Condenação Criminal e Suspensão dos Direito Políticos



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Transcrição:

Condenação Criminal e Suspensão dos Direito Políticos Alexandre de Moraes Promotor de Justiça assessor do Procurador-geral de Justiça de São Paulo. Doutor em Direito do Estado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo; nas Escolas Superiores dos Ministérios Públicos dos Estados de São Paulo e da Bahia e na Universidade Presbiteriana Mackenzie. Membro do Conselho Editorial Atlas e do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional (IBDC) e coordenador da Série Fundamentos Jurídicos, publicada pela Atlas. SUMÁRIO: 1. Privação dos direitos políticos - 2. Histórico - 3. Condenação criminal com trânsito em julgado enquanto durarem seus efeitos e suspensão dos direitos políticos - 4. Condenação criminal com trânsito em julgado e perda de mandato eletivo - 5. Diferenciação entre suspensão dos direitos políticos por condenação criminal transitada em julgado (CF, art. 15, III) e inelegibilidade legal em face de condenação criminal por determinadas infrações penais (Lei complementar n.º 64/90, art. 1º, I, e) 1. Privação dos direitos políticos O cidadão pode ser privado, definitiva ou temporariamente, de seus direitos políticos, em face de hipóteses taxativamente previstas no texto constitucional, pois como afirmava Pimenta Bueno, ao analisar a mesma matéria prevista no art. 8, inciso II, da Constituição do Império e ressaltando a necessidade de previsão constitucional, "o gozo dos direitos políticos, a participação ou intervenção no governo ou regime político do Estado é tão importante, que a lei não devia deixar de prever as circunstâncias em que ele deve ser interrompido em benefício da segurança social". A Constituição Federal não aponta as hipóteses de perda ou suspensão dos direitos políticos, porém a natureza, forma e principalmente, efeitos das mesmas possibilita a diferenciação entre os casos de perda ou suspensão. O art. 15 da Constituição Federal estabelece ser vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; incapacidade civil absoluta; condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5.º, VIII e improbidade administrativa, nos termos do art. 37, 4º. Ocorrendo uma das hipóteses previstas na Constituição Federal, o fato deverá ser comunicado ao Juiz Eleitoral competente, que determinará sua inclusão no sistema de dados, para que aquele que estiver privado de seus direitos políticos, seja definitivamente (perda), seja temporariamente (suspensão), não figure na folha de votação. A privação dos direitos políticos, seja nas hipóteses de perda seja nas de suspensão, engloba a perda do mandato eletivo, determinando, portanto, imediata cessação de seu exercício, pois necessária é a existência de controles em relação aos mandatos políticos, como forma de respeito à participação popular no poder estatal e garantia da permanência das liberdades civis, como nos ensinam Norberto Bobbio e Roscoe Pound. Aquele que estiver com sua inscrição cancelada, por ter perdido seus direitos políticos, ou suspensa, por estar com seus direitos políticos suspensos, cessado o motivo ensejador da privação, poderá regularizar sua situação junto à Justiça Eleitoral.

No presente trabalho trataremos da hipótese de suspensão dos direitos políticos em face de condenação criminal com trânsito em julgado, enquanto durarem seus efeitos. 2. Histórico A Constituição de 25 de março de 1824 - Constituição do Império - previa em seu art. 8, inciso II, a suspensão dos direitos políticos por sentença condenatória a prisão, ou degredo, enquanto durarem os seus efeitos. Ressalte-se que foi a única Carta brasileira que restringiu a suspensão dos direitos políticos à aplicação de determinadas espécies de pena, quais sejam, prisão ou degredo. Todas as demais Constituições previram a suspensão dos direitos políticos como conseqüência de uma condenação criminal, independentemente da espécie de pena aplicada. O art. 71, 1, b, da Constituição brasileira de 1891 estipulava que os direitos do cidadão brasileiro seriam suspensos por condenação criminal, enquanto durassem seus efeitos. Essa mesma norma era expressa da Constituição de 16 de julho de 1934 (art. 110, b) e na Constituição de 10 de novembro de 1937 (art. 118, b). A Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 1946, também previa em seu art. 135, II, a suspensão dos direitos políticos em virtude de condenação criminal enquanto durarem seus efeitos. Igual efeito previa a Constituição Federal de 1967, em seu art. 144, I, b, acrescentando, porém, em em seu 1 que "nos casos previstos neste artigo, acarreta a suspensão de mandato eletivo, cargo ou função pública, enquanto perdurarem as causas que a determinaram. Com a Emenda Constitucional n 01, de 1969, houve alteração na disciplina jurídica da matéria pois, apesar de permanecer a existência de norma prevendo a suspensão dos direitos políticos por condenação criminal, enquanto durassem seus efeitos (art. 149, 2, c), tratava-se de norma constitucional de eficácia limitada à edição de lei complementar que deveria dispor sobre a especificação dos direitos políticos, o gozo, o exercício, a perda ou suspensão de todos ou de qualquer deles e os casos e as condições de sua reaquisição (art. 149, 3 ). 3. Condenação criminal com trânsito em julgado enquanto durarem seus efeitos e suspensão dos direitos políticos Todos os sentenciados que sofrerem condenação criminal com trânsito em julgado estarão com seus direitos políticos supensos até que ocorra a extinção da punibilidade, como conseqüência automática e inafastável da sentença condenatória. A duração dessa suspensão cessa com a já citada ocorrência da extinção da punibilidade, seja pelo cumprimento da pena, seja por qualquer outras das espécies previstas no Código Penal, independentemente de reabilitação ou de prova de reparação de danos (Súmula 9 do TSE: "A suspensão de direitos políticos decorrente de condenação criminal transitada em julgado cessa com o cumprimento ou a extinção da pena, independendo de reabilitação ou de prova de reparação dos danos"). Os requisitos para a ocorrência dessa hipótese de suspensão dos direitos políticos são: condenação criminal com trânsito em julgado: O art. 15, inciso III, da Constituição Federal é auto-aplicável, sendo conseqüência direta e imediata da decisão condenatória transitada em julgado, não havendo necessidade de manifestação expressa a respeito de sua incidência na decisão condenatória e prescindindo-se de quaisquer formalidades. Assim, a condenação criminal transitada em julgado acarreta a suspensão de direitos políticos pelo tempo em que durarem seus efeitos, independentemente de estar em curso ação de revisão criminal. Não transitada em julgado a sentença condenatória, pode ser concedido o registro do

candidato, uma vez que a suspensão dos direitos políticos prevista pelo inciso III, do art. 15, da Constituição Federal, ainda não terá incidência. O disposto no artigo 15, III, da Constituição Federal, ao referir-se ao termo "condenação criminal transitada em julgado" não distingue quanto ao tipo de infração penal cometida, abrangendo não só aquelas decorrentes da prática de crimes dolosos ou culposos, mas também às decorrentes de contravenção penal, independentemente da aplicação de pena privativa de liberdade, pois a ratio do citado dispositivo é permitir que os cargos públicos eletivos sejam reservados somente para os cidadãos insuspeitos, preservando-se a dignidade da representação democrática. Importante, portanto, relembrar a lição do Ministro Carlos Velloso que, ao defender a aplicabilidade do art. 15 inciso III tanto aos crimes dolosos quanto aos crimes culposos, afirma que "sou daqueles que entendem que os cargos públicos deveriam ser reservados para os cidadãos insuspeitos. Não posso entender que a administração pública possa impedir que, para cargos menores, sejam empossados cidadãos com maus antecedentes e que os altos cargos eletivos possam ser exercidos por cidadãos que estão sendo processados e por cidadão até condenados". Analisando o mesmo dispositivo, previsto no art. 135, 1, II, da Constituição Federal de 1946, Pontes de Miranda ensinava nesse mesmo sentido, ao afirmar que "as regras são plenas, exaustivas e bastantes em si (self-executing). A condenação criminal suspende, qualquer que ela seja, enquanto eficaz a sentença, os direitos políticos. Não só se a pena é restritiva da liberdade". Efeitos da condenação criminal: a suspensão dos direitos persistirá enquanto durarem as sanções impostas ao condenado, tendo total incidência durante o período de livramento condicional, e ainda, nas hipóteses de prisão albergue ou domiciliar, pois somente a execução da pena afasta a suspensão dos direitos políticos com base no art. 15, III, da Constituição Federal. Em relação ao período de prova do sursis, por tratar-se de forma de cumprimento da pena, o sentenciado igualmente ficará privado temporariamente de seus direitos políticos. Anote-se, que diferentemente da Constituição anterior, não se trata atualmente de norma constitucional de eficácia limitada à edição de uma futura lei complementar, o que impediria a aplicação imediata da suspensão dos direitos políticos como ocorria. O artigo 149, parágrafo 2º, "c", com a redação dada pela Emenda Constitucional n.º 01, de 1969, determinava que "Assegurada ao paciente ampla defesa, poderá ser declarada a perda ou a suspensão dos seus direitos políticos por motivo de condenação criminal, enquanto durarem seus efeitos". Porém, o parágrafo 3º desse mesmo artigo estipulava a necessidade de edição de lei complementar para dispor sobre a especificação dos direitos políticos, o gozo, o exercício, a perda ou suspensão de todos ou de qualquer deles e os casos e as condições de sua reaquisição. Em virtude dessa redação, entendia o Supremo Tribunal Federal que a condenação criminal transitada em julgado não importava na automática suspensão dos direitos políticos, face à inexistência da Lei complementar exigida pela Constituição Federal. À partir da Constituição Federal de 1988, a suspensão dos direitos políticos em virtude de condenação criminal transitada em julgado se dá ainda que em curso o período de prova do sursis, conforme destacado pelo Supremo Tribunal Federal: "Em face do disposto no artigo 15, III, da Constituição Federal, a suspensão dos direitos políticos se dá ainda quando, com referência ao condenado por sentença criminal transitada em julgado, esteja em curso o período da suspensão condicional da pena". 4. Condenação criminal com trânsito em julgado e perda de mandato eletivo Lembremo-nos que, como regra geral, a privação dos direitos políticos, inclusive na

hipótese de condenação criminal transitada em julgado enquanto durarem seus efeitos, engloba a perda do mandato eletivo, determinando, portanto, imediata cessação de seu exercício. Porém, os parlamentares federais no exercício do mandato que forem condenados criminalmente, salvo se incidirem na hipótese do art. 55, VI e parágrafo 2º da CF não perderão automaticamente o mandato, mas não poderão disputar novas eleições enquanto durarem os efeitos da decisão condenatória. Isso ocorre pois a própria Constituição Federal estabelece que perderá o mandato o Deputado ou Senador que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado, sendo que a perda será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa. Assim, em face de duas normas constitucionais aparentemente conflitantes (CF, arts. 15, III e 55, VI) deve-se procurar delimitar o âmbito normativo de cada uma, vislumbrando-se sua razão de existência, finalidade e extensão, para então interpretá-las no sentido garantir-se a unidade da Constituição e a máxima efetividade de suas previsões. À partir dessa análise, percebe-se que a razão de existência do art. 55, VI e parágrafo 2º, da Constituição Federal é de garantir ao Congresso Nacional a durabilidade dos mandatos de seus membros (deputados federais e senadores da República), com a finalidade de preservar a independência do Legislativo perante os demais poderes, tendo sua extensão delimitada, tão somente, aos próprios parlamentares federais, por expressa e taxativa previsão constitucional. Trata-se pois de uma norma constitucional especial e excepcional em relação à previsão genérica do art. 15, inciso III. Dessa forma, em relação aos Congressistas condenados criminalmente, com transito em julgado, não será automática a perda do mandato, pois a própria Constituição estabelecendo que "a perda será decidida", exigiu a ocorrência de um ato político e discricionário da respectiva Casa Legislativa Federal, absolutamente independente à decisão judicial. Nesse sentido, importante lição nos traz o Ministro Moreira Alves, relator do Rextr. n.º 179.502-6/SP, em cuja decisão o Supremo Tribunal Federal pacificou o assunto: "Assim sendo, tem-se que, por esse critério da especialidade - sem retirar a eficácia de qualquer das normas em choque, o que só se faz em último caso, pelo princípio dominante no direito moderno, de que se deve dar a máxima eficácia possível às normas constitucionais -, o problema se resolve excepcionando-se da abrangência da generalidade do artigo 15, III, os parlamentares referidos no artigo 55, para os quais, enquanto no exercício do mandato, a condenação criminal por si só, e ainda quando transitada em julgado, não implica a suspensão dos direitos políticos, só ocorrendo tal se a perda do mandato vier a ser decretada pela Casa a que ele pertencer". Diversa, porém, é a hipótese em relação aos parlamentares estaduais, distritais ou municipais, uma vez que a Constituição Federal não os excepcionou da total incidência do referido inciso III, do art. 15, não havendo, portanto, em relação aos deputados estaduais, distritais e vereadores o que justifique o afastamento da regra geral aplicável na hipótese de suspensão dos direitos políticos, qual seja, imediata cessação do exercício do mandato. Dessa forma, uma vez transitada em julgado a sentença condenatória por infração penal praticada por deputado estadual, distrital ou vereador, serão remetidas certidões à Justiça Eleitoral, que as encaminhará ao Juiz Eleitoral competente, que oficiará o Presidente da respectiva Casa Legislativa, para que declare a extinção do mandato, e consequentemente, efetive o preenchimento da vaga. Trata-se de ato vinculado do Poder Legislativo estadual, distrital ou municipal que deverá, obrigatoriamente, aplicar o efeitos decorrentes do art. 15, III, da Constituição Federal,

independentemente de qualquer deliberação política. 5. Diferenciação entre suspensão dos direitos políticos por condenação criminal transitada em julgado (CF, art. 15, III) e inelegibilidade legal em face de condenação criminal por determinadas infrações penais (Lei complementar n.º 64/90, art. 1º, I, e) Por fim, a presente hipótese de suspensão dos direitos políticos em virtude de condenação criminal transitada em julgado enquanto durarem seus efeitos não se confunde com a previsão de inelegibilidade do art. 1º, I, e, da Lei Complementar n.º 64/90, que prevê serem inelegíveis para qualquer cargo os que forem condenados criminalmente, com sentença transitada em julgado, pela prática de crimes contra a economia popular, a fé pública, a administração pública, o patrimônio público, o mercado financeiro, pelo tráfico de entorpecentes e por crimes eleitorais, pelo prazo de 3 (três) anos, após o cumprimento da pena. Enquanto a primeira hipótese tem seu fundamento no art. 15, III, da Constituição Federal (suspensão), a segunda tem seu fundamento no parágrafo 9º, do art. 14 (inelegibilidade legal) e somente abrange uma situação de inelegibilidade, posterior ao término da suspensão dos direitos políticos, aos condenados pela prática dos crimes previstos no já citado artigo 1º, da LC n.º 64/90. Assim, conforme decidido pelo Egrégio Tribunal Superior Eleitoral, "extinta a pena, não cabe cogitar de subsistência da suspensão de direitos políticos decorrentes da condenação criminal e, por outro lado, não incide o art. 1º, I, e, LC n.º 64/90, se a condenação não foi baseada em qualquer dos crimes nela enumerados taxativamente". NOTAS 1 - BUENO, Pimenta. Direito público brasileiro e análise da constituição do império. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa Nacional, 1958. p. 474. 2 - STF - 1ª T - Embs. Decl. em Embs. Decl. em Agr. Reg. em Ag. de inst. ou de pet. n.º 177313/MG - rel. Min. Celso de Mello, Diário da Justiça, Seção I, 05 nov. 1996, p. 44488 - Ementário STF, 1850/1900. 3 - BOBBIO, Norberto. Igualdade y libertad. Barcelona: Paidós, 1993. p. 117. 4 - POUND, Roscoe. Liberdades e garantias constitucionais. 2. ed. São Paulo: Ibrasa, 1976. p. 05. 5 - cf. Título III - Da perda e da suspensão de direitos políticos - Tribunal Superior Eleitoral - Resolução n.º 19.875, de 12 de junho de 1997, modificada pela Resolução n.º 19.975, de 23 de setembro de 1997. 6 - STF - Pleno - Rextr. n.º 0179502/SP - rel. Min. Moreira Alves, Diário da Justiça, Seção I, 08 set. 1995, p. 28389. 7 - TRE/SP - Tribunal Pleno - Acórdão n.º 125.688 - Processo n.º 10.572 - Classe segunda - rel. Des. Djalma Lofrano, d. 31 de agosto de 1996. 8 - No mesmo sentido: Tribunal Regional Eleitoral Estado de São Paulo - Tribunal Pleno -

Acórdão n.º 112.985 - Processo n.º 9.477 - Classe sétima - rel. Juiz A C. Mathias Coltro, d. 02 de julho de 1992. 9 - TSE - Pleno - Resp. n.º 0013924/PB - rel. Min. Eduardo Andrade Ribeiro de Oliveira, d. 01 outubro de 1996. 10 - TSE - Pleno - Resp. n.º 0001368/SP - rel. Min. Haroldo Teixeira Valladão, d. 02 outubro de 1958; TSE - Pleno - Resp. n.º 0000129/SP - rel. Min. Antônio Vieira Braga, d. 30 setembro de 1958. 11 - TSE - Pleno - MS n.º 2.471/PR - Acórdão n.º 2.471 (11.9.96) - rel. Min. Eduardo Ribeiro. 12 - STF - Pleno - Rextr. n.º 179.502-6/SP - rel. Min. Moreira Alves - Ementário n.º 1799-09; TSE - Pleno - Recurso n.º 9.900/RS - Acórdão n.º 12.731 - rel. Min. Sepúlveda Pertence, d. 24 setembro de 1992. Na hipótese tratava-se de suspensão dos direitos políticos em virtude de condenação transitada em julgado por lesões corporais culposas. 13 - TSE - Pleno - Resp. n.º 0013293/MG - rel. Min. Eduardo Andrade Ribeiro de Oliveira, d. 07 novembro de 1996. 14 - Importante salientar o posicionamento mais restritivo do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, para o qual "utilizando-se da técnica finalistica de interpretação constitucional, poder-se-ia concluir que os crimes culposos são insuscetíveis de suspensão dos direitos políticos e os crimes dolosos determinantes dessa mesma suspensão independente da existência ou cumprimento da pena privativa de liberdade" (Acórdão n.º 112.985 - rel. Juiz Mathias Coltro), que porém não encontra respaldo no Supremo Tribunal Federal, como salientado pelo Min. Ilmar Galvão ao analisar o art. 15, III: "Também estou com S.Exa. em identificar na ética o fundamento da norma, embora extremamente rigorosa, com é de se reconhecer, porque não discrimina a natureza nem a espécie de crimes" (Rextr. n.º 179.502-6/SP - Ementário n.º 1799-09). 15 - citação no voto do Min. Celso de Mello - STF - Pleno - Rextr. n.º 179.502-6/SP - rel. Min. Moreira Alves - Ementário n.º 1799-09. 16 - MIRANDA, Pontes de. Comentários à constituição de 1946. São Paulo: Henrique Cahen Editor, 1947. v.iii, p. 133. 17 - Tribunal Regional Eleitoral Estado de São Paulo - Tribunal Pleno - Acórdão n.º 112.985 - Processo n.º 9.477 - Classe sétima - rel. Juiz A C. Mathias Coltro, d. 02 de julho de 1992. 18 - TSE - Pleno - Recurso n.º 9.760/PI - Acórdão n.º 12.877 - rel. Min. Eduardo Alckmin, d. 29 setembro de 1992; TSE - Pleno - Recurso n.º 10.797/RS - Acórdão n.º 12.926 - rel. Min. Carlos Velloso, d. 1 outubro de 1992. 19 - TSE - Pleno - Recurso especial eleitoral n.º 14.231/SP - Acórdão n.º 14.231 (01.10.96) - rel. Min. Eduardo Ribeiro. 20 - STF - RTJ, 61/581; 82/647. 21 - STF - Pleno - Rextr. n.º 0179502/SP - rel. Min. Moreira Alves, Diário da Justiça, Seção I, 08 set. 1995, p. 28389. 22 - STF - 1ª T - Embs. Decl. em Embs. Decl. em Agr. Reg. em Ag. de inst. ou de pet. n.º 177313/MG - rel. Min. Celso de Mello, Diário da Justiça, Seção I, 05 nov. 1996, p. 44488 - Ementário STF, 1850/1900; TSE - Pleno - Agravo regimental na medida cautelar n.º 33/RO - Acórdão n.º 33 (26.8.96) - rel. Min. Marco Aurélio; Tribunal Regional Eleitoral Estado de São Paulo - Tribunal Pleno - Acórdão n.º 112.985 - Processo n.º 9.477 - Classe sétima - rel. Juiz A C. Mathias Coltro, d. 02 de julho de 1992. Conforme destacado no

Acórdão n.º 116444/TRE-SP, "impõe-se o cancelamento do alistamento e da filiação partidária dos condenados, ex vi do art. 71, inc. II do Código Eleitoral e artigo 69, inc. II da Lei Orgânica dos Partidos Políticos, por período igual ao da pena aplicada, aqui incluído o prazo do sursis, perdendo os eleitos, por igual razão, os respectivos mandatos" (Tribunal Pleno - Acórdão n.º 116444 - processo n.º 22/89 - Classe quarta - rel. Juiz Sebastião Oscar Feltrin, d. 29 de outubro de 1992). 23 - TSE - Pleno - Recurso especial eleitoral n.º 13.324/BA - Acórdão n.º 13.324 (11.03.97) - rel. Min. Ilmar Galvão. EMENTA: "Registro de candidatura. Inelegibilidade. Art. 15, inciso III, da Constituição. Término do cumprimento da pena posterior ao pedido de registro e anterior às eleições. É inelegível o candidato que à época do pedido de sua candidatura encontrava-se com seus direitos políticos suspensos, não importando que a causa da inelegibilidade tenha cessado antes da realização das eleições". 24 - trecho do voto do Min. Moreira Alves - STF - Pleno - Rextr. n.º 179.502-6/SP - Ementário n.º 1799-09. 25 - Nesse sentido decidiu o Supremo Tribunal Federal: "Condição de elegibilidade. Cassação de diploma de candidato eleito vereador, porque fora ele condenado, com trânsito em julgado, por crime eleitoral contra a honra, estando em curso a suspensão condicional da pena. Interpretação do artigo 15, III, da Constituição Federal. Em face do disposto no artigo 15, III, da Constituição Federal, a suspensão dos direitos políticos se dá ainda quando, com referência ao condenado por sentença criminal transitada em julgado, esteja em curso o período da suspensão condicional da pena". Em sentido contrário: Pedro Henrique Távora Niess entende que essa regra aplica-se por igual aos deputados estaduais e aos vereadores, que portanto somente poderiam perder seus mandatos, em virtude de decisão condenatória transitada em julgado, após voto secreto da maioria absoluta dos membros da respectiva casa, garantida a ampla defesa(direitos políticos. condições de elegibilidades e inelegibilidades. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 21). 26 - No Estado de São Paulo, conferir a Circular n.º 166, do Tribunal Regional Eleitoral, de 26 de outubro de 1992, que estabelece: ""recebidas as certidões pelo Juízo Eleitoral deverá ser instaurado procedimento administrativo de suspensão da inscrição eleitoral, não havendo necessidade de expedição de edital e nem tampouco de novo contraditória, uma vez que a suspensão dos direitos políticos decorre no próprio texto constitucional" (cf. TRE/SP - MS n.º 1.266 - Angatuba - Acórdão n.º 124.734, rel. Juiz Souza José, d. 14 de maio de 1992). 27 - cf. ROLLO, Alberto e BRAGA, Enir. Inelegibilidade à luz da jurisprudência. São Paulo: Fiuza, 1995. p. 20. 28 - TSE - Pleno - Recurso n.º 9.900/RS - Acórdão n.º 12.731 - rel. Min. Sepúlveda Pertence, d. 24 setembro de 1992.