Estratégias para a Implementação da Information Technology Infrastructure Library: um Estudo em Organizações do Setor Público



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Transcrição:

Estratégias para a Implementação da Information Technology Infrastructure Library: um Estudo em Organizações do Setor Público Resumo Autoria: Rebecca Oliveira Xavier Santos, Jairo Simião Dornelas A pesquisa, de abordagem exploratória e método qualitativo, utilizou-se da estratégia de estudo de casos múltiplos, em que foram selecionadas duas organizações públicas com implementações bem sucedidas da ITIL. A análise dos dados foi realizada através de análise de conteúdo com apoio do software AtlasTI. Os resultados permitiram identificar convergência para quatro principais fases treinamento, modelagem de processos, aquisição da ferramenta e implementação em que foram destacadas diferenças quanto à maturidade organizacional, aos recursos disponibilizados para a implementação e à infra-estrutura de TI, bem como à amplitude de atuação e ao foco da TI como área meio ou área fim. 1

1. Introdução Nas últimas décadas, o ambiente globalizado da economia e o ambiente de redes digitais que interligam indivíduos e organizações têm afetado os parâmetros nos quais se baseiam os modelos de gestão e de controle, impactando também a forma de gestão pública (KLISBERG, 1994). Nestes tempos, as organizações têm utilizado uma infinidade de modelos e técnicas de gestão de processos com vistas à obtenção de performance superior (SANTOS, 2003). Assim, o interesse por modelos de referência que auxiliem na redução de custos e riscos inerentes às mudanças dos processos passa a ser crescente no ambiente organizacional (HOCHSTEIN; ZARNEKOW; BRENNER, 2005a), inclusive na esfera pública. De fato, segundo Guimarães e Medeiros (2005), no complexo público a tecnologia da informação (TI) exerce papel crucial no modo como as organizações públicas cumprem suas principais funções numa feição gerencial de eficiência. Isso indica que a TI tem mudado a abordagem da gestão pública, configurando uma realidade na qual os cidadãos, empresas e demais atores sociais requerem acesso cada vez mais rápido, fácil e consistente às informações e aos serviços públicos (GUIMARÃES; MEDEIROS, 2005). Com isso, a utilização da tecnologia da informação na transformação dos processos internos do governo, na modernização dos instrumentos de gestão e controle e na entrega de serviços públicos, tornou-se condição essencial para a mudança de paradigma de eficiência do setor público (FOUNTAIN, 2001; PAVLICHEV; GARSON, 2004). Nesta ótica, os órgãos de TI são vistos como provedores de serviços tecnológicos, sendo desafiados a deixarem seu papel de desenvolvedores de aplicações e operadores de infra-estrutura orientados à tecnologia, para se tornarem fornecedores de serviços orientados a clientes, cidadãos e usuários (GALUP et al., 2007), que demandam funcionalidade da tecnologia o suporte de suas atividades dentro dos processos organizacionais (BRAUN; WINTER, 2007) e de transparência pública. Realmente, com a crescente pressão política de grupos de interesse e eleitores, a TI se tornou um grande fator na mudança também para as organizações públicas (THONG; YAP; SEAH, 2000) que começaram a transformar a maneira como o público interage com elas. A transformação provocada pela tecnologia da informação se tornou mundial e um investimento substancial tem sido feito para melhorias de infra-estrutura e entrega de serviços aos cidadãos (PAN; PAN; DEVADOSS, 2008). Tendo em vista a necessidade de aperfeiçoamento da oferta de serviços prestados pelo governo, os recursos de TI se tornaram instrumentos essenciais (BARBOSA et al., 2006) e aos poucos têm permeado as organizações governamentais e instituições em todos os níveis auxiliando os processos de armazenamento, análise e resgate de informações e desempenhando um importante papel no setor (BRETSCHNEIDER, 2003). Neste cenário, é ressaltada a importância da gestão mais eficiente da infra-estrutura da TI, do maior controle dos processos, da eliminação de tarefas redundantes, da flexibilidade na gestão da mudança, da melhor qualidade dos serviços de tecnologia da informação, sendo estes benefícios possíveis pela utilização de modelos de referência, dentre estes a biblioteca rotulada como information technology infrastructure library (ITIL) (CEITA, 2006). A adoção da ITIL por uma organização pressupõe que a área de tecnologia esteja baseada em processos e não seja vista apenas como centro de custos, com foco exclusivo em tecnologia. Da mesma forma, torna-se necessário, nesta visão, que a TI tenha o foco voltado para o cliente para o qual presta serviços e gera valor (MAGALHÃES; PINHEIRO, 2007). Assim, muitas organizações públicas têm adotado padrões tecnológicos como forma de melhorar o controle sobre seus processos e a eficiência no gerenciamento de seus serviços 2

de tecnologia da informação (CATER-STEEL; TAN, 2005; HOSHSTEIN; ZARNEKOW; BRENNER, 2005a; POLLARD; CATER-STEEL, 2009). A ITIL, uma dessas peças, é um modelo adaptável a diversos ambientes organizacionais, possibilitando a adoção de suas práticas nos diferentes tipos de organizações (MCLAUGHLIN; DAMIANO, 2007). Entretanto, segundo Pollard e Cater-Steel (2009), as publicações da ITIL não prescrevem como adotar, adaptar e implementar as práticas da biblioteca para torná-las parte de uma estratégia do gerenciamento de serviços. Por não haver esse guia prescritivo, com especificação das ferramentas a serem utilizadas para a coordenação dos esforços de implementação da ITIL, a organização que adota o modelo ITIL precisa adaptá-lo segundo seu ambiente e conforme requisitos específicos (LAWES, 2003) e segue a estratégia de implementação que considerar mais adequada (MOHAMED et al., 2008). Por estas razões, implementar modelos como a ITIL não é tarefa fácil, pois envolve tanto o processo de tomada de decisão dos gestores quanto transformações nos processos organizacionais, afetando equipes e sistemas (POLLARD; CATER-STEEL, 2009). Em seus estudos, Sharifi et al. (2008) concluem que nem toda implementação da biblioteca é bem sucedida e algumas organizações se desapontam com os resultados. Considerando que atualmente as falhas de TI podem causar, além de simples inconvenientes para os usuários em geral, verdadeiros transtornos para as funções organizacionais críticas (WAN; CHAN, 2008), implementar o gerenciamento dos serviços de TI de forma bem sucedida parece ser essencial para evitar tais falhas e prover um ambiente tecnológico adequado. Essa ausência de uniformidade nas estratégias de implementação da ITIL impulsionou o desenvolvimento do estudo apresentado neste artigo, pois se acredita que a falta de padronização, ou mesmo direcionamento, quanto às estratégias adotadas associada ao relativo desconhecimento dos gestores de TI sobre o que seja crítico neste processo representa um obstáculo ao bem sucedido desempenho dessas estratégias. 2. Visita à Literatura 2.1 Tecnologia da Informação no setor público A tecnologia da informação melhora os processos utilizados pela organização para obter seus produtos e serviços, oferecendo ferramentas que facilitam a comunicação interna e a coordenação dos processos entre as áreas da organização por meio da integração (GRAEML, 2000). Sallé (2004) afirma que a TI se tornou a espinha dorsal das empresas, auxiliando as organizações a desempenharem mais eficientemente suas atividades, a ponto de ser impossível para muitas delas funcionarem sem a presença da tecnologia. Por este motivo, as organizações têm investido na aplicação da tecnologia da informação aos processos organizacionais, visto que estes precisam ser adequadamente executados para possibilitar a oferta de produtos e serviços pela organização (GONÇALVES, 2000). No setor público, o gerenciamento dos recursos da TI é essencial para incrementar a oferta de serviços prestados pelo governo e para fortalecer os mecanismos de transparência, governança e responsabilização na administração pública (BARBOSA et al., 2006). No âmbito da administração pública, a TI tem como foco simplificar o uso dos recursos, aumentar a transparência na utilização dos recursos através da prestação de contas públicas e monitoramento da execução orçamentária, regulamentar as redes de informação, no que concerne à governança, certificação e tributação, melhorar a qualidade dos serviços públicos disponíveis e modernizar a gestão pública (BASGAL, 2005). 3

Neste contexto, o conceito de governo eletrônico, também conhecido por e- government, vem ganhando espaço da administração pública. O governo eletrônico visa fornecer e disponibilizar informações, serviços ou produtos, através do meio eletrônico sem restrições de hora e local de acesso, agregando valor a todos os cidadãos e organizações envolvidos com a esfera pública (ZWEERS; PLANQUÉ, 2001). Castor e José (2002) afirmam que a TI aplicada ao conceito de e-government tem o potencial de transformar vários processos simultaneamente, pois: possibilita uma melhoria significativa na prestação de serviços públicos, viabilizando o acesso do cidadão a serviços de diferentes organizações governamentais no mesmo local físico; auxilia as tomadas de decisão administrativas complexas por facilitar a tramitação de processos administrativos envolvendo diferentes áreas; modifica a logística dos governos na publicidade de intenções e decisões de compras e contratações do governo; viabiliza a modernização do processo político-administrativo mediante a facilidade de acesso aos atos e gastos dos governantes dada ao cidadão e às organizações intermediárias. Assim, as organizações do setor público são desafiadas a gerenciar eficazmente os recursos de TI alinhados aos objetivos organizacionais com o menor custo possível, associando a isto a necessidade de atender não apenas os reclames internos da administração pública, mas especialmente os anseios de uma população mais consciente de seus direitos (SILVA; OLIVEIRA, 2004). 2.2 Estratégias para implementação do gerenciamento da tecnologia da informação Ratifica-se, de início, que gerenciar um ambiente complexo e variado de infraestrutura da tecnologia da informação está se tornando cada vez mais um diferencial competitivo. Esse gerenciamento envolve o entendimento sobre o negócio, seus fatores críticos de sucesso e como desenvolver um portfólio de capacidades de TI em sinergia com esses pontos (KUMBAKARA, 2008). Sallé (2004) observou que o gerenciamento das funções de TI segue tipicamente três estágios de evolução em seu relacionamento com a organização: gerenciamento da infraestrutura, gerenciamento dos serviços e governança. A relação entre estes estágios está representada na figura 1. Objetivos organizacionais Governança de tecnologia de informação Gerenciamento da infra-estrutura de tecnologia da informação Gerenciamento e controle Gerenciamento dos serviços de tecnologia da informação Figura 1: Etapas da governança de tecnologia da informação 4

Fonte: Adaptado de Sallé (2004). Durante o estágio de gerenciamento da infra-estrutura, o foco é maximizar o retorno dos ativos computacionais e controlar a infra-estrutura, incluindo hardware, software e bancos de dados. Entretanto, quando as organizações avançam para o estágio de gerenciamento dos serviços, a atividade da função de TI identifica os serviços que os clientes necessitam e foca o planejamento e a entrega destes serviços de modo a garantir disponibilidade, performance e requerimentos de segurança. Adicionalmente, os acordos de nível de serviços contratos entre os clientes e o fornecedor sobre a garantia de desempenho do serviço (HANEMANN; SAILER; SCHMITZ, 2004) são gerenciados, tanto interna quanto externamente, a fim de alcançar os alvos de qualidade e de custos. Por fim, o estágio da governança se refere ao alinhamento da TI aos objetivos organizacionais que são usados na definição das metas, dos objetivos e das métricas de performance necessárias ao gerenciamento da TI. Neste estágio, os processos de auditoria são postos em prática para medir e analisar o desempenho organizacional. Sobre o relacionamento esboçado na figura 1, Peterson (2003) já afirmava que enquanto o domínio do gerenciamento de serviços tem foco no suporte eficiente e efetivo dos serviços e produtos de TI, a governança deve contribuir para as operações e performance da tecnologia da informação no momento atual e transformar e posicionar esta tecnologia para enfrentar os futuros desafios. O gerenciamento de serviços de tecnologia da informação constituiu o foco da pesquisa ora apresentada, visto que a biblioteca ITIL propõe a estruturação dos processos de suporte aos serviços e entrega dos serviços de tecnologia da informação. 2.3 Information Technology Infrastructure Library Desenvolvida no final da década de 1980 pelo governo britânico, mais precisamente pela sua secretaria de comércio, atualmente conhecida como Office of Government Commerce (OGC), a ITIL é uma biblioteca de gestão dos serviços de tecnologia que surgiu da necessidade de se ter processos organizados e claros na área de TI na esfera governamental (SALLÉ, 2004). Não obstante, devido a sua robustez, a ITIL tem sido usada para disseminar, de modo sistemático e coeso, as melhores práticas comprovadas de gerenciamento de serviços de tecnologia da informação (OGC, 2006). Conforme descrito por Brenner (2006), a primeira versão da ITIL foi publicada em 10 livros que continham orientações para o gerenciamento dos serviços de TI, considerando o suporte e a entrega dos serviços. Na versão 2 da biblioteca, os dois componentes fundamentais entrega de serviços e suporte aos serviços consistem, cada um, em cinco processos principais que a área de tecnologia das organizações deve considerar a fim de fornecer serviços de TI de qualidade a seus clientes (CATER-STEEL; POLLARD, 2008). A central de serviço, sexto elemento do suporte, não é considerada um processo e sim uma função de negócio (BRENNER, 2006). Já a versão 3 da biblioteca abrange cinco principais livros estratégia, desenho, transição, operação e melhorias contínuas e rearranja os processos para refletir o ciclo de vida dos serviços (GREINER, 2007). Contudo, mesmo após o lançamento da versão 3, a segunda versão continua sendo a mais implementada (POLLARD; CATER-STEEL, 2009), o que justifica o foco do presente estudo na versão 2 da ITIL. A figura 2 apresenta uma breve descrição de cada um dos processos desta versão. Na figura 2, é possível ainda observar a diferenciação que a ITIL faz entre o papel do usuário alguém que usa os serviços de TI e o papel do cliente parceiro contratual que celebra um acordo de nível de serviço com o órgão de TI, também conhecido como service 5

level agreement (SLA). O ponto de contato do cliente com a organização é o gerenciamento do nível de serviço, enquanto o do usuário é a central de serviços (BRENNER, 2006). Os processos de suporte aos serviços, que fazem parte do nível operacional, focam os usuários dos serviços de TI e têm como preocupação central assegurar que estes usuários tenham acesso adequado aos serviços como suporte às suas tarefas. Já os processos que compõem a entrega de serviços estão relacionados ao nível tático e são voltados para o planejamento do suprimento dos serviços de TI (TAN et al., 2007). Gerenciamento de incidentes Gerenciamento de problemas Gerenciamento de mudanças Gerenciamento da liberação Gerenciamento da configuração Central de serviços Gerenciamento do nível de serviço Gerenciamento financeiro Gerenciamento da capacidade Gerenciamento da continuidade Gerenciamento da disponibilidade Processos de interface com o usuário Reduz ou elimina os efeitos das perturbações potenciais ou reais nos serviços, garantindo o menor impacto possível ao trabalho dos usuários Investiga a infra-estrutura e todas as informações disponíveis para identificar a causa subjacente de falhas reais e potenciais na oferta de serviços Administra o processo de mudança com o objetivo de limitar o surgimento de erros e incidentes relacionados às mudanças Garante a qualidade do ambiente de produção usando procedimentos formais e verificações quando se implementam novas versões Verifica se as mudanças na infra-estrutura de TI foram registradas corretamente e monitora os componentes de TI para garantir a confiabilidade das versões existentes Atua como linha de frente para os outros departamentos e lida com muitas dúvidas dos clientes sem a necessidade de fazer contato com pessoal especializado Processos de interface com o cliente Visa encontrar um equilíbrio entre a oferta e a procura de qualidade, a facilidade de uso pelo cliente e os custos dos serviços Ajuda à área de TI no gerenciamento dos recursos de TI necessários para o fornecimento dos serviços a um custo compensador Fornece a capacidade exigida para o processamento e o armazenamento de dados no momento certo e de um modo compensador quanto ao custo Lida com os desastres que afetam os serviços e mantém os serviços para que o negócio continue a funcionar Fornece, com eficiência de custo, um determinado nível de disponibilidade do serviço que capacite o negócio a atingir seus objetivos Figura 2: Descrição dos componentes da versão 2 da information technology infrastructure library Fonte: Adaptado de OGC (2006) e Tan et al. (2007). A estrutura ITIL foi desenvolvida sobre os processos e práticas seguidos por muitas organizações do setor público e privado. Entretanto, conforme ressaltado por Kumbakara (2008), nem todos os seus processos são importantes para todas as organizações. Dependendo do tamanho, complexidade e de quão críticos são os serviços de TI para a organização, algumas partes da ITIL podem se apresentar mais importantes que outras e o conhecimento profundo da estrutura da ITIL é o que possibilitará a determinação dos processos relevantes. 2.4 Implementação da ITIL 6

Muitas organizações estão adotando ITIL com vistas à melhoria do gerenciamento de seus serviços de TI (CATER-STEEL; TAN, 2005). Entretanto, apesar dos direcionamentos oferecidos pela ITIL serem considerados cruciais para o processo de implementação (SHARIFI et al., 2008), aparentemente não há nenhuma abordagem padrão utilizada pelas organizações para este fim (CATER-STEEL; POLLARD, 2008). A ITIL não oferece táticas de implementação bem definidas e os mecanismos a serem usados são decididos pelos profissionais responsáveis por implementá-la. Mohamed et al. (2008) consideram este método muito interessante para a área de TI, especialmente por vir associado à liberdade para escolha e uso da criatividade e inovação. Acreditam que, ao introduzir flexibilidade no gerenciamento dos serviços de TI, o processo de implementação da ITIL torna possível o uso de fatores como cultura organizacional e a taxa de absorção do conhecimento, para que cada organização determine que processos deve priorizar, determinando a sequência de implementação dos dez processos e da central de serviços da biblioteca. Este escopo adéqua-se perfeitamente aos objetivos perseguidos no estudo realizado. Bartlett et al. (2001) recomendam que o gerenciamento da configuração, o gerenciamento da mudança e o da liberação sejam planejados e implementados em paralelo. Por outro lado, destacam que a implementação por sequência cronológica torna-se mais apropriada para organizações que possuem recursos limitados. Conforme afirmam Hochstein, Zarnekow e Brenner (2005b), não há uma forma que enquadre todas as soluções de desenho e implementação dos processos da ITIL para gerenciamento e entrega dos serviços de TI. Assim, cada organização pode adotar linhas de direção, princípios e conceitos da ITIL e adaptá-los ao seu contexto organizacional, independente da área de tecnologia da informação ser interna ou ser sedimentada em um provedor de serviço externo (KUMBAKARA, 2008). Gacek, Giese e Hadar (2008) consideram que, em sua essência, a ITIL não é uma infra-estrutura fixa, mas uma estrutura que permite a liberdade para expansão e adaptação conforme a necessidade. Esses autores afirmam que não existe uma única forma de implementação para ITIL, salientando que trata-se de uma arquitetura de referência conceitual e holística sobre o gerenciamento dos serviços de TI e não uma panacéia para resolver problemas de implementação de tecnologia da informação. 3. Proceder Metodológico Hart (1998) considera como pesquisas exploratórias aquelas que buscam satisfazer a curiosidade do pesquisador sobre um tema pouco pesquisado, proporcionando uma melhor compreensão do problema e do contexto, possibilitando ainda examinar a viabilidade do estudo e identificar sua relevância. Por abordar um tema cientificamente pouco explorado, com bibliografia escassa e sem teorias explicativas adequadas, até onde se pôde apurar, a pesquisa foi caracterizada como exploratória, embora com nuances descritivas. A escolha do método de pesquisa qualitativa foi feita por melhor se adequar ao tema discutido neste trabalho, tendo em vista que este diz respeito ao dinâmico e complexo processo de implementação de um padrão para TI em organizações públicas e à identificação das estratégias que se tornam elementos relevantes para descrever o fenômeno. Este método é justificado para pesquisas que envolvem estudos de fenômenos complexos que precisam ser exaustivamente analisados e para compreensão de situações nas quais a prática se antecipa à teoria (BENBASAT; GOLDSTEIN; MEAD, 1987). Já a estratégia adotada foi o estudo de caso, a qual direcionou os procedimentos metodológicos empregados. Considerando os tipos de projetos específicos para estudos de caso apresentados por Yin (2001), a pesquisa utilizou casos múltiplos, visto que não há a 7

presença de um caso decisivo que possibilite confirmar, contestar ou estender os conceitos e teorias existentes sobre o tema. Tão pouco há casos raros ou reveladores que exijam estudo de caso único. Por outro lado, o estudo visa examinar a natureza global de cada caso e, portanto, se qualifica como holístico. O desenho a seguir ilustra as etapas de operacionalização da pesquisa, descrevendo as atividades que foram realizadas, bem como as técnicas empregadas e os produtos obtidos em cada etapa. Seleção dos casos Novembro/2009 Contatos preliminares com gerentes e responsáveis pela implementação da ITIL Seleção dos entrevistados Elaboração do roteiro da entrevista Dezembro/2009 Pré-teste do roteiro da entrevista Janeiro/2010 Realização das entrevistas com os gestores e integrantes da equipe de implementação da ITIL Fevereiro/2010 Análise de conteúdo de cada caso Codificação Identificação Interpretação Março/2010 Análise comparativa dos casos Apresentação dos resultados encontrados Junho/2010 Figura 3: Desenho da pesquisa. 3.1 Os casos selecionados Como não existem regras para a seleção dos casos, Mattar (1996) sugere a escolha de casos que reflitam mudanças, uma vez que possibilitam a obtenção de dados com tal nível de profundidade que permitam caracterizar e explicar detalhadamente os aspectos singulares de cada caso em estudo. Visando atender aos objetivos da pesquisa, foram identificados no escopo geográfico do estado de Pernambuco, os casos pesquisáveis e, dentre eles, selecionados apenas aqueles que se apresentaram como casos de sucesso na adoção e implementação das melhores práticas da ITIL para o gerenciamento de seus serviços de tecnologia da informação, visto que a identificação de estratégias adotadas é interessante apenas para casos de implementação bem sucedida. 8

Também pesou na escolha, por conveniência, a acessibilidade da pesquisadora ao ambiente organizacional selecionado. Considerando os critérios de escopo e de conveniência da aplicação desta pesquisa foram então selecionados dois casos de organizações públicas que, apesar de distintos, se assemelham por apresentarem foco na prestação de serviços para a Fazenda, seja no âmbito nacional, que é o caso do Serviço Nacional de Processamento de Dados (SERPRO), seja no âmbito estadual, no qual se enquadra a Secretaria da Fazenda do Estado de Pernambuco (SEFAZ-PE). Vale ressaltar que, para estes dois casos, a implementação da ITIL foi iniciada em 2004. Visando possibilitar o incremento na análise dos dados, o quadro comparativo apresentado na figura 4 ressalta as principais diferenças entre os casos pesquisados e auxilia a compreensão e interpretação dos dados coletados através das entrevistas. SEFAZ SERPRO Área de atuação Estadual Federal Finalidade Arrecadação tributária Infra-estrutura tecnológica Gestão administrativa Subordinação governamental Autonomia administrativa Investimento em TI Parcial Total 3.2 Coleta e análise de dados Figura 4: Comparação dos casos selecionados. A definição dos instrumentos de pesquisa deve ser feita cuidadosamente, pois eles serão utilizados para a leitura da realidade, visto que o pesquisador está vinculado à produção de resultados que se aproximem ao máximo dessa realidade. Nas ciências sociais, o esforço do pesquisador é particularmente crítico, pois geralmente os fenômenos investigados medem o comportamento e a percepção dos indivíduos (HOPPEN; LAPOINTE; MOREAU, 1996). Neste sentido, para a aplicação desta pesquisa, foi selecionada como instrumento de coleta de dados a entrevista guiada, semi-estruturada e aberta, tendo por base um roteiro de questões que possibilitou ao entrevistado responder livremente à entrevista, numa tentativa de capturar a realidade da maneira mais honesta possível e conduzir do processo de tal modo que o mesmo pudesse ser refeito por outrem que queira retestar. O roteiro foi desenvolvido com base no referencial teórico, orientado principalmente pelas pesquisas sobre a implementação da ITIL abordadas no item 2.4, visando aumentar a comparabilidade dos dados e intensificar sua estruturação, conforme proposto por Flick (2004). A fim de garantir a validade das questões elaboradas para a entrevista, foi realizado um pré-teste que consistiu na realização da entrevista com um grupo de respondentes substitutos, com mesmo perfil e formação similar aos respondentes desejados, seguindo, portanto, os procedimentos recomendados por Cooper e Schindler (2003). A escolha dos entrevistados, para os dois casos, foi por indicação de gestores de TI responsáveis pela implementação da ITIL, através dos quais foi estabelecido o contato preliminar com a organização. Por acessibilidade, foram entrevistados presencialmente 6 profissionais, dentre analistas e gerentes de tecnologia da informação da SEFAZ e, por telefone, 8 coordenadores e gerentes de TI, bem como o superintendente de gestão de serviços do SERPRO. A aplicação das entrevistas foi realizada em paralelo nas organizações em estudo, no período de um mês, através de contato pessoal na SEFAZ e por telefone no SERPRO, visto que, nesta última organização, os responsáveis pela implementação da ITIL estavam 9

distribuídos em diversas cidades do país. Todas as entrevistas foram gravadas com autorização dos respondentes a fim de garantir maior fidelidade à análise dos dados coletados. Os dados foram analisados através da técnica de análise de conteúdo a qual consiste nas etapas de pré-análise, codificação, categorização e análise e interpretação dos dados (BARDIN, 1977). A pré-análise teve como documentos escolhidos as transcrições das entrevistas que foram gravadas para transcrição e análise através da técnica acima citada, possibilitando a categorização e o agrupamento dos dados, e auxiliando a definição de temas comuns às respostas e a posterior comparação com os temas propostos. A análise foi feita com apoio do software AtlasTI que, segundo Barry (1998), permite a visualização de diversos aspectos dos dados e de sua análise simultaneamente, possibilitando a identificação dos relacionamentos entre diferentes partes dos dados de forma a encorajar a criatividade e facilitar o reconhecimento de padrões. Neste software foram inseridas todas as entrevistas transcritas e realizadas as codificações com base em unidades de registro como palavras ou trechos significativos. A busca de significância entre as expressões contidas nos discursos dos respondentes permitiu a categorização dos dados conforme a figura 5 apresentada na discussão dos resultados. 4. Resultados Apesar de não haver uma prescrição para a adoção, adaptação e implementação das práticas da ITIL, conforme destacado na literatura por Pollard e Cater-Steel (2009), a análise comparativa das estratégias de implementação da ITIL, nos casos em estudo, permitiu identificar uma convergência para quatro principais fases o treinamento, a modelagem de processos, a aquisição da ferramenta e implementação desenvolvidas a partir de uma visão estratégica, conforme a figura 5. Destaca-se que as principais diferenças entre a estratégia adotada por cada organização estão relacionadas à maturidade organizacional, aos recursos disponibilizados para a implementação e à infra-estrutura de TI, bem como à amplitude de atuação e ao foco de TI como área meio ou área fim. As seções que seguem abordam a análise e comparação dessas categorias nos casos em estudo. 4.1 Treinamento A estratégia de implementação, para os dois casos, teve início com o treinamento de um grupo de trabalho, o qual envolveu pessoas de diversas áreas da organização selecionadas para participar de todas as etapas da implementação da biblioteca, sendo que foram constatadas diferenças quanto ao andamento desta etapa. Na SEFAZ, a formação da equipe de trabalho, bem como seu treinamento e capacitação contou inicialmente com o apoio e orientação de uma consultoria externa, devido ao baixo nível de conhecimento sobre a biblioteca. A equipe foi composta por pessoas da área de TI que detinham conhecimento dos processos que seriam afetados pela implementação da biblioteca e, por esta razão, puderam contribuir para a modelagem dos processos. Já para o SERPRO, esta etapa inicial teve como foco um treinamento intensivo, com realização de cursos presenciais e à distância, incluindo a certificação de algumas pessoas em ITIL, para que atuassem como coordenadores nas etapas de implementação. Foram ainda treinados líderes, chefes e formadores de opinião que, apesar de não trabalharem diretamente na implementação da biblioteca, atuaram como disseminadores dos novos processos 10

estabelecidos, contribuindo com o trabalho de sensibilização para os demais integrantes da empresa. Destaca-se que, nos dois casos, o trabalho colaborativo permitiu a identificação das práticas organizacionais e a verificação de sua adequação aos processos da ITIL, enquanto a existência de um comitê decisório, no SERPRO, possibilitou a discussão, elaboração e internalização dos processos. 4.2 Modelagem de processos As principais semelhanças identificadas na análise e comparação da modelagem dos processos para os casos em estudo referem-se à adaptação dos processos da biblioteca às necessidades organizacionais, bem como à priorização dos processos de suporte aos serviços de TI. Para os dois casos, a adaptação da biblioteca foi a principal dimensão vinculada à modelagem de processos, visto que optou-se por definir processos baseados nos conceitos da ITIL, mas adaptados ao contexto de cada organização. As organizações em estudo destacaram a importância de se considerar as práticas vigentes que foram identificadas através do conhecimento e experiência dos integrantes da equipe de trabalho. No SERPRO, devido sua área de atuação ser federal, a adaptação teve como objetivo a criação de práticas corporativas que considerassem o conhecimento adquirido das práticas segmentadas até então vigentes. Neste sentido ressaltou-se a importância do mapeamento dos processos realizado e da identificação das melhores práticas da empresa, ato que se revelou de grande contribuição para a etapa de modelagem, visto que nele foram identificadas diversas práticas locais eficientes, mas desconhecidas corporativamente. Este trabalho ocorreu de modo colaborativo, visto que a amplitude geográfica e a complexidade dos serviços prestados tornava necessário o envolvimento de pessoas de diversas áreas e localidades da empresa. Na SEFAZ, destaca-se que os processos adaptados foram documentados também com o apoio e orientação de consultores, buscando-se um ganho na qualidade da definição dos processos. 4.3 Aquisição da ferramenta Para a etapa de aquisição da ferramenta, em ambos os casos destacou-se a importância do levantamento de requisitos e da adaptação da ferramenta aos novos processos modelados. O levantamento de requisitos se faz relevante para a aquisição do software para operacionalização dos processos, visto que nas organizações públicas a contratação ocorre por processo licitatório que impede a livre escolha do software a ser contratado. Além das restrições no processo de compra, a substituição da ferramenta por outra que se apresente mais adequada também é dificultada pela regulamentação à qual organizações públicas estão submetidas. Assim, a possibilidade de a ferramenta se adaptar aos processos estabelecidos torna-se um dos requisitos fundamentais no processo de aquisição. Para os dois casos estudados, os requisitos para aquisição do software foram estabelecidos de forma colaborativa, através dos grupos de trabalho que atuaram na modelagem dos processos. Destaca-se, ainda, que a criatividade para adaptar a ferramenta adquirida foi considerada um fator muito importante para a implementação da biblioteca no SERPRO. 4.4 Implementação 11

A fase de implementação apresentou-se bastante divergente quando comparados os casos. Essas diferenças podem ser explicadas pelas características organizacionais bastante distintas, visto que, enquanto a SEFAZ utiliza a TI como meio para gerir adequadamente a arrecadação tributária, o SERPRO tem a gestão da TI como atividade fim. Isto possibilita ao SERPRO um maior nível de maturidade nos processos de TI, bem como a adequada infraestrutura de TI, que permitiram a implementação direta e independente de apoio de consultores externos. Após aquisição e adaptação da ferramenta de operacionalização dos processos foi iniciada a efetiva implantação com priorização, nos dois casos, para os processos de suporte aos serviços de TI, anteriormente modelados. A principal diferença consistiu na implantação dos processos, que na SEFAZ ocorreu por módulos, visto que a infra-estrutura tecnológica não permitia uma implantação total, enquanto no SERPRO foi realizada de forma direta, possibilitada por sua estrutura organizacional e tecnológica e pela existência de uma forte liderança. Para a secretaria, nesta etapa destacaram-se a importância da disseminação dos novos processos através de palestras apresentadas nas áreas afetadas pelas novas práticas e o trabalho de conscientização que permitiu diminuir as resistências à mudança. Já no SERPRO, uma empresa de grande porte e distribuída nacionalmente, foi necessário um trabalho estruturado de sensibilização, visando conscientizar todos os colaboradores dos benefícios que os novos processos trariam, principalmente quando estes fossem de encontro às práticas segmentadas. Decisão estratégica Planejamento estratégico Treinamento Modelagem dos processos Aquisição da ferramenta Implementação Consultoria Envolvimento das áreas Adaptação da biblioteca Documentação Priorização dos processos de suporte aos serviços de tecnologia da informação Levantamento de requisitos Adaptação da ferramenta Implantação por módulos Disseminação dos processos Trabalho de conscientização Certificação em Information Technology Infrastructure Library Comitê decisório Disseminadores dos processos Mapeamento dos processos Adaptação da biblioteca Práticas organizacionais Priorização dos processos de suporte aos serviços de tecnologia da informação Levantamento de requisitos Adaptação da ferramenta Implantação direta Sensibilização Gerenciamento de risco Liderança Figura 5: Análise comparativa das estratégias de implementação. 12

5. Considerações Finais Pôde-se constatar que efetivamente não há uma abordagem única e padronizada para implementação da biblioteca, conforme destacado na literatura por Cater-Steel e Pollard (2008).Entretanto, os resultados obtidos demonstram que em ambos os casos, as estratégias adotadas foram baseadas em quatro etapas principais: o treinamento da equipe, a modelagem dos processos, a aquisição da ferramenta e a efetiva implementação. A partir do levantamento das ações adotadas como estratégia, obteve-se a figura 4 que sintetizou as categorias criadas para a análise dos casos. Observa-se que, dentro de cada uma das etapas, foram destacadas as atividades realizadas para cada caso. Na etapa do treinamento da equipe destacou-se o trabalho colaborativo envolvendo pessoas de diversas áreas da organização, possibilitando a troca de conhecimento sobre as práticas organizacionais e a verificação da aderência destas práticas aos processos da ITIL, corroborando a possibilidade abordada por Kumbakara (2008) e Gacek, Giese e Hadar (2008) de adaptação da biblioteca ao contexto organizacional e ainda ratificando o uso da liberdade de escolha, criatividade e inovação previsto por Mohamed et al. (2008). A equipe de implementação também participou da aquisição da ferramenta. Verificouse que, uma vez que a contratação da ferramenta é baseada no processo licitatório, o levantamento de requisitos torna-se essencial para adquirir a ferramenta que melhor se adéque às práticas estabelecidas. Este fator, a princípio não referenciado no lastro teórico desta pesquisa é intrínseco ao setor público e relevante para a implementação da ITIL em organizações que atuem neste setor. Em meio às similaridades das estratégias adotadas, destacam-se duas categorias bastante distintas para cada caso: o uso de consultores e a implantação, por módulos ou direta. A contratação de consultoria externa foi utilizada apenas pela SEFAZ. O SERPRO identificou que seus funcionários tinham capacidade e experiência suficientes em implementação de tecnologias da informação, bastando, portanto, investir maciçamente em treinamento para que fosse adquirido o conhecimento específico sobre a biblioteca. Percebese que a diferença do nível de maturidade entre as organizações em estudo é a principal razão desta distinção de estratégias. A implantação dos processos da ITIL também foi diferente para os dois casos. Conforme previsto na literatura por Mohamed et al. (2008), o processo de implementação torna possível o uso da cultura organizacional, bem como do conhecimento da organização para que sejam determinados que processos se deve priorizar, determinando a sequencia de implementação. Sendo assim, a diferença de cultura e conhecimento organizacionais entre os casos selecionados contribuiu para as distintas práticas de implantação: a SEFAZ adotou a implantação por módulos, em que cada módulo correspondia a um processo; enquanto no SERPRO a implantação foi direta, ou seja, todos os processos entraram em execução concomitantemente. Conforme abordado no referencial conceitual, Barlettet al.(2001) destacam que a implementação sequencial torna-se mais apropriada para organizações que possuem recursos limitados, o que foi corroborado com o caso da secretaria. Já o SERPRO possuía uma infraestrutura adequada, tanto em termos tecnológicos como de pessoas, que permitiu enfrentar o desafio de implantar todos os processos em um único momento. Diante destes resultados, conclui-se que as estratégias são diferentes de fato. Ainda que identificada a convergência para quatro principais etapas, as características organizacionais inicialmente destacadas na figura 3 determinam as diferenças quanto à 13

cultura, à maturidade dos processos e à adequada infra-estrutura de TI, influenciando diretamente cada etapa da estratégia adotada. Limitações Nos estudos qualitativos, ainda que se busque o compromisso em desenvolver a pesquisa, aplicá-la e analisá-la com profundidade, não se pode negar a subjetividade das análises inerentes ao contexto de aplicação dos procedimentos metodológicos. A utilização de estudo de caso, ainda seja casos múltiplos, não permite a generalização dos resultados obtidos. Além disso, a própria escolha do caso pode estar sujeita a vieses inerentes ao pesquisador que afetem a análise dos resultados e não cobrem, de fato, todo o escopo de estudo. Quanto ao instrumento de coleta de dados, o roteiro da entrevista semi-estruturada foi elaborado pela pesquisadora com base no referencial teórico e nos objetivos a que a pesquisa se pretendia. Entretanto, apesar de submetido à validação de um pré-teste, é possível que haja restrições quanto à validade, visto não ser um instrumento amplamente aplicado e testado. A análise dos resultados, ainda que apoiada por software de análise de conteúdo, pode evidenciar a subjetividade como restrição, visto que apenas a pesquisadora procedeu com a identificação das categorias e interpretação das informações. Por fim, o tema abordado nesta pesquisa trata de estratégias para a implementação da ITIL em organizações públicas e é um tema ainda pouco explorado, dificultando comparações com outros estudos. Referências BARBOSA, A. F.; JUNQUEIRA, A. R.; DE LAIA, M. M.; FARIA, F. I. Governança de TIC e Contratos no Setor Público. Anais do Congresso Anual de Tecnologia da Informação. São Paulo: Fundação Getúlio Vargas, 2006. BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. BASGAL, D. O. E-gov: modernização da administração tributária municipal. X Congresso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de La Administración Pública, Santiago, Chile, out, 2005. BARRY, C. A. Choosing qualitative data analysis software: Atlas/ti and Nudist Compared. Sociological Research Online, v. 3, n. 3, 1998. BARLETT, J.; HINLEY, D.; JOHNSON, B.; JOHNSTON, D.; KEELING, C.; LIOYD, V.; MACDONALD, I.; MATHER, J.; MCLAUGHLIN, G.; RUDD, C.; WHEELDON, D.; YOUNG, R. Best practices for service delivery. London: The Stationery, 2001. BENBASAT, I., GOLDSTEIN, D. K., MEAD, M. The case research strategy in studies of information systems. MIS Quarterly, v. 11, n. 3, p. 369-386, 1987. BRAUN, C.; WINTER, R. Integration of IT Service Management into Enterprise Architecture. SAC 07, march, 2007. BRENNER, M. Classifying ITIL Processes: a taxonomy under tool support aspects. IEEE, 2006. BRETSCHNEIDER, S. Information Technology, E-Government and Institutional Change. Public Administration Review, v. 63, n. 6, p. 738-741, 2003. CASTOR, J.; JOSÉ, A. Atualizando o Modelo Administrativo Brasileiro As promessas e Perspectivas do Governo Eletrônico. XXVI Encontro Anual da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração. Salvador, setembro, 2002. 14

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