PARECER AJL/CMT Nº 012/2014. Teresina (PI), 10 de fevereiro de 2014. Assunto: Projeto de Lei Ordinária n 015/2014 Autor: Ver. Edilberto Borges - Dudu Ementa: Torna obrigatória a Inscrição do Grupo Sanguíneo e do Fator RH nas Fichas Escolares dos Alunos da Rede Pública de Ensino no Município de Teresina. Conclusão: parecer contrário à tramitação, discussão e votação do presente projeto de lei I RELATÓRIO / HISTÓRICO: De autoria do ilustre Vereador Edilberto Borges - Dudu, o presente projeto de lei possui a seguinte ementa: Torna obrigatória a Inscrição do Grupo Sanguíneo e do Fator RH nas Fichas Escolares dos Alunos da Rede Pública de Ensino no Município de Teresina. Em justificativa escrita, o digníssimo autor afirmou que a aludida proposição legislativa possui o intuito proteger a saúde dos alunos que estudam nas redes públicas e particulares de ensino do estado, por meio do registro do grupo sanguíneo e do fator RH em suas fichas de matrícula. É, em síntese, o relatório. Seguindo nova sistemática do processo legislativo e por orientação e provocação do Departamento Legislativo, esta Assessoria Jurídica Legislativa foi instada a emitir parecer jurídico. II DA NOVA SISTEMÁTICA NO PROCESSO LEGISLATIVO DA CÂMARA MUNICIPAL DE TERESINA E A POSSIBILIDADE DE MANIFESTAÇÃO DA ASSESSORIA JURÍDICA LEGISLATIVA: Ab initio, impende salientar que a emissão de parecer por esta Assessoria Jurídica Legislativa não substitui o parecer das Comissões especializadas, porquanto essas são compostas pelos representantes eleitos e constituem-se em manifestação efetivamente legítima do Parlamento. Dessa forma, a opinião jurídica exarada neste parecer não tem força vinculante, podendo seus fundamentos serem utilizados ou não pelos membros desta Casa.
De qualquer sorte, torna-se de suma importância algumas considerações sobre a possibilidade e compatibilidade da nova sistemática adotada para o processo legislativo no âmbito desta Casa de Leis de Teresina. A Resolução Normativa n 036/2011, que dispõe sobre as atribuições dos Assessores Jurídicos Legislativos, estabelece em seu art. 9º, 1º, inciso I: Art. 9 Ficam criados 05 (cinco) cargos de Assessor Jurídico Legislativo, privativos de bacharéis em Direito, dentro do Quadro Efetivo de Pessoal da Câmara Municipal de Teresina, a serem providos na forma do que dispõe o art. 37, I e II, da Constituição Federal e 75, I e II, da Lei Orgânica do Município de Teresina. 1 São atribuições dos Assessores Jurídicos Legislativos: I emitir pareceres, por escrito, das proposições que tramitam no Departamento Legislativo, quando lhes forem solicitados, bem como, prestar assessoria e consultoria à Presidência, Mesa Diretora e as Comissões Permanentes e Especiais; (...) (grifo nosso) Assim sendo, a referida Resolução estabelece expressamente a possibilidade de emissão de parecer escrito sobre as proposições legislativas, exatamente o caso ora tratado. A sistemática, ressalte-se, não é exclusividade de Teresina, sendo adotada por diversas outras Câmaras Municipais brasileiras. Ainda assim, a opinião técnica desta Assessoria Jurídica é estritamente jurídica e opinativa não podendo substituir a manifestação das Comissões Legislativas especializadas, pois a vontade do Parlamento deve ser cristalizada através da vontade do povo, aqui efetivada por meio de seus representantes eleitos. E sãos esses mesmos representantes que melhor podem analisar todas as circunstâncias e nuances (questões sociais e políticas) de cada proposição. Por essa razão, em síntese, a manifestação deste órgão de assessoramento jurídico, autorizada por norma deste Parlamento Municipal, serve apenas como norte, em caso de concordância, para o voto dos edis mafrenses, não havendo substituição e obrigatoriedade em sua aceitação e, portanto, não atentando contra a soberania popular representada pela manifestação dos Vereadores. III ADMISSIBILIDADE: Inicialmente, observa-se que o projeto está redigido em termos claros, objetivos e concisos, em língua nacional e ortografia oficial, devidamente subscrito por seu autor, além
de trazer o assunto sucintamente registrado em ementa, tudo na conformidade do disposto nos arts. 99 e 100, ambos do Regimento Interno da Câmara Municipal de Teresina - RICMT. Observa-se, ainda, que o autor articulou justificativa escrita, atendendo ao disposto no art. 101 da mesma norma regimental. A distribuição do texto também está dentro dos padrões exigidos pela técnica legislativa, não merecendo qualquer reparo. Destarte, nenhum óbice de ordem técnico-formal existe, daí porque merecer a matéria toda consideração da edilidade no tocante a tais aspectos. IV ANÁLISE SOB O PRISMA LEGAL E CONSTITUCIONAL: De relevo absolutamente indiscutível é a matéria proposta no projeto em testilha, uma vez que, ao tornar obrigatória a inscrição do grupo sanguíneo e do fator RH nas fichas escolares dos alunos da rede pública de ensino do Município de Teresina, objetiva proteger a saúde desses alunos em caso de eventuais acidentes. Entretanto, insta ressaltar que a proposição legislativa em análise, ao instituir a referida obrigatoriedade, dispõe sobre a organização administrativa e atribuições dos órgãos da administração pública municipal, matéria cuja iniciativa é exclusiva do Chefe do Poder Executivo Municipal, incorrendo, por esse motivo, em inconstitucionalidade formal subjetiva. Nesse sentido, tem-se o disposto no art. 51, inciso IV e no art. 71, inciso V, da Lei Orgânica do Município de Teresina - LOM, abaixo transcritos: Art. 51. São de iniciativa exclusiva do Prefeito as leis que disponham sobre: (...) IV criação, estruturação e atribuições dos órgãos da administração direta ou indireta; (grifo nosso) Art. 71. Compete privativamente ao Prefeito: (...) V dispor sobre a organização e o funcionamento da administração municipal, na forma da lei; (grifo nosso)
No mesmo sentido, tem-se o art. 102, inciso VI, da Constituição do Estado do Piauí, o qual estabelece ser competência privativa do Chefe do Poder Executivo Estadual a disposição sobre a organização, o funcionamento, a reforma e a modernização da administração estadual, na forma da lei. Trata-se, assim, de uma ingerência na competência exclusiva do Poder Executivo, a qual representa afronta ao princípio da separação dos poderes, insculpido no art. 2º, da Constituição da República Federativa do Brasil - CRFB/88. Sobre o tema, Hely Lopes Meirelles (em Direito Municipal Brasileiro, 7ª ed., p. 443) esclarece de forma bem objetiva que: Leis de iniciativa da Câmara ou, mais propriamente, de seus vereadores, são todas as que a lei orgânica municipal não reserva, expressa ou privativamente à iniciativa do prefeito. As leis orgânicas municipais devem reproduzir, entre as matérias previstas nos artigos 61, 1º, e 165 da Constituição Federal, as que se inserem no âmbito da competência municipal. São, pois, da iniciativa do prefeito como Chefe do Executivo local, os projetos de lei que disponham sobre a criação, estruturação e atribuição das secretarias, órgãos e entes da Administração Pública Municipal; criação de cargos, funções ou empregos públicos na Administração direta, autárquica e fundacional do Município; o regime jurídico único e previdenciário dos servidores municipais, fixação e aumento de sua remuneração; o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias, o orçamento anual e os créditos suplementares e especiais. Os demais projetos competem concorrentemente ao prefeito e à Câmara, na forma regimental. (grifo nosso) No mesmo sentido, tem-se o entendimento esposado pelos tribunais brasileiros, dentre eles o Supremo Tribunal Federal - STF, in verbis: LEI MUNICIPAL. CRIAÇÃO DE OBRIGAÇÕES E DESPESAS PARA ÓRGÃOS DO PODER EXECUTIVO. COMPETÊNCIA DE INICIATIVA PRIVATIVA DO CHEFE DO EXECUTIVO. VÍCIO DE INICIATIVA. Dentre os princípios constitucionais limitadores da autonomia organizatória dos Municípios está o que estabelece a competência de iniciativa privativa do Poder Executivo, cuja violação importa em atentado contra outro princípio ainda mais forte, o da separação dos poderes. A Lei Municipal nº 4667/2007, que dispõe sobre a obrigatoriedade do registro do grupo sanguíneo e do fator RH nas cadernetas escolares e nas fichas cadastrais dos alunos da rede pública e privada do ensino do Município do Rio de Janeiro, subtraiu do Chefe do Poder Executivo a iniciativa da matéria de sua competência privativa na direção de sua Administração. Manifesto o vício da inconstitucionalidade formal, afrontando-se os arts. 7º e 112, 1º, II, d da Constituição Estadual. Procedência da Representação.(Órgão Especial. Representação por Inconstitucionalidade
nº 102/08 0047584-83.2008.8.19.0000. Relator: Des. Sérgio Cavalieri Filho) AÇÃO DIRETA ESTADUAL -LEI MUNICIPAL -INICIATIVA PARLAMENTAR -SEPARAÇÃO DE PODERES -INTERFÊRENCIA NO FUNCIONAMENTO DE ÓRGÃOS DO PODER EXECUTIVO- INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. 1. O Tribunal de origem, em ação direta, declarou a inconstitucionalidade formal da Lei nº 1.296/2009 do Município de Rio Pomba, ante fundamentos assim resumidos (folha 121): Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Municipal. Iniciativa do Poder Legislativo. Interferência na organização administrativa e criação de despesas. Município. Impossibilidade. Vício. É inconstitucional a Lei Municipal, de iniciativa do Poder Legislativo, que dispõe sobre criação, estruturação e definição das atribuições dos órgãos da Administração Pública. Representação julgada procedente. 2. Na interposição deste agravo foram observados os pressupostos de recorribilidade. A peça, subscrita por procuradora de justiça, foi protocolada no prazo assinado em lei. O Supremo já proclamou ser obrigatório aos entes federativos observar o modelo de separação de Poderes adotado pela Constituição Federal de 1988, o que inclui as regras específicas de processo legislativo. Precedentes: Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 243/RJ, de minha relatoria, e Ação Originária nº 284/SC, relator Ministro Ilmar Galvão. O acórdão impugnado na origem está em harmonia com esse entendimento, no que restringe a iniciativa de projetos de lei sobre a organização e funcionamento dos órgãos da administração direta e autárquica ao Chefe do Poder Executivo. A finalidade de revestir de maior efetividade determinado direito individual ou social não convalida o vício formal verificado na iniciativa parlamentar. 3. Ante o quadro, conheço do agravo e o desprovejo. 4. Publiquem. Brasília, 25 de junho de 2012. (Supremo Tribunal Federal; Processo: are 683581 MG; Relator(a): Min. Marco Aurélio; julgamento: 25/06/2012; publicação: dje-156 divulg 08/08/2012 public 09/08/2012) AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 3.964/2010 DO MUNICÍPIO DE PINHEIRO MACHADO. PRÉ-AGENDAMENTO DE CONSULTAS EM QUALQUER UNIDADE DE ESTRATÉGIA DA SAÚDE DA FAMÍLIA -ESF. NECESSIDADE DE CONTRATAÇÃO DE PESSOAL. AUMENTO DE DESPESA. VÍCIO FORMAL. PROJETO DE LEI DE INICIATIVA DO PODER EXECUTIVO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SIMETRIA. Tanto na esfera da União (artigo 84, inciso VI, letra a, da Constituição Federal) quanto no âmbito estadual (art. 82, inc. VII, da CE) é conferida ao Chefe do Poder Executivo exclusividade de iniciativa para projetos de lei que disponham sobre estruturação, funcionamento e organização das Secretarias e órgãos da administração. Assim, pelo Princípio da Simetria, forçoso reconhecer vício de iniciativa na elaboração da Lei Municipal nº 3.964, de 10 de dezembro de 2010, de
Pinheiro Machado, pois ao autorizar o pré-agendamento de consultas em qualquer unidade de Estratégia da Saúde da Família ESF, cria obrigações diretas para a Secretaria Municipal de Saúde, inclusive com a necessidade de contratação de pessoal para o atendimento da nova demanda. (Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 70040438335 Tribunal de Justiça DO Rio Grande do Sul - TJ/RS) AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI MUNICIPAL N 6.641, DE 31 DE JULHO DE 2006, QUE DISPÕE SOBRE A OBRIGATORIEDADE DE FIXAÇÃO DE QUADRO INFORMATIVO COM NOME, REGISTRO E ESPECIALIDADE DE PROFISSIONAL MÉDICO DE PLANTÃO NOS PRONTO-SOCORROS E UNIDADES BÁSICAS DE SAÚDE - Ato típico de administração, cujo exercício e controle cabe ao Chefe do Poder Executivo - Ofensa ao princípio da separação dos poderes - Criação de despesas não previstas no orçamento - Afronta aos artigos 5º, 25 e 144, ambos da Constituição Estadual - Ação procedente. (ADI 149.363-0/3-00, rel. des. Debatin Cardoso, j. 03.10.2007 Tribunal de Justiça de São Paulo TJ/SP). Nesse sentido, conclui-se pela inconstitucionalidade formal subjetiva da proposição legislativa em comento, uma vez ser da competência exclusiva do Poder Executivo Municipal a iniciativa de projeto de lei concernente à matéria ora tratada. Entretanto, tendo em vista a relevância social do projeto em análise, que objetiva proteger a saúde dos alunos das escolas da rede pública e particular municipal em caso de ocorrência de acidentes, sugere-se que esse seja transformado em indicativo de lei. A indicação, nos termos do art. 110, do Regimento Interno da Câmara Municipal de Teresina - RICMT, consiste em uma proposição escrita através da qual o Vereador sugere medidas de interesse público aos Poderes competentes. Nesse sentido, segue a redação do mencionado dispositivo, in verbis: Art. 110. Indicação é a proposição escrita pela qual o Vereador sugere medidas de interesse público aos Poderes competentes. (grifo nosso) V- CONCLUSÃO: Por essas razões, esta Assessoria Jurídica Legislativa opina pela IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA da tramitação, discussão e votação do projeto de lei ordinária ora tratado, sugerindo sua transformação em indicativo, nos termos do art. 110, do RICMT.
Legislativa. ESTADO DO PIAUÍ É o parecer, salvo melhor e soberano juízo das Comissões e Plenário desta Casa CRISTIANNE DOS SANTOS MENDES ASSESSORA JURÍDICA LEGISLATIVA MATRÍCULA 06855-1 CMT