Questões de graus de equivalência lexical entre português, inglês e espanhol no domínio da Dermatologia



Documentos relacionados
Energia Eólica. Atividade de Aprendizagem 3. Eixo(s) temático(s) Ciência e tecnologia / vida e ambiente

ENSINO DA TERMINOLOGIA DO TURISMO: BUSCA DOS TERMOS EM INGLÊS RELATIVOS A EQUIPAMENTOS USADOS EM TÉCNICAS VERTICAIS PARA ELABORAÇÃO DE GLOSSÁRIO

Vídeo Institucional: PETCom Internacional 1

DIFICULDADES NA COMPILAÇÃO DE UM CORPUS DE LÍNGUA ESPANHOLA

Renata Aparecida de Freitas

Estruturando o Pré Projeto

A PERCEPÇÃO DE JOVENS E IDOSOS ACERCA DO CÂNCER

SIE - SISTEMA DE INFORMAÇÕES PARA O ENSINO CADASTRO DE FUNCIONÁRIOS

III SEMINÁRIO EM PROL DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA Desafios Educacionais

PÓS-GRADUAÇÃO ENAF/DESENVOLVIMENTO SERVIÇOS EDUCACIONAIS MANUAL PARA ELABORAÇÃO DO TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO (TCC)

XI Encontro de Iniciação à Docência

ALTERNATIVAS APRESENTADAS PELOS PROFESSORES PARA O TRABALHO COM A LEITURA EM SALA DE AULA

CONSTRUÇÃO DE QUADRINHOS ATRELADOS A EPISÓDIOS HISTÓRICOS PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA RESUMO

XI Jornada Científica. Maria da Graça KRIEGER Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), Brasil Grupo TermiLex

Ficha Terminológica Informatizada: etapas e descrição de um banco de dados terminológico bilíngüe. Guilherme Fromm 1

AS CONTRIBUIÇÕES DO SUJEITO PESQUISADOR NAS AULAS DE LEITURA: CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS ATRAVÉS DAS IMAGENS

UNIVERSIDADE PAULISTA CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA

Cadernos do CNLF, Vol. XVI, Nº 04, t. 3, pág. 2451

PIBID: DESCOBRINDO METODOLOGIAS DE ENSINO E RECURSOS DIDÁTICOS QUE PODEM FACILITAR O ENSINO DA MATEMÁTICA

ENSINO DE CIÊNCIAS PARA SURDOS UMA INVESTIGAÇÃO COM PROFESSORES E INTÉRPRETES DE LIBRAS.

Teste de Software: Um Breve Estudo do Importante Processo no Desenvolvimento de Softwares

ESPAÑOL, POR EXEMPLO RESUMO

INTERPRETANDO A GEOMETRIA DE RODAS DE UM CARRO: UMA EXPERIÊNCIA COM MODELAGEM MATEMÁTICA

Aula10 PEOPLE OF DIFFERENT KINDS. Fernanda Gurgel Raposo

As decisões intermédias na jurisprudência constitucional portuguesa

Desenhando perspectiva isométrica

Estudo Exploratório. I. Introdução. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Pesquisa de Mercado. Paula Rebouças

TÍTULO: Entendendo a divisão celular. NÍVEL DA TURMA: 1º ano do ensino médio. DURAÇÃO: 1h e 80 minutos (3 aulas)

CENTRO PAULA SOUZA FACULDADE DE TECNOLOGIA DE FRANCA. Dr. THOMAZ NOVELINO DIGITE NOME. TÍTULO (DIGITE: TEXTO FORMATADO) Subtítulo (use se necessário)

Exercícios Teóricos Resolvidos

ED WILSON ARAÚJO, THAÍSA BUENO, MARCO ANTÔNIO GEHLEN e LUCAS SANTIGO ARRAES REINO

Leishmaniose visceral: vacina europeia traz fórmula inovadora

IMPLANTAÇÃO DA FERRAMENTA LINHA DE BALANÇO EM UMA OBRA INDUSTRIAL

Apresentação. Cultura, Poder e Decisão na Empresa Familiar no Brasil

4.1. UML Diagramas de casos de uso

PROGRAMA ASSOCIADO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA UPE/UFPB

SÓ ABRA QUANDO AUTORIZADO.

DE ARTIGO CIENTÍFICO

MODELAGEM MATEMÁTICA: PRINCIPAIS DIFICULDADES DOS PROFESSORES DO ENSINO MÉDIO 1

ROTEIRO DE RECUPERAÇÃO DE CIÊNCIAS

ITINERÁRIOS DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: O ESTÁGIO SUPERVISIONADO E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA

Pesquisa das Características e motivação de consumidores de produtos do Comércio Justo e Solidário

MATEMÁTICA FINANCEIRA BÁSICA

Relatório: Os planos do governo equatoriano: incentivo ao retorno da população migrante 38

Classificar poliedros identificando-os pelos nomes.

1. APRESENTAÇÃO. Cartilha do ENADE. Caro estudante,

Guia de utilização da notação BPMN

Cotagem de dimensões básicas

Aprendendo, de uma forma lúdica, o sistema monetário - Jogo da caixa C.E.I.PROFª DULCE DE FARIA MARTINS MIGLIORINI

Dúvidas Freqüentes IMPLANTAÇÃO. 1- Como aderir à proposta AMQ?

COMO REDIGIR ARTIGOS CIENTÍFICOS. Profa. EnimarJ. Wendhausen

Dicas para elaborar um relatório científico

Palavras-Chave: Sistema de Posicionamento Global. Sistemas de Localização Espacial. Equação de Superfícies Esféricas.

ENSINO E APRENDIZAGEM DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS, COM A UTILIZAÇÃO DE JOGOS DIDÁTICOS: RELATO DE EXPERIÊNCIA.

5 Considerações Finais 5.1 Conclusão

O princípio multiplicativo

Sistemas Lineares. Módulo 3 Unidade 10. Para início de conversa... Matemática e suas Tecnologias Matemática

GESTÃO COLETIVA NO AMBIENTE DIGITAL

Astra LX Frases Codificadas Guia para o processo de Configuração de Frases Codificadas no Programa AstraLX.

Análise e Desenvolvimento de Sistemas ADS Programação Orientada a Obejeto POO 3º Semestre AULA 03 - INTRODUÇÃO À PROGRAMAÇÃO ORIENTADA A OBJETO (POO)

FALSOS COGNATOS FRANCÊS-PORTUGUÊS ENTRE TERMOS DE ESTATUTOS SOCIAIS

A INFLUÊNCIA DOCENTE NA (RE)CONSTRUÇÃO DO SIGNIFICADO DE LUGAR POR ALUNOS DE UMA ESCOLA PÚBLICA DE FEIRA DE SANTANA-BA 1

A PRESERVAÇÃO DOS ARQUIVOS NO MUNICÍPIO DE PALMITAL (SP)

LEVANTAMENTO SOBRE A POLÍTICA DE COTAS NO CURSO DE PEDAGOGIA NA MODALIDADE EAD/UFMS

SONDAGEM ESPECIAL PRODUTIVIDADE RIO GRANDE DO SUL. Sondagem Especial Produtividade Unidade de Estudos Econômicos Sistema FIERGS

IMPLANTAÇÃO DOS PILARES DA MPT NO DESEMPENHO OPERACIONAL EM UM CENTRO DE DISTRIBUIÇÃO DE COSMÉTICOS. XV INIC / XI EPG - UNIVAP 2011

1. Introdução. Avaliação de Usabilidade Página 1

Construção da Consulta. Para a construção da consulta, siga os passos abaixo:

Themis Serviços On Line - Publicações

Áudio GUIA DO PROFESSOR. Idéias evolucionistas e evolução biológica

Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União PARECER

OFICINA DE ESTRANGEIRISMO E O ALUNO DO ENSINO MÉDIO: PERSPECTIVAS E REFLEXÕES

UNIDADE III Análise Teórico-Prática: Projeto-intervenção

9 Como o aluno (pré)adolescente vê o livro didático de inglês

Essas são as perguntas que mais ouvi nesses vinte anos em que leciono:

A DESIGNAÇÃO DE TERCEIRIZAÇÃO NA REVISTA CARTA CAPITAL

1 Um guia para este livro

MANUAL DE TRABALHO INTERDISCIPLINAR TI - INTEGRADOR FAN CEUNSP

2 METODOLOGIA DA PESQUISA

Utilizando conceitos termodinâmicos na explicação de uma reação química

TREINAMENTO SOBRE PRODUTOS PARA VENDEDORES DO VAREJO COMO ESTRATÉGIA PARA MAXIMIZAR AS VENDAS 1. Liane Beatriz Rotili 2, Adriane Fabrício 3.

Organização em Enfermagem

ESAPL IPVC. Licenciatura em Engenharia do Ambiente e dos Recursos Rurais. Economia Ambiental

O QUE APORTAM E O QUE OCULTAM AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NO ENSINO A DISTÂNCIA DA FURG: UM OLHAR SOBRE O CURSO DE PEDAGOGIA

RECURSOS DIDÁTICOS E SUA UTILIZAÇÃO NO ENSINO DE MATEMÁTICA

FATORES INOVADORES NA PRODUÇÃO TEXTUAL DE LÍNGUA ESPANHOLA

GRUPO DE ESTUDOS PREVENÇÃO AO USO INDEVIDO DE DROGAS

AS CONTRIBUIÇÕES DAS VÍDEO AULAS NA FORMAÇÃO DO EDUCANDO.

JOGOS ELETRÔNICOS CONTRIBUINDO NO ENSINO APRENDIZAGEM DE CONCEITOS MATEMÁTICOS NAS SÉRIES INICIAIS

Recomendada. A coleção apresenta eficiência e adequação. Ciências adequados a cada faixa etária, além de

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande d o Norte -IFRN acs@cefetrn.br

ESTENDENDO A UML PARA REPRESENTAR RESTRIÇÕES DE INTEGRIDADE

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DOS PROFESSORES DE MATEMÁTICA DO ENSINO MÉDIO DA ESCOLA ORLANDO VENÂNCIO DOS SANTOS DO MUNICÍPIO DE CUITÉ-PB

A Matemática do ENEM em Bizus

Bem-vindo ao curso delta Gerenciamento de peso para a versão 9.1. Este curso aborda a nova solução de peso introduzida nessa versão.

GUERRA FISCAL: SÃO PAULO E ESPÍRITO SANTO ICMS - IMPORTAÇÃO

Palavras-chave: Historiografia; Paraná; Regime de Historicidade; História Regional

Indicamos inicialmente os números de cada item do questionário e, em seguida, apresentamos os dados com os comentários dos alunos.

COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA DO CEARÁ

Transcrição:

Questões de graus de equivalência lexical entre português, inglês e espanhol no domínio da Dermatologia Ivanir Azevedo Delvizio 1, Lidia Almeida Barros 2 1,2 Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas Universidade Estadual Paulista (UNESP) São José do Rio Preto SP Brasil ivanir_ad@yahoo.com.br, lidia@lem.ibilce.unesp.br Abstract. In this paper we will analyze questions of linguistic equivalence (total) and correspondence (partial) between Brazilian Portuguese, English and Spanish terms in the domain of Dermatology. We will show in which level they bear total or partial identity with regard to the language level, usage or semantic extension. Keywords. Terminology, Bilingual Terminology; Lexical Equivalence, Dermatology. Resumo. Neste trabalho abordaremos questões de equivalência (total) e correspondência (parcial) entre termos em português, inglês e espanhol do domínio da dermatologia. Mostraremos em que grau mantêm relações de identidade total ou parcial no que se concerne ao nível de língua, ao uso ou à extensão semântica. Palavras-chave. Terminologia; Terminologia Bilíngüe; Equivalência Lexical; Dermatologia. Introdução Na pesquisa terminológica bilíngüe ou multilíngüe, o terminólogo deve encontrar, na língua de chegada (LC), um termo que possua identidade de sentidos e de uso com o termo da língua de partida (LP). Porém, observa-se que nem sempre o termo da LC recobre totalmente o campo de significação ou se situa no mesmo nível de língua ou possui os mesmos usos do termo da LP. Essas diferenças se devem, principalmente, ao fato de que uma mesma realidade extralingüística pode ser analisada de pontos de vista muito divergentes em línguas diferentes, a partir dos laços profundos e complexos que existem entre estrutura da língua e visão de mundo (Alpízar-Castillo, 1995, p. 102). No âmbito do projeto Vocabulário Multilíngüe de Dermatologia (VMD), coordenado pela Profª. Drª. Lidia Almeida Barros, desenvolvemos uma pesquisa, apoiada pela FAPESP, que consiste na busca de equivalentes em espanhol para um conjunto terminológico, em português, do domínio da Dermatologia. As questões que acabamos de levantar apresentaram-se em nossa pesquisa e pretendemos abordá-las neste trabalho. Vale ressaltar que, para verificar dados duvidosos entre esses dois idiomas, recorremos a um terceiro (inglês), que forneceu elementos preciosos à pesquisa, enriquecendo-a. Porém, Estudos Lingüísticos XXXIV, p. 1218-1223, 2005. [ 1218 / 1223 ]

antes de expormos dados concretos e práticos, consideramos importante discorrer sobre alguns aspectos teóricos de Terminologia Bilíngüe que fundamentam nossa pesquisa. Questões de Terminologia Bilíngüe Segundo Miguel Ángel Vega (1995, p. 65), a Terminologia possui uma primeira e fundamental aplicação intralingüística, que consiste na ordenação e sistematização de um conjunto de termos e seus respectivos conceitos, com o fim de delimitar com precisão o conteúdo conceptual de cada um desses termos e tratá-los de um ponto de vista lingüístico. Trata-se da Terminologia monolíngüe. A outra aplicação, a interlingüística, refere-se ao estudo comparado de termos pertencentes a duas ou mais línguas para a identificação de equivalentes. Esse trabalho auxilia o tradutor, entre outros usuários, disponibilizando, sob a forma de dicionários especializados ou bases de dados terminológicos bi- ou multilíngües, listas de termos equivalentes em diferentes idiomas, e facilita o intercâmbio de informações entre especialistas falantes de línguas diferentes. Trata-se da Terminologia Bilíngüe. Deve-se atentar para o fato de que o princípio básico que norteia a pesquisa terminológica bilíngüe é que fazer Terminologia não é fazer Tradução (Cabré, 1993, p. 246). De fato, como explica Rodolfo Alpízar Castillo (1995, p. 104), a busca de equivalentes não consiste na simples tradução literal do termo, o que poderia ocasionar a criação de termos artificiais, ou seja, que não corresponda à realidade lingüística do domínio em questão. Deve-se, depois de recolhidas as denominações que os usuários de uma língua empregam para se referirem a um conceito, identificar, na língua estrangeira, o termo equivalente, usado pelos especialistas para se referirem ao mesmo conceito. O terminólogo deve, portanto, encontrar, na língua de chegada (LC), um termo que possua identidade de sentidos e de uso com o termo da língua de partida (LP). Contudo, ao se compararem os conceitos existentes em um dado domínio em línguas distintas, observamos que nem sempre o termo de uma língua recobre totalmente o conceito designado em um outro idioma, havendo diferentes graus de equivalência lexical. Segundo Alpízar-Castillo (1995, p. 101) a correspondência entre termos de idiomas diferentes situa-se em um diapasão de possibilidades que vai desde o total recobrimento do conteúdo do termo da língua A por um da língua B, até a total falta de equivalências, passando por uma variada gama de recobrimentos parciais. De acordo com o autor, é possível, inclusive, que o próprio conceito não exista em alguma das línguas confrontadas (1995, p. 102). Robert Dubuc (1985, p. 55), por sua vez, distingue claramente equivalência e correspondência. Para o autor, equivalência é o termo que, na LC, exibe uma identidade completa de sentidos e de uso com o termo da LP, no interior de um mesmo domínio de aplicação. Já correspondência é o termo que recobre apenas parcialmente o campo de significação do termo de um outro idioma, ou que se situa em um nível de uso diferente de seu homólogo do outro idioma. Em nosso trabalho adotamos essa distinção e procuramos identificar a ocorrência de diferentes graus de equivalência terminológica. Estudos Lingüísticos XXXIV, p. 1218-1223, 2005. [ 1219 / 1223 ]

Casos de equivalência lexical na Dermatologia Analisaremos, agora, alguns casos que nos chamaram a atenção durante nossa pesquisa e que ilustram relações de diferentes graus de equivalência lexical entre termos da Dermatologia, nos idiomas português, inglês e espanhol. Hanseníase Na Antiguidade, o termo lepra era usado para designar diversas doenças da pele, especialmente as de caráter crônico ou contagioso e incurável. Na Dermatologia atual, esse termo designa uma doença infecciosa causada pelo Mycobacterium Leprae ou Bacilo de Hansen. Devido aos avanços da Medicina atual, possui tratamento. Ainda hoje, porém, esse termo carrega o estigma historicamente inerente ao seu nome, fortemente vinculado ao preconceito social (Faria, 2003). O mesmo ocorre com os termos lepra, em espanhol, e leprosy, em inglês. Como designações alternativas a essa existem os epônimos mal de Hansen (port.), enfermedad de Hansen (esp.) e Hansen s disease (ingl.). Porém, como pudemos atestar em nosso corpus textual de Dermatologia, esses termos são pouco utilizados nos três idiomas em questão. O português ainda dispõe do termo hanseníase para se referir à mesma doença. Esse é um termo científico e hoje é utilizado com o intuito de amenizar o estigma social que lepra impõe. Não foram encontrados equivalentes para esse termo nos outros dois idiomas. Assim, chegamos ao seguinte quadro de comparação terminológica: Português Espanhol Inglês a lepra lepra leprosy b mal de Hansen enfermedad de Hansen Hansen s disease c hanseníase Ø Ø Na linha (b) do quadro temos um caso de equivalência total, já que os termos designam o mesmo conceito, possuem o mesmo nível de língua e a mesma freqüência de uso (pouco usado) nos três idiomas em contraste. Na linha (a) os três termos se equivalem do ponto de vista etimológico, conceptual e quanto ao valor sociolingüístico (forma marcada). Entretanto, diferem-se quanto ao uso: em inglês e espanhol, respectivamente, as formas leprosy e lepra são freqüentemente utilizadas em obras científicas, como pudemos atestar em nosso corpus textual. Já em português, o uso do termo lepra em textos científicos é menos freqüente e não recomendado. Por isso, leprosy (ingl.) e lepra (esp.) não podem ser considerados como equivalentes totais de lepra (port.). No Brasil, a Lei nº. 9.010, de 29 de março de 1995, substituiu o termo lepra por hanseníase com a intenção de diminuir o preconceito em relação à doença. Conforme o art. 1º dessa, o termo Lepra e seus derivados não poderão ser utilizados na linguagem Estudos Lingüísticos XXXIV, p. 1218-1223, 2005. [ 1220 / 1223 ]

empregada nos documentos oficiais da Administração centralizada e descentralizada da União e dos Estados-membros. Tal substituição pode ser vista tanto nos tratados de Dermatologia, quanto na campanha nacional de prevenção a essa doença (A hanseníase tem cura). Esse termo, como se pode observar no item (c) do quadro, não possui equivalentes nos outros idiomas. Assim, poderíamos dizer que leprosy (ingl.) e lepra (esp.), que são equivalentes de fato entre si, são apenas correspondentes de hanseníase (port.). Do ponto de vista prático, porém, são equivalentes funcionais desse termo, já que as três unidades terminológicas são usadas em obras científicas (nos respectivos idiomas) para designarem o mesmo conceito. Cútis O termo pele (port.) designa o revestimento cutâneo de todo o corpo humano, enquanto o termo cútis (port.) designa especificamente a pele do rosto, possuindo, portanto, uma extensão menor do que o primeiro. O mesmo ocorre em espanhol entre os temos piel e cutis. Assim, podemos dizer que os pares pele / piel e cútis / cutis mantêm entre si uma relação de equivalência perfeita. Entretanto, o mesmo não ocorre no que concerne ao inglês, entre os pares skin e cutis. Segundo Fernando A. Navarro (1999), cutis é um latinismo utilizado em inglês e não corresponde ao que em português e em espanhol é chamado, respectivamente, de cútis e cutis (pele do rosto). Refere-se, ao contrário, ao revestimento do corpo todo, do mesmo modo que skin. Esta é a forma vernácula (inglesa) de cutis (forma erudita). Para designar a pele do rosto o inglês emprega o termo facial skin. Para melhor visualizarmos o que dissemos até o momento, vejamos o quadro abaixo: Conceito Português Espanhol Inglês revestimento do corpo pele piel skin, cutis pele do rosto cútis cutis facial skin Portanto, o latinismo cutis não possui os mesmos traços conceituais nesses três idiomas, sendo genérico em inglês (pele do corpo todo) e específico (do rosto) em português e espanhol. Nesses dois últimos idiomas são equivalentes, enquanto que, em relação ao inglês, são apenas correspondentes. Córion Em português e inglês os termos derme e dermis, respectivamente, designam a camada da pele subjacente à epiderme. Também são utilizados para designar esse mesmo conceito os termos córion (port.) e corium (ingl.). Porém esses últimos, conforme pudemos atestar em obras de Dermatologia nos dois idiomas em questão, possuem um uso menos corrente. Também observamos que, nos dicionários pesquisados, os verbetes de córion (port.) e corium (ingl.) remetem o leitor aos verbetes de derma (variante de derme) e dermis, respectivamente, tratamento dado às designações de menor uso. Vejamos os verbetes: Estudos Lingüísticos XXXIV, p. 1218-1223, 2005. [ 1221 / 1223 ]

corium n Anat. the dermis. (The Compact Oxford Dictionary, 1996) córion 1 EMBR nos répteis, aves e mamíferos, membrana celular que envolve o embrião e o saco vitelínico, e que, nos mamíferos placentários, se associa ao alantóide para formar a placenta 2 EMBR membrana acelular que reveste o ovo de diversos animais como peixes e insetos 3 HISTOL m.q. derma. (...) (Houaiss, 2001) Também é importante observar, para a análise que faremos a seguir, que além do conceito de derme, o termo córion, em português, também pode se referir à membrana embrionária ou ao revestimento do ovo. Com relação ao espanhol, também se dispõe do termo dermis para designar a camada cutânea. Contudo, o termo corion, em espanhol, que poderíamos pensar ser uma outra designação de dermis (esp.), recobre parcialmente o campo semântico de córion (port.), referindo-se apenas aos conceitos de envoltório embrionário e revestimento do ovo : corion m (Anat) 1 En los mamíferos: membrana exterior del embrión 2 En otros animales: Revestimiento del huevo (Seco, 1999) Portanto, em espanhol, a camada cutânea localizada abaixo da epiderme é chamada apenas de dermis (Navarro, 1999). Pelo fato dessas duas últimas acepções apresentadas pertencerem a um domínio exterior ao da dermatologia, área de interesse da pesquisa, resumiremos o que dissemos até o momento nos limitando ao conceito de derme : Conceito Português Espanhol Inglês camada cutânea subjacente à derme derme, derma dermis dermis córion, cório Ø corium Como podemos observar as unidades terminológicas derme (port.), dermis (ingl.) e dermis (esp.) mantêm entre si uma relação de equivalência perfeita, pois recobrem o mesmo conteúdo semântico (camada cutânea subjacente á derme) e possuem os mesmos níveis de língua (usados em obras científicas) e uso (freqüente). A mesma relação se estabelece entre os termos córion (port.) e corium (ingl.), sendo que seu uso é menos corrente. Entretanto, esses não possuem um equivalente perfeito em espanhol, já que corion (esp.) não possui o mesmo conteúdo semântico. Conclusão Por meio dos exemplos mencionados neste trabalho, verificamos que podem ocorrer diferentes graus de equivalência lexical entre séries sinonímicas de termos em diferentes idiomas e pode ocorrer até mesmo a ausência de um equivalente em algum deles. Como é o caso do termo hanseníase (port.) que não possui equivalentes (quanto ao uso e valor sociolinguístico) em espanhol e em inglês. O latinismo cutis, por sua vez, não possui os Estudos Lingüísticos XXXIV, p. 1218-1223, 2005. [ 1222 / 1223 ]

mesmos traços conceituais nos idiomas em questão, sendo genérico em inglês e específico em português e espanhol Vimos também o caso do termo córion (port.), corion (esp.) e corium (ingl.) que recobrem campos semânticos diferentes ou de forma parcial. Por isso, o terminólogo, ao elaborar obras terminográficas bi- ou multilíngües, deve ficar sempre atento aos diferentes recortes da realidade de cada língua e proceder a análises contextuais que evidenciem o uso, o conteúdo semântico e o nível de língua dos termos para estabelecer entre eles relações de equivalência ou correspondência. Referências ALPÍZAR-CASTILLO, R. Cómo hacer un diccionario científico-técnico?. La Habana: Félix Varela, 1995, p. 52-55, 104-105. CABRÉ, M. T. La terminología: teoria, metodologia, aplicaciones. Barcelona: Antártida, Empúries, 1993. THOMPSON, D. F. (ed). The Compact Oxford Dictionary. 1. ed. Oxford: Clarendon Press, 1996. DUBUC, R. Manuel pratique de terminologie. 2.ed. Québec: Linguatech, 1985, p. 57. FARIA, L. R. Hanseníase: histórico e perspectivas atuais. (26/09/2003). Disponível em: «www.hu.ufal.br.» Acesso em: junho de 2004 HOUAISS, A. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. Versão 1.0. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. NAVARRO, F. A. Glosario Dermatológico de dudas inglés-español. Madrid: Actas Dermo-Sifiliográficas, 1999. SECO, R., GABINO G., OLÍMPIA, P. Diccionario del Español Actual. Madrid: Grupo Santillana de Ediciones, S. A., 1999. VEGA, M. A. Terminología y traducción - Jornada Palatina de Terminologia. Barcelona, 1995, p. 85. Estudos Lingüísticos XXXIV, p. 1218-1223, 2005. [ 1223 / 1223 ]