Fernanda Simoneti 1, Larissa Olm Cunha 1, Cassiano Tamura Vieira Gomes 1, Neil Ferreira Novo 1, Décio Luis Portella 1, Hamilton Aleardo Gonella 1

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Transcrição:

DOI: 10.5327/Z1984-4840201624713 Artigo Original / Original Article Perfil epidemiológico de pacientes com tumores cutâneos malignos atendidos em ambulatório de cirurgia plástica de serviço secundário no interior de São Paulo Epidemiological profile of patients with malignant skin tumors at the plastic surgery secondary service in the countryside of São Paulo, Brazil Fernanda Simoneti 1, Larissa Olm Cunha 1, Cassiano Tamura Vieira Gomes 1, Neil Ferreira Novo 1, Décio Luis Portella 1, Hamilton Aleardo Gonella 1 RESUMO Introdução: O tumor de pele não melanoma é o de maior prevalência e incidência no Brasil, englobando o carcinoma espinocelular (CEC) e o basocelular (CBC). O principal fator de risco para o desenvolvimento desses tumores é a exposição crônica aos raios solares, justificando a faixa etária e as localizações anatômicas mais acometidas. O tratamento objetiva extirpar a lesão com deformidade mínima. A excisão cirúrgica com margens seguras é a principal opção terapêutica; outras dependem do número de lesões, localização, tipo histológico, estado geral e comorbidades clínicas. Objetivos: Descrever o perfil epidemiológico dos pacientes com tumores cutâneos malignos; identificar a prevalência dos não melanoma; e avaliar a margem cirúrgica. Métodos: Estudo observacional, longitudinal e retrospectivo de pacientes submetidos à ressecção de lesões suspeitas em serviço secundário. Resultados: Foram identificadas 140 lesões em 67 pacientes, sendo 59% do sexo masculino e 71,6% maiores de 60 anos. O segmento mais acometido foi cabeça/pescoço (72,1%); 69,1% eram CBC, 29,2% CEC e 1,6% melanoma; 80,4% informavam margens livres, 7,3% indicavam comprometimento; esses pacientes apresentavam média de 75,2 anos e 8,7 lesões concomitantes. A associação foi significante entre gênero feminino e presença de lesões <5 mm. Conclusões: O predomínio de lesões em indivíduos do sexo masculino acima de 60 anos é compatível com o padrão já descrito na literatura. As margens livres, obtidas em grande parte do presente estudo, indicam eficácia terapêutica da excisão cirúrgica simples. As margens macroscópicas adotadas na marcação préoperatória favorecem a eficácia, reservando a cirurgia de Möhs para recidivas ou comprometimento de margem. Palavras-chave: neoplasias cutâneas; procedimentos cirúrgicos operatórios; carcinoma de células escamosas; carcinoma basocelular. ABSTRACT Introduction: Non-melanoma skin tumor is the one with highest prevalence and incidence in Brazil, comprising squamous cell carcinoma (SCC) and basal cell carcinoma (CBC). The main risk factor for the development of these tumors is chronic exposure to sunlight, justifying the most affected age group and anatomical locations. Treatment aims to excise the lesion with minimal deformity. Surgical excision with safe margins is the main therapeutic option; others depend on the number of lesions, location, histological type, general health and medical comorbidity. Objectives: To describe the epidemiological profile of patients with skin tumors; to identify the prevalence of non-melanoma; and to evaluate surgical margin. Methods: Observational, longitudinal and retrospective study of patients undergoing resection of suspicious lesions in secondary service. Results: We identified 140 lesions in 67 patients, 59% were male and 71.6% over 60 years of age. The most affected regions were head and neck (72.1%); 69.1% were CBC, 29.2% CBC, and 1.6% melanoma; 80.4% informed free margins, 7.3% indicated affected margins; the mean age of these patients was 75.2 years and the mean number of concomitant injuries was 8.7. The association was significant between female gender and presence of lesions <5 mm. Conclusions: The prevalence of lesions in elderly men (over 60 years) is in accordance with the pattern described in literature. Free margins, which were obtained in most of the cases in this study, indicate therapeutic efficacy of the simple surgical excision. Marcroscopic margins adopted in the preoperative marking favor effectiveness, reserving Möhs surgery for recurrence or margin involvement. Keywords: skin neoplasms; surgical procedures, operative; carcinoma, squamous cell; carcinoma, basal cell. 1 Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde Sorocaba (SP), Brasil. Contato: nandasimoneti@hotmail.com Recebido em 05/09/2015. Aceito para publicação em 29/02/2016. 98

INTRODUÇÃO Os tumores de pele acometem uma parcela relevante da população e correspondem ao câncer de maior prevalência no Brasil.¹ A estimativa do Instituto Nacional do Câncer (INCA) de neoplasias malignas de pele não melanoma para os anos de 2012 e 2013, no estado de São Paulo, era de 82,22 e 66,84 casos a cada 100 mil habitantes para o sexo feminino e masculino, respectivamente. Para o ano de 2014 estima-se que 182.130 indivíduos foram acometidos por tumores não melanoma,¹ demonstrando aumento nas estimativas de casos no país, em comparação aos anos anteriores. Esses dados apontam para a necessidade de abordagem mais ampla desse grave problema de saúde pública. Os tumores cutâneos podem ser classificados em benignos, pré-neoplásicos e malignos, esses se subdividindo em tipo melanoma e não melanoma. O não melanoma é o de maior prevalência e incidência na população brasileira em ambos os sexos e é composto principalmente pelo carcinoma espinocelular ou epidermoide (CEC) e o basocelular (CBC). Embora apresentem baixos índices de mortalidade, esses tumores geram grande morbidade, em decorrência da destruição tecidual adjacente com prejuízo estético e/ou funcional ao paciente.² Os fatores de risco conhecidos para o desenvolvimento de CBC e CEC envolvem tanto fatores genéticos quanto ambientais. Raça, idade e gênero são aspectos relevantes na avaliação e classificação desses pacientes. 3,4 O principal fator de risco ambiental é a exposição crônica aos raios solares sem o uso de proteção, justificando a faixa etária e as localizações anatômicas mais acometidas. São mais prevalentes em idosos, visto que esses foram sujeitos à exposição solar por maior intervalo de tempo. Quanto à localização anatômica, costumam aparecer nas zonas mais expostas do corpo, como face, orelhas, couro cabeludo, pescoço, ombros e dorso. 2,3 Outros fatores de risco para tumores não melanoma são a exposição a agentes químicos, radiações, presença de papiloma vírus humano e imunossupressão. 2 O tratamento tem como objetivo a extirpação da lesão com o mínimo de deformidade possível, 5 fator esse de grande impacto na qualidade de vida dos pacientes com neoplasias cutâneas. 6 A excisão cirúrgica é a principal estratégia terapêutica, desde que as margens de segurança sejam respeitadas. Outras opções dependem de fatores relevantes como número de lesões, dimensões do tumor, localização anatômica, tipo histológico, estado geral e comorbidades do paciente, além da própria experiência do médico. 2,4,5 Alternativas no tratamento dos tumores cutâneos são a eletrocauterização, crioterapia, terapia fotodinâmica, laser, ablação química, radioterapia e cirurgia microscópica ou de Möhs. 2,6 A excisão cirúrgica consiste em ressecção tumoral com margens de segurança que medem de 3 a 10 mm da borda do tumor dependendo da localização. 6 No município em que se deu o presente estudo, os pacientes são direcionados da Unidade Básica de Saúde para avaliação clínica da lesão suspeita e possível procedimento em serviço municipal a nível secundário. Trata-se de um polo de atendimento municipal de saúde 7 e centro de referência para cerca de 658 mil habitantes, sendo responsável por cerca de 25,7 mil atendimentos por mês, com base nos dados de 2010. 8 A adequada identificação dos tumores de pele mais prevalentes auxilia a adoção de políticas públicas envolvidas na prevenção, diagnóstico e tratamento precoce, bem como possibilita uma melhor provisão de recursos necessários para uma assistência adequada. OBJETIVOS 1. Descrever o perfil epidemiológico dos pacientes com tumores cutâneos malignos não melanoma atendidos em ambulatório municipal de cirurgia plástica no interior de São Paulo. 2. Identificar a prevalência dos diferentes tumores malignos de pele não melanoma em pacientes atendidos nesse serviço. 3. Avaliar a margem cirúrgica das lesões cutâneas, conforme laudo do exame anatomopatológico. MATERIAIS E MÉTODOS Trata-se de estudo observacional, longitudinal, retrospectivo e de abordagem quantitativa, aprovado pelo Comitê de Ética local, sob número 608.556. Foram analisados prontuários de pacientes atendidos no município de Sorocaba, São Paulo, que foram submetidos à ressecção cirúrgica de lesões suspeitas pelo mesmo cirurgião plástico, no período de 01 de janeiro a 31 de dezembro de 2012, com resultado do laudo de estudo anatomopatológico. As lesões foram marcadas macroscopicamente pelo cirurgião com régua simples, no pré-operatório, da seguinte forma: lesões com até 10 mm, 1 cm de margem de segurança (MS); 10 a 20 mm, 2 cm de MS; >20 mm, 2 cm de MS. As variáveis analisadas foram idade e gênero dos pacientes, características tumorais como sítio anatômico acometido, diagnóstico anatomopatológico, dimensões da peça cirúrgica e lesão, margens livres ou comprometidas, além de número de lesões concomitantes. A localização anatômica foi dividida, a critério dos pesquisadores, em quatro grandes regiões: cabeça e pescoço; tronco e dorso; membros superiores e inferiores; e não especificadas (informação não constava em prontuário). A região da cabeça e pescoço, por reunir a maior parte das lesões, foi subdividida para melhor detalhamento dos achados. Os resultados foram interpretados com auxílio da estatística pela técnica ANOVA, teste do qui-quadrado de Pearson com nível de significância adotado de 5% (p<0,05). RESULTADOS Foram identificadas 140 lesões dentre os 67 pacientes, sendo 59% do sexo masculino. Em relação à distribuição etária, os indivíduos mais acometidos foram com idade igual ou superior a 60 anos, correspondendo a 71,6% do grupo (Tabela 1). 99 Rev Fac Ciênc Méd Sorocaba. 2016;18(2):98-102.

A maioria dos pacientes (64,2%) apresentou somente uma lesão, enquanto 35,8% apresentaram concomitância de duas lesões ou mais (Tabela 2). Houve ainda importante predomínio de lesões em regiões específicas como cabeça e pescoço (Tabela 3). Em ordem decrescente de número de lesões por região cabeça e pescoço, foi observada a seguinte distribuição: nariz (31), lábios (13), orelhas/região periauricular (11), região malar (8), fronte (7), pálpebras/supercílios (6), mandíbula (6), região temporal (5), região periorbitária (6), mento (4), pescoço (3) e couro cabeludo (1). Dentre as lesões com diagnóstico histopatológico de malignidade (n=123), 114 (92,7%) informavam margens livres, sendo que 99 informavam margens livres (80,4%), 15 Tabela 1. Distribuição dos pacientes por grupo etário. Anos Nº de pacientes % 20 a 29 1 1,5 30 a 39 2 3,0 40 a 49 5 7,5 50 a 59 11 16,4 60 a 69 20 29,8 70 a 79 17 25,4 80 ou + 11 16,4 Total 67 100,0 Tabela 2. Distribuição dos pacientes segundo o número de lesões encontradas. Nº de lesões Nº de pacientes % 1 43 64,2 2 10 14,9 3 3 4,5 4 5 7,4 5 1 1,5 7 4 6,0 16 1 1,5 Total 67 100,0 Tabela 3. Distribuição dos pacientes segundo a localização das lesões. Local Nº de lesões % Cabeça e pescoço 101 72,1 Tronco e dorso 12 8,5 Membros superiores e inferiores 16 11,3 Não especificado 11 7,8 Total 140 100 não informavam comprometimento (12,1%), enquanto apenas 9 (7,3%) indicavam comprometimento, resultando em 85 tumores com diagnóstico de CBC e 36 como CEC (Tabela 4). Somente duas lesões foram classificadas como tipo melanoma, ambas com margens livres. Dentre os pacientes com margens comprometidas, 7 eram do sexo masculino e 2 do feminino, apresentavam idade média de 75,2 anos e lesões concomitantes (média de 8,7 lesões/paciente). Os CBC foram ainda caracterizados por laudo histológico em: ulcerado (31), pigmentado (9), adenoide (3), esclerodermiforme (6), nodular (16), superficial (8), multicêntrico (5) e sólido (24). Dentre as lesões malignas, apenas 114 continham todas as informações dimensionais no laudo anatomopatológico, e considerando a maior medida fornecida no laudo anatomopatológico, distribuíram-se conforme o gênero como mostra a Tabela 5. A análise mostrou associação significante (p<0,05) entre o gênero feminino e a presença de lesões <5 mm. Todas as lesões com diâmetro inferior a 5 mm foram identificadas em mulheres, com grande parte das lesões (79,5%) inferior a 15 mm nesse grupo. DISCUSSÃO Em relação ao gênero e à faixa etária mais envolvida, os resultados se mostraram compatíveis com a literatura, com predomínio em homens 9 e idade igual ou superior a 60 anos. O sexo masculino é atribuído como fator de risco para o desenvolvimento de neoplasias cutâneas não melanoma em alguns estudos. 6,10 O sexo feminino correspondeu à parcela mais afetada por lesões em regiões com maior chance de falha terapêutica, metástase e recidivas, 11 como a nasal, periorbitária e malar. Tabela 4. Distribuição dos tumores segundo o comprometimento das margens. Média Diagnóstico Comprometidas Livres livres (em mm) Carcinoma basocelular 7 78 13,7 Carcinoma espinocelular 2 34 13,7 Tabela 5. Diâmetro das lesões por gênero dos pacientes. Diâmetro Feminino Masculino n % n % <5 mm 8 20,6 5 9 mm 10 25,6 19 25,3 10 14 mm 13 33,3 26 34,7 15 19 mm 4 10,3 18 24,0 20 e + 4 10,3 12 16,0 Total 39 100,0 75 100,0 100

A distribuição etária justifica-se pelo aumento da expectativa de vida da população, 3 aliado ao maior acesso à informação e aos serviços de saúde capazes de diagnosticar e tratar essas lesões. Alguns estudos demonstraram relação direta e proporcional entre a faixa etária, a partir dos 60 anos, e o aumento da incidência de tumores cutâneos. Os resultados que demonstram a identificação de mais de uma neoplasia cutânea no mesmo paciente são atribuídos ao maior risco desses tumores no desenvolvimento de novas lesões no indivíduo. Quanto ao sítio anatômico acometido, outros estudos corroboram os achados de predominância dos carcinomas cutâneos no segmento cefálico, com valores semelhantes aos descritos nas publicações, variando entre 52,1 e 86,0%. 11,12 De acordo com a região anatômica facial, existe variação quanto ao risco de metástases, comprometimento de bordas, agressividade do tumor e, portanto, maior chance de insucesso do tratamento cirúrgico. 11,13 Isso se deve, entre outras causas, pela tendência de se realizar margens de ressecção mais conservadoras em áreas nobres do corpo, como a face. 11 A análise dos dados demonstrou grande número (87,8%) de casos com diagnóstico neoplásico confirmado. Dados da Sociedade Brasileira de Dermatologia demonstram distribuição de 2.578 casos anuais de câncer de pele no município estudado, sendo que cerca de 2/3 correspondem ao tipo não melanoma, confirmando a importância do serviço à população. O diagnóstico anatomopatológico das lesões confirmou a alta prevalência de CBC e CEC em relação a outros tipos de neoplasias cutâneas, dado que corrobora os achados de estudos semelhantes no Brasil e no mundo. 1-3, 7,11,12 A explicação para a distribuição de tumores cutâneos malignos, como o CBC e o CEC, é multifatorial. As características histológicas intrínsecas, somadas a fatores de risco, como a exposição crônica à radiação ultravioleta, implicam em maior susceptibilidade ao desenvolvimento de lesões neoplásicas. O CBC, usualmente, aparece como lesão única, embora tenha sido descrita a ocorrência de lesões simultâneas ou subsequentes. 12 Ocorre, predominantemente, em áreas expostas ao sol, principalmente na região da cabeça e do pescoço (80% dos casos), seguida do tronco (15%), mãos e pernas. Desde os primeiros estudos da histogênese aos dias atuais, tem-se procurado associar sua origem a partir das células basais da epiderme e dos anexos cutâneos. É um tumor de baixo grau de malignidade, com capacidade de invasão local, destruição tecidual, recidivante e com limitado poder de metastatização. 12 O CEC, por outro lado, é responsável por aproximadamente 25% dos tumores cutâneos malignos não melanoma³ e detém um poder metastático maior, podendo acometer, conforme o tempo de evolução, linfonodos regionais e até mesmo produzir metástases à distância envolvendo ossos, cérebro e pulmões. 2,4 Os fatores de risco conhecidos para o desenvolvimento de CBC e CEC envolvem dados como raça, idade, gênero e fototipo, relevantes na classificação e estratificação desses pacientes. 4 No presente trabalho, não foi possível a coleta de informações como fototipo e raça, visto que não constavam nos prontuários. A associação significante entre o gênero feminino e a presença de lesões <5 mm pode ser justificada pelo fator cultural inerente a ambos os gêneros, com a maior percepção da importância do autocuidado pelas mulheres, diante da negligência masculina na busca do atendimento médico, que pode ser atribuída a diversos elementos psicossociais. 14 Além disso, a menor propensão à mudança comportamental e à adoção de medidas preventivas justificaria os maiores danos solares identificados entre os homens. 10 Assim, o diagnóstico precoce aponta para tamanhos menores de lesão configurando melhor prognóstico, como os encontrados no presente estudo. A importância do tamanho da lesão e do comprometimento das margens cirúrgicas é importante no prognóstico e na avaliação da terapêutica a ser adotada. Trata-se de grande discussão no meio acadêmico e o comprometimento de margens cirúrgicas após um tratamento inicial inadequado ressecção insuficiente pode resultar em recorrências e sequelas importantes. 11,13 CONCLUSÃO O presente estudo apontou predomínio de lesões cutâneas em indivíduos do sexo masculino e naqueles com idade superior a 60 anos, correspondendo ao perfil epidemiológico descrito em diversos estudos. As principais neoplasias malignas encontradas foram o CBC e o CEC, com margens cirúrgicas livres confirmadas por laudo anatomopatológico em 92,3% dos casos, demonstrando eficácia terapêutica com a excisão cirúrgica simples, resultado que poderá ser comparado à cirurgia de Möhs em futuras pesquisas. Sendo assim, pode-se inferir que a excisão simples é capaz de produzir bons resultados e segurança das margens cirúrgicas, o que possibilita reservar a cirurgia micrográfica de Möhs para casos de recidiva ou comprometimento de margem. REFERÊNCIAS 1. Brasil. Ministério da Saúde. 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