito para o adulto. No latente a técnica alternativa é a ventilação boca-a-boca e nariz. Embora as máscaras de bolso com válvula unidirecional sejam de tamanho único é, igualmente, possível efetuar ventilação boca-máscara na criança ou mesmo no lactente. Nestes casos a adaptação da máscara à face da criança é feita em posição invertida, em relação ao anteriormente descrito, isto é, colocando o vértice da máscara virado para o queixo. Fig. 5.6. Insuflação em pediatria. 6

Se tiver dificuldade em conseguir ventilações eficazes pode existir obstrução da via aérea. Se for o caso: Abrir a boca da vítima e procurar objetos visíveis; se existirem remova-os; Reposicione a cabeça de forma a permeabilizar adequadamente a via aérea; Tentar ventilar de novo, fazendo até 5 tentativas; Se apesar de tudo não conseguir, continue avaliação. Fig. 5.7. Pesquisa de corpos estranhos na cavidade oral. A pesquisa de corpos estranhos na cavidade oral através da exploração digital às cegas não deve ser feita. A introdução do dedo (pinça ou sonda de aspiração), apenas deve ser feita para remover um corpo estranho visível, sempre com o máximo cuidado para não empurrar o objeto. Após efetuar as 5 insuflações passe à realização das compressões torácicas (Fig. 5.7). Fig. 5.7. Posição para aplicação das compressões torácicas. As compressões devem ser realizadas de forma a causar uma depressão de aproximadamente um terço da altura do tórax (ou seja, pelo menos 4 cm no lactente e 5 cm na criança), a uma frequência de 100 por minuto (no máximo de 120/min minuto). Entre as compressões é fundamental que permita a completa re-expansão torácica, aliviando totalmente a pressão exercida sobre o tórax, sem, no entanto, retirar as mãos do local das compressões. É diferente a forma de realizar corretamente as compressões torácicas nas crianças e nos lactentes. 7

Técnica para executar compressões torácicas nas crianças: Ajoelhe-se junto da criança; Colocar o bordo de uma mão no 1/3 inferior do esterno; Levantar os dedos de forma a não comprimir as costelas; Mantendo o braço esticado, sem fletir o cotovelo, posicionar-se para que o ombro fique perpendicular ao ponto de apoio da mão; Pressionar o tórax cerca de 1/3 da sua altura (pelo menos 4 cm no lactente e 5 cm na criança); Fig. 5.9. Compressões torácicas na criança. Aliviar a pressão sem retirar a mão do esterno; Repetir o procedimento 30 vezes a uma frequência de pelo menos 100/minuto (no máximo de 120/min); Recomenda-se que comprima com força e rapidez. Permeabilize a via aérea e efetue 2 insuflações; Mantenha compressões e ventilações na relação de 30:2. Não deve ser apenas a idade da criança a determinar a técnica a aplicar. Nas crianças maiores poderá ser necessário usar o mesmo método do adulto (ou seja sobrepor a mão à que se encontra um dedo acima do apêndice xifoide, entrelaçar os dedos e levantá-los de forma a não exercer pressão sobre o hemitórax oposto e mantendo os braços esticados e se fletir os cotovelos, pressionar verticalmente sobre o esterno) sendo nesse caso usada também a mesma relação compressões ventilações 30:2. Técnica para executar compressões torácicas nos lactentes 2 dedos Mantenha a permeabilidade da via aérea, mantendo a cabeça em posição neutra, com uma mão na cabeça do lactente; Coloque a ponta de dois dedos da outra mão sobre o terço inferior do esterno do lactente; Comprima o tórax na vertical de forma a causar uma depressão com cerca de ⅓ da sua altura; 8

Fig. 5.10. Colocação dos dedos para as compressões torácicas. Aliviar a pressão de forma a permitir ao tórax retomar a sua forma e voltar a comprimir de forma a conseguir uma frequência de pelo menos 100/minuto Fazer 30 compressões seguidas de 2 insuflações e assim sucessivamente (30:2) Para evitar perdas de tempo desnecessárias os dedos devem permanecer sobre o tórax, sem exercer pressão enquanto se fazem as insuflações; Fig. 5.11. Insuflações sem perder a referência do ponto das compressões torácicas. Caso estejam presentes dois reanimadores um inicia o SBV enquanto o outro vai pedir ajuda, logo que detetada a PCR. Caso esteja presente apenas um reanimador devem ser mantidas as manobras de SBV durante 1 minuto (3 ciclos 30:2 se for o caso) altura em que, se ainda estiver sozinho, deverá ir pedir ajuda ligando 112. No caso dos lactentes, ou sempre que a criança seja suficientemente pequena para ser transportada ao colo, deve levá-la consigo para manter as manobras de SBV durante esse período de tempo. Após o pedido de ajuda apenas deverá reavaliar o lactente ou a criança se, quando a deixou para pedir ajuda, ela apresentava sinais que entretanto pudessem ter-se deteriorado (como a existência de respiração normal). Caso contrário deve reiniciar de imediato as compressões torácicas. 9

A única exceção a realizar 1 minuto de SBV antes de pedir ajuda é o caso duma criança que colapsa subitamente perante o reanimador, e este se encontra sozinho com a vítima. Neste caso a causa provável da paragem cardíaca é uma arritmia e a criança pode necessitar de desfibrilhação. Após o pedido de ajuda deve regressar para junto da criança e continuar as manobras de SBV de forma ininterrupta, até que: Chegue ajuda diferenciada; A criança recupere sinais de vida: comece a acordar, inicie movimentos, abra os olhos e respire normalmente: Fique exausto e incapaz de continuar o SBV. Nas situações de PCR só deve interromper as manobras de SBV, para reavaliação da criança, caso esta apresente algum sinal de vida: respiração normal, tosse, presença de movimentos ou abertura dos olhos. Nesse caso o reanimador deve confirmar a presença de respiração normal, efetuando o VOS. 10

ALGORITMO DE SUPORTE BÁSICO DE VIDA PEDIÁTRICO GARANTIR CONDIÇÕES DE SEGURANÇA Se RESPONDE Avalie o Estado de Consciência AVALIE Chame ajuda se necessário Estimule Chame em voz alta Está Bem? Se NÃO RESPONDE GRITE POR AJUDA Permeabilize a via aérea - Exponha o tórax - Abertura da via aérea RESPIRA normalmente Pesquise respiração normal (VOS) até 10 segundos P.R./P.L.S. Chame ajuda Reavalie NÃO RESPIRA normalmente 5 Insuflações Inicie: 30 Compressões torácicas 2 Insuflações 3 Ciclos (1 minuto) Continuar até: A vítima recuperar: - Respiração normal; - Movimento; - Abertura dos olhos. Chegada de ajuda; Exaustão. LIGUE 112 11

5. OBSTRUÇÃO DA VIA AÉREA EM PEDIATRIA 5.1. Causas e Reconhecimento Ao contrário do que acontece no adulto, a obstrução da via aérea (OVA) nas crianças é uma situação mais frequente. A maioria das situações de OVA nas crianças ocorre durante a alimentação ou quando as crianças estão a brincar com objetos de pequenas dimensões. Muitas vezes são situações presenciadas pelo que o socorro pode ser iniciado de imediato, ainda com a vítima consciente. Na criança, a obstrução da via aérea por corpo estranho (OVA CE) manifesta-se por dificuldade respiratória de início súbito com tosse e estridor. Estes mesmos sinais também podem surgir na obstrução da via aérea por infeção ou inflamação, como na epiglotite, mas o seu início é habitualmente menos abrupto e acompanhado por febre. Nestas situações não está indicado proceder a manobras de desobstrução da via aérea. Deve-se suspeitar de OVA: Se a alteração do estado da criança for muito súbita; Se não existirem outros sinais de doença; Se existir história de a criança ter comido ou brincado com objetos de pequenas dimensões imediatamente antes do início dos sintomas. 5.2. Classificação A obstrução da via aérea pode ser grave ou ligeira. Se a obstrução é ligeira, provavelmente por ser parcial, a criança tosse, consegue falar ou chorar, faz algum ruído a respirar e pode estar agitada. Neste caso, desde que a criança consiga tossir, não deve interferir, encorajando-a apenas a continuar a tossir. Quando a obstrução é total o quadro é de obstrução grave, a criança não consegue tossir, falar ou chorar e não se ouve qualquer ruído respiratório. Pode inicialmente manter-se reativa ou ficar inconsciente. Na obstrução total da via aérea é necessário atuar rapidamente, caso contrário, em poucos minutos a PCR será inevitável. Sinais de obstrução da via aérea por corpo estranho (OVA CE) ligeira e grave na criança VA CE Grave Tosse ineficaz Incapaz de falar ou vocalizar Tosse silenciosa Respiração ineficaz Cianose Diminuição do estado de consciência Sinais gerais de OVA Episódio testemunhado Tosse / sufocação Início súbito História de refeição recente / pequenos objetos na boca OVA CE Ligeira Tosse eficaz Choro ou resposta verbal Tosse audível Capaz de inspirar antes de tossir Reativo 12

Várias técnicas e várias sequências de atuação têm sido defendidas em relação à desobstrução da via aérea nas crianças, sendo difícil provar o benefício indiscutível de umas sobre as outras. Nos lactentes podem ser utilizadas pancadas inter-escapulares e compressões torácicas. Nas crianças com mais de 1 ano são usadas pancadas inter-escapulares e compressões abdominais. As compressões abdominais estão contra - indicadas nos lactentes com menos de 1 ano pelo perigo de causarem lesões nos órgãos intra-abdominais. O objetivo de qualquer das manobras recomendadas é provocar um aumento súbito da pressão intra - torácica, que funcione como uma tosse artificial e desobstrua a via aérea. 5.3. Sequência de Atuação - OBSTRUÇÃO DA VIA AÉREA - LATENTES CONSCIENTE: 1. Segure o lactente em decúbito ventral, com a cabeça mais baixa que o resto do corpo, suportando a cabeça com uma mão e apoiando o tórax no antebraço e / ou na coxa (neste último caso deverá estar sentado); 2. Aplique pancadas interescapulares (nas costas entre as 2 omoplatas) com o bordo da mão, usando uma força adequada ao tamanho da criança, com o objetivo de remover o corpo estranho. Se necessário aplique até um total de 5 pancadas inter-escapulares; Fig. 5.13. Aplicação das pancadas inter-escapulares no lactente. 3. Se não conseguir deslocar o objeto e remover o corpo estranho com as pancadas inter-escapulares, passe à aplicação de compressões torácicas; 4. Com uma mão segure a cabeça do lactente, na região occipital e rode-o em bloco, para que este fique em decúbito dorsal sobre o outro antebraço. Mantenha a cabeça a um nível inferior ao do resto do corpo; 5. Faça compressões torácicas, tal como explicado na técnica de compressões torácicas com 2 dedos, mas mais lentas (frequência aproximada de 20/min), com o objetivo de deslocar o corpo estranho; 13

Fig. 5.15. Aplicação das compressões torácicas no lactente. 6. Faça até 5 compressões, se necessário, para tentar desobstruir a via aérea; 7. Após as 5 compressões torácicas inspecione a cavidade oral, removendo algum objeto apenas se for visível; 8. Repita sequências de 5 pancadas interescapulares, 5 compressões torácicas até a obstrução ser resolvida ou o lactente ficar inconsciente. 5.5. Sequência de Atuação - OBSTRUÇÃO DA VIA AÉREA - CRIANÇAS CONSCIENTE Se a criança consegue respirar e tossir deve apenas encorajá-la a tossir. Se a tosse for ineficaz ou a criança desenvolver dificuldade respiratória marcada é necessário atuar rapidamente. Grite imediatamente por ajuda e avalie o estado de consciência da criança. Aplique pancadas interescapulares, até um total de 5, se necessário; Se a obstrução persiste efetue compressões abdominais manobra de Heimlich, até 5 tentativas; Fig. 5.15. Pancadas inter-escapulares e compressões abdominais na criança. Verifique se houve saída de corpo estranho; Repita a sequência, anteriormente descrita, até resolução da obstrução ou até a criança ficar inconsciente. 14

No latente e na criança, enquanto não ocorrer a resolução e a vítima se mantiver consciente, a sequência deve ser mantida sem que se abandone a vítima. No entanto deve-se tentar gritar por ajuda, ou enviar alguém para pedir ajuda se ainda não foi feito. Se a obstrução for resolvida, com a expulsão do corpo estranho, deve ser feita uma avaliação do estado da vítima. É possível que parte do corpo estranho que causou a obstrução ainda permaneça no trato respiratório. Se existir qualquer dúvida deve ser procurada ajuda médica. A aplicação das compressões abdominais nas crianças requer que o reanimador se coloque de joelhos atrás da vítima em vez de permanecer de pé. As compressões abdominais poderão eventualmente causar lesões internas pelo que, quando tiverem sido efetuadas, a criança assim tratada deve ser examinada por um médico. 5.5. Sequência de Atuação - OBSTRUÇÃO DA VIA AÉREA LATENTE ou na CRIANÇA INCONSCIENTE Após confirmar que a criança está inconsciente e ainda estiver sozinho, deve ativar o sistema de emergência médica ligando 112, ou, se possível, envie alguém para pedir ajuda; Não abandone a vítima neste momento; Coloque o latente ou a criança sobre uma superfície plana e dura; Verifique a existência de algum corpo estranho na boca e se for visível remova-o; Não tente efetuar a manobra digital para retirar o corpo estranho, se este não estiver visível, nem repita este procedimento continuamente; Tente efetuar 5 insuflações, verificando a eficácia de cada insuflação: se a insuflação não promove a expansão torácica, reposicione a cabeça antes de nova tentativa; Inicie SBV; Pesquise a cavidade oral antes de tentar efetuar as insuflações; Se for observado um corpo estranho, deve tentar removê-lo através da manobra digital (também pode ser usada uma pinça ou um aspirador de secreções). No lactente ou na criança, sempre que parecer que a obstrução foi resolvida, deve ser permeabilizada a via aérea, como anteriormente referido, e reavaliada a respiração (VOS). Se continuar sem respirar normalmente fazer novamente 5 insuflações e reiniciar o algoritmo de SBV. Se a criança recuperar consciência e a sua respiração se tornar eficaz, deverá ser colocada na posição de recuperação, vigiando e reavaliando continuamente o nível de consciência e a respiração até à chegada da ajuda diferenciada. 15

Algoritmo de Desobstrução da Via Aérea por Corpo Estranho na Criança GARANTIR AS CONDIÇÕES DE SEGURANÇA Avalie o Estado de Consciência Consciente? Sinais de Obstrução da Via Aérea? Obstrução LIGEIRA Avaliar a GRAVIDADE Obstrução GRAVE Tosse eficaz Tosse ineficaz ENCORAJAR A TOSSE Consciente Inconsciente Vigiar agravamento Tosse ineficaz Resolução da obstrução - 5 Pancadas inter-escapulares - 5 Compressões - Torácicas no latente - Abdominais na criança Ligar 112 Permeabilizar a VA 5 Insuflações Iniciar SBV Pesquise a cavidade oral antes de insuflar 16

RESUMO Há diferenças na reanimação de acordo com a idade/tamanho da criança; O SBV deve ser de qualidade e ininterrupto; As compressões torácicas devem ser de elevada qualidade, devem deprimir o esterno pelo menos 1/3 do diâmetro do tórax, ao ritmo de pelo menos 100 compressões minuto e permitir uma boa re-expansão torácica; A OVA pode evoluir rapidamente para PCR, pelo que é importante reconhecer e tratar precocemente. 17