Desenvolvimento Integral na Primeira Infância

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Transcrição:

apresentam Desenvolvimento Integral na Primeira Infância Agenda de ações para a região da América Latina Resultados da Oficina Construindo uma Agenda Regional para o Desenvolvimento na Primeira Infância, realizada entre 14 e 16 de setembro de 2015 em São Paulo, Brasil. Elaborado por Carolina Aulicino e Gala Díaz Langou em outubro de 2015.

Desenvolvimento Integral na Primeira Infância Agenda de ações para a região da América Latina

Uma agenda regional para o Desenvolvimento Integral na Primeira Infância (DIPI) A primeira infância, entendida como o período que abrange desde a gravidez até os 5 anos de vida, constitui uma etapa central e uma janela inigualável de oportunidades tanto para o presente como para o futuro de nossas sociedades. Priorizar a primeira infância é a melhor decisão que um país pode tomar: é um dos investimentos com maior retorno e permite atingir, ao mesmo tempo, objetivos de equidade e eficiência. Alcançar o Desenvolvimento Integral na Primeira Infância (DIPI) pressupõe ir além do olhar tradicional (localizado e voltado prioritariamente à sobrevivência da criança), em direção a políticas que, a partir do ponto de vista dos direitos, permitam às crianças se desenvolverem plenamente em todas as dimensões: física, social, emocional e cognitiva. É fundamental que a agenda para as ações na primeira infância parta das disposições da Convenção sobre os Direitos da Criança (aprovada em 1989), especificamente do Comentário Geral Nº 7: considerar as crianças como sujeitos ativos de direito e cidadãos plenos, reconhecer o papel primordial das famílias como grupo fundamental para o desenvolvimento da criança (núcleo que o Estado deve apoiar e fortalecer) e como sócia ativa em todas as políticas, e respeitar os valores tradicionais e culturais no desenvolvimento da criança. Tomar como ponto de partida esse foco nos direitos pressupõe reconhecer que os Estados são os principais encarregados de assegurar o cumprimento dos direitos da criança e que a infância deve ser o centro da agenda pública. Além disso, deve ser considerado o ciclo de vida, o que implica uma abordagem integral da criança, em todas suas dimensões, a partir da concepção e ao longo dos primeiros anos de vida. A integralidade vai além da soma das ações: pressupõe que o foco das políticas seja o conjunto das necessidades das pessoas, famílias e comunidades, e coloca desafios de coordenação tanto entre os atores públicos e privados quanto entre os diversos níveis do governo. A América Latina encontra-se diante de uma oportunidade histórica de avançar nesse sentido. O desafio é grande e urgente: em nossa região, as crianças continuam mais pobres do que o resto da população e estão sujeitas a uma multiplicidade de vulnerabilidades. Em particular, esse fato determina a necessidade de priorizar os grupos em situação de vulnerabilidade e focar na redução das brechas: o problema central da região é a desigualdade 3

no acesso às oportunidades para o desenvolvimento das crianças. As políticas do DIPI devem ter como visão estratégica diminuir brechas nos setores em situação de vulnerabilidade, levando em conta a exposição a contextos de precariedade, violência, maus-tratos e abandono em que, em muitos casos, as crianças da região se encontram e envolvendo as famílias como atores-chave. Mudar o olhar para o conceito do DIPI pressupõe não somente investir mais na primeira infância, mas também investir melhor, incorporando a qualidade como desafio no desenvolvimento das políticas. Para tal, é fundamental que as intervenções a serem realizadas estejam baseadas nas melhores evidências nacionais e internacionais. A partir dessas considerações, o Movimento Todos Pela Educação, a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal e o Diálogo Interamericano (com o apoio da Fundação Bernard Van Leer e da Rede Latino-americana de Organizações da Sociedade Civil para a Educação REDUCA) convocaram diferentes participantes para uma oficina, realizada entre os dias 14 e 16 de setembro de 2015 em São Paulo, Brasil, com o objetivo de definir uma Agenda Regional para o Desenvolvimento Integral na Primeira Infância, como instrumento para incidir nos diferentes países da região. A base da metodologia de trabalho foi um processo de construção coletiva horizontal liderado por um moderador, com inclusão de espaços de debate e definição de consensos tanto nos grupos quanto nas sessões plenárias. Culminou com a definição de cinco pontos centrais, entre os quais dois são transversais aos outros. Todos eles, porém, têm a mesma importância e urgência, tal como é apresentado no esquema a seguir. Agenda Regional para o Desenvolvimento Integral na Primeira Infância (DIPI) TEMA 1: Gerar processos participativos para a definição de metas e indicadores do Desenvolvimento Integral na Primeira Infância, baseados num enfoque nos direitos TEMA 2: Criar e/ou fortalecer um mecanismo institucional, com autoridade orçamentária, de articulação entre setores e jurisdições TEMA 3: Fortalecer a gestão do atendimento integral e de qualidade para a primeira infância nos serviços e nas práticas de criação por parte das famílias TEMA 4: Construir e consolidar uma coalizão sociopolítica para impulsionar a prioridade do Desenvolvimento Integral na Primeira Infância tanto nas políticas públicas quanto no comprometimento dos cidadãos TEMA 5: Fortalecer a gestão do conhecimento sobre o Desenvolvimento Integral na Primeira Infância na região 4

A Agenda Regional permite definir um conjunto de metas para o DIPI baseadas em um enfoque nos direitos e em uma perspectiva integral (Tema 1). Para isso, é necessário fortalecer os governos por meio da institucionalização de mecanismos centrais (Tema 2), locais e nas famílias (Tema 3). São dois os alicerces que sustentam esse modelo: a criação de uma coalizão sociopolítica (Tema 4) e a gestão do conhecimento (Tema 5). No primeiro caso, representa um esforço conjunto dos atores regionais, nacionais e locais (tanto governamentais quanto privados e da sociedade civil). O segundo fator possibilita a produção de evidências que sustentem as intervenções. 5

Tema 1 Gerar processos participativos para a definição de metas e indicadores do Desenvolvimento Integral na Primeira Infância, baseados num enfoque nos direitos A definição das metas e indicadores do Desenvolvimento Integral na Primeira Infância (DIPI) é um ponto de partida central e chave. A definição deve ir além da perspectiva da oferta, contemplando também questões relativas à qualidade. Para que as metas e indicadores atinjam a multidimensionalidade e complexidade do DIPI, é necessário que o próprio processo de definição seja de caráter integral e consensual (envolvendo uma diversidade de atores com experiência na área) e tenha rigor técnico. Para isso, é preciso avançar em duas direções: 1a) Convocar um processo amplo, transparente e consultivo, coordenado pelos governos e baseado em evidências e consensos internacionais, para definir as metas do Desenvolvimento Integral na Primeira Infância Essas metas devem considerar todas as dimensões do desenvolvimento integral ao longo do ciclo de vida da criança. Na convocatória, devem ser incluídos tanto os atores estatais quanto os não estatais que contem com experiência e trabalhos na área: organizações da sociedade civil e comunitárias, especialistas, universidades. O trabalho deve ser alimentado pelos consensos que existem internacionalmente (plasmados em diferentes convenções, declarações e instrumentos normativos) e pela evidência da experiência internacional. A coordenação dessa instância deve ser de responsabilidade dos governos. Caso não exista a vontade política de convocar esse processo no país, abre-se um espaço para que a sociedade civil mobilize essa demanda. Um exemplo de sucesso da participação da sociedade civil nesse processo (no caso, em articulação com o Estado) pode ser identificado no Uruguai. 6

1b) Realizar, em cada país, a seleção de indicadores e instrumentos de desenvolvimento na primeira infância baseados em evidências, com o apoio de um comitê técnico intersetorial A autoridade política deve convocar um comitê formado por técnicos com especialização nas diferentes áreas do desenvolvimento na primeira infância (saúde e nutrição, cognitivo, linguístico-comunicacional, motor e socioemocional) e com competência técnica comprovada, para debaterem e chegarem a um consenso sobre uma série de indicadores e instrumentos de desenvolvimento na primeira infância, em cada dimensão. Esses indicadores devem corresponder às metas definidas no ponto 1a. Além disso, o ponto de partida deve ser um enfoque nos direitos que leve em conta o papel ativo da criança como sujeito de direitos e que respeite as diferenças culturais e os contextos locais. Isso implica ir além de uma avaliação da oferta de políticas e incluir formas de medir o desenvolvimento das crianças que permitam uma avaliação sobre a medida em que a oferta de políticas proporcione a elas desenvolver plenamente suas competências e ter acesso a seus direitos, e não sobre seu desempenho. Esses indicadores não seriam portanto um instrumento de avaliação das crianças e, de forma alguma, buscariam classificar, estigmatizar ou atribuir-lhes uma nota (como aconteceu no passado em alguns países). Pelo contrário, o objetivo seria entender a situação da infância e avaliar o desempenho dos programas e políticas públicos orientados para a primeira infância. Eles indicarão em que medida os serviços oferecidos em cada país contribuem para assegurar o desenvolvimento pleno das crianças na primeira infância. Nesse processo, o comitê técnico deverá partir dos instrumentos e métodos de medição utilizados em seu país e internacionalmente, e identificar as melhores práticas que possam ser replicadas, sempre levando em conta os contextos locais. 7

Tema 2 Criar e/ou fortalecer um mecanismo institucional, com autoridade orçamentária, de articulação entre os setores e jurisdições A definição das estratégias integrais do DIPI não assegura, necessariamente, que elas sejam implementadas na prática. Por isso, a chave é contar com um mecanismo institucional que possa assegurar a articulação (tanto entre os setores quanto entre os níveis do governo) no exercício da gestão. Em outras palavras, essa instância deve contar com autoridade orçamentária, importante respaldo político e legitimação pelos outros atores para exercer a função de primus inter pares, definindo os papéis de cada ator e arbitrando nos casos de conflito. A proposta é criar e/ou fortalecer esses mecanismos institucionais de articulação, posto que alguns países já contam com instâncias dessas características 1, enquanto outros ainda não avançaram nessa direção. O avanço deve ser realizado em três frentes: 2a) Formular, monitorar e avaliar um plano nacional de primeira infância com base nas metas do desenvolvimento infantil integral A partir das metas definidas no Tema 1, torna-se necessário definir um plano nacional e articular os planos setoriais em torno dele. Isso implica explicitar os componentes que formam a política nacional e os pontos críticos entre eles, definir as estruturas e papéis institucionais dos setores e jurisdições, monitorar e avaliar o cumprimento das metas previstas no plano, e informar regularmente os avanços para a sociedade. 1 É o caso do Chile, Colômbia, Cuba e Equador. 8

Esse plano deve contemplar todas as dimensões que formam o DIPI e definir a criação da estrutura referida no ponto 2b. 2b) Estabelecer uma estrutura e dinâmica institucional que conte com respaldo político, competência técnica para orientar e capacidade de incidir no orçamento Para tal, em primeiro lugar, é preciso ter o respaldo direto da Presidência, que dê legitimidade à estrutura perante os outros atores setoriais, os diferentes níveis do governo e a sociedade civil. Além disso, é necessário que a estrutura tenha uma incidência real na orientação dos orçamentos setoriais e competência técnica para orientar os processos do DIPI. 2c) Ajustar o marco normativo e regulatório das políticas de Desenvolvimento Integral na Primeira Infância Isso pressupõe dar forma legal à instância institucional de articulação intersetorial e institucionalizar o plano nacional. Além disso, implica ajustar e harmonizar o marco jurídico relacionado com o DIPI e as instituições associadas, assim como fortalecer os sistemas de proteção integral para a primeira infância. 9

Tema 3 Fortalecer a gestão do atendimento integral e de qualidade para a primeira infância nos serviços e nas práticas de criação por parte das famílias Tanto os serviços quanto as famílias e a comunidade são dimensões centrais para a primeira infância. As famílias e comunidades devem ser consideradas participantes ativas e corresponsáveis do DIPI. As famílias, especificamente, constituem o grupo fundamental e o meio natural para o DIPI, de acordo com a Convenção sobre os Direitos da Criança. Os Estados devem respeitar seu papel, dar apoio a elas e fortalecer sua tarefa, especialmente nos casos das famílias que enfrentam situações de vulnerabilidade socioeconômica e dificuldades no acesso à informação. No caso dos serviços destinados à infância (públicos e privados), fortalecer a gestão do atendimento integral e de qualidade implica incluir também o nível local como uma dimensão importante para o DIPI. Em ambos os casos, é necessário avançar nas discussões para definir o que é qualidade no DIPI. Isso implica uma interface entre esse tema e os temas 1 e 5. Para tal, a proposta é avançar em cinco dimensões: 3a) Definir padrões de qualidade A definição dos padrões de qualidade deve focar nos processos de interação entre adultos e crianças em todos os serviços do DIPI. Existe a necessidade prévia de gerar conhecimento sobre como mensurar melhor essa dimensão e de assegurar que a eleição das diferentes modalidades de atendimento para os grupos, divididos por idade, esteja baseada nas melhores evidências disponíveis (interface com o Tema 5). No caso da educação, é necessário considerar tanto a formação contínua quanto o fortalecimento dos projetos e processos pedagógicos, que incluem tanto os serviços de educação formal quanto o âmbito familiar e as diferentes modalidades de intervenção. 10

Os padrões de qualidade devem considerar em conta as particularidades das diferentes culturas e contextos, a partir de um enfoque nos direitos (interface com o Tema 1). 3b) Criar um sistema de gestão da qualidade Em todos os serviços do DIPI, é necessário promover sua gestão de forma sistêmica. Para isso, deve-se desenvolver um sistema de gestão da qualidade que defina e assegure que os padrões definidos no ponto 3a sejam implementados. O foco na integralidade em matéria de qualidade pressupõe que esse conceito esteja presente em todos os processos e dimensões que envolvem o DIPI. Para isso, é necessária a criação de um sistema que abranja tanto os recursos humanos (formação inicial dos docentes, agentes e profissionais envolvidos com a primeira infância) quanto a informação (criar um sistema integrado de informação social, ponto 3d) e o orçamento (por meio de mecanismos de incentivos como os descritos a seguir no ponto 3c). 3c) Fortalecer a competência institucional local para a gestão integral O DIPI exige uma participação efetiva de múltiplos atores presentes no território (tanto atores estatais quanto comunitários e sociais). Dadas as competências heterogêneas desses atores, é necessário seu fortalecimento com um enfoque de gestão integral. Para tal, será realizado um diagnóstico das competências e responsabilidades institucionais territoriais, a partir do qual esquemas de incentivos serão desenhados, com a distribuição dos recursos e o acompanhamento para seu fortalecimento institucional. Além disso, é necessário estabelecer incentivos para a participação das famílias e comunidades, como sócios ativos e corresponsáveis do DIPI. Isso implicaria ir além dos conselhos de pais e gerar instâncias de consulta e mecanismos de intercâmbio de informação entre os centros de atendimento e as famílias e comunidades, para promover a corresponsabilidade. 3d) Criar processos de acompanhamento e retroalimentação para uma melhoria contínua É crucial levar adiante um processo de monitoramento do desempenho dos prestadores quanto ao cumprimento dos padrões de qualidade estabelecidos no ponto 3a, com sistemas de alarmes que permitam detectar precocemente casos de risco biopsicossocial e mecanismos de retroalimentação para uma melhoria contínua. Assim, também tem relação com o ponto 3c, porque requer o desenvolvimento das competências institucionais locais, dependendo dos diversos contextos nacionais. 11

3e) Desenvolver um sistema integrado de informação que permita o acompanhamento do atendimento de cada criança Isso pressupõe avançar em sistemas de informação nacionais que registrem tanto os dados do desenvolvimento da criança quanto sua passagem nas instituições e intervenções. Implica, portanto, a compatibilidade das diferentes bases de dados, que permita cruzar as informações e estabelecer, nas instituições, a cultura de registrar a informação e a própria prática. Como exemplo, merece destaque o sistema de acompanhamento criança por criança desenvolvido na Colômbia 2. 2 Disponível em: <http://www.deceroasiempre.gov.co/paginas/deceroasiempre.aspx>. 12

Tema 4 Construir e consolidar uma coalizão sociopolítica que dê prioridade ao Desenvolvimento Integral na Primeira Infância, tanto nas políticas públicas quanto no comprometimento dos cidadãos É imprescindível criar uma coalizão sociopolítica formada tanto por atores governamentais quanto pela sociedade civil, com a cooperação internacional, para impulsar a priorização do DIPI no âmbito das políticas públicas e nos campos de atuação dos diferentes atores sociais. Isso pressupõe desenvolver ações tanto em nível regional quanto nacional e local, para transcenderem as mudanças de governo, e está fortemente relacionado com o Tema 1, posto que a coalizão desempenha um papel importante na convocatória dos processos participativos. É necessário avançar em três frentes simultâneas: 4a) Realizar pactos que envolvam os Estados, a sociedade civil organizada e a cooperação internacional em favor das políticas do DIPI É indispensável alcançar acordos políticos (partidários) e intergovernamentais (em todos os níveis da administração), que tomem como base a Declaração sobre os Direitos da Criança, o Comentário Geral Nº 7 do Comitê sobre os Direitos da Criança e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Além disso, é importante utilizar o argumento dos retornos do investimento no DIPI, em especial para a formação da coalizão intraestatal. Essa coalizão tem o papel-chave de incidir na transição entre os governos, para manter a agenda do DIPI. Além disso, é importante gerar instâncias de cooperação entre os Estados nacionais. 13

4b) Lançar campanhas de comunicação em massa, persistentes e impactantes Em primeiro lugar, um ponto chave é lançar uma campanha regional maciça sobre a importância crítica do investimento no DIPI, baseada em evidências e que utilize tanto ações e meios tradicionais quanto alternativos (como os meios 3.0). Além disso, ela deve ser complementada com campanhas locais permanentes dirigidas a adultos envolvidos na criação de forma direta e indireta: pais, mães, avôs, cuidadores, docentes, médicos, advogados etc. 4c) Envolver as organizações da sociedade civil, coalizões e redes para gerar um processo de mobilização social forte, organizado, competente e validado Isso pressupõe convocar todas as organizações que trabalhem pelos direitos da primeira infância, seu fortalecimento e a criação de interações e redes entre elas, com outras redes e com o Estado. Também existe o interesse em promover um compromisso social empresarial com a primeira infância, incluindo ações de promoção da maternidade e paternidade desde uma ótica de corresponsabilidade. 14

Tema 5 Fortalecer a gestão do conhecimento sobre o Desenvolvimento Integral na Primeira Infância na região A falta de informação completa e pertinente sobre a primeira infância é um fator que limita o desenvolvimento de políticas públicas adequadas. É necessário enriquecer a produção de informação com a evidência internacional sobre o assunto e considerar o foco nos direitos para sua elaboração e utilização (tal como foi estabelecido no Tema 1). O avanço deve ser realizado em quatro pontos: 5a) Desenhar um sistema, com atribuição de responsabilidades e orçamento, para recolher a informação relativa ao DIPI O processo de levantamento das informações deve ser suficientemente amplo para contemplar as inequidades de gênero, socioeconômicas, regionais, étnicas e deficiências, entre outras. Além disso, deverá abordar a dimensão da qualidade, tanto dos serviços quanto das práticas de criação por parte das famílias e comunidades (interface com o Tema 3). Por isso, devem ser incluídos o diagnóstico e a medição do desenvolvimento infantil; o monitoramento da qualidade dos serviços de atendimento à primeira infância (com foco especial nos serviços direcionados às crianças de 0 a 3 anos); o monitoramento dos princípios e práticas de criação por parte das famílias; a avaliação do impacto das diferentes intervenções para o atendimento à primeira infância; a avaliação da escalabilidade das intervenções; a avaliação da integralidade no atendimento, monitoramento e avaliação das instâncias de articulação; estudos do custo-benefício das intervenções nas diferentes modalidades (e das consequências derivadas da não intervenção); os critérios de medição das despesas; e o registro (sistema de contas nacionais) e sistematização das experiências. 15

5b) Gerar processos de difusão dos resultados do monitoramento em diferentes públicos Isso implica um vínculo com a coalizão sociopolítica (Tema 4) para posicionar o tema do DIPI na agenda, definir dados orçamentários e de despesas e estabelecer metodologias de open data para a divulgação da informação recolhida (levando sempre em conta o respeito pelo direito das crianças no processo de divulgação). 5c) Promover o uso dos resultados para a investigação, a defesa e o aprendizado horizontal entre os países É necessário posicionar a investigação sobre a primeira infância nos sistemas de fomento à ciência e tecnologia. Um exemplo nesse aspecto é o Núcleo Ciência pela Infância (NCPI), do Brasil. 5d) Estabelecer mecanismos para o uso dos resultados na tomada de decisões, incluídas as orçamentárias, as políticas de atendimento e as de formação inicial, e no serviço dos profissionais do DIPI Isso implica, para os profissionais do DIPI, gerar espaços de reflexão sobre as práticas a partir da informação obtida, incluindo mecanismos de melhoria contínua. Por outro lado, para aqueles que decidem as políticas, significa contar com âmbitos de socialização dos resultados obtidos, com a faculdade de propor mudanças nas intervenções sobre essa base. 16

Mapa do percurso A Agenda das ações para a região da América Latina que foi apresentada traz diversas consequências para cada um dos países. Nesta seção, são propostos alguns dos desafios mais relevantes que possam surgir nos diferentes grupos de países e quais são as condições necessárias para superá-los. A importância do Desenvolvimento Integral na Primeira Infância (DIPI) é um assunto que já esteve presente na agenda de políticas públicas em muitos países da região e com diferentes níveis de comprometimento, mas não em todos. O primeiro ponto necessário para avançar na consecução do DIPI é o reconhecimento desse fato e trabalhar por sua presença prioritária na agenda governamental e também no debate público. A maioria dos países nos quais o DIPI não se encontra consolidado como prioridade apresenta uma multiplicidade de programas (frequentemente desarticulados) que são implementados sem o marco de uma estratégia integral. Portanto, é fundamental que a estratégia de incidência a ser proposta (pela coalizão sociopolítica estabelecida no Tema 4) para colocar o DIPI na agenda pública e governamental parta de uma concepção integral baseada no enfoque de direitos. As oportunidades, nesse caso, estão centradas em aprender a partir das experiências de outros países que já avançaram nessa direção. A solidez da composição e consolidação da coalizão sociopolítica e, especialmente, o peso relativo dos atores que façam parte dela serão fatores críticos para atingir o objetivo de priorizar, de forma efetiva, o DIPI. É importante notar que, embora, provavelmente, a coalizão sociopolítica tenha um papel muito mais visível nesse primeiro grupo de países, sua consolidação também é central naqueles países que já priorizaram o tema na agenda e estão implementando estratégias com pretensões de integralidade. A coalizão tem o papel-chave de respaldar o trabalho que for realizado em favor do DIPI em todos os países da região e, por isso, é um dos temas transversais na Agenda. Além disso, é um ator central na promoção da criação de processos participativos para a definição de metas e indicadores do DIPI, baseados num enfoque nos direitos (Tema 1 da Agenda). Posteriormente ou paralelamente, também é necessário reconhecer que vários países conseguiram priorizar (ao menos, discursivamente) o DIPI e consolidar estratégias integrais, mas que não são implementadas de forma compreensiva. Para esse conjunto de países, será fundamental avançar na criação ou na melhor gestão do fortalecimento das autoridades institucionais de articulação e, especialmente, promover um atendimento integral de qualidade para a primeira infância (temas 2 e 3 da Agenda). Nesse sentido, um aspecto central será afiançar a instância institucional proposta ou fortalecer-se como autoridade orçamentária real na atribuição dos recursos setoriais para o DIPI. A fortaleza dos diferentes setores envolvidos em trabalhos especializados deve ser um objetivo, mas será relevante posicionar a autoridade reitora como uma instância hierarquicamente superior que consiga, de forma efetiva, gerar 17

as articulações intersetoriais e entre jurisdições que forem necessárias para a implementação integral das estratégias do DIPI. Finalmente, aqueles países que conseguiram gerar e implementar estratégias integrais ainda têm desafios relacionados à sintonia fina das intervenções. É necessário fortalecer, na região, a gestão dos conhecimentos sobre o DIPI (Tema 5 da Agenda). Isso implica conhecer melhor o que funciona e como para que as políticas do DIPI sejam oportunas e adequadas. Esse aspecto está intimamente vinculado à definição de metas e indicadores do DIPI (Tema 1 da Agenda) que possam contribuir para determinar quais políticas (e com quais padrões de qualidade) podem assegurar, de forma mais eficiente, o direito das crianças ao pleno desenvolvimento. Em todos os países da região, independentemente do grau do avanço relativo alcançado, será fundamental que as políticas dirigidas à primeira infância estejam focadas no DIPI, o que não acontece sempre. Para tal, a gestão do conhecimento e as estratégias de incidência baseadas na evidência que surgir disso (temas 4 e 5 da Agenda) deverão ressaltar a relevância, a urgência e a injustiça que representa o desafio da desigualdade no acesso às oportunidades para o desenvolvimento infantil pleno. 18