A JORNADA DE TRABALHO NA PERSPECTIV ERSPECTIVA DA T EORIA DOS JOGOS
SIMONE BARBOSA DE MARTINS MELLO Analista Judiciária do Tribunal Regional da 2ª Região. Professora Convidada do MBA em Direito e Processo do Trabalho da FGV. Coordenadora do Curso de Pós-Graduação em Direito e Processo do Trabalho da UNINOVE Universidade Nove de Julho. Professora da Graduação e responsável pelo Núcleo de Direito do Trabalho na UNINOVE Universidade Nove de Julho. Mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP. Mestre em Direito Constitucional e Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela UNIFOR Universidade de Fortaleza. Membro da Asociación Ibero-americana del Derecho del Trabajo y de la Seguridad Social. A JORNADA DE TRABALHO NA PERSPECTIV ERSPECTIVA DA T EORIA DOS JOGOS
R EDITORA LTDA. Todos os direitos reservados Rua Jaguaribe, 571 CEP 01224-001 São Paulo, SP Brasil Fone (11) 2167-1101 www.ltr.com.br Janeiro, 2012 Versão impressa - LTr 4505.0 - ISBN 978-85-361-1989-2 Versão digital - LTr 7278.0 - ISBN 978-85-361-2077-5 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Mello, Simone Barbosa de Martins A jornada de trabalho na perspectiva da teoria dos jogos / Simone Barbosa de Martins Mello. São Paulo : LTr, 2012. Bibliografia 1. Desemprego 2. Jornada de trabalho 3. Teoria dos jogos I. Título. 11-09826 CDU-34:331.81 Índice para catálogo sistemático: 1. Jornada de trabalho na perspectiva da teoria dos jogos : Direito do trabalho 34:331.81
Sumário APRESENTAÇÃO... 7 INTRODUÇÃO... 9 CAPÍTULO 1 A TEORIA DOS JOGOS 1.1. CONCEITO... 11 1.2. A ORIGEM DA TEORIA DOS JOGOS... 12 1.3. ELEMENTOS ESSENCIAIS A UM JOGO ESTRATÉGICO... 15 1.4. CLASSIFICAÇÃO... 17 1.4.1. QUANTO AOS RESULTADOS... 17 1.4.2. QUANTO AO MODO DE INTERAÇÃO... 17 1.4.3. QUANTO AO NÚMERO DE INTERAÇÕES... 17 1.4.4. QUANTO À FORMA DE MOVIMENTAÇÃO... 17 1.4.5. QUANTO AO CONTEÚDO DA ESTRUTURA DO JOGO... 18 1.4.6. QUANTO À EXTENSÃO DA INFORMAÇÃO... 18 1.5. FORMAS QUE FIGURAM O JOGO... 18 1.6. TIPOS DE JOGOS... 20 1.7. ALGUNS JOGOS... 20 1.7.1. O DILEMA DOS PRISIONEIROS: COOPERAÇÃO VERSUS INTERESSE PRÓPRIO... 20 5
1.7.2. O JOGO DO GALINHA : COMPETIÇÃO DESTRUTIVA... 22 1.7.3. O JOGO DA CAÇA AO CERVO: CONTRATO SOCIAL (ROUSSEAU)... 22 CAPÍTULO 2 A JORNADA DE TRABALHO 2.1. ETIMOLOGIA E CONCEITO... 25 2.2. COMPONENTES DA DURAÇÃO DO TRABALHO DIA, SEMANA, ANO E VIDA... 26 2.3. A JORNADA NOTURNA... 28 2.4. HORA DE DESLOCAMENTO (IN ITINERE)... 30 2.5. A HORA EXTRA... 32 2.6. COMPENSAÇÃO DE HORAS... 35 2.7. TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO... 37 2.8. O TRABALHO EM TEMPO PARCIAL... 43 2.9. HORÁRIO FLEXÍVEL... 46 2.10. TEMPO RESIDUAL À DISPOSIÇÃO... 48 2.11. SOBREAVISO E PRONTIDÃO... 48 2.12. INTERVALOS... 50 2.13. A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS REFERENTES À JORNADA DE TRABALHO... 53 CAPÍTULO 3 A PROPOSTA DE REDUÇÃO DO TEMPO DE TRABALHO 3.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS... 61 3.2. EXPERIÊNCIA FRANCESA... 68 3.3. A REDUÇÃO DO TEMPO DE TRABALHO NO BRASIL... 75 3.3.1. PROJETOS DE LEI E PROPOSTAS DE EMENDA CONSTITUCIONAL NO BRASIL... 87 CONCLUSÃO... 95 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS... 97 6
Apresentação A teoria dos jogos é definida como um estudo das formas em que as interações estratégicas entre os jogadores visam a produzir resultados de suas preferências. No entanto, é preciso ter em mente que, neste jogo de interações, cada um dos jogadores poderá ganhar ou perder e ambos poderão ganhar ou perder. Simone Barbosa de Martins Mello, autora desta obra, de forma original, aplica a teoria dos jogos ao estudo das problemáticas do Direito do Trabalho e em especial à questão da redução da jornada legal de trabalho. Para tanto, a autora examina a experiência francesa e projeta sua reflexão sobre a realidade brasileira. Em 1998 a França reduziu a jornada legal de trabalho semanal de 40 para 35 horas, na expectativa de preservar e criar novos empregos, para dar eficácia ao princípio travailler moins pour travailler tous (trabalhar menos para todos trabalharem). Ora, a estratégia adotada pela França não resultou a recompensa social almejada, em que ambos os parceiros sociais deveriam ganhar, isto é, os trabalhadores com o aumento do nível de emprego e as empresas com o maior crescimento econômico-financeiro. Em 2008, a estratégia foi alterada, tendo a legislação francesa flexibilizado a jornada legal de 35 horas de trabalho semanal, ao possibilitar, pela negociação coletiva, a sua prorrogação com a realização de horas suplementares pelos trabalhadores, de modo que fosse atendido o novo princípio travailler plus pour gagner plus (trabalhar mais para todos ganharem). A seguir, a autora examina a realidade brasileira, em que os trabalhadores organizados reivindicam reduzir a jornada legal semanal de 44 para 35 horas. 7
Quais as estratégias que deveriam ser adotadas, para que ambos os parceiros sociais sejam compensados? Seria permitida a prorrogação da jornada legal de trabalho semanal pelo sistema de compensação do horário ou de horas suplementares? A implantação da redução da jornada legal de trabalho semanal seria progressiva e haveria diferenciação para as micro e pequenas empresas? É com satisfação que apresento esta obra de Simone Barbosa de Martins Mello, que é o resultado de sua pesquisa para a dissertação de mestrado, cujo título de Mestre em Direito conquistou, sob minha orientação, na Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Com certeza esta obra muito contribuirá, de forma complementar, para o estudo do Direito do Trabalho na busca da eficácia dos direitos fundamentais nas relações de trabalho, com a aplicação do princípio da proporcionalidade, tendo em vista os valores constitucionais da atividade empresarial, uma vez que a teoria dos jogos possibilita o exame da estratégia a ser adotada, também em relação à aplicação dos direitos fundamentais nas relações de trabalho, de modo que os parceiros sociais sejam devidamente compensados. Professor Doutor Renato Rua de Almeida Professor e coordenador do Núcleo de Pesquisa em Direito do Trabalho do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo 8
Introdução O tema da dissertação é proposto em decorrência da reiterada leitura de trabalhos e matérias publicadas em jornais, revistas e periódicos jurídicos que despertaram o interesse pela pesquisa sobre a teoria dos jogos, assim como sobre a jornada de trabalho. Verificou-se, na época, quanto é discutido o tempo de trabalho e quanto foram alteradas as leis que tratam de seus limites. Hoje há a compensação da jornada, o banco de horas, o turno ininterrupto de revezamento com jornada de seis horas, salvo negociação coletiva, a jornada móvel, a jornada flexível e o trabalho em tempo parcial (part time). E, atualmente, debate-se a redução da jornada de trabalho como uma das soluções propostas para a redução da taxa de desemprego. Para muitos, reduzir tempo de trabalho traduz-se na certeza de novos postos de trabalho. Daí decorre o questionamento, que se apresenta como problematização: é possível aplicar a teoria dos jogos na análise da jornada de trabalho? E, ainda: reduzir tempo de trabalho gera novos postos de trabalho? O tema possui relevância na medida em que a discussão é atual. Várias entidades representativas dos trabalhadores lutam pela redução da duração semanal do trabalho para que o trabalhador possa usufruir de seu tempo livre, como, por exemplo, para estar com a família. Em contrapartida a esse anseio, há a repercussão da crise econômica de 2008 que avassalou vários mercados. No Brasil, inclusive, há empresas que efetuaram a despedida coletiva e outras que reduziram salários (com diminuição proporcional de jornada). Portanto, reduzir jornada de trabalho sem redução de salário e sem uma contrapartida fiscal do governo não agravaria a situação? 9
Para a pesquisa foram utilizados materiais bibliográficos: livros, jornais, revistas e sites da internet. Buscou-se, na medida do possível, apresentar dados estatísticos atualizados. Nesse contexto, primeiro, foram abordados a teoria dos jogos, seu conceito, sua classificação, alguns tipos de jogos e a forma de sua aplicação. O Dilema dos Prisioneiros, que é bastante conhecido na área do Direito Penal, será resumidamente tratado e servirá para exemplificar o modo de aplicação da teoria no âmbito jurídico. Em seguida serão abordados a jornada de trabalho, a etimologia, o conceito, os componentes da duração do trabalho e os elementos que a compõem. A flexibilização também se apresenta como um aspecto importante, pois por meio desse movimento a jornada de trabalho foi afetada: banco de horas, trabalho em tempo parcial e horário flexível, por exemplo. Referidos aspectos serão tratados, também, na perspectiva da Teoria dos Jogos, mensurando os custos e benefícios sobre quem ganha e quem perde na negociação. A teoria dos jogos é importante para que o empregador possa analisar, com base em decisões anteriores, se de fato há benefícios em prorrogar a jornada normal de trabalho de um empregado que já possa estar desmotivado com o baixo salário. A proposta de alteração da Consolidação da Legislação do Trabalho, que acrescentaria em seu art. 618 a possibilidade de estabelecer condições de trabalho através de normas autônomas (acordos e convenções coletivas), prevalecendo o convencionado sobre o legislado, acarretou polêmica entre trabalhadores, juristas, políticos e sindicalistas de forma a levar ao seu arquivamento. Se aprovado, tal projeto traria maior flexibilidade quanto aos limites da jornada de trabalho, devendo ser respeitadas, no entanto, as determinações do art. 7º da Constituição Federal e as normas de segurança e medicina do trabalho. É de primaz importância as alterações nas normas trabalhistas para que essas fortaleçam os trabalhadores. Por fim, será abordada a matéria pertinente à redução da jornada como forma de reduzir o desemprego. Tratou-se da redução da jornada de modo geral, do processo de redução na França e do que se propõe no Brasil. Na França, onde o governo estabeleceu a meta de reduzir a duração semanal de trabalho para 35 horas, há um incentivo para as empresas que abrem novos postos de trabalho. Mas cada país deve achar o seu caminho, adotando seu modelo. Consabido que na França a redução da duração semanal não trouxe o resultado esperado e, por tal motivo, a regra foi revista, como se verá. Pela Teoria dos Jogos é possível analisar a decisão do governo Francês quanto a manter ou rever a Lei Aubry 35 horas. 10
Capítulo 1 A T A TEORIA DOS JOGOS Não é que as pessoas estejam contra você. É que elas estão a favor delas próprias. Gene Fowler, biógrafo e jornalista norte-americano (1890-1960) 1.1. C 1.1. CONCEITO A teoria dos jogos é aplicada em situações nas quais estejam envolvidas interações entre agentes racionais, que ajam com estratégia em busca de recompensa (pay-off) e que sejam passíveis de análise formal, como num jogo. Portanto, o agente deve atuar não só pensando em seus objetivos e em suas ações isoladamente; mas deve mensurar o objetivo do outro jogador e suas possíveis ações. É um jogo de interação, no qual (a) um dos jogadores poderá ganhar ou perder; (b) os dois poderão ganhar; ou (c) os dois poderão perder. A enciclopédia de Stanford conceitua a Teoria dos Jogos nos seguintes termos: Game theory is the study of the ways in which strategic interactions among rational players produce outcomes with respect to the preferences (or utilities) of those players, none of which might have been intended by any of them. (1) (1) Disponível em: <http://plato.stanford.edu/entries/game-theory/> Acesso em: 18.4.2010. Tradução: A teoria dos jogos é o estudo das formas em que as interações estratégicas entre os jogadores racionais produzem resultados no que diz respeito às preferências (ou aos utilitários) dos jogadores, nenhum poderia ter sido previsto por nenhum deles. 11
Para Gilmar de Melo Mendes, a teoria dos jogos é a disciplina matemática que, aplicada à economia, pretende descrever e prever o comportamento econômico. Muitas decisões no âmbito econômico dependem das expectativas que se tenha sobre o comportamento dos demais agentes. (2) Segundo Ronaldo Fiani, a teoria dos jogos ajuda a entender teoricamente o processo de decisão de agentes que interagem entre si, a partir da compreensão da lógica da situação em que estão envolvidos. (3) Alguns conceitos importantes: a) ação: não como atividade, mas como decisão. São as escolhas que o jogador pode fazer durante o jogo; b) estratégia: um plano de ações, determinando qual deverá ser sua ação a cada etapa do jogo; c) recompensa: aquilo que o jogador ganhou quando foi encerrado o jogo. Seu ganho será consequência de suas próprias escolhas e das de outros jogadores. A recompensa pode ser em valor monetário ou em utilidades. Morton D. Davis diz o seguinte sobre a teoria dos jogos e a teoria da tomada de decisões: The theory of games is a theory of decision making. It considers how one should make decisions and, to a lesser extent, how one does make them. You make a number of decisions every day. Some involve deep thought, while others are almost automatic. (4) A Teoria dos Jogos é aplicada em situações em que estão envolvidas duas ou mais decisões possíveis. A ação (decisão) deve ser tomada levando em conta a estratégia (com racionalidade) e com vista à recompensa (resultado) pretendida. A inovação da Teoria dos Jogos consiste em decidir pensando não só em suas ações e em seus objetivos, mas também nas possíveis ações e nos objetivos do outro jogador. 1.2. A ORIGEM ORIGEM DA TEORIA DOS JOGOS A dúvida é desagradável, mas a certeza é ridícula. Voltaire O primeiro a tratar dos elementos que acarretariam a evolução da teoria dos jogos foi o matemático francês Antoine Augustin Cournout (1801-1877), que em (2) Disponível em: <http://igc.infonet.com.br/imprimir.asp?codigo=6140&catalogo=5&inicio=30> Acesso em: 16.4.2010. (3) Op. cit., p. 9. (4) Game theory. A nontechnical introduction. Foreword by Oskar Morgenstern. New York: Dover, 1997. p. 3. Tradução: A teoria dos jogos é uma teoria da tomada de decisão. Considera como se deve tomar decisões e, em menor medida, o que se pode fazer delas. Você toma uma série de decisões a cada dia. Algumas envolvem uma profunda reflexão, enquanto outras são quase automáticas. 12
1838 publicou a obra intitulada Recherches sur les Principes Mathématiques de La Théorie dês Richesses. Nesse livro, Cournout não tratou especificamente da teoria dos jogos, mas trouxe aspectos do duopólio, que foi um exemplo de análise de equilíbrio em jogos não cooperativos, ou seja, no duopólio não há possibilidade de os agentes estabelecerem acordos acerca do seu comportamento durante a interação antes de ela ocorrer. Segundo o professor Ailton Guimarães: O modelo básico de Cournot mostra a interação de duas empresas que fabricam produtos homogêneos e, portanto, disputam o mesmo mercado. A análise é fundamentada na hipótese de que as empresas buscam maximizar seus lucros que, neste caso, serão seus payoffs ou suas recompensas. Devemos então encontrar a função de recompensa de cada uma e a partir daí chegaremos a seus lucros. (5) Deve-se ressaltar, no entanto, que alguns economistas, como Roger B. Myerson, julgam um equívoco considerar Cournot como o fundador da teoria dos jogos, embora ele tenha contribuído para a análise moderna do oligopólio. Para Antonio Rogério da Silva: Tudo começou quando o matemático e lógico alemão Ernst Zermelo (1871-1953) publicou um teorema que demonstrava a existência de uma estratégia para jogos como o xadrez, que assegurava a vitória ou ao menos o empate para o jogador que a tomasse em primeiro lugar. Jogos como o xadrez são aqueles nos quais os jogadores sabem todas as regras e os resultados possíveis, sendo que um deverá vencer, enquanto o outro perderá, ou ambos nada ganham com o empate, durante um número finito de rodadas. Assim, o xadrez é uma espécie de jogo cuja soma dos resultados do vencedor e do perdedor é igual a zero, com informação perfeita e rodadas definidas. Zermelo mostrou que seu teorema garantia que quem estivesse de posse de uma estratégia vitoriosa teria ao menos o empate em determinados tipos de interação, independentemente do que o outro adversário viesse a fazer. Zermelo logrou chegar a esse resultado no artigo Über eine Anmendung der Mengenlehre auf die Theorie des Schachspiels (Sobre uma aplicação da doutrina mista à teoria do jogo de xadrez, 1913). (6) Mas a efetiva elaboração da teoria dos jogos está diretamente relacionada ao matemático húngaro John Von Neumann (1903-1957). A primeira publicação sobre teoria dos jogos foi em 1928, com o trabalho intitulado Zur Theorie der (5) Disponível em: <http://www.fortium.com.br/faculdadefortium.com.br/ailton_%20guimaraes/material/ Teoria%20dos%20Jogos%20nota%20de%20aula%206.pdf> Acesso em: 16.4.2010. (6) Disponível em: <http://www.discursus.hpg.ig.com.br/moderna/teojogos.html> Acesso em: 16.4.2010. 13
Gessellschaftsspiele, pelo qual demonstra que a solução para jogos de soma zero pode ser determinada por técnicas matemáticas previamente estabelecidas. A teoria dos jogos foi desenvolvida posteriormente, em 1944, pelo livro The theory of games and economic Behavior, em que Neumann escreveu em conjunto com Oskar Morgenstern (1902-1977). Citando Bicchieri, Celia de Andrade Lessa afirma que sempre que o resultado de uma ação de um indivíduo depende das ações de outros, com quem este interage, na mesma medida em que depende de suas próprias ações (e os indivíduos estão cientes desta dependência), suas atividades demonstram um componente estratégico e, logo, se adequam à definição de Von Neumann-Morgentern de um jogo. (7) Segundo Ronaldo Fiani, embora tenha sido a pedra fundamental da teoria dos jogos, The theory of games and economic Behavior tinha uma limitação séria: o fato de se concentrar em jogos de soma zero. (8) E para ele essa não é a descrição adequada para um número de interações sociais: Como instrumento de análise das interações entre indivíduos e organizações na sociedade, em particular na economia, os jogos de soma zero se mostram inadequadamente restritivos. Era preciso encontrar ferramentas teóricas que permitissem analisar uma variedade maior de modelos de interação estratégica. (9) As ferramentas teóricas a que se refere Ronaldo Fiani foram, a partir de 1950, exploradas pelos matemáticos John Forbes Nash, John C. Harsanyi e Reinhard Selten, o que lhes trouxe o Prêmio Nobel de Economia de 1994. John Forbes Nash (10) (1928-), norte-americano, é considerado um dos mais importantes matemáticos do século XX. Ele não se contentou com os jogos de soma zero como a única forma de equilíbrio e a partir daí desenvolveu sua teoria. Segundo Sylvia Nasar, autora da biografia do matemático: Ele provou que, para uma determinada categoria muito ampla de jogos com qualquer número de jogadores, existe pelo menos um ponto de equilíbrio desde que sejam permitidas estratégias mistas. Mas alguns jogos têm muitos pontos de equilíbrio e outros, aqueles relativamente (7) LESSA, Celia de Andrade. Racionalidade estratégica e instituições. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 13, n. 37, 1998. (8) FIANI, Ronaldo. Teoria dos jogos: com aplicações em economia, administração e ciências sociais. 3. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. p. 36. (9) Op. cit., p. 36. (10) Cuja história foi contada no filme Uma mente brilhante, tinha apenas 21 anos quando escreveu seu trabalho sobre os jogos de estratégias cooperativas, em que defendia o que hoje chamamos de equilíbrio de Nash. Em 1948 foi para Princeton e em 1958 tomou posse em Massachusetts Institute of Technology (MIT). Por causa de sua esquizofrenia paranoica, perdeu seu emprego no MIT em 1959. Na década de 1970, quando sua doença estava sob controle, Nash voltou a trabalhar em pesquisas matemáticas. 14
raros que não se enquadram na categoria que ele definiu, talvez não tenham nenhum. (11) O equilíbrio de Nash é aquele que resulta do fato de cada jogador adotar a estratégia que é a melhor resposta às estratégias adotadas pelos demais jogadores. (12) Ou seja, em um jogo em que estejam dois ou mais jogadores, nenhum tem a ganhar mudando sua estratégia isoladamente. Desse modo, cada jogador concluirá que não é possível melhorar sua estratégia em razão das estratégias fixadas pelos demais jogadores (estratégias não podem ser alteradas). Segundo Marcelo Batuíra da Cunha Losso Pedroso: A sua genial observação levou à conclusão de que os jogos de soma positiva (quando todos os jogadores ganham) são os que mais ocorrem na interação humana, inclusive nas negociações econômicas. Isso resultou no que se chamou de Equilíbrio de Nash (Nash Equilibrium), segundo o qual, os indivíduos racionais selecionam estratégias que sejam as melhores alternativas para cada um, pois a seleção de tais conjuntos de alternativas beneficiará a todos ao mesmo tempo, não causando a nenhum jogador qualquer arrependimento da sua escolha. (...) O conjunto de estratégias racionais de cada jogador está em equilíbrio de Nash se sua implementação confirma as expectativas de cada jogador sobre a escolha dos outros. A ideia que está elíptica nesse conceito é a de que jogadores racionais não irão querer mudar suas estratégias se eles souberem o que cada um escolheu. (13) O equilíbrio de Nash consiste, portanto, na escolha de uma estratégia que manifeste a melhor opção diante da escolha dos outros. E, dessa forma, nenhum jogador ganhará mudando sua estratégia isoladamente. 1.3. E 1.3. ELEMENTOS ESSENCIAIS A UM JOGO ESTRATÉGICO TÉGICO São elementos essenciais para a caracterização da teoria dos jogos: o jogo, os agentes (jogadores), as interações, a racionalidade, o comportamento estratégico e a recompensa (pay-off). Inicialmente deve haver um jogo com regras claras e preestabelecidas para que seja possível a tomada de decisões. (11) NASAR, Sylvia. Uma mente brilhante. Tradução: Sergio Moraes Rego. Rio de Janeiro: Record, 2002. p. 122. (12) Op. cit., p. 36. (13) PEDROSO, Marcelo Batuíra da Cunha Losso. Liberdade e irrenunciabilidade no direito do trabalho: do estudo dos princípios a economic analysis of law aplicados ao direito do trabalho. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2005. p. 296. 15