CRIMES DE BAGATELA LUIZ FERNANDO BOTELHO DE CARVALHO

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Transcrição:

CRIMES DE BAGATELA LUIZ FERNANDO BOTELHO DE CARVALHO Consultor Legislativo da Área II Direito Civil e Processual Civil, Direito Penal e Processual Penal, de Família, do Autor, de Sucessões, Internacional Privado NOVEMBRO/2005

Luiz Fernando Botelho de Carvalho 2 2005 Câmara dos Deputados. Todos os direitos reservados. Este trabalho poderá ser reproduzido ou transmitido na íntegra, desde que citados o autor e a Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados. São vedadas a venda, a reprodução parcial e a tradução, sem autorização prévia por escrito da Câmara dos Deputados. Este trabalho é de inteira responsabilidade de seu autor, não representando necessariamente a opinião da Câmara dos Deputados. Câmara dos Deputados Praça 3 Poderes Consultoria Legislativa Anexo III - Térreo Brasília - DF

Luiz Fernando Botelho de Carvalho 3 CRIMES DE BAGATELA O Direito Penal tem por fim precípuo definir as condutas humanas mais reprováveis ocorridas em uma sociedade, estabelecendo penas e medidas de segurança aos seus infratores. Assim, não se pode definir como infração penal toda e qualquer conduta, mas somente aquelas que atinjam os bens jurídicos de maior importância e vitais ao convívio em comunidade e que devem ser protegidos por esse ramo do ordenamento jurídico. É nesse sentido que assevera o jurista Luiz Regis Prado, o pensamento jurídico moderno reconhece que o escopo imediato e primordial do Direito Penal radica na proteção de bens jurídicos essenciais ao indivíduo e à comunidade. Os demais valores, bens e interesses da sociedade são tutelados por outros ramos do direito que não o penal. Delineia-se, nesse ponto, o caráter subsidiário do direito penal, onde a sua intervenção só ocorre quando a proteção por outros ramos do direito revela-se insuficiente. É a chamada intervenção mínima que preconiza a criminalização de uma conduta somente em último caso, quando se constituir o meio necessário para o proteção de determinado bem jurídico. É nesse sentido a lição de Muñoz Conde : O poder punitivo do Estado deve estar regido e limitado pelo princípio da intervenção mínima. Com isto, quero dizer que o Direito Penal somente deve intervir nos casos de ataques muito graves aos bens jurídicos mais importantes. As perturbações mais leves do ordenamento jurídico são objetos de outros ramos do Direito. 1 E na mesma direção discorre Francisco Assis de Toledo : E aqui entremostra-se o caráter subsidiário do ordenamento penal : onde a proteção de outros ramos do direito possa estar ausente, falhar ou revelar-se insuficiente, se a lesão ou exposição a perigo do bem jurídico tutelado apresentar certa gravidade, até aí deve estender-se o manto da proteção penal, como ultima ratio regum. Não além disso. Destarte, deve, o Direito Penal, pelo princípio da intervenção mínima, selecionar somente os bens considerados mais importanrtes e de maior relevo para o indivíduo e para a comunidade, deixando para outros ramos do Direito a tutela dos demais bens jurídicos. Outro pilar informador do Direito Penal é o princípio da Adequação Social que serve como instrumento de interpretação de tipos penais bem como norteia a atividade legiferante. 1 MUÑOZ CONDE, Francisco. Introducción al derecho penal. Barcelona: Bosch, 1975.

Luiz Fernando Botelho de Carvalho 4 Por esse princípio, as condutas socialmente aceitas não serão consideradas crimonosas, ainda que se adeqüem a algum tipo penal. Assim, exclui-se desde logo a conduta do âmbito de incidência do delito, situando-a entre os comportamentos atípicos, ou seja, como comportamentos normalmente tolerados. Vale a pena trazer a colação os ensinamentos de Luiz Regis Prado : A teoria da adequação social, concebida por Hans Welzel, significa que apesar de uma conduta se subsumir ao modelo legal não será considerada típica se for socialmente adequada ou reconhecida, isto é, se estiver de acordo com a ordem social da vida historicamente condicionada 2 A conduta socialmente adequada está excluida do tipo penal porque se realiza dentro do âmbito da normalidade. É por isso que uma lesão coporal cometida durante um jogo de futebol em uma situação de competição não é penalmente punível. Embora, a lesão corporal seja tipificada como conduta delituosa, a sua ocorrência durante uma disputa atlética não será punível. Assim, o Direito Penal, sob os auspícios dos Princípios da Adequação Social e da Intervenção mínima, somente deve agir até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico, não se ocupando de bagatelas. Decorre daí o Princípio da bagatela ou da Insignificância que pode ser conceituado como sendo aquele que permite afastar a tipicidade de fatos causadores de danos de pouca ou nenhuma importância. Dessa forma, não merecem a atenção do Direito Penal. Em outras palavras, o princípio da insignificância pertine aos delitos de bagatela, permitindo sua consideração pela jurisdição penal como fatos atípicos, posto que destituídos de qualquer valoração a merecer tutela penal e, portanto, irrelevantes. São ações aparentemente típicas, mas de tal modo inexpressivas e insignificantes que não merecem a reprovabilidade penal. O legislador, ao estabelecer os tipos penais, visa apenas tutelar os prejuízos relevantes que o comportamento incriminado possa causar à ordem jurídica e social. Todavia, não dispõe de meios para evitar que também sejam alcançados os casos leves. Nesse diapasão, destaca-se o princípio da insignificância com o intuito de justamente evitar situações dessa espécie, atuando como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal. Vale lembrar que o princípio ora em destaque deve ser utilizado pelo exegeta na maioria do casos. Contudo há tipos penais que não se coadunam com a interpretação da bagatela. É o caso do homicídio, onde o bem jurídico violado é a vida da vítima, que não pode de forma alguma ser considerada como bem jurídico de pouca 2 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro Parte Geral. São Paulo. 2. Ed. Revista dos Tribunais : 2000.

Luiz Fernando Botelho de Carvalho 5 importância. O Professor e Ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça, Francisco de Assis Toledo nos fornece diversos exemplos da aplicação do princípio da insignificância, a saber : Assim, no sistema penal brasileiro, por exemplo, o dano do art. 163 do Código Penal não deve ser qualquer lesão à coisa alheia, mas sim aquela que possa representar prejuízo de alguma significação para o proprietário da coisa; o descaminho do art. 334, parágrafo 1º, d, não será certamente a posse de pequena quantidade de produto estrangeiro, de valor reduzido, mas sim a de mercadoria cuja quantidade ou cujo valor indique lesão tributária, de certa expressão, para o Fisco; o peculato do art. 312 não pode estar dirigido para ninharias como a que vimos em um volumoso processo no qual se acusava antigo servidor público de ter cometido peculato consistente no desvio de algumas poucas amostras de amêndoas; a injúria, a difamação e a calúnia dos arts. 140, 139 e 138, devem igualmente restringir-se a fatos que realmente possam afetar significativamente a dignidade, a reputação, a honra, o que exclui ofensas tartamudeadas e sem conseqüências palpáveis e assim por diante 3 A inteligência doutrinária em pauta encontra eco, outrossim, na jurisprudência nacional. O princípio da insignificância teve, pela primeira vez, seu acolhimento "expresso" pelo Supremo Tribunal Federal em julho de 1988 (RHC nº 66.869-1, 2º turma, votação unanime). No julgamento, o STF decidiu arquivar a ação penal com o fundamento de que uma equimose, de três centímetros de diâmetro, decorrente de um acidente automobilístico, escapa ao interesse punitivo do Estado em virtude do princípio da insignificância, alegando que o prosseguimento da ação penal não lograria nenhum resultado, só sobrecarregaria mais os serviços da Justiça e incomodaria inutilmente a vítma. Destarte, algumas condutas, que em razão de sua aceitação pela sociedade ou por de causarem danos socialmente irrelevantes, devem ser consideradas atípicas. Embora, o fato se amolde formalmente ao tipo penal, deve, o intérprete, considerar a conduta materialmente atípica. Assim, a insignificância do fato está diretamente relacionada à atipicidade. A bagatela está diretamente relacionada à atipicidade penal. Portanto, conclui-se que a expressão crime de bagatela é imprópria, vez que não existe crime quando o fato é insignificante. Ou seja, melhor seria a expressão fato de bagatela. Assim, conclui-se que o princípio da insignificância é um critério geral interpretativo de exclusão da tipicidade. É uma máxima orientada ao exegeta que ao analisar a tipicidade deve verificar se o dano afetou significativamente o bem jurídico a ponto de ser imprescindível a aplicação de reprimenda penal. 3 TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal. 5 ed. São Paulo. Saraiva : 1994

Luiz Fernando Botelho de Carvalho 6 O princípio da insignificância, embora não esteja expresso formalmente em nosso ordenamento jurídico, encontra-se implícito nos rol dos princípios constitucionais. Na Constituição Federal delineia-se um sistema jurídico penal moderno que se coaduna com os ditames de um Estado democrático de direito. Nesse sentido, destaca-se a dignidade da pessoa como valor supremo, sendo os direitos e liberdades fundamentais do indivíduo protegidos em face do poder punitivo do Estado. Assim, adota-se um Direito Penal de intervenção mínima, ou seja, somente os fatos significativos são penalmente reprimidos. Portanto, o princípio da insignificância, embora não explícito formalmente em nenhuma lei, já se encontra consagrado em nosso ordenamento jurídico, sendo largamente utilizado pelos tribunais pátrios. Todavia, se o legislador desejasse descrevêlo em algum diploma legal, seria a Constituição Federal o texto mais adequado para tal tarefa. Assim, seria imprescindível a proposição de uma emenda constitucional que incluísse a máxima interpretativa da bagatela entre o rol dos princípios constantes do artigo 5 da Carta Magna. O Código Penal, em sua parte geral, também poderia abarcar formalmente o princípio da insignificância. No entanto, seu conteúdo não estaria no topo da pirâmide jurídica. Assim sendo, a máxima em questão não teria mais o status de norma constitucional, podendo ser revogada ou alterada por qualquer lei ordinária posterior.