DISCURSO PROFERIDO PELO DEPUTADO GERALDO RESENDE (PPS/MS), NA SESSÃO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS, EM 13 / 04 / 2005. Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados, A tragédia que se abate sobre os índios Guaranis-Caiovás no Mato Grosso do Sul é um reflexo dos equívocos com que a questão indígena tem sido tratada no Brasil desde sempre. Os índios no Brasil passaram e ainda passam por choque cultural, social, lingüístico e espiritual. Eles não são brancos nem podem viver como índios. Nada pior para um ser humano do que esse esvaziamento da personalidade. Nada pior do que viver sem perspectivas, sem um substrato cultural reconhecido e valorizado que sirva de guia para uma vida produtiva e plenamente realizada. Nós, brancos, conduzimos os índios a uma vida de zumbis, uma vida nas sombras.
A realidade indígena tem sido a desestruturação das famílias, tradicionalmente grandes grupos de várias gerações morando juntas; a perda da identidade cultural e religiosa; a perda de sua língua e de suas tradições; tudo isso gera, a falta de perspectiva e a discriminação. Esses elementos também explicam a alta taxa de suicídios entre os índios: só nos últimos quatro anos 194 índios se mataram no Mato Grosso do Sul. Muitos índios vivem hoje de cestas básicas, verdadeiras esmolas do governo. O indígena tem pleno discernimento para repudiar isso; não é isso que ele quer ou precisa. Ora, crianças indígenas estão morrendo de fome ou de doenças causadas e agravadas pela desnutrição em todo o País. Os dados da Fundação Nacional de Saúde Funasa mostram entre 2003 e 2004, em 13 dos 32 Distritos Sanitários Especiais Indígenas DSEI, como são chamados os núcleos de saúde das reservas, a mortalidade infantil aumentou. Não é para menos, uma vez que a maioria dos índios no Brasil vive em aldeias sem sistema de saneamento básico, com esgotos a céu aberto e consumindo água contaminada. No Mato Grosso do Sul, segundo a Funasa, existe Sistema de Água em 100% das Aldeias, contudo,
estranhamente, isso não significa que a água efetivamente chega às famílias. A precariedade das condições de vida de muitas tribos e a falta de ações de saúde dirigidas traz graves conseqüências, como a disseminação de doenças, o consumo de álcool e até o suicídio. Assim, a expectativa média de vida dos índios é de 42,6 anos, enquanto os nãoíndios vivem em média 68 anos. Os indígenas têm índices de mortalidade infantil, em média, maiores do que não-índio. Enquanto o País apresenta média de 24 por mil nascidos vivos, entre os índios essa média em 2003, entre todas as tribos foi de 48,5 por mil. O maior índice entre indígenas, em 2004, foi na área de Parintins, entre Amazonas e Pará. A segunda região com maior problema é entre os xavantes, em Mato Grosso, onde morreram 32 bebês no ano passado, a maioria por doenças ligadas à desnutrição. Os guarani-caiovás aparecem apenas 19.º na lista da Funasa. Segundo os dados oficiais, morreram 54 bebês em 2004, mas como o número de crianças ali é grande (1.534 registradas), o índice de mortalidade é menor que em outras regiões. Como se vê, esse problema histórico não é concentrado nos guarani-caiovás. Nota-se também foco entre Caingangues, no Rio Grande do Sul e entre Pataxós da
Bahia, onde 50% das crianças até 5 anos estão subnutridas ou abaixo do peso. Hoje, em Dourados, há quase 40 crianças guarani-caiová internadas no Centro de Recuperação Nutricional da Reserva Indígena local. Desde que medidas emergenciais se iniciaram para combate à desnutrição, o número de internações caiu de 12 por semana em fevereiro para quatro nas duas primeiras semanas de março, porém as mortes não cessaram. O que vemos agora é um debate evasivo e demagógico de algumas autoridades, sobre a desnutrição dos índios. Uma discussão inútil que desvia o foco da questão. A desnutrição do índio é também de atenção governamental, desnutrição de saneamento; desnutrição de cumprimento das promessas; o índio também está carente de terra e de condições para plantar. Vejam: sementes chegam atrasadas às aldeias, fora da época do plantio. O governo do Mato Grosso do Sul, alega que as licitações atrasam a compra e a entrega de sementes. De seu lado o Fome Zero Indígena mandou 150 pintinhos para a aldeia em outubro passado. A metade morreu.
A situação do índio no Brasil requer ação urgente e não meras palavras. A que fator atribuir as mortes de crianças indígenas em Dourados a não ser a políticas indigenistas equivocadas e perversas ao longo dos anos? O próprio presidente da Funai informa que, em Dourados 11.500 guaranis-caiuás ocupam 3.540 hectares. É evidente a desproporção. Ele denunciou ainda o arrendamento de parte dessa terra por um grupo de índios, o que diminui a área das aldeias. Segundo consta a Funai trabalha na regularização de 35 terras indígenas em Mato Grosso do Sul. O Governo precisa corrigir os erros do passado e assumir os custos políticos e financeiros dessas ações. No programa de governo 2002 coligação Lula presidente, na parte "Compromisso com os povos indígenas", o presidente dizia que o Índio (com i maiúsculo) não pode mais ser visto como um elemento exótico, um "incômodo, ou obstáculo ao desenvolvimento, ou mesmo um mero objeto de piedade, paternalismo e caridade". Infelizmente, isso parece hoje ser letra morta, pois é exatamente como objeto de paternalismo e caridade que o índio tem sido tratado nesse governo. A lucidez, capacidade e resolução no trato com a questão indígena de que fala o programa, ainda não vimos.
Um dos títulos do referido programa de governo para a área indígena é "um quadro lamentável". Lamentável é que a situação continue a mesma. Esperamos que o governo envide os esforços prometidos para mudar a situação. Sala das Sessões, em de abril de 2005. Deputado GERALDO RESENDE PPS/MS