Fisiopatologia da menopausa



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Transcrição:

Fisiopatologia da menopausa SUSANA ANTUNES*, OFÉLIA MARCELINO*, TEREZA AGUIAR* RESUMO A menopausa representa o fim das menstruações espontâneas da mulher. Neste artigo, faz-se uma breve revisão, referindo os mecanismos fisiológicos subjacentes à menopausa, o seu diagnóstico (que dispensa, na maior parte das vezes, exames complementares) e as repercussões que apresenta a nível dos vários órgãos e sistemas. O conhecimento das funções dos estrogénios, permite compreender o impacto da sua carência, na saúde da mulher. Palavras-Chave: Menopausa; Estrogénios; Órgãos-Alvo. Centro de Saúde da Reboleira, Extensão da Damaia Amadora *Interna do internato Complementar de Clínica Geral INTRODUÇÃO EDITORIAIS A menopausa, ou fim das menstruações espontâneas, é um processo biológico natural, que ocorre na vida da mulher: com o envelhecimento, ocorre uma alteração na estrutura e função dos folículos ovários. No mundo ocidental, a idade média em que as mulheres atingem a menopausa, é de 51,4 anos, numa distribuição gaussiana, dos 40 aos 58 anos: algumas fazem-no aos 30 anos, outras, aos 60 anos de idade. A idade média em que ocorre a menopausa espontânea, na população portuguesa, ronda os 48 anos. Apesar de, ao longo dos anos, a esperança média de vida ter aumentado, nos últimos séculos, a idade da menopausa manteve-se constante. No passado, poucas eram as mulheres que viviam longos períodos após a menopausa; actualmente um terço da sua vida pode ser passado em pós- -menopausa. Nos Estados Unidos, estimou-se que, em 2000, cerca de 42,19 milhões de mulheres tinham mais de 50 anos e 33,21 milhões tinham idades superiores a 55 anos. Espera-se que, no ano de 2020, cerca de 45,9 milhões tenham idades superiores a 55 anos. MECANISMO FISIOLÓGICO EDITORIAIS DA MENOPAUSA A menopausa, ou seja, o cessar das menstruações espontâneas, ocorre em virtude da grande redução na actividade dos ovários, que deixam, deste modo, de libertar óvulos mensalmente. Ao mesmo tempo, os estrogénios começam a ser secretados em menor quantidade. O organismo da mulher fica, então, exposto a um novo ambiente hormonal, designado por hipoestrogenismo. Se este se instala de uma forma súbita, as mulheres apresentam sintomas que serão muito mais exuberantes, do que se a instalação for lenta e progressiva. Por razões desconhecidas, o ovário perde ou consome a maior parte dos seus folículos até à menarca, chegando à menopausa com um número reduzido. Nessa altura, a primeira expressão da redução significativa da função dos folículos ováricos é o aparecimento das irregularidades menstruais, que podem durar vário anos. Numa primeira fase, os ciclos tornam-se mais curtos, por maturação folicular acelerada, mantendo alguma regularidade; mais tarde, tornam-se irregulares, sucedendo-se ciclos de duração muito variável. A amenorreia definitiva surge ao fim de algum tempo, quando ocorre a falência ovárica, devida ao consumo total dos seus folículos. Sob o ponto de vista endócrino, exis- Rev Port Clin Geral 2003;19:353-7 353

te, no ovário, um aumento da produção de androgénios, que, no tecido adiposo periférico, são convertidos em estrona e estradiol (que circulam em baixas concentrações). Há, também, uma diminuição da produção da inibina e de estradiol. A diminuição, ou a ausência, destes dois últimos, estimula a hipófise, que produz níveis crescentes de FSH. Existem vários factores que podem influenciar o aparecimento da menopausa: 1) O tabagismo antecipa a menopausa em cerca de 1,5 anos (facto que também depende da carga tabágica e dos anos de exposição). 2) A nuliparidade, a exposição a químicos tóxicos, o tratamento com antidepressivos, a epilepsia (principalmente se as crises são frequentes), são factores que se associam a menopausa precoce. 3) Factores familiares, como polimorfismos genéticos dos receptores de estrogénio. 4) A multiparidade, o excesso de massa corporal e o elevado QI na infância estão relacionados com o aparecimento mais tardio da menopausa. Não foi encontrada qualquer relação entre a idade de aparecimento da menopausa e a idade da menarca, a toma de anticonceptivos orais, o nível sócio- -económico ou a raça. Nesta fase da vida da mulher, definem-se, assim, vários períodos: 1) Climatério fase da vida da mulher da qual passa do estado reprodutivo para o não reprodutivo. É um processo contínuo e não uma fase pontual da sua vida, pois engloba a pré-menopausa e a pós-menopausa. Pode acompanhar-se de sintomatologia, mas não é imperativo que o climatério apresente sempre sintomas. 2) Pré-menopausa é o período cerca de cinco anos, que precede a menopausa. Nesta fase, o capital folicular que resta nos ovários responde mal aos estímulos das gonadotrofinas hipofisárias (FSH e LH), com produção irregular de inibina, o que leva ao aparecimento de ciclos anovulatórios ou disovulatórios. A característica endócrina mais importante desta fase é o défice de progesterona. Os ciclos tornam-se mais curtos e, posteriormente, mais longos. 3) Peri-menopausa período que decorre desde que se iniciam os ciclos irregulares e as perturbações vasomotoras (pré-menopausa) até um ano após a última menstruação. 4) Menopausa significa, a data do último período menstrual, como expressão da falência da actividade endócrina dos ovários. Surge quando os folículos se tornam insuficientes para produzir estrogénios nas concentrações necessárias para induzir a proliferação do endométrio e dar origem à menstruação. 2) Pós-menopausa longo período de vida da mulher que decorre desde o fim da menstruação até à morte. Considera-se que existe uma menopausa precoce, quando esta ocorre antes dos 45 anos de idade (40 anos para alguns autores), conferindo à mulher um risco aumentado para as complicações de carência estrogénica. Nestes casos, está indicada a terapêutica de reposição hormonal, tanto mais indicada quanto mais precocemente tiver ocorrido a falência ovárica. A menopausa tardia é a que ocorre após os 53 anos de idade e justifica algumas preocupações acrescidas, com as consequências da exposição prolongada aos estrogénios, nomeadamente no que se refere ao risco de cancro da mama e do endométrio. A menopausa artificial é consequência da ooforectomia cirúrgica ou iatrogénica (radiações, citostáticos, etc.). Sob o ponto de vista endócrino, a menopausa cirúrgica tem consequências particularmente drásticas, já que determina a perda total e instantânea de produção hormonal. O tecido adiposo converte os androgénios circulantes (produzidos 354 Rev Port Clin Geral 2003;19:353-7

pelos ovários e supra-renais) em estrona e estradiol, que constituem a principal fonte de estrogénios na mulher menopáusica. Este facto justifica que as mulheres obesas apresentem uma carência estrogénica menos marcada, o que contribui para a menor incidência de osteoporose neste grupo. DIAGNÓSTICO EDITORIAIS DA MENOPAUSA O diagnóstico da menopausa é essencialmente clínico e retrospectivo: uma mulher entre os 45 e os 52 anos de idade, com amenorreia de pelo menos um ano, sem que se identifiquem outras causas para a amenorreia, ou com irregularidades menstruais e perturbações vasomotoras, está, seguramente, na fase da menopausa. Os doseamentos hormonais têm um valor limitado, pois as hormonas são, nesta fase, segregadas em picos e apresentam grandes variações. São, contudo, importantes, em alguns casos específicos: Suspeita de menopausa precoce: o diagnóstico de menopausa é confirmado se o doseamento de FSH>40mlU/ml e estradiol <20-30pg/ml. Nas mulheres peri-menopáusicas a fazer contracepção oral: proceder aos doseamentos de FSH e estradiol, 20 dias após a suspensão da pílula. Em mulheres histerectomizadas que mantiveram os ovários, quando não existem sintomas compatíveis com a menopausa. MANIFESTAÇÕESEDITORIAIS DA CARÊNCIA ESTROGÉNICA A carência de estrogénios induz repercussões a nível de vários órgãos-alvo e de vários sistemas, manifestando-se, essencialmente, em dois picos temporais: sintomatologia precoce sintomatologia tardia Manifestações precoces: 1. Perturbações vasomotoras 2. Perturbações psicológicas 3. Perturbações genito-urinárias 1. PERTURBAÇÕES VASOMOTORAS As perturbações vasomotoras, que incluem os «afrontamentos» e os suores, constituem a sintomatologia mais frequente da mulher menopáusica, atingindo cerca de 60-80% das mulheres. São mais intensos nos dois primeiros anos da menopausa. Em geral, cessam espontaneamente aos cinco anos de menopausa. Em algumas culturas, em que a menopausa é encarada como trazendo benefícios ao seu estatuto social, as mulheres não referem perturbações vasomotoras. O seu mecanismo fisiopatológico parece relacionar-se com uma alteração a nível dos neurotransmissores cerebrais, provocada pela diminuição de estrogéneos, ocorrendo uma maior libertação de Gn-Rh e uma perturbação do equilíbrio térmico. Manifestam-se como uma onda de calor, por norma bastante intensa, que atinge predominantemente a metade superior do corpo, a que se segue, em poucos minutos, suores frios. São acompanhadas por um aumento da frequência cardíaca e do fluxo sanguíneo periférico. Por vezes associam-se a vertigens. Não são controláveis pela mulher nem previsíveis. 2. PERTURBAÇÕES PSICOLÓGICAS Diversos estudos demonstraram que as mulheres na menopausa referem, com frequência, dificuldade em adormecer e em manter a continuidade do sono, bem como insónia matinal, sintomas que melhoravam, substancialmente, com a THS. Estas queixas podem depender, directamente, da carência estrogénica, mas também da existência das perturbações vasomotoras, que alteram a qualidade do sono. Em relação à depressão, os estudos Rev Port Clin Geral 2003;19:353-7 355

não foram conclusivos sobre se existe uma associação entre esta doença e a menopausa. No entanto, e embora os resultados sejam inconsistentes, os estrogénios melhoram o humor em algumas mulheres menopáusicas. Os estrogénios parecem exercer efeitos reguladores a nível das áreas do sono no hipotálamo, região pré-óptica e hipocampo. Também funcionam como agonistas da serotonina e da acetilcolina. Têm um efeito misto a nível da noradrenalina e das endorfinas, diminuindo os receptores da dopamina e aumentando a actividade do GABA. Estes dados sugerem que os estrogénios podem ter uma interferência directa no humor. É importante não esquecer que esta fase da vida da mulher coincide com muitas mudanças, que podem influenciar o seu humor. O «ninho vazio» familiar, o período de transição para a reforma e o encarar do envelhecimento, são factores que podem contribuir para uma maior incidência de sintomas depressivos na peri-menopausa. 3. PERTURBAÇÕES GENITO-URINÁRIAS A mucosa da vagina, da uretra, e do terço inferior da bexiga têm origem embrionária comum, estrogénio-dependente. Assim, a diminuição dos estrogénios circulantes leva a atrofia da mucosa vaginal, aumento do ph e diminuição da secreção vaginal. Tais efeitos explicam as queixas frequentemente apresentadas pelas mulheres. Estas consistem em secura vaginal, com irritação local, dispareunia e aumento da frequência de infecções urinárias, bem como o aparecimento do síndrome ureteral. A diminuição dos níveis de estrogéneos causa uma diminuição da pressão ureteral, levando a incontinência urinária, inicialmente de esforço e com agravamento progressivo. Tal sintomatologia interfere muitas vezes na actividade sexual da mulher, diminuindo a líbido e a auto-estima, perturbando o relacionamento com o parceiro. Manifestações tardias 1. Alterações a nível cerebral 2. Alterações a nível cutâneo 3. Alterações a nível articular 4. Alterações cardiovasculares 5. Alterações ósseas 6. Alterações no peso 1. ALTERAÇÕES A NÍVEL CEREBRAL A carência estrogénica, embora por mecanismo desconhecido, parece estar associada a um aumento da incidência de doença de Alzheimer e de acidentes vasculares cerebrais. 2. ALTERAÇÕES A NÍVEL CUTÂNEO A diminuição de estrogénios causa uma perda progressiva do colagéneo cutâneo, causando uma diminuição da tonicidade a nível da pele, com um aparecimento acelerado das vulgares «rugas». 3. ALTERAÇÕES A NÍVEL ARTICULAR Embora não seja consensual, diversos estudos parecem demonstrar que a diminuição de estrogénios induz um aumento das queixas associadas a doenças reumáticas, como a artrite reumatóide, nomeadamente a nível das articulações das mãos. 4. ALTERAÇÕES CARDIOVASCULARES A diminuição dos estrogénios circulantes causa um aumento da incidência de enfarte agudo do miocárdio em mulheres a partir dos 50 anos, tornando-se a principal causa de morte. Nesta faixa etária, a mortalidade por doença cardiovascular ultrapassa, mesmo, a mortalidade associada às neoplasias. Os estrogénios conferem uma protecção cardiovascular muito importante: apresentam um efeito benéfico a nível do perfil lipídico, com diminuição do colesterol total, diminuição das LDL e aumento das HDL, tornando-os mais próximos do perfil lipídico ideal. 356 Rev Port Clin Geral 2003;19:353-7

Para além dos efeitos a nível do perfil lipídico, vários estudos demonstraram, ainda, que os estrogéneos favorecem a vasodilatação, diminuem o nível de homocisteína, têm um efeito neutro sobre a proteína C reactiva e diminuem o nível de fibrinogénio. Também diminuem a lipoproteína A e parecem ter efeitos positivos a nível do desenvolvimento da aterosclerose. Diversos estudos mostraram que as alterações do perfil lipídico são responsáveis por apenas 30% dos efeitos benéficos dos estrogéneos a nível cardiovascular; os outros mecanismos, referidos atrás, serão os responsáveis pelos restantes 70%. 5. ALTERAÇÕES ÓSSEAS OSTEOPOROSE A carência estrogénica traduz-se por um aumento precoce da incidência de osteoporose, com uma diminuição acentuada da densidade mineral óssea, em cerca de 20-30%, na primeira década após a menopausa. Tal deve-se a um aumento do metabolismo de reabsorção óssea e diminuição da fixação de cálcio no osso, e pode facilmente detectar-se por alterações dos marcadores de actividade óssea (fosfatase alcalina, p.e.). O impacto da osteoporose é enorme: por exemplo, nos EUA, mais de 1,5 milhões de pessoas já sofreram fracturas osteoporóticas. Após uma fractura da anca, apenas 50% dos doentes recuperam o mesmo grau de independência que apresentam antes da lesão, e 12 a 40% dos doentes com fractura da anca morrem em 6 meses. 6. ALTERAÇÕES NO METABOLISMO GANHO DE PESO Embora exista uma ideia generalizada que a mulher menopáusica tem tendência a aumentar de peso, tal não parece depender da carência estrogénica. Vários estudos demonstraram que o aumento de peso em mulheres na menopausa, parece estar relacionado, mais intímamente, com alterações fisiológicas e comportamentais associadas ao envelhecimento, do que com a privação estrogénica. Outros estudos parecem demonstrar que a menopausa aumenta a adiposidade central, mas não o ganho global de peso. Este apresenta uma relação directa com a diminuição da actividade física que se verifica nesta faixa etária. BIBLIOGRAFIA Silva DP, Silva, JA. Terapêutica hormonal de susbstituição na práctica clínica. Lisboa: Organon; 1999. Endereço para correspondência: Centro de Saúde da Reboleira Extensão da Damaia Praceta Conde da Lousã Damaia 2720 - Amadora Rev Port Clin Geral 2003;19:353-7 357