O ensino formal e informal de piano visando uma formação mais ampla para o aluno do instrumento Simone de Miranda pianistasimonemiranda@hotmail.com Maria Helena Jayme Borges mhelenajb@terra.com.br Resumo: Este artigo mostra um relato de experiência no ensino individual de piano em escolas particulares de música e em um projeto na cidade de Cuiabá MT. Tendo em vista a integração dos conhecimentos adquiridos durante o Curso de Licenciatura em Música na UFMT faço uma proposta da junção dos conhecimentos adquiridos no ensino formal e informal de piano propiciando aos alunos uma formação ampla. Durante esta prática notei maior interesse dos estudantes pelo instrumento e pela música de maneira geral, assim como mais segurança nas atividades de performer. Espera-se que os demais professores de instrumento possam usar tal sugestão no ensino da música para seus alunos. Palavras-chave: Aulas de piano; ensino formal e informal; educação musical. INTRODUÇÃO A minha performance como pianista na faculdade envolveu uma prática principalmente com cantores solistas e corais. Foi nestas atuações que notei minhas dificuldades em desenvolver algumas habilidades que não haviam sido desenvolvidas durante meu curso técnico de piano. Tal situação me fez refletir sobre minha atuação como professora e até que ponto poderia auxiliar meus alunos na sua performance como pianista. Tanto nos projetos como nas aulas particulares que lecionei durante minha graduação os alunos eram na maioria crianças e adolescentes de idades entre 5 e 18 anos, quase todos de classe média alta. Em ambas instituições o objetivo principal era desenvolver o conhecimento musical do aluno através do instrumento em aulas formais. Notei que muitos alunos faziam aulas porque os pais queriam ou porque pretendiam tocar músicas que faziam parte do seu cotidiano. Diante disso, procurei tornar o aprendizado do instrumento mais cativante e prazeroso possível e ao mesmo tempo propiciando um conhecimento sólido da música.
Os conhecimentos adquiridos no curso de Licenciatura em Música da Universidade Federal de Mato Grosso aliados à minha atuação como pianista e professora de piano, instigaram-me a um olhar investigativo sobre a possibilidade de integração entre a teoria e a prática. Foi neste processo que procurei fazer uma reflexão sobre a aprendizagem e o desenvolvimento das habilidades nos alunos de piano, considerando os locais e principalmente as formas de ensino direcionadas à eles. Em reciprocidade com a contemporânea concepção de educação musical, que tem cada vez mais se aprofundado em pesquisas que visam uma reflexão sobre os meios mais adequados e consistentes para se ensinar música, pretendo mostrar que tal pensamento também deve fazer parte do ensino do instrumento. Grande parte dos educadores musicais espera que seus alunos aprendam conteúdos relevantes para a vida, usando os recursos musicais de forma consciente, através de uma metodologia cativante e eficaz baseada nas necessidades do mundo contemporâneo. Visando uma educação mais reflexiva tanto para aluno quanto para os professores, menciono aqui Barbeitas (2002, p. 81) que acredita na mudança dos currículos para diplomar músicos com uma formação cultural mais ampla e capacitados para uma prática artística em maior diálogo com a cultura e a sociedade brasileira. Com o objetivo de integrar os conhecimentos adquiridos durante o curso de licenciatura em música com a prática de ensino do piano visando uma formação mais completa e instigante para o aluno, pretendo esclarecer os múltiplos espaços e contextos do ensino e aprendizagem do instrumento. Divido-os aqui em dois grupos: o ensino informal (ou não formal) e ensino formal. Wille (2005, p.40) mostra em seu artigo a diferença entre estes termos. Segundo a autora o termo formal pode indicar: escolas, oficial, ou dotado de uma organização, com outras palavras o ensino formal seria aquele que acontece de maneira organizada com o intuito de aprendizagem, com metas estabelecidas e planejadas. Por outro lado, ao tratar de ensino informal Wille (2005) faz uma ligação direta com a aprendizagem não intencional, sem metas ou objetivos preestabelecidos, são conhecimentos adquiridos através da experiência direta com algo.
Considerando outras pesquisas que envolvem o processo de ensino ou de aprendizagem especificamente no ensino do instrumento, são usados outros termos para diferenciar os contextos e estas práticas musicais. Mundim (2009) trata da formação dos pianistas de duas formas: acadêmica e empírica, já Santiago (2006) se refere ao ensino do instrumento como prática deliberativa e prática informal. Ambos se relacionam aos conhecimentos adquiridos em locais que estes processos acontecem de forma intencional e não intencional, respectivamente, como citados no parágrafo anterior. Levando em conta as considerações anteriores optei em usar os seguintes termos para basear as duas práticas de ensino mais vistas no ensino do piano: formal, que neste trabalho estará ligada ao ensino nos cursos que conferem uma habilitação profissional (conservatórios, projetos, graduações, etc.); e informal que vou associar às formas de ensino que acontecem através da própria experiência e a vivência direta como pianista, ou seja, o conhecimento empírico. Para isso, segue uma breve reflexão sobre as duas formas de ensino expostas, tendo em vista as habilidades desenvolvidas em cada uma delas. Na educação formal, pode-se encontrar às vezes a prioridade do ensino da música erudita, e algumas vezes baseados no ensino europeu como cita Amato (2003) em seu artigo. Estes cursos geralmente usam metodologias engessadas a um período da música que já passou; o objetivo principal é formar um pianista exclusivamente solista, dando pouca ou até mesmo nenhuma atenção à prática do pianista em outras áreas. Nestes locais podemos encontrar alguns professores preocupados em orientar unicamente alunos que dominem seus instrumentos, dando muito valor à técnica e ao virtuosismo, esquecendo a importância sobre o entendimento da música e suas características. França (2003, p. 69) mostra a realidade de boa parte dos conservatórios e escolas de música onde, devido às exigências técnicas do repertório tradicionalmente imposto aos alunos, seu desempenho pode não representar o refinamento de sua compreensão musical, ou seja, é como se o aluno simplesmente tocasse um repertório de forma subjetiva, sem a devida compreensão. Pude vivenciar tal realidade em algumas das minhas aulas de piano onde tocava as músicas apenas reproduzindo as notas da partituras sem
uma devida compreensão sobre a obra em si. De acordo com Amato (2003) esse modelo conservador pode criar:...uma desvinculação da realidade e do mundo do trabalho que: os descontextualiza da contemporaneidade da linguagem musical, estabelece uma dicotomia entre música erudita e popular e uma fragmentação do saber musical, separa a prática da teoria e conserva o despreparo dos professores quanto a concepções educacionais e metodologias inovadoras pertinentes à realidade social e cultural do país. (AMATO, 2003, p.94) Outra questão ligada ao ensino formal está presente no artigo de Penna (2008), onde a autora faz algumas reflexões sobre o ensino de música mostrando que, nestas instituições do ensino formal, existe grande valorização sobre a leitura de partitura; ela chama este método de ensino como adestramento visual-motor (2008, p.56) ligado ao uso inadequado da partitura. Sobre esta reflexão sempre procurei desenvolver em meus alunos tanto a habilidade de ler partitura como tocar de ouvido, já que tais habilidades fazem com que o aluno tenha uma formação mais completa para atuar em diversos meios. Não pretendo desmerecer nenhum dos conhecimentos ou habilidades adquiridas nos locais de ensino formal; pelo contrário, todas estas habilidades são importantes na formação do pianista, mas acredito que a vivência destas habilidades podem ser melhor exploradas para que a formação dos pianistas não seja inadequada ou até privada de certos conhecimentos. Por outro lado, o ensino informal tem sido muito importante para a formação dos pianistas principalmente daqueles que pretendem atuar em grupos, pois encontram várias oportunidades de conhecer outras possibilidades de atuação além de solista. As habilidades do ensino informal podem ser obtidas através de cursos esporádicos, através da interação com outros músicos, e até mesmo na vivência direta com alguma atividade como pianista como, por exemplo, tocar em uma banda. Todas estas práticas são essenciais para auxiliar no desenvolvimento das habilidades que geralmente não são desenvolvidas no ensino formal. Essa afirmação também está presente no artigo de Santiago (2006, p.60):
Nem sempre o contexto do ensino formal de música oferece aos seus alunos uma formação instrumental integrada, que, além de contemplar o desenvolvimento técnico-musical e a aquisição de repertório, incorpore as atividades que compõem a prática informal. Se este for o caso, muitas das habilidades musicais, imprescindíveis para a formação do músico instrumentista, poderão estar sendo omitidas do seu processo de aprendizado. (SANTIAGO, 2006, p.60) Entre as habilidades que podem ser desenvolvidas no ensino informal estão: o domínio da harmonia, execução de ritmos diversos, o estímulo à improvisação e principalmente o estímulo para a prática efetiva destas habilidades em diversos contextos. Sabemos que somente estas habilidades não serão suficientes para a formação dos pianistas, mas dependendo da área de atuação elas serão essenciais. CONSIDERAÇÕES FINAIS Todas as situações citadas anteriormente foram vivenciadas durante minha formação de pianista; por outro lado, as habilidades que aprendi informalmente nunca foram interligadas ao conteúdo aprendido formalmente. Ao perceber tal situação comecei a propor aos meus alunos que trouxessem músicas que eles aprenderam em casa, com os amigos, com a família ou até mesmo sozinhos para serem desenvolvidas formalmente. Trazendo estas reflexões para o ensino de piano, percebi que os conhecimentos adquiridos unicamente informal podem propiciar aos pianistas alguns vícios e manias que podem atrapalhar na performance, mas que trabalhadas durante as aulas formais eram aos poucos resolvidas. Não quero julgar os conhecimentos adquiridos de maneira informal, e muito menos rebaixá-los, mas propor uma reflexão para que as duas formas de ensino (formal e informal) possam interagir na formação do pianista. Cabe considerar que os locais onde atuei como professora não tem como objetivo principal profissionalizar os alunos, mas propiciar a oportunidade de aprender um instrumento de maneira mais formal. Este motivo facilitou a liberdade na metodologia usada para os alunos usando o repertório que faziam
parte do seu contexto cultural, aliados a prática de tocar de ouvido, ler partituras, leitura de cifras e execução de estilos mais diversos. A reflexão que faço ao finalizar este relato, fruto de minha atuação como pianista, aluna e professora particular de piano em escolas de música e projetos interligados, é que o ensino formal de piano deve primeiramente, instigar em seus alunos a busca por diferentes práticas informais. Em um segundo momento, deve integrar as habilidades do ensino formal com as habilidades adquiridas nas práticas informais. Desta forma os alunos de piano podem ter uma vivência direta com os mais diversos recursos musicais e, a partir destas experiências, obter uma formação ampla dialogando com a cultura, a sociedade e o próprio fazer musical. REFERÊNCIAS AMATO, Rita de Cássia Fucci. Educação pianística: o rigor pedagógico dos conservatórios. Revista música HODIE, Goiânia, v. 6, n. 1, 2006 BARBEITAS, Flavio Terrigno. Do Conservatório à Universidade: o novo currículo de graduação da Escola de Música da UFMG. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 7, p. 75-81, set. 2002. FRANÇA, Cecília Cavalieri, BEAL, Ana Denise Donadussi. Redimensionando a performance instrumental? Pesquisa/ação no ensino de piano de nível médio. Em Pauta, Poto Alegre, v. 14, n. 22, p. 65-84, junho de 2003. MUNDIM, Adriana Abid. Pianista colaborador: a formação e atuação performática voltada para o acompanhamento de Flauta Transversal. Belo Horizonte: UFMG, 2009. 135 p.dissertação (Mestrado em Música), Programa de Pós-graduação da Escola de Música da Universidade Federal de Minas Gerais. PENNA, Maura. Música(s) e seu ensino. Porto Alegre: Sulina, 2008. 230 p. SANTIAGO, Patrícia. A integração da prática deliberada e da prática informal no aprendizado da música instrumental. Per Musi, Belo Horizonte, n.13, p.52-62, 2006. WILLE, Regina Blank. Educação musical formal, não formal ou informal: um estudo sobre processos de ensino e aprendizagem musical de adolescentes. Revista da ABEM, Porto Alegre, v.13, p. 39-48, set. 2005.