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Barroco Século XVII - Bahia Usina de Açúcar Franz Post

Gregório de Matos Guerra (1633 1696) Eu sou aquele que os passados anos Cantei na minha lira maldizente Torpezas do Brasil, vícios e enganos.

Poesia lírico-amorosa Apelo direto aos sentidos Jogo de opostos Efemeridade da vida Imagens de coisas fugidias como: Fumaça Névoas Sol Lua (Dia Noite) Estações Flor

Poesia lírico-religiosa Reflete toda a contradição do homem Gregório, pois não seria concebível para ele (ao escutarmos a sua sátira nos damos conta) realizar poemas de alto sentimento religioso. Elabora uma contrição retórica

Poesia satírica Essa poesia é marcada pela: crítica feroz da sociedade baiana poetização da linguagem popular. erotismo humor violento e corrosivo atualidade

Anjo no nome, Angélica na cara! Isso é ser flor, e Anjo juntamente: Ser Angélica flor, e Anjo florente, Em quem, senão em vós, se uniformara: Quem vira uma tal flor, que não a cortara, De verde pé, da rama florescente; E quem um Anjo vira tão reluzente, Que por seu Deus o não idolatrara? Se pois como Anjo sois dos meus altares, Fôreis o meu Custódio, e a minha guarda, Livrara eu se diabólicos azares. FLOR X ANJO TERRA X CÉU TENTAÇÃO X ADORAÇÃO Mas vejo, que por bela, e por galharda, Posto que os Anjos nunca dão pesares, Sois Anjo, que me tenta, e não me guarda.

Discreta e formosíssima Maria, Enquanto estamos vendo a qualquer hora Em tuas faces a rosada Aurora, Em teus olhos e boca o Sol e o dia, (...) Goza, goza da flor da mocidade, Que o tempo trata a toda ligeireza, E imprime em toda a flor sua pisada. Lírica Amorosa: passagem do tempo Oh não aguardes, que a madura idade, Te converta essa flor, essa beleza, Em terra, em cinza, em pó, em sombra, em nada.

Estilos do Barroco Conceptismo = jogo de idéias, jogo de conceitos (significação)

Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado, Da vossa alta clemência me despido; Porque quanto mais tenho delinqüido Vos tenho a perdoar mais empenhado. Se basta a vos irar tanto pecado, A abrandar-vos sobeja um só gemido: Que a mesma culpa que vos há ofendido, Vos tem para o perdão lisonjeado. Se uma ovelha perdida e já cobrada Glória tal e prazer tão repentino Vos deu, como afirmais na sacra história, Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada, Recobrai-a; e não queirais, Pastor Divino, Perder na Vossa ovelha a Vossa glória. PECADO X PERDÃO HOMEM X DEUS RAZÃO X FÉ

Cultismo = jogo de palavras, jogo de sensações (expressão formal) O todo sem a parte não é todo, A parte sem o todo não é parte, Mas se a parte o faz todo, sendo parte, Não se diga, que é parte, sendo todo. (Gregório de Matos)

Que falta nesta cidade? Verdade Que mais por sua desonra? Honra Falta mais que se lhe ponha? Vergonha. O Demo a viver se exponha, Por mais que a fama a exalta, Numa cidade, onde falta Verdade, Honra, Vergonha. E que a justiça a resguarda? Bastarda É grátis distribuída? Vendida Que tem, que a todos assusta? Injusta. Poesia Satírica Valha-nos Deus, o que custa, O que El-Rei nos dá de graça, Que anda a justiça na praça Bastarda, Vendida, Injusta.

E nos frades há manqueiras? Freiras Em que se ocupam os serões? Sermões Não se ocupam em disputas? Putas. Com palavras dissolutas Me concluís na verdade, Que as lidas todas de um Frade São Freiras, Sermões, e Putas. O açúcar já se acabou? Baixou E o dinheiro se extingui? Subiu Logo já convalesceu? Morreu. À Bahia aconteceu O que a um doente acontece, Cai na cama, o mal lhe cresce, Baixou, Subiu, e Morreu.

Triste Bahia! ó quão dessemelhante Estás e estou do nosso antigo estado! Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado, Rica te vi eu já, tu a mi abundante. A ti trocou-te a máquina mercante, Que em tua larga barra tem entrado, A mim foi-me trocando, e tem trocado, Tanto negócio e tanto negociante. Deste em dar tanto açúcar excelente Pelas drogas inúteis, que abelhuda Simples aceitas do sagaz brichote. Oh se quisera Deus que de repente Um dia amanheceras tão sisuda Que fora de algodão o teu capote!

Padre Antônio Vieira (1608 1697) Autor ligado tanto à literatura portuguesa quanto à brasileira, Vieira é considerado o maior orador sacro da nossa história, tendo escrito cerca de duzentos sermões. É também a mais alta expressão da prosa conceptista nas nossas letras. A temática explorada em seus sermões é bastante variada: revoltou-se contra a ocupação holandesa no Brasil; defendeu os cristãos novos; lutou contra a escravidão indígena no Maranhão; insurgiu-se contra a escravidão do negro; etc. Antônio Vieira foi um espírito inquieto, sensível aos problemas do seu tempo, servindo muitas vezes como porta-voz da colônia na corte de Lisboa.

O Amor e o Tempo Tudo cura o tempo, tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba. Atreve-se o tempo a colunas de mármore, quanto mais a corações de cera! São as afeições como as vidas, que não há mais certo sinal de haverem de durar pouco, que terem durado muito. São como as linhas, que partem do centro para a circunferência, que quanto mais continuadas, tanto menos unidas. Por isso os antigos sabiamente pintaram o amor menino; porque não há amor tão robusto que chegue a ser velho. De todos os instrumentos com que o armou a natureza, o desarma o tempo. Afrouxalhe o arco, com que já não atira; embota-lhe as setas, com que já não fere; abre-lhe os olhos, com que vê o que não via; e faz-lhe crescer as asas, com que voa e foge. A razão natural de toda esta diferença é porque o tempo tira a novidade às coisas, descobre-lhe os defeitos, enfastia-lhe o gosto, e basta que sejam usadas para não serem as mesmas. Gasta-se o ferro com o uso, quanto mais o amor?! O mesmo amar é causa de não amar e o ter amado muito, de amar menos.

Crítica ao exagero do estilo barroco Não fez Deus o Céu em xadrez de estrelas, como os Pregadores fazem o sermão em xadrez de palavras. Se de uma parte está o Branco, da outra há de estar o Negro; se de uma parte está o Dia, da outra há de estar a Noite; se de uma parte dizem Luz, da outra hão de dizer Sombra; se de uma parte dizem Desceu, da outra hão de dizer Subiu. Basta que não havemos de ver num sermão duas palavras em paz? Todas hão de estar sempre em fronteira com o seu contrário?

Os senhores poucos, os escravos muitos; os senhores rompendo galas, os escravos despidos e nus; os senhores banqueteando, os escravos perecendo à fome; os senhores nadando em ouro e prata, os escravos carregados de ferros; os senhores tratandoos como brutos, os escravos adorando-os e temendo-os como deuses; os senhores em pé apontando para o açoite, como estátuas da soberba e da tirania, os escravos prostrados com as mãos atadas atrás, como imagens valíssimas da servidão e espetáculos de extrema miséria.

SENHORES x ESCRAVOS 1. poucos 2. rompendo galas 3. banqueteando 4. nadando em ouro e prata 5. adorados como deuses 6. em pé apontando para o açoite 7. estátuas da soberba e da tirania 1. muitos 2. despidos e nus 3. perecendo à fome 4. carregados de ferros 5. tratados como brutos 6. prostrados com as mãos atadas atrás 7. imagens da servidão e espetáculos de extrema miséria

Sermão da Sexagésima (fragmento) Ecce exiit qui seminat, seminare. Diz Cristo que saiu o pregador evangélico a semear a palavra divina. Bem parece este texto dos livros de Deus. Não só faz menção do semear, mas faz também caso de sair. Exiit, porque no dia da messe hão-nos de medir a semeadura; e hão-nos de contar os passos. O mundo, aos que lavrais com ele, nem vos satisfaz o que despendeis, nem vos paga o que andais. Deus não é assim. Para quem lavra com Deus até o sair é semear, porque também das passadas colhe fruto.

Sermão da Sexagésima (continuação) Entre os semeadores do Evangelho, há uns que saem a semear, são os que vão pregar à Índia, à China, ao Japão: os que semeiam sem sair são os que se contentam com pregar na Pátria. Todos terão sua razão, mas tudo tem sua conta. Aos que têm a seara em casa, pagar-lhes-ão a semeadura: aos que vão buscar a seara tão longe, hãolhes de medir a semeadura, e hão-lhes de contar os passos. Ah dia do juízo! Ah pregadores! Os de cá, acharvos-ei com mais paço; os de lá, com mais passos: Exiit seminare.

Idéias em oposição sair a semear X semear sem sair passos humildade trabalho paço luxo ócio