A PRESENÇA ESTRANGEIRA NO MERCADO DE CAPITAIS BRASILEIRO



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Transcrição:

Carta da SOBEET ANO X - Nº 41 Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica Edição bimestral Os últimos anos têm testemunhado um notável ganho de dinamismo nos mercados de capitais brasileiros. Em movimento simultâneo com uma melhora substantiva dos fundamentos macroeconômicos e uma forte apreciação cambial, estes mercados vêm acolhendo um montante cada vez maior de capitais externos. A presença estrangeira nos mercados de capitais brasileiros é aqui qualificada e descrita, e sua importância, notadamente nas aberturas de capital mais recentes, pode ser vista como resultado de um movimento de maior fôlego iniciado com a abertura da economia, e solidificado com a prosperidade da economia mundial e a consolidação da estabilidade. Os indicadores da participação estrangeira mostram seu forte crescimento, tanto em fusões e aquisições de empresas domésticas como através da aquisição de ações em mercado aberto. Nas ofertas públicas de capital em mercado aberto, por exemplo, mais de 7% do volume total negociado ficou com investidores estrangeiros. A PRESENÇA ESTRANGEIRA NO MERCADO DE CAPITAIS BRASILEIRO 1. Introdução O substancial ingresso de fluxos financeiros de investidores estrangeiros nos últimos anos no Brasil já não é uma novidade. Desde os primórdios do processo de estabilização macroeconômica, a sociedade brasileira acostumou-se a debater os prós e os contras dos capitais externos e a eventual vulnerabilidade a que poderiam submeter a economia nacional. Hoje ainda podemos falar de capital especulativo e dos custos inerentes aos aportes de capital estrangeiro. Mas o fazemos em um cenário de recordes quebrados de entrada de investimentos estrangeiros diretos, de importantes investimentos de empresas transnacionais brasileiras em outros países e de ganho crescente de importância dos mercados de capitais. Os resultados das bolsas de valores brasileiras têm sido expressivos nos últimos anos. E a presença estrangeira nestes mercados também. Em meio a um processo mais amplo de abertura econômica, iniciada por sua vertente comercial, passando pelas medidas financeiras, o Brasil vem intensificando sua inserção na economia mundial. Nesse contexto, o presente o estudo tem como proposta central a de descrever a participação de investidores estrangeiros nos mercados de capitais brasileiros, notadamente em processos de abertura de capital e fusões e aquisições. Estes processos retratam a integração econômica entre empresas - principalmente de médio e grande portes - e economias. Como contribuição para a discussão acerca da magnitude da presença estrangeira nos mercados de capitais e sua importância, o texto propõe dois grandes tópicos de conteúdo: uma breve apresentação do panorama da abertura econômica; e a experiência brasileira no contexto da internacionalização do capital, particularmente nos casos de fusões e aquisições, e das ofertas públicas de capital, as IPOs. Na última seção, são feitas as considerações finais. 2. Abertura e internacionalização do capital no Brasil O processo de abertura econômica no Brasil assumiu um ritmo mais intenso desde o início da década de 199 tendo na dianteira a abertura comercial e apenas mais tarde medidas de abertura financeira. Já no final da década anterior, as medidas de abertura comercial, como a eliminação de barreiras tarifárias aceleraram a inserção do Brasil na economia mundial, ao mesmo tempo em que deram origem a uma profunda mudança no ambiente econômico interno. A realidade imposta pela nova dinâmica de funcionamento da economia brasileira a partir de então foi fundamental na determinação dos processos de concentração e centralização do capital. No início dos anos 199, com a generalização de medidas de abertura pelo mundo, notadamente nos países emergentes, a expansão dos mercados globais trouxe ao debate o caráter nacional das estruturas produtivas. 1

No caso brasileiro, o processo de abertura dos mercados veio em resposta à crise enfrentada nos anos 8, quando a inflação crônica e elevada foi o sinal mais forte e persistente. A abertura externa brasileira envolveu dois movimentos que ocorreram de maneira simultânea: por um lado, o aumento de importações, impondo ao mercado interno uma substancial intensificação da concorrência, favorecida também pela queda das barreiras tarifárias e pela sobrevalorização da moeda nacional; por outro, a expansão do total exportado pelo país, fazendo com que o empresariado desenvolvesse técnicas de produção mais eficientes, que permitissem a redução de custos e subseqüente competição no mercado externo. Esse conjunto de políticas esteve inserido no contexto da nova Política Industrial e de Comércio Exterior, uma vez que a recuperação do atraso industrial era vista como uma prioridade para a estabilidade econômica no médio e longo prazos. Assim, importantes modificações foram feitas na política comercial voltada ao exterior. Dentre estas medidas, a principal foi a eliminação de barreiras tarifárias, com a intensificação do programa de liberalização da política de importações (ver Gráfico 1). Este programa consistiu em eliminar não apenas as barreiras tarifárias, mas também reduzir e eliminar as barreiras não tarifárias (como reservas de mercado, quotas, proibição de importação de determinados bens, etc.), minorar o nível médio das tarifas aplicadas às importações, além de diminuir o grau de dispersão da estrutura tarifária. Em conjunto com a política de liberalização comercial, foi implementada uma política de competitividade, que tinha por principal objetivo apoiar o setor produtivo em seus esforços para elevar os níveis de eficiência e na busca por transformações, especialmente tecnológicas, dotando a economia brasileira de condições para enfrentar a maior concorrência com os produtos importados, que se beneficiaram da redução das barreiras tarifárias. Na prática, foram extintas as listas de produtos importados apenas sob a emissão de guias de importação, fazendo com que findassem os mais importantes controles quantitativos de importação. Permaneceram os controles tarifários, mas com tarifas cada vez menores, dando lugar a um sistema menos protecionista que culminaria, com o passar do tempo, numa economia aberta. Nesse meio tempo, procederam-se modificações de amplo alcance na economia. GRÁFICO 1 IMPORTAÇÕES TARIFA ALÍQUOTA LEGAL 1 (%) 7 6 5 4 3 2 1 1955 1957 1959 1961 1963 1965 1967 1969 1971 1973 1975 1977 1979 1981 1983 1985 1987 1989 1991 1993 1995 1997 1999 21 23 25 Fonte: IPEA - Elaboração: SOBEET 2 1 Alíquotas médias das importações brasileiras. Para maiores detalhes, recomenda-se consultar Castro, Cavalcanti e Cavalcanti (1997), além do sitio da Secretaria da Receita Federal.

O processo de abertura econômica impôs, seja de maneira forçada ou de forma indireta, uma reestruturação econômica e, mais precisamente, do processo produtivo brasileiro. Tal processo teve como principal objetivo o de dotar a economia brasileira de maior grau de dinamismo. Em decorrência disso, as empresas iniciaram sua busca por novas formas de organização produtiva condizentes com a nova realidade da economia brasileira: impuseram-se não apenas alterações nas formas de organização do trabalho e da produção, como também modificações nas relações entre empresas. A abertura comercial também proporcionou uma maior integração do país ao mercado financeiro internacional e aos fluxos de investimento estrangeiro direto. Com a liberalização financeira externa, a economia brasileira se integrou aos fluxos de capital em busca de novas fontes de aplicação nos países em desenvolvimento, mas também atraiu, a partir da década de 199, um substancial fluxo de capitais, triplicado neste período. Além disso, as mudanças na balança comercial brasileira acompanharam as mudanças no balanço de pagamentos. A abertura comercial e financeira, juntamente com a intensificação da atividade econômica interna (especialmente após o Plano Real), auxiliaram na deterioração das contas externas. Os investimentos diretos passaram, portanto, a financiar os crescentes déficits comerciais, situação que perdurou até a crise asiática, em meados de 1997. A partir de então, o país não mais conseguiu captar recursos suficientes para financiar os déficits do balanço de pagamentos, perdendo reservas e abandonando de vez o regime de câmbio adotado até então. Após a mudança da política cambial, em 1999, iniciouse uma fase muito propícia para as contas externas. Tal fase foi endossada pelo crescimento econômico mundial nos anos subseqüentes, que levou ao surgimento e amadurecimento de novos demandantes externos - reduzindo parcialmente a dependência da demanda norte-americana como propulsora da economia dos países emergentes. Soma-se a isso a desvalorização do dólar em decorrência dos elevados déficits norte-americanos e a recuperação moderada dos preços de commodities. É neste cenário econômico brasileiro que deve ser estudada a internacionalização do capital nos anos posteriores. A última década do século XX foi fundamental não apenas pelas condições externas, mas principalmente porque a economia doméstica tomou rumos muito diversos daqueles que até então vigoravam em nosso ambiente econômico. Por isso não é exagero entender o Plano Real como um divisor de águas, pois possibilitou a estabilização interna que permitiu a inserção da economia brasileira no mercado externo. Em economias abertas, um elemento fundamental para o bom funcionamento da mesma é a percepção que os investidores internos e externos têm dos fundamentos macroeconômicos e do ambiente institucional. A internacionalização do capital, seja tratada como conseqüência ou ainda como o desdobramento natural da abertura econômica dos países, evidencia uma nova realidade. A análise do cenário de uma economia que se encontre em um processo contínuo de internacionalização parece ser o melhor caminho para buscar uma definição do mesmo. De maneira geral, uma economia já inserida nesse processo se caracteriza, primordialmente, por fazer parte de um sistema de concorrência em nível mundial, competindo com empresas de todos os países, até aqueles mais pobres e menos desenvolvidos. A abertura econômica ocorrida a partir da década de 198 pode ser vista tanto como o princípio de um processo de internacionalização de capital, como um instrumento para chegar a tal. Junto com isso, um movimento de mundialização dos ativos evidenciou a importância da atração de capital financeiro pelas economias, e inseriu de forma mais marcante o elemento especulação e vulnerabilidade externa para determinadas economias, em especial as emergentes. O ingresso de capitais estrangeiros tem, evidentemente, influência direta sobre a atividade econômica doméstica. O cenário interno no Brasil, como mencionado, mostrouse favorável para o êxito da abertura comercial. Ademais, o sucesso do Plano Real no controle da inflação fez com que a economia brasileira se tornasse mais atrativa aos capitais externos, e propiciou seu amadurecimento não só no âmbito econômico, mas também nas esferas política e social. As condições externas também foram extremamente favoráveis para o processo de internacionalização do capital. O movimento de globalização, induzido especialmente pelos grandes conglomerados e empresas transnacionais, tornou premente a necessidade de integração dos países na grande economia. A internacionalização do capital só foi possível mediante um processo anterior de acumulação do mesmo. A acumulação do capital gerou, por sua vez, alterações na estrutura produtiva, no nível tecnológico, na velocidade da qualificação e renovação da mão-de-obra, aumento do consumo, expansão do setor de serviços, crescimento da economia informal, além da criação de grandes conglomerados financeiros. Todas essas mudanças alteraram a aparência e o formato de nossa economia ao longo das últimas duas décadas. 3

3. A experiência brasileira: IPOs, fusões e aquisições A experiência brasileira com a internacionalização da economia tem sido extremamente positiva. É fato que o processo de abertura comercial e o amadurecimento da economia brasileira dentro de um prognóstico altamente favorável de desenvolvimento econômico e financeiro dotaram-na de um novo dinamismo. Este fato se reflete não apenas nos dados da estabilização econômica, mas em toda a economia, pois, ao tentar internalizar os pressupostos de um novo modelo econômico baseado na internacionalização do capital, o país alterou de maneira radical a sua inserção na economia mundial. Em função disso, estimulou-se de forma crucial a liberalização econômica, financeira e comercial, juntamente com medidas que tornaram propício o ingresso de quantidades significativas de recursos estrangeiros, internacionalizando inclusive o processo produtivo. Em diversos setores da atividade econômica verificouse a elevação do grau de internacionalização do capital. Com o aumento da presença de empresas estrangeiras na economia, vários setores passaram para o controle de capitais externos. Este foi o caso da indústria de alimentos, o setor de informática, farmácia, limpeza, entre outros. Ao mesmo tempo, a redução paulatina do risco-país e um forte aumento do volume investido nos mercados de capitais do país ilustram esse ganho de dinamismo. Para uma visão panorâmica do processo, o Gráfico 2 ilustra a melhora na avaliação do país pelas agências internacionais em conjunto com o índice da Bolsa de Valores de São Paulo. Especialmente após as fases de maior incerteza e aversão ao risco em períodos de crises financeiras (final dos anos 199 e início da década atual) e na transição política brasileira de 22, a valorização das empresas de capital aberto ocorre concomitantemente com a redução do risco-país. As Cartas da SOBEET ao longo de 27 mostraram as várias faces da melhora nas condições externas do país: pelo desempenho comercial nos últimos dez anos, pela apreciação cambial e transformação estrutural do passivo externo. Ibovespa 7 6 5 Ibovespa - Fechamento (1º dia do mês) EMBI+ Brazil (1º dia do mês) GRÁFICO 2 IBOVESPA X EMBI+ BRAZIL EMBI+ Brazil 25 2 4 15 3 1 2 1 5 dez/97 abr/98 ago/98 dez/98 abr/99 ago/99 dez/99 abr/ ago/ dez/ abr/1 ago/1 dez/1 abr/2 ago/2 dez/2 abr/3 ago/3 dez/3 abr/4 ago/4 dez/4 abr/5 ago/5 dez/5 abr/6 ago/6 dez/6 abr/7 ago/7 dez/7 4 Fonte: Bovespa - Elaboração: SOBEET Nos últimos anos verificou-se um número cada vez maior de abertura de capitais no país: em 27, as aberturas de capital proporcionaram giro financeiro superior a R$ 1 trilhão, e a expectativa é de manutenção de tal cenário no ano de 28. Um dado marcante nesse processo tem sido a participação estrangeira: atualmente, mais de 7% das ofertas públicas iniciais de capital vão parar nas mãos de investidores estrangeiros. Outro importante reflexo do processo de internacionalização se mostra no total de fusões e aquisições efetuado nos últimos anos. Segundo dados

da ANBID, 2 as operações de fusões e aquisições no primeiro semestre de 27 registraram crescimento aproximado de 28%, frente ao mesmo período do ano de 26, com particular destaque para o aumento de 19,6% das aquisições de empresas brasileiras por investidores estrangeiros. Nota-se, portanto, que há um aumento significativo da participação estrangeira nesse tipo de negócio: seja em IPO, 3 seja através de fusões e aquisições. Sabendo que essas são algumas das principais portas de entrada dos investidores estrangeiros em nossa economia, vejamos mais cuidadosamente como se desenvolvem esses processos, focalizando o setor produtivo através das fusões e aquisições, e o setor financeiro através dos processos de oferta inicial de capital. Fusões e Aquisições A partir da década de 199 e, especialmente após 1994, com a paridade entre o real e o dólar, o Brasil iniciou uma fase de fusões e aquisições no setor industrial. Tais processos impuseram vantagens à economia brasileira, como o aumento da eficiência dentro do processo produtivo, a elevação do grau de competitividade de alguns ramos de atividade, alto grau de controle dos custos de produção e de qualidade, e o aumento do total de investimentos estrangeiros diretos na economia (IED). Entretanto, são identificados como decorrências indesejáveis do processo a desnacionalização de algumas empresas, ou até mesmo de setores inteiros, e o alto grau de comprometimento de recursos financeiros. No entanto, não há um consenso sobre o que é considerado vantagem e desvantagem desse tipo de comercialização. O que é evidente, e concreto, é o aumento do volume de negociações, e a natureza entre as partes que as efetuam. As fusões, sob a ótica financeira, ocorrem estritamente quando duas ou mais empresas são associadas, resultando em uma empresa que mantém a identidade de apenas uma delas. 4 A outra empresa, apesar de juridicamente desaparecer, permanece existindo nos ativos humanos e materiais que foram agregados na fusão. As aquisições são muito similares às fusões, com a diferença de que os ativos tanto humanos quanto materiais da empresa adquirida passam a ser de propriedade da empresa adquirente. Nada garante, porém, que eles permaneçam no processo produtivo. Vários são os motivos para que duas empresas busquem realizar fusões, e até mesmo aquisições. Por vezes, as empresas almejam o rápido crescimento, seja em tamanho ou em participação no mercado, e isso se faz possível através da fusão de duas ou mais empresas do mesmo ramo. Outra razão que une empresas nesses tipos de procedimento são as sinergias: a união de dois ou mais produtores pode gerar significativas economias de escala, reduzindo custos indiretos das empresas fusionadas. Por fim, muitas vezes as empresas se fundem com o objetivo de elevar a capacidade administrativa, financeira e tecnológica. GRÁFICO 3 AQUISIÇÕES E FUSÕES (MONTANTE R$ MILHÕES) 7.94 8.322 1º semestre/6 1º semestre/7 5.288 5.696 3.367 2.864 2.47 125 Aquisições entre empresas brasileiras Aquisições de estrangeiras por brasileiras Aquisições de brasileiras por estrangeiras Aquisições entre empresas estrangeiras (*) Fonte: Anbid - Elaboração: SOBEET 2 Boletim Fusões e Aquisições ANBID Abril/27. 3 Oferta pública inicial de capital (Initial Public Offering IPO). 4 Para maiores esclarecimentos, sugere-se, como literatura complementar, Brealey e Myers (26). 5

6 A partir de 199, os processos de fusão e aquisição passaram a ser utilizados como forma de entrada no mercado brasileiro. Entre 1994 e 22, a economia brasileira vivenciou aproximados 1.3 casos entre fusões e aquisições (as primeiras em volume bem restrito). Ocorreram, pois, em um cenário extremamente propício a este tipo de processo: de um lado, estabilidade econômica e crescimento do mercado interno como impulsionadores da entrada de empresas estrangeiras no país; por outro, a valorização cambial, ocorrida concomitantemente à abertura comercial e à reestruturação tecnológica, que deixou parte do empresariado nacional em dificuldades de concorrência, o que motivou a venda ou a reestruturação produtiva. O mercado brasileiro passou a atrair empresas e investidores estrangeiros, dada a sua condição de mercado emergente pouco explorado. Atualmente, as perspectivas de crescimento da economia e a maior estabilidade do país também têm contribuído para o aumento do volume de fusões e aquisições. Dados mais recentes mostram que, nos primeiros seis meses do ano de 27, as operações envolvendo fusões e aquisições na economia brasileira, seja entre empresas brasileiras, entre empresas estrangeiras ou envolvendo ambas as partes, apresentaram um crescimento de 27,9% frente aos seis primeiros meses de 26, totalizando um montante da ordem de R$ 23,58 bilhões (superior àquele verificado no mesmo período do ano anterior em 27,8%). Dentre este resultado, surpreende a proporção de empresas estrangeiras que, por este mecanismo, entraram no mercado brasileiro: no período, enquanto as aquisições entre empresas brasileiras mostraram aumento de 5,2%, as aquisições de empresas nacionais por conglomerados externos inflaram-se na ordem de 19,6%, sempre comparados com os valores apurados no mesmo período de 26. Este movimento já era esperado após o aumento de quase 25% verificado em 26 frente a 25. No mesmo período, as empresas brasileiras desaceleraram sua inserção em outras economias: as aquisições de empresas estrangeiras por investidores ou empresas brasileiros retraiu-se 4,9%. Estes dados contrariaram o movimento de aquisição de empresas estrangeiras por investidores nacionais verificado no ano de 26, com expansão da ordem de 5% frente aos valores de 25. Uma vez que o processo de globalização é irreversível, o entendimento adequado das estratégias de internacionalização permite compreender o atual volume de fusões e aquisições que ocorre no país, utilizando-se basicamente uma comparação entre vantagens e desvantagens. Isso permite, inclusive, que o próprio empresariado brasileiro, tendo consciência de tal processo, busque uma preparação adequada para uma eventual internacionalização, em busca de novos mercados. Oferta Pública Inicial de Capital IPO A atividade de abertura de capital é vista, no mercado, como um bom indicador da performance da economia, já que mostra que as empresas estão apresentando bons resultados, e que os investidores estão mais confiantes na economia. Nos últimos anos, é notório o aumento do número de empresas que optaram pela abertura de capital, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. De acordo com inúmeros estudiosos, 5 o mercado de ações brasileiro renasceu, e com fôlego renovado, após os lançamentos de ações em 24, quando se verificaram 9 aberturas primárias 6 de capital e outras 12 aberturas secundárias, 7 captando mais de R$ 9 bilhões. O sucesso das ofertas de capital ocorridas especialmente no ano de 24 gerou um verdadeiro círculo virtuoso na economia: entre as empresas que já tinham o capital aberto, estimulou-se a mudança dos padrões éticos e profissionais; entre aquelas que ainda eram empresas fechadas, estimulou-se a abertura do capital. Em 27, as aberturas de capital foram responsáveis por uma movimentação superior a R$ 1 trilhão. Estes resultados conferiram à Bolsa de Valores de São Paulo não apenas a 7ª colocação em volume de ofertas iniciais no âmbito global, como o posto de maior Bolsa da América Latina. A abertura de capital feita através das ofertas públicas de capital (ou, ainda, as chamadas IPOs Initial Public Offering) representam, para muitas empresas, nada mais do que uma alternativa aos financiamentos bancários. Para outras, é uma forma de evitar problemas aos quais as companhias fechadas estão sujeitas, garantindo a profissionalização da administração e separando interesses corporativos e familiares. Teoricamente, as aberturas de capital são motivadas pela idéia de levantar capital, e também oferecem uma opção de saída para os acionistas, proporcionando maior liquidez aos ativos. 5 Para maiores detalhes, ver Cunha (25). 6 Uma oferta primária corresponde à emissão de novas ações, ou seja, a base acionária da empresa aumenta. As IPOs são ofertas primárias públicas. 7 Uma oferta secundária de ações não implica no lançamento de novas ações, de forma que o montante total de ações que constitui o capital social da empresa continua o mesmo. Este tipo de transação representa a venda de ações que estão em posse dos acionistas atuais para novos acionistas.

Apesar desses atrativos, o processo de abertura de capital também acarreta em maiores deveres e responsabilidades para a empresa. Um deles é que, ao abrir o capital, a empresa se compromete a adotar práticas formais de governança corporativa, contrariando práticas informais enquanto as empresas permanecem sob domínio familiar. Outra mudança vinculada à abertura de capital é a perda de controle: antes da abertura, os executivos da empresa podem agir com maior liberdade, o que contraria o objetivo primordial de transparência quando a empresa se torna aberta. Além disso, o processo de abertura de capital envolve custos acentuados, como aqueles intrínsecos às exigências legais, os relativos à intermediação financeira, entre outros. O Brasil, seguindo a tendência mundial, destacou-se pelo significativo aumento das emissões primárias e secundárias nos últimos anos. Entre 1995 e 23, foram realizados apenas seis IPOs. Em 24, foram realizadas 21 operações envolvendo oferta de ações, totalizando R$ 9,1 bilhões, sendo 9 ofertas primárias (R$ 4,4 bilhões) e 12 secundárias (R$ 4,6 bilhões), com 7 IPOs. No ano de 27, as emissões primárias totalizaram mais de R$ 33 bilhões, com 59 operações, e as secundárias, R$ 34 bilhões com 44 operações. No total, realizaram-se, só em 27, 13 operações, dentre as quais 63 eram IPOs que envolveram um montante superior a R$ 55 bilhões, mais de 25% de crescimento frente ao volume captado em IPOs no ano de 26. GRÁFICO 4 OFERTAS PRIMÁRIAS DE AÇÕES REGISTRADAS NA CVM 7 35 6 5 Nº de registros Volume em R$ bilhões 3 25 4 3 2 15 1 2 5 1 1996 1997 1998 1999 2 21 22 23 24 25 26 27-5 Fonte: CVM - Elaboração: SOBEET Como observamos no Gráfico 4, nos últimos anos verificou-se uma enorme expansão das ofertas primárias de ações, apesar das baixas taxas de crescimento no período. Conforme exposto na trigésima oitava carta da SOBEET, entre janeiro de 1999 e outubro de 22 o real nominal apresentou um processo quase contínuo de desvalorização em termos nominais, que se refletiu em uma queda acentuada tanto no número de emissões primárias efetuadas no período quanto no volume financeiro envolvido em tal processo. A partir de outubro de 22, no entanto, a desvalorização cambial reverteu-se de forma pontual para um quadro de valorização cambial, estimulado pelo contexto econômico mundial (com elevada liquidez e diminuição dos riscos de mercado) e pelas condições positivas do cenário doméstico. A valorização da moeda brasileira, aliada à desvalorização da moeda estadunidense e à redução da taxa de juros doméstica, proporcionou o grande salto no volume de emissões primárias e secundárias de ações. Isso porque a valorização cambial propiciou 7

um aumento do interesse pelos ativos brasileiros através da queda dos preços, tanto da parte de residentes quanto da parte de não-residentes e, somados à queda da taxa de juros, elevaram a demanda pelos papéis brasileiros. Assim, a significativa elevação das ofertas de capital, sejam primárias ou secundárias, está intimamente relacionada à consolidação da estabilidade da economia brasileira, iniciada em meados da década de 199, além das condições favoráveis da própria economia global. TABELA 1 OFERTAS PRIMÁRIAS E SECUNDÁRIAS DE AÇÕES REGISTRADAS NA CVM ANO Nº de registros Fonte: CVM - Elaboração: SOBEET PRIMÁRIAS SECUNDÁRIAS TOTAL Volume em R$ bilhões Nº de registros Volume em R$ bilhões Nº de registros Volume em R$ bilhões 1996 22 9,142 2,37 24 9,179 1997 2 4,112 14 1,856 34 5,968 1998 2 4,112 14 1,856 34 5,968 1999 1 2,749 14 1,886 24 4,635 2 6 1,41 14 12,127 2 13,537 21 6 1,353 7 4,38 13 5,661 22 4 1,5 2 5,96 6 6,146 23 2,229 6 1,856 8 2,85 24 9 4,469 12 4,682 21 9,151 25 13 4,364 15 6,634 28 1,998 26 29 14,223 3 12,76 59 26,983 27 59 33,135 44 34,121 13 67,256 GRÁFICO 5 OFERTAS PRIMÁRIAS E SECUNDÁRIAS DE AÇÕES REGISTRADAS NA CVM TOTAL Nº de registros 12 1 Nº de registros Volume em R$ bilhões Volume em R$ bilhões 8 7 6 8 5 6 4 4 3 2 2 1 8 1996 1997 1998 1999 2 21 22 23 24 25 26 27 Fonte: CVM - Elaboração: SOBEET

GRÁFICO 6 OFERTAS INICIAIS PÚBLICAS DE CAPITAL IPO Nº de IPO 7 R$ bilhões 6 6 5 Número de IPOs Volume R$ bilhões 5 4 4 3 3 2 2 1 1 1995-23 24 25 26 27 Fonte: Bovespa - Elaboração: SOBEET GRÁFICO 7 PARTICIPAÇÃO DOS INVESTIDORES NAS OFERTAS JAN-NOV/7 Invest. Institucionais 2% Invest. Estrangeiros 74% Pessoas Físicas 6% Fonte: Bovespa - Elaboração: SOBEET Esse crescimento das aberturas de capital foi marcado pela presença de investidores estrangeiros, por ser um modo muito atraente de entrada no mercado brasileiro. Entre janeiro e novembro de 27, do total de ofertas de capital feitas no mercado brasileiro, mais de 73% foi adquirido por investidores estrangeiros. Dentre os investidores domésticos, quase 8% dos participantes eram investidores institucionais. 9

Dentre os participantes estrangeiros, a maior parte (57,1%) é composta por investidores americanos, seguidos dos europeus (38,8%), de acordo com dados dos relatórios da ANBID 8. Além disso, a maior parte deste capital vem de fundos de investimento internacionais. Essa marcante característica se tornou mais evidente especialmente a partir do ano de 25, e apresentou uma tendência crescente nos últimos dois anos. Segundo dados da Bolsa de Valores de São Paulo BOVESPA, em 27 a participação estrangeira nas ofertas públicas de ações representou 75,8% do total de R$ 64,18 bilhões das operações realizadas neste ano. Em 25, esta participação encontrava-se restrita a 6,19% do total de ofertas públicas realizadas naquele ano, calculado em R$ 16,22 bilhões. Em 27, dentre todas as ofertas, a que teve maior adesão dos investidores internacionais foi a do Banco Banrisul, na qual 97% dos papéis colocados no mercado foram comprados por estrangeiros. Em seguida, aparecem Gafisa e PDG Realty, com participação de 93% dos estrangeiros. GRÁFICO 8 PARTICIPAÇÃO ESTRANGEIRA NA OFERTA TOTAL DE AÇÕES Participação (% ) nº de investidores estrangeiros 8, 7, Volume Estrangeiro na Oferta Total de Ações Número de Investidores Estrangeiros 8 7 6 6, 5 5, 4 4, 3 2 3, 25 26 27 1 Fonte: Bovespa - Elaboração: SOBEET É possível observar, portanto, o aumento tanto do volume de capital com procedência estrangeira quanto no número de investidores estrangeiros. Este último, inclusive, apresentou uma taxa de crescimento superior ao primeiro, mostrando que o mercado brasileiro tem sido muito atraente não apenas para os investidores estrangeiros que já aplicavam seu capital aqui, como também para novos investidores que, possivelmente observando o bom resultado obtido por outros investidores, também optaram por aplicar seu capital no mercado financeiro brasileiro. Prova do grande sucesso desse processo evolutivo dentro do mercado financeiro brasileiro, a própria Bovespa, responsável pela comercialização dos papéis das empresas listadas em mercado, abriu seu capital em meados de 27. Seus resultados confirmaram as expectativas: a demanda por ações na reserva superou a casa dos R$ 3 bilhões; a oferta total somou R$ 6,6 bilhões, dos quais aproximados 8% teriam ficado com investidores estrangeiros; ademais, em sua estréia, as ações apresentaram valorização de 52,13%. No mesmo sentido, poucas semanas depois a Bolsa de Mercadorias & Futuros BM&F abriu seu capital, replicando os resultados obtidos anteriormente pela Bovespa: alto volume financeiro de captação de recursos (quase R$ 6 bilhões), com alta participação de investidores estrangeiros. 1 8 Boletim ANBID Ano II, Edição nº 9 Dezembro/27.

Tipo de Investidor Fonte: BM&F - Elaboração: SOBEET TABELA 2 RESULTADOS DA IPO BM&F Número de compradores % Quantidade de ações % Número de ações / Investidor Pessoas Físicas 253.77,9723 28.561.898,955 112,58 Fundos de Investimento 4,15 31.798.465,163 79.496,16 Investidores Estrangeiros 86,31 231.438.175,7736 287.144,14 Outros 6.33,231 7.386.38,247 1.224,32 TOTAL 26.946 299.184.846 Quais as explicações da grande participação estrangeira nas ofertas de capital? Muitas podem ser as explicações para este fato. Entretanto, parece que o motivo verdadeiro é simplesmente que o mercado de capitais brasileiro se tornou muito atrativo aos olhos estrangeiros, seja por seu amadurecimento, seja por sua rentabilidade. No que diz respeito ao amadurecimento do mercado financeiro brasileiro, a imagem do país no ambiente internacional melhorou muito nos últimos anos, com a queda do risco-país e a estabilização da economia, causados principalmente pela melhora dos fundamentos macroeconômicos do país que são fruto do sucesso do tripé da política econômica: metas de inflação, controle do déficit primário do setor público e câmbio flutuante. Tendo por base esses e outros indicadores, especialmente de ordem macroeconômica, o país está próximo a alcançar o grau de investimento. Por isso, a economia brasileira acabou por se transformar em uma das principais candidatas por investidores estrangeiros. Os indicadores macroeconômicos foram muito importantes nesse processo, pois apontaram uma trajetória de crescimento equilibrada para o país: elevação do PIB conjuntamente à diminuição da dívida externa (apesar da alta dívida interna que ainda hoje é persistente), ao controle inflacionário e à diminuição das disparidades sócio-econômicas. A rentabilidade também tem sido um grande atrativo do mercado financeiro. A partir de 23, observamos um movimento constantemente ascendente do índice Bovespa, que passou de aproximados 11. pontos em janeiro/23 para mais de 63. pontos em dezembro/27. Os significativos resultados apurados pela Bolsa de Valores de São Paulo também mostram que o mercado brasileiro não se encontra mais tão vulnerável a crises ou recessões externas (especialmente àquelas vindas de mercados emergentes). Apesar da crise imobiliária americana e dos péssimos indicadores apurados nos Estados Unidos, a Bovespa registrou alta acumulada de 43,7% em 27. Este resultado consolidou a posição da Bovespa como sendo uma das melhores e maiores bolsas do mundo. Outros fatores determinantes para o maior ingresso de investidores no mercado brasileiro, e especificamente os estrangeiros, foram o aprimoramento da regulamentação do mercado financeiro e a maior transparência da situação das empresas que almejavam ingressar na Bolsa. Nesse sentido, foram imprescindíveis para a ampliação do público investidor a disseminação da cultura de investimentos e o avanço das práticas de governança corporativa. Dentro desse aspecto, a maioria das empresas que realizaram IPOs em 27 aderiu ao Novo Mercado, que representa o nível máximo de governança corporativa dentre os segmentos da Bovespa. Este segmento busca minimizar a diferença entre o valor justo e o valor de mercado 9 atribuída aos papéis. Nesse sentido, quanto maior for o comprometimento das empresas em termos de transparência, menor será o desconto advindo de incertezas e, portanto, mais próximo será o valor justo do valor de mercado. Das 63 IPOs realizadas, 68% optaram pelo Novo Mercado. As perspectivas para o mercado de capitais seguem positivas no início de 28. Acredita-se que o mercado financeiro brasileiro continuará apresentando bons resultados em 28. Apesar da grande insegurança frente aos resultados da economia americana (que ainda encontra-se muito envolta nos problemas do mercado imobiliário e nos indicadores macroeconômicos pouco favoráveis), os investidores acreditam que 28 será um ano muito favorável ao mercado brasileiro. Uma das justificativas para tal crença é a possibilidade do país 9 O valor justo de uma ação pode ser compreendido como a diferença entre os ativos e passivos de determinada empresa (com base em valores de mercado) dividido pelo número de ações que compõem o capital social. Já o valor de mercado é calculado como o valor justo de um papel ajustado ao risco do investidor, causado por falta de informação, desigualdade de direitos, baixa liquidez, entre outros. 11

12 obter o grau de investimento a partir do segundo semestre. Ademais, os bons indicadores da economia doméstica também deverão contribuir para a manutenção do cenário otimista. 4. Considerações finais A economia brasileira vem passando por profundas transformações em sua estrutura desde a década de 199. Embora esteja disseminada entre analistas e na literatura a tese de que a alteração da dinâmica de funcionamento da economia brasileira foi causada pela maturação dos investimentos realizados na década de 197, alterando significativamente o parque industrial, foi nos anos 199 que se deu a prova do desempenho econômico do país pelo processo de abertura comercial. A partir de então, a dinâmica da economia nacional passou a se aproximar do desempenho da economia mundial. O conjunto de medidas que deu substância à liberalização econômica, se, por um lado, expôs a economia à dinâmica externa, por outro, consolidou a necessidade de transformações e a internacionalização, não só pelo ingresso de capitais no Brasil, mas pela maior dimensão de algumas empresas brasileiras que passaram a investir no exterior. A internacionalização é um fenômeno mais amplo de que sua esfera comercial, ela é também financeira e industrial. Nesse contexto, o notável ingresso de empresas estrangeiras atuando em nosso ambiente doméstico, sejam como investidores, sejam como produtores parece ser um fenômeno consolidado e com tendências de expansão. De fato, os dados confirmam que, tanto por meio fusões e aquisições de empresas domésticas quanto por meio da aquisição de ações em mercado aberto, a participação do capital estrangeiro constitui uma tendência daqui para frente. Referências Bibliográficas: ANBID Boletim Fusões e Aquisições. Ano I, Edição Especial Abril/27. ANBID - Boletim Mercado de Capitais. Ano II, Edição nº 18: Novembro/27. ANBID - Boletim Mercado de Capitais. Ano II, Edição nº 19: Dezembro/27. ALÉM, A. C. e CAVALCANTI, C.E. O BNDES e o apoio à internacionalização das empresas brasileiras: algumas reflexões in Revista do BNDES. Rio de Janeiro: V.12, Nº 24, p. 43-76, Dezembro/25. BIELSHOWSKY, R. e STUMPO, G. A internacionalização da Indústria Brasileira: números e reflexões depois de alguns anos de abertura in BAUMANN, R. (org), O Brasil e a Economia Global. Rio de Janeiro: Campus, 1996. BM&F Bolsa de Mercadorias & Futuros. Sitio: <http:/ /www.bmf.com.br> BOVESPA Bolsa de Valores de São Paulo. Sitio: <http:/ /www.bovespa.com.br> BREALEY, R.A. e MYERS, S.C. Investimentos de Capital e Avaliação Finanças Corporativas. São Paulo: Bookman Companhia Ed., 1ª ed., 26. BRETTAS, T. A internacionalização do capital e o Plano Real: uma análise político-econômica do governo FHC. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 25. CANO, M. O recente processo de fusões e aquisições na economia brasileira. Campinas: Instituto de Economia da Unicamp, 22. CASTRO, S., CAVALCANTI, A. e CAVALCANTI, M.A.F.H. Estimação de equações de exportações e importações para o Brasil 1955/95. Rio de Janeiro: IPEA / Dimac, mar.1997. (Texto para discussão, 469), CUNHA, M. R. Lições dos IPOs: parte I. Agência Estado Financeiro. São Paulo: jan. 25. CVM Comissão de Valores Mobiliários. Sitio: <http:// www.cvm.org.br> FURTADO, J. Globalização das Empresas e Desnacionalização in LACERDA, A. C. (org). Desnacionalização: Mitos, Riscos e Desafios. São Paulo: Contexto, 2. GONÇALVEZ, R. Globalização, estabilização e o colapso da empresa nacional. São Paulo: Paz e Terra, 1999. KPMG. Fusões & Aquisições no Brasil: Análise dos Anos 9. São Paulo, KPMG, 21. MACHADO, J. Internacionalização do Capital uma fase perversa. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), 1998. MENEZES, A.M.F e FONSECA, M. J. M. A mundialização do capital e seus rebatimentos na economia brasileira: análise dos processos de abertura econômica e de privatização in Bahia Análise & Dados. Salvador: V.13, nº 1, p. 9-21, jun/23. Secretaria da Receita Federal. Sitio: <http:// www.receita.fazenda.gov.br> SUEN, A.S. e KIMURA, H. Fusão e Aquisição como Estratégia de Entrada (Entre Mode) no mercado brasileiro in Caderno de Pesquisas em Administração Programa de Pós-Graduação da FEA/USP. São Paulo: Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo FEA/USP, jun/1997.

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