ROTINA DIDÁTICO-PEDAGÓGICA: INSERÇÃO DA CRIANÇA AUTISTA NO CONTEXTO ESCOLAR. MONTEIRO, Paola Campolina Graduanda em Pedagogia / Universidade de Brasília AZEVEDO, Sabrina Maria Cezario de Graduanda em Pedagogia / Universidade de Brasília RESUMO Brasília/DF 2014 Este trabalho tem como objetivo relatar a experiência formativa das graduandas bolsistas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência, da Universidade de Brasília, curso de Pedagogia. A atuação ocorreu em Brasília/DF, na Escola Classe 405 Norte, inclusiva, com duas crianças com Transtorno do Espectro Autista. As estudantes acompanharam duas crianças no período de fevereiro a junho de 2014. A primeira criança, com seis anos de idade, está no 1º ano do ensino fundamental, em classe regular inclusiva com 17 crianças com o desenvolvimento típico. A segunda criança, com 12 anos de idade, esta na classe especial, juntamente com outras três crianças com o mesmo transtorno. Durante este período, foram realizadas algumas atividades visando o melhor desenvolvimento destas crianças. No começo do ano, elas tinham dificuldades de organização para desempenhar tarefas e obedecer comandos do professor em sala de aula, já que a rotina das mesmas não tinha significado. A partir desta realidade, foi proposto, em parceria com os professores e atividades propostas em
cada classe, apresentar às crianças uma rotina visual e palpável, já que estas normalmente apresentam pensamento concreto. Logo, a utilização de materiais dessa forma é mais significativa (SILVA; GAIATO; REVELES, 2012), facilitando o entendimento da rotina diária da sala de aula. Foram tiradas fotos das crianças em vários momentos do dia, fazendo atividade, brincando, lavando as mãos, lanchando, no parquinho, filme e outras situações do dia a dia. A partir do material construído, as crianças demonstraram maiores interesses nas tarefas propostas, já que algumas das imagens representavam momentos que lhes satisfaziam, e, assim, começaram a se apropriar melhor da sua rotina escolar. Desta forma, as crianças começaram a fazer questionamentos sobre a sequência dos momentos que iriam ser vividos, acostumando-se com diferentes atividades para cada dia da semana. Ao final da experiência, percebeu-se que elas tinham adquirido maior capacidade em se organizar, e estavam melhor inseridas no contexto escolar Palavras Chaves: Transtorno do Espectro Autista. Rotina. Contexto Escolar. 1. A importância da rotina escolar No dicionário Michaelis (2002), rotina é definida como prática, uso ou norma geral; hábito de fazer as coisas da mesma maneira. A rotina pode ser entendida como uma definição sistemática de uma sequência de atividades e ações a serem realizadas, que envolvem tempo, espaço e atitudes necessárias para realização das atividades propostas. Neste trabalho a rotina foi contemplada no contexto escolar, vista como organizadora das atividades e um instrumento que tranquiliza o ambiente. A confecção da rotina pode trazer confiança e equilíbrio para as crianças. Segundo Bilória e Metzener (2013), a rotina possibilita que a criança se oriente na relação espaço-tempo e, a partir do reconhecimento desta é possível que o estudante melhor se organize no decorrer do dia. Uma rotina estável, clara e compreensível permite que as crianças a incorporem, podendo antecipar o que irá acontecer em seguida. Isso oferece uma sensação de segurança a elas, o que, por sua vez, permitirá que elas atuem com maior autonomia e tranquilidade no ambiente escolar. (VALADARES, 2013)
O professor, juntamente com as crianças, deve construir uma rotina que abarque as necessidades e demandas de todos da classe. Esta rotina deve ser feita de uma forma dinâmica, não mecânica, onde todos podem palpitar dando suas sugestões de maneira democrática. É importante frisar que a rotina deve ser flexível, as atividades também devem ser diversificadas, feitas de várias maneiras, para que a aula se torne mais atrativa para os estudantes. Tabela 1 - Rotina Escolar Classe Regular Inclusiva ENTRADA HISTÓRIA ATIVIDADE PROPOSTA LANCHE RECREIO RELAXAMENTO ATIVIDADE PROPOSTA LEITURA SAÍDA A tabela 1 acima é um exemplo de rotina construída em uma Classe Regular Inclusiva, de uma Escola Pública de Brasília do Ensino Fundamental I que conta com a presença de pibidianas, que são estudantes do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência PIBID - de Pedagogia/Universidade de Brasília (UnB). O planejamento e elaboração em conjunto de uma rotina passível de mudanças podem trazer diversos benefícios: estudantes e professores começam a organizar ações, atividades, intervenções, tempo e espaço escolares de uma forma mais estruturada; os educandos se sentem mais seguros para realização das atividades; a turma participa mais da aula; diminui a ansiedade dos estudantes no decorrer do dia; os estudantes criam um sentimento de pertencimento à dinâmica do dia e a turma, pois participam de todo processo de organização e execução das atividades planejadas na rotina. 2. A rotina e o estudante autista Estudos no campo da neuropsicologia afirmam que pessoas com autismo possuem comprometimento nas funções executivas, que são um conjunto de processos neurológicos que auxiliam na resolução de problemas, no planejamento, permanência e execução das atividades. Assim, as funções executivas se relacionam ao cumprimento
da rotina escolar, já que esta exige o planejamento e execução de diversas atividades do cotidiano. As crianças com desenvolvimento típico compreendem a rotina de forma mais clara, ou seja, elas sabem que no contexto escolar devem realizar atividades conforme são solicitadas pelo professor, sem poder negar a execução de tais tarefas sempre que quiserem. Em contrapartida, a realização da rotina com crianças autistas é mais complicada, elas possuem uma dificuldade em continuar em uma atividade. Assim, a confecção de rotinas se torna muito útil, pois as ajuda a organizar seu dia e compreender que existem atividades que eles terão que fazer no contexto escolar, para que depois possam realizar o que desejam. Para muitos de nós, o propósito de fazer nossas tarefas matutinas e se arrumar para ir à escola a tempo, é a compreensão de nosso papel como aluno sabedor de ter que chegar à escola no horário e também nosso papel de criança que dá ouvidos aos pais e que respeita suas regras. Esses conceitos são abstratos e para algumas crianças difíceis de integrar. (Site AMA, 2010,p. 2) Muitos autistas são apegados a rotinas rígidas, possuem dificuldades no planejamento, organização, gerenciamento do tempo e bastante resistência à mudança. Dessa forma, possuir um instrumento que oriente seu dia, auxilia muito na aprendizagem desses estudantes, e esse instrumento pode ser a confecção das rotinas flexíveis e concretas. Frequentemente elas ficam paralisadas ou sofrem muito para iniciar uma ação. Muitas crianças se mostram ansiosas frente às mudanças e têm grandes problemas com transições. Muitas das vezes também se sentem sobrecarregadas e se isolam ou têm consideráveis crises de birra. (Site AMA, 2010 p.1) As rotinas concretas foram utilizadas nesta pesquisa, pois possibilitam maior entendimento da sequencia das atividades que ocorrerão no decorrer do dia, sendo primordial a utilização de material visual, como imagens, figuras e fotos. 3. Metodologia A partir da inserção das duas pibidianas em Classe Especial e Classe Comum Inclusiva, foi percebida uma demanda para utilização de uma rotina concreta para as crianças autistas para melhor apropriação das atividades que iriam acontecer durante determinado dia. No presente trabalho, o objetivo foi analisar se a criança autista se apropria melhor das atividades a serem realizadas no dia por meio de uma rotina mais palpável, tangível. Desta forma, foi utilizada uma metodologia com abordagem de pesquisa
qualitativa, que conforme Golsalves (2011) visa à compreensão e interpretação do fenômeno, considerando todos os sujeitos envolvidos e tendo o processo como principal foco da pesquisa. Pensando na importância da rotina em sala de aula e nas dificuldades que estudantes com autismo possuem na execução de tarefas planejadas, foi pensada a construção desta rotina, que pode ser moldada a partir da singularidade de cada estudante e do contexto escolar no qual está inserido. As pessoas com autismo costumam ter pouca capacidade de fazer abstrações, normalmente seu pensamento é mais voltado para o concreto. Desta forma, a rotina foi construída a partir da utilização de imagens e fotos dos próprios estudantes. As fotos foram tiradas pelas pibidianas em diversos contextos e singularidades de cada sala de aula como, por exemplo: hora do lanche, hora do relaxamento, hora do recreio, hora da atividade, e muitos outros. Desta forma, no início de cada aula, com as fotos de todos os momentos da criança realizando as atividades, as pibidianas, cada uma em sua classe, montaram juntamente com o estudante autista a rotina daquele dia. Durante a organização desta rotina, a criança poderia palpitar e opinar na sequência das atividades a serem desempenhadas ao longo do dia. 4. Resultados Após a utilização da rotina durante o semestre, percebeu-se que os estudantes modificaram alguns comportamentos como: apresentar maior aceitação da rotina escolar, melhor participação das atividades, menos agressividade, ansiedade e rejeição nas atividades que não os satisfaziam, melhor socialização com a turma, e outros. Desta forma os estudantes autistas demonstraram menos nervosismo no cumprimento das atividades planejadas para o dia, principalmente das que não gostam muito, sabiam que em algum momento teriam que cumpri-las. Além disso, os estudantes começaram a demonstrar suas opiniões, pois participaram da confecção das rotinas. Eles compreenderam que suas opiniões eram importantes para a escolha e a ordem das atividades; quando era proposto algo que gostam, suas feições se modificavam e demonstravam euforia. Em contrapartida, quando proposto algo que não apreciam, suas feições se modificavam e demonstravam desaprovação. Esses momentos também proporcionaram que os estudantes
aprendessem a fazer combinados e a se tornarem mais flexíveis. Dessa forma, as suas vontades e as do professor eram contempladas. Ao mesmo tempo em que é importante organizar rotinas diárias, também se faz essencial que essas crianças compreendam as possíveis mudanças. Como mencionado, autistas possuem uma tendência em se fixar em rotinas, e aprender a lidar com as frustrações também foi muito importante nesse processo. Em alguns momentos, quando alguma atividade não era cumprida, as pibidianas tinham que explicar para os estudantes, tentar acalmá-los, e no decorrer do semestre esses momentos de frustração se tornaram menos frustrantes. 5. Referências BILORIA, Jessica., METZNER, Cristina. A importância da rotina da educação infantil. Disponível em: https://www.unifafibe.com.br/revistasonline/arquivos/revistafafibeonline/sumario/28/11 122013185355.pdf. Visualizado em 2 de Outubro de 2014. MORANGON, Cristiane. Um quadro de rotinas. Revista Nova Escola. Edição nº 160. São Paulo: Editora Abril, março, 2003. SCHWARTZ, Marci, Transtornos do espectro autista e a importância da estrutura Disponível em : http://www.ama.org.br/site/images/stories/voceeaama/artigos/100415estruturaeautismo art.pdf. Visualizado em 2 de Outubro de 2014. SILVA, Ana Beatriz B. S., GAIATO, Mayra B., REVELES, Leandro T. Mundo Singular: entenda o autismo. Rio de Janeiro: Fontanar, 2012. VALADARES, A.C. Rotina do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental. Blog do Colegio A. Carlos Valadares. Indaroba (SE), 28 de Fevereiro de 2013. Disponível em: http://colegioacvaladares.blogspot.com.br/2013/02/rotina-do-1-ao-5-ano-do-ensino.html. Acessado em: 10 de Outubro de 2014, às 18h.
6. Anexo Figura 1 - Rotina confeccionada para estudante autista de Classe Especial.
Figura 2 - Rotina confeccionada para estudante autista da Classe Comum Inclusiva