1 Banco de dados e website da História Colonial Alagoana Alex Rolim Machado Graduando em História/Ufal Colaborador PIBIC GEAC Grupo de Estudos Alagoas Colonial Prof. Orientador: Antonio Filipe Pereira Caetano 1817. Data da emancipação política das Alagoas. Não foi um ato gracioso de um rei. As Alagoas já existiam como espaço físico, autônomo, com população, vida econômica e social diferenciadas do resto da Capitania de Pernambuco 1, pode-se somar a esse trecho também indícios de uma vida religiosa e uma administração militar Alagoana, de onde saiam documentos para o príncipe regente com assuntos diversos, em especial, requerimentos de patentes para postos militares das conquistas alagoanas. Como o de Ignácio Cardim de Oliveira, em 4 de novembro de 1799, escrevendo carta para a coroa portuguesa da região de Porto Calvo, pedindo confirmação de sua nomeação para o posto de Sargento Mor dos Forasteiros do Distrito de Porto Calvo, patente nomeada pelo o Capitão General de Pernambuco, Dom Thomás José de Melo. Nela, dizia: Senhor. Diz Inácio Cardim de Oliveira que pela Patente Junta foi nomeado pelo Capitão General de Pernambuco no posto de Sargento Mor dos Forasteiros do Distrito de Porto Calvo e porque dele deve haver confirmação de Vossa Alteza Real.Pede a Vossa Alteza Real seja servido confirmado no dito posto.(...) 2 Antes de tal requerimento ao príncipe regente da época, D. João, em 2 de outubro de 1794, Ignácio Cardim de Oliveira é nomeado ao posto de Sargento Mor dos Forasteiros do Distrito de Porto Calvo pelo Governador e Capitão General de Pernambuco, Paraíba e mais capitanias anexas, Dom Thomas José de Melo: 1 Lindoso, Dirceu. Interpretação da Província: estudo da Cultura Alagoana. Maceió: Edufal, 2005, p.96 2 Arquivo Histórico Ultramarino, Alagoas Avulsos, Documento 274, fl. 1
2 Dom Thomas Joze de Melo do Concelho de Sua Magestade Fidelissima Cavalheiro da Sagrada Religião de Malta chefe de Divizão da Armada Real Governador e Capitão General de Pernambuco, Paraibas e mais Capitanias anexas Etc. Faço saber aos que esta Carta Patente virem que havendo Respeito a concorrerem nas pessoas de Ignacio Cardim de Oliveira os merecimentos precisoz e necessarioz para exercer o Posto de Sargento Mor dos Forasteiros do destrito de Porto Calvo(...) Hey por bem na conformidade do Capítulo 20 do Regimento deste Reino nomiar /como por esta nomeyo/ ao dito Ignacio Cardim de Oliveira no Posto de Sargento Mor dos Forasteiros do destrito de Porto Calvo, com o qual Posto não haverá soldo algum, mas gozará de todas as honras, graças, franquezas, liberdades, privilégios, e izençoens que em raz[ao] delle lhe pertencem(...)e as pessoas suas subordinadas lhe obedeção e cumprão as suas ordens relativas ao Real serviço (...) 3 Pegando por base esse 2º fólio do documento, o pesquisador que queira estudar a promoção e a petição de cargos militares em Alagoas Colonial terá um vasto campo de informações, seja sobre quem está nomeando...dom Thomas Joze de Melo do Concelho de Sua Magestade Fidelissima Cavalheiro da Sagrada Religião de Malta chefe de Divizão da Armada Real Governador e Capitão General de Pernambuco Paraibas e mais Capitanias anexas Etc... e também sobre quem está sendo nomeado...ignacio Cardim de Oliveira... além dos envolvidos no processo. O pesquisador poderá saber sobre o cargo que o requerente está fazendo solicitação da carta patente, ou seja, o de...sargento-mor dos Forasteiros do distrito de Porto Calvo.... Poderão também ser ampliadas as pesquisas para as questões das regalias e suas respectivas faltas ao receber a patente, conforme foi dito no documento...não haverá soldo algum, mas gozará de todas as honras, graças, franquezas, liberdades, privilégios, e izençoens que em raz[ao] delle lhe pertencem... ; e também informações do poder do seu novo posto e sua autoridade...e as pessoas suas subordinadas lhe obedeção e cumprão as suas ordens relativas ao Real serviço... 4 Esse tipo material é importantíssimo para auxiliar nas pesquisas sobre a história de Alagoas, não de maneira completa, é claro, mas pelo menos (tomando o exemplo acima dado como motivo de pesquisa), sobre a história de Porto Calvo ou sobre algum acontecimento importante que mereça um aprofundamento maior durante a gestão de Ignácio Cardim de Oliveira enquanto Sargento-mor dos Forasteiros do distrito de Porto Calvo. Tais tipos de documentos e o trabalho sobre eles fazem com que a história de Alagoas colonial seja um assunto de interesse diferenciado e traz à tona mais indícios de 3 Idem, Ibidem, fl. 2 4 Idem, Ibidem, fl. 2
3 uma Alagoas peculiar e autônoma em sua administração em relação às suas localidades, trazendo a lume informações inéditas que podem ser cotejadas e aprofundadas. Para isso, é justamente este o objetivo do projeto Documentação, Poder e Administração em Alagoas Colonial (Séculos XVII-XVIII) que tem por intenção descortinar a malha política e administrativa alagoana durante dois séculos enquanto localidade submissa a Capitania de Pernambuco. Os resultados destas atividades, usando tais corpus documental, nos permite, por exemplo explorar/conhecer mais sobre estas distribuições de patentes na região, já que dos mais de 50 documentos transcritos, em torno de 10 tocam nos requerimentos militares. Tal conjunto documental pode ser usado para montar um perfil de análise nas questões militares e políticas na Capitania de Alagoas. Uma das Ações da pesquisa referem-se à transcrição dos 532 conjuntos documentais do catálogo de manuscritos avulsos referentes à Capitania de Alagoas e existentes no Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa. Os mesmos foram organizados pelo projeto Resgate e se acham em forma de documentos digitalizados, sendo hoje seu acesso feito através do Centro de Pesquisa e Documentação História da UFAL. Desta maneira, uma das intenções da pesquisa volta-se para a transcrição dos documentos referentes à Capitania das Alagoas dos séc. XVII e XVIII, compreendendo 297 corpus documental. O restante atribuído aos séculos seguintes, por enquanto, não farão parte da pesquisa, mas futuramente, também serão avaliados, transcritos e adaptados. Esses documentos são transcritos de maneira formal, como manda o Conselho Nacional de Arquivos, que se orientam através das (...) normas gerais de transcrição de documentação manuscrita (...) atualizadas, e reformuladas no II Encontro Nacional de Paleografia, realizado em São Paulo, em 1993 5. E logo depois são adaptados de maneira informal (com a grafia e formatação contemporânea). Como pode ser visto no documento anterior, a grafia ultrapassada e cheia de falhas e correções impossibilita uma leitura rápida do texto, fazendo com o que o leitor dobre a atenção, pois a formatação é isenta de parágrafos, o que faz, na maioria dos casos, o pesquisador ficar confuso e ter dificuldades de procurar alguma informação de seu interesse. Além da formatação, o documento apresenta uma grafia superada pelo tempo e que sofria constantes mudanças de acordo com a época, até porque: 5 Cf. Dias, Madalena Marques & BIVAR, Vanessa Santos Bodstein, Paleografia para o período colonial In: SAMARA, Eni de Mesquita. Paleografia e Fontes do Período Colonial. São Paulo: Humanitas/USP, 1986, p. 20
4 No século XVI, produziu-se no Brasil Colonial documentação caracterizada pela forma eclética de escrita. Assim, persistem documentos com formas gráficas uniformes e elegantes remanescentes da escrita cortesã lusa, especialmente a manuelina e joanina como documentos de escrita rápida e malcuidada, típica de escrivães apressados que não tinham formação caligráfica. Essa segunda tendência predomina no século XVII, e o rigor ortográfico nas escritas, que já era pouco, torna-se menor ainda. Para o século XVIII, por sua vez, assiste-se a uma progressiva retomada dos rigores ortográficos e caligráficos, que segue até meados do século XIX, quando a escrita cursiva torna-se similar à atual. 6 Levando isso em consideração, a título de comparação, segue um exemplo do mesmo documento, mas agora posto de modo adaptado, para melhor entendimento de suas informações. Dom Thomas José de Melo, do Conselho de Sua Majestade Fidelíssima, Cavalheiro da Sagrada Religião de Malta, Chefe de Divisão da Armada Real, Governador e Capitão General de Pernambuco, Paraíba e mais capitanias anexas etc. Faço saber aos que esta Carta Patente virem que havendo respeito a concorrerem na pessoa de Inácio Cardim de Oliveira, os merecidos precisos e necessários para exercer o posto de Sargento Mor dos Forasteiros do Distrito de Porto Calvo(...)Ei por bem na conformidade do capítulo 20 do regimento deste reino nomear (como por esta nomeio) ao dito Inácio Cardim de Oliveira no posto de Sargento Mor dos Forasteiros do Distrito de Porto Calvo, com o qual posto não haverá soldo algum, mas gozará de todas as honras, graças, franquezas, liberdades, privilégios e isenções que em razão dele lhe pertecem(...)e as pessoas, suas subordinadas, lhe obedeçam e cumpram as suas ordens relativas ao real serviço. 7 Percebe-se nesse novo documento, a diferença de leitura (mais rápida e ágil). Pode-se notar também que a principal característica da adaptação é a mudança da grafia e da formatação do texto, preservando o sentido original do mesmo, não sendo permitido assim nenhum tipo de mudança textual que possa afetar o documento. Por mais confuso que fique as articulações gramaticais, o projeto se compromete apenas com a transcrição informal do mesmo, ocasionando assim, a perda da numeração de cada linha e a formatação do texto por parágrafos, agilizando a procura particular de setores de prioridade pelo pesquisador (despachos, corpo principal, pareceres, 6 Idem, p. 19 7 Arquivo Histórico Ultramarinho, Alagoas avulsos, Documento 274, fl. 2 (Versão Adaptada)
5 assinaturas, etc.) evitando aquele bolo de palavras. Para melhor visibilidade, são também sinalizados todos os pontos de sic, borrões, dúvidas, e outros sinais do texto que para quem está transcrevendo insere nas transcrições para alertar ao leitor sobre problemas textuais. Ambas as transcrições fazem parte de um banco de dados (ainda em construção, com mais de 50 documentos transcritos e os respectivos já adaptados). Além do banco de dados, será feito um website com todas as informações e mais utilidades sobre esses estudos e pesquisas, com alas de documentos, artigos, guias de leituras e outras ferramentas, que poderão ser usados por pesquisadores, leitores, curiosos, e outras pessoas que queiram ler e se enveredar na história de Alagoas Colonial dos séc. XVII e XVIII. Apesar do exemplo prático, a intenção aqui foi mostrar apenas uma faceta dos documentos (nesse caso, os requerimentos de promoções para altos cargos). O banco de dados disponibilizará vários outros documentos que falam de assuntos diversos, sejam questões militares, petições religiosas, demarcações de territórios, projetos arquitetônicos, reclamações para os órgãos administrativos coloniais, promoções administrativas, troca, venda e atribuições de cargos, entrega de heranças, nomeações e petições nobiliárquicas, mudanças de moradia, financiamento de estudos e outros assuntos ainda desconhecidos pela historiografia alagoana por estes conjuntos documentais não terem ainda sidos transcritos, proporcionando uma dificuldade no trato sobre o passado colonial alagoano. Assim, o banco de dados ajudará em trabalhos de conclusão de cursos, artigos acadêmicos, obras fechadas, dissertações e teses de doutorado, proporcionando, talvez, a construção de um novo passado alagoano colonial, passado este que pode saber mais sobre a história do tal Ignácio Cardim de Oliveira, personagem do início desse texto, sendo assim, quem sabe, descortinarmos sua vida privada, sua atuação no cotidiano de Sargento Mor e sua família, sua formação familiar e intenção na realidade local. Como diziam os positivistas, o documento é o início do processo para se fazer história, mas acreditamos que cabe ao historiador, através da ampliação do acesso a essas fontes, montar, recortar, repensar e reavaliar seu passado.
6 Referências Bibliográficas e Documentais: LINDOSO, DIRCEU. Interpretação da Província: estudo da Cultura Alagoana. Maceió: Edufal, 2005, p.96 Arquivo Histórico Ultramarino, Alagoas Avulsos, Documento 274 Cf. DIAS, MADALENA MARQUES & BIVAR, VANESSA SANTOS BODSTEIN, Paleografia para o período colonial In: SAMARA, Eni de Mesquita. Paleografia e Fontes do Período Colonial. São Paulo: Humanitas/USP, 1986