22º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 14 a 19 de Setembro 2003 - Joinville - Santa Catarina II-325 - PERFORMANCE DE UM SISTEMA DE LAGOAS EM CLIMA SUBTROPICAL Lademir Luiz Beal Engenheiro Químico pela Fundação Universidade de Rio Grande Mestre em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental pelo Instituto de Pesquisa Hidráulicas UFRGS. Doutorando em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental do Instituto de Pesquisas Hidráulicas -UFRGS Professor do Departamento de Engenharia Química da Universidade de Caxias do Sul Cláudia Teixeira Panarotto Bióloga pela Universidade de Caxias do Sul (UCS/RS). Mestre em Gerenciamento de Recursos Hídricos e Saneamento pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP/SP). Doutora em Engenharia Civil pela Universidade de Sherbrooke Québec Canadá. Professora do Departamento de Engenharia Química (DENQ/UCS). Diretora do Instituto de Saneamento Ambiental da Universidade de Caxias do Sul (ISAM/UCS/RS). Raquel Finkler Bióloga pela Universidade de Caxias do Sul. Mestre em Engenharia Ambiental pela Universidade Federal de Santa Catarina. Técnica do Instituto de Saneamento Ambiental. Endereço(1): Rua Antônio Bohler, 79/1101 Bairro: Petropólis. CEP: 95070 440 Caxias do Sul-RS e-mail: llbeal@ucs.br
RESUMO No Brasil, tem-se pesquisado a performance de lagoas de maturação, com maior ênfase, na região tropical. Na região sul do Brasil com clima tipicamente subtropical ocorre uma variação climática bem acentuada, de acordo com as estações do ano, sendo que em algumas micro-regiões (serra gaúcha e catarinense) ocorre precipitação de neve no inverno. Não raro são observadas temperaturas abaixo de zero. Salvo algumas pesquisas (ex: Nascimento et al., 2000), há uma escassez de dados de performance desse tipo de lagoas A Universidade de Caxias do Sul, construiu, em 2001 uma Estação de Tratamento de Efluentes composta de uma lagoa aerada, uma lagoa de sedimentação e duas lagoas de maturação com chicanas, dispostas em série. Com um ano de monitoramento, a estação tem apresentado uma eficiência satisfatória mesmo no período de inverno, onde as condições climáticas são mais severas. A remoção de DBO5 em todo o sistema foi de 75,9%, de DQO 71%, de Sólidos Suspensos Totais de 52,3% e a remoção de Coliformes Fecais de 99,997%. Essas eficiências médias, demonstram a versatilidade com que o sistema opera, possibilitando pelas suas características absorver as oscilações de carga orgânica a que é submetido. A carga orgânica considerando a DBO5 variou de 0,028 kg DBO5/m3.dia a 0,324 kg DBO5/m3.dia e a eficiência da lagoa aerada mais lagoa de sedimentação oscilou entre 17,8% e 87,8%. A remoção de coliformes fecais no conjunto lagoa aerada mais lagoa de sedimentação foi praticamente o mesmo daquele alcançado pelas lagoas de maturação respectivamente, 99,2% e 99,5%. PALAVRAS-CHAVE: Lagoas de estabilização; Lagoas aeradas; Lagoas de maturação; Remoção de coliformes. INTRODUÇÃO No Brasil, tem-se pesquisado a performance de lagoas de maturação, com maior ênfase, na região tropical. Na região sul do Brasil com clima tipicamente subtropical ocorre uma variação climática bem acentuada, de acordo com as estações do ano, sendo que em algumas micro-regiões (serra gaúcha e catarinense) ocorre precipitação de neve no inverno. Não raro são observadas temperaturas abaixo de zero. Salvo algumas pesquisas (ex: Nascimento et al., 2000), há uma escassez de dados de performance desse tipo de lagoas. Através do Plano de Gerenciamento Ambiental que vem sendo implementado desde 1999 na Universidade de Caxias do Sul, foi projetada e executada uma estação de tratamento para os efluentes gerados na Cidade Universitária. O processo de tratamento consiste em uma Lagoa Aerada seguida de uma Lagoa de Sedimentação e duas Lagoas de Maturação com chicanas. Dessa forma, a ETE foi dimensionada para que também fosse possível a remoção de coliformes fecais.
MATERIAIS E MÉTODOS As características do sistema de lagoas estão listados na tabela 1 a seguir. Tabela 1: Características de projeto do sistema de lagoas UNIDADE TRH L C H V L. AERADA 4 d 11,2 m 19,40 m 3,0 m 400 m3 L. SEDIMENTAÇÃO 2 d 6,70 m 14,10 m 3,0 m 200 m3 L. MATURAÇÃO
10,66 d 19,0 m 57, 5 m 1,0 m 1.066 m3 L. MATURAÇÃO 16,27 d 19,0 m 87,47 m 1,0 m 1.627 m3 TRH: Tempo de retenção hidráulica; C: Comprimento da lagoa na linha da água H: Altura do nível da água; L: largura no nível da linha da água; V: Volume da lagoa Figura 1: Foto panorâmica da Estação de Tratamento de Efluentes da Universidade de Caxias do Sul. A vazão média de alimentação no projeto é de 100 m3/dia. As duas lagoas de maturação possuem duas chicanas cada construídas em alvenaria sobre uma estrutura de concreto. Os tempos de detenção são os de parâmetro de projeto e, obviamente, quando da operação variam de acordo com a oscilação da vazão a ser tratada. Os parâmetros de controle apresentados neste artigo foram aqueles exigidos pelo órgão ambiental estadual (FEPAM) e são os seguintes: DQO, DBO5, SS, Coliformes Fecais (CF), ph, óleos e graxas, temperatura, vazão. Os métodos analíticos utilizados estão tabelados na tabela 2. (1999). A periodicidade de coleta é de 15 dias sendo observada a metodologia específica de coleta para cada parâmetro. Tabela 2: Parâmetros e Técnicas Analíticas Utilizadas. PARÂMETROS TÉCNICA ANALÍTICA
UNIDADE SST Standard Methods, Gravimétrico mg/l DQO Standard Methods, Refluxo Aberto mg/l DBO5 Standard Methods, método de Winkler mg/l Coliformes Fecais Standard Methods, Tubos Múltiplos NMP/100 ml RESULTADOS Número de dispersão O número de dispersão das lagoas foi obtido através da equação de Yanez (1993) apud von Sperling (1996), e a relação L/B para lagoas com chicanas paralelas ao comprimento L foi calculada de acordo com a equação,, onde n é o número de chicanas. Assim as relações L/B para as lagoas LM1 e LM2 foram, respectivamente 26,55 e 38,7. Dessa forma, o número de dispersão para as lagoas, baseado somente na geometria destas é de, 0,03681 e 0,02532 respectivamente para as lagoas de maturação LM1 e LM2. Pode-se estimar que o comportamento hidráulico aproxima-se do fluxo de pistão.
Performance do sistema de lagoas A tabela 2 apresenta os resultados médios e desvios padrões de alguns parâmetros monitorados. Tais valores compreendem o monitoramento do período de 05/06/2002 a 22/05/2003, com exceção para Coliformes Fecais, cujos resultados são analisados até 03/04/2003 Tabela 3: Resultados médios do sistema de lagoas PARÂMETRO SST (mg/l) DQO (mg/l O2) DBO5 (mg/l O2) CF (NMP/100mL) C / s C / s C / s C / s ENTRADA 104,3 / 57,7 380,8 / 176,08 212,3 / 103,2 5,0X106 / 11,5X106
ENTRADA LM1 65,5 / 34,7 182,1 / 141,51 90,7 / 52,77 40.639 / 74.716 ENTRADA LM2 59,1 / 34,7 135,3 / 90,3 67,7 / 44,8 2.742 / 5.924 SAÍDA ETE 49,2 / 27,6 110,4 / 59,1 51,1 / 32,3 198 / 337 EFICIÊNCIA TOTAL 52,3% 71,00% 75,9% 99,997% LM1: Lagoa de Maturação 1; LM2: Lagoa de Maturação 2 C : Média Aritmética; s : Desvio Padrão Remoção de coliformes fecais
A elevada remoção de coliformes foi constante durante todo o período avaliado conforme mostra a figura 1. A remoção de coliformes fecais na lagoa aerada mais lagoa de sedimentação, da ordem de 99,2%, estabelece uma eficiência acima daquela esperada para estes sistemas biológicos. Tal aspecto pode ser creditado a baixa carga orgânica aplicada a lagoa aerada. A carga orgânica média, no período analisado, foi de 0,06 kg DBO5/m3.d. Tal fato somado a não existência de recirculação de biomassa, permite que a lagoa aerada opere com uma baixa concentração de biomassa o que implica em uma transparência maior à luz tanto nesta lagoa como na lagoa de sedimentação, possibilitando uma eliminação de coliformes pela incidência de raios UV. A remoção de coliformes fecais nas lagoas de maturação obteve um percentual de 99,51%. Esta remoção é praticamente a mesma da obtida no conjunto lagoa aerada mais lagoa de sedimentação. Embora o gráfico apresente algumas variações na concentração de Coliformes Fecais, os resultados sempre estão abaixo do limite máximo permitido pelo órgão ambiental estadual (FEPAM/RS) e pela Portaria CONAMA 20/86. Figura 2: Logaritmo da concentração de coliformes fecais no sistema de lagoas A eficiência de remoção de coliformes fecais em todo o sistema é de 99,997%, mesmo no período de inverno. Isso permite garantir que mesmo para clima subtropical esse sistema é eficiente, bastando, porém, critérios de projetos específicos que possibilitem manter a eficiência mesmo em períodos de temperaturas baixas. Remoção de DBO5 A remoção de DBO5 no sistema apresentou uma eficiência média de 75,9%. A distribuição desta remoção foi de 57,3% para o conjunto lagoa aerada mais lagoa de sedimentação e de 43,7% para as lagoas de maturação. A carga orgânica considerando a DBO5 variou de 0,028 kg DBO5/m3.dia a 0,324 kg DBO5/m3.dia e a eficiência da lagoa aerada mais lagoa de sedimentação oscilou entre 17,8% e 87,8%. Mesmo que a eficiência de remoção de DBO5 apresente-se com um comportamento tão variável, o efluente da lagoa aerada, com exceção de três pontos, já satisfaz as exigências do órgão ambiental. A inexistência da recirculação de biomassa pode explicar tal variabilidade. Essa recirculação poderia estabelecer um concentração de biomassa mais elevada que possibilitaria uma resposta melhor às oscilações de carga orgânica que esta é submetida como observa-se na figura 2, a despeito da lagoa aerada operar em regime de mistura completa. Além disso o aumento da concentração de biomassa pode também aumentar a eficiência de remoção de DBO5
Figura 3: Gráfico mostrando o comportamento da DBO5 no sistema de lagoas. Apesar do elevado tempo de retenção hidráulico entre as lagoas LM1 e LM2 (26,93 dias) a remoção não é muito significativa devido a transformação da matéria orgânica em biomassa o que pode ser inferido devido a baixa diferença na concentração de sólidos suspensos totais nas lagoas LM1 e LM2. Utilizando o modelo de mistura completa verificou-se que a taxa de remoção de DBO5 foi 0,24 d-1 o que é um valor bem aquém daquele utilizado em projeto (1,397 d-1 para 10 oc). Não obstante essa diferença acentuada, o regime hidráulico de mistura completa assim como a potência de aeração instalada que em lagoas aeradas tratando efluentes domésticos é majoritariamente para manter as características hidráulicas e a biomassa em suspensão, permite a manutenção da eficiência desejada. Remoção de DQO A remoção média de DQO no sistema de lagoas foi de 71%, sendo que 52,2% está associada a performance da lagoa aerada e 41,8% associada a performance das lagoas de maturação. Figura 4: Comportamento da DQO no sistema de tratamento de efluentes. A variabilidade da eficiência na remoção de DQO na lagoa aerada foi de 4,6% a 81,8% e no sistema de 37,6% a 89,6%. As baixas eficiências relativas a remoção da DQO, assim como da DBO5 na lagoa aerada mais lagoa de sedimentação estão associadas a alimentação de efluentes com baixas concentrações desses parâmetros como pode ser verificado na figura 4. O sistema de tratamento de efluentes proposto opera com boa capacidade de remoção de DQO e, na maior parte do tempo somente o conjunto lagoa aerada mais lagoa de sedimentação já é suficiente para possibilitar o atendimento aos parâmetros de emissão exigidos pelo órgão ambiental estadual (FEPAM). A carga orgânica aplicada na lagoa aerada, considerando a DQO, oscilou entre 0,032 kg DQO/m3.dia e 0,70 kg DQO/m3.dia o que corrobora a capacidade de uma lagoa aerada de operando com regime hidráulico de mistura completa em absorver tais oscilações de carga.
Remoção de Sólidos Suspensos Totais A remoção de sólidos suspensos totais no sistema de lagoas foi de 52,3%. Nas lagoas de maturação a remoção não foi significativa devido, principalmente a influência das algas na determinação deste parâmetro, o efluente final. Tal comportamento pode ser avaliado na figura 5 onde verifica-se que na maioria dos pontos as concentrações de sólidos suspensos totais estão muito próximas. Figura 5: Comportamento de sólidos suspensos totais no sistema de lagoas. Como nas lagoas de maturação ocorre uma proliferação acentuada de algas, sendo este um fenômeno natural associado a oferta de nutrientes, não é de se surprender que a remoção de sólidos suspensos seja mínima e que as concentrações destes nas duas lagoas sejam próximas. O que ocorre é uma transformação da matéria orgânica, seja na forma insolúvel ou dissolvida, em biomassa. Como a determinação de sólidos suspensos não é seletiva, não é possível diferenciar através desses parâmetros não específicos a contribuição das algas e demais formas de sólidos suspensos neste tipo de análise. CONCLUSÕES Os resultados obtidos até o presente momento, relativamente aos parâmetros monitorados, mostram que o sistema de lagoas apresentou performance consistente, atendendo assim os parâmetros exigidos pelo órgão ambiental estadual. Destaca-se a elevada remoção média de coliformes fecais, da ordem de 99,997%. A remoção média de DBO5 de 75,9% também comprova a eficiência desse sistema. O regime de mistura completa na lagoa aerada permite uma absorção das oscilações de carga orgânica sem comprometer sua eficiência. O baixo coeficiente de degradação médio de DBO5 observado, quando comparado com os dados disponibilizados pela literatura permite questionar parâmetros de projeto utilizados para esses sistemas. Assim, a Estação de Tratamento de Efluentes da Universidade de Caxias do Sul além de tratar o efluente de acordo com o exigido pelo órgão ambiental, também permite a realização de diversas pesquisas. Dessa forma, poderá colaborar com o desenvolvimento do conhecimento desses sistemas em climas subtropicais com maior segurança aumentando assim o estado da arte desse tema no Brasil. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRITO, M. C. S. O. M., CHERNICHARO, C. A. L. e SPERLING, M. von 1997 Avaliação intensiva de um sistema UASB-lagoa de maturação com chicanas na cidade de Itabira-MG. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. Foz do Iguaçu. Brasil NASCIMENTO, J. R. S., MONTEGGIA, L. O., GOMES, R.J. 2000 Pós-tratamento de efluentes de retaores anaeróbios em lagoas de lata taxa de produção de algas. XXVII Congresso Interamericano de Ingenieria Sanitaria Y Ambiental. Porto Alegre. Brasil NASCIMENTO, J. R. S 2001 Lagoas de alta taxa de produção de algas para pós-tratamento de efluentes de reatores anaeróbios Dissertação de Mestrado. IPH/UFRGS. Porto Alegre. Brasil PINTO, M. T., NEDER, K. D., FELIZZATO M. R. E LUDUVICE M. L., 1997 ETE Samambaia - dos projetos à prática dos novos conceitos no processo de tratamento de esgotos por lagoas de estabilização. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. Foz do Iguaçu. Brasil SPERLING, v. MARCOS Lagoas de Estabilização. 1a Edição. 1996. DESA/UFMG Brasil. CONAMA 1986 Resolução número 20 de 1986. Brasília. Brasil