FISIOLOGIA DO ESTRESSE: ASPECTOS NEUROENDÓCRINOS E COMPORTAMENTAIS. Autores: Cármen Marilei Gomes, Juliana Azambuja da Silva



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FISIOLOGIA DO ESTRESSE: ASPECTOS NEUROENDÓCRINOS E COMPORTAMENTAIS Autores: Cármen Marilei Gomes, Juliana Azambuja da Silva

Estresse: Aspectos Gerais O estresse pode se definido como um esforço de adaptação do organismo para enfrentar situações ameaçadoras a sua vida e ao seu equilíbrio interno (FRANCI, 2005). Salienta-se que vem sendo motivo de estudo desde a antiguidade, quando era conceito central na medicina e na saúde (STRAUB, 2005). Um nível de estresse é necessário e saudável para que possamos desempenhar nossas diferentes atividades, porém, é para a sobrecarga de estresse que se deve chamar a atenção, pois é quando este pode vir a tornarse prejudicial (ROSSI, 2004). A palavra "Estresse" vem do inglês "Stress". Esse termo foi usado inicialmente na física para traduzir o grau de deformidade sofrido por um material quando submetido a um esforço ou tensão. Hans Selye foi o primeiro a utilizar o termo estresse em 1926, ao notar um conjunto de sintomas comuns em determinados pacientes, tais como, falta de apetite, hipertensão arterial, desânimo e fadiga. Ele transpôs este termo para a medicina e biologia, significando esforço de adaptação do organismo para enfrentar situações que considere ameaçadoras a sua vida e ao seu equilíbrio interno. Apesar de alguns autores conceberem o estresse como algo nocivo, desencadeado por estados emocionais negativos, essa resposta do organismo pode também ser precipitada por emoções positivas, percebidas como excessivas (McEwen, 2000). O que desencadeia ou não a resposta é a avaliação que o organismo faz da situação (Lipp, 2003; McEwen, 2000). O estresse pode ser compreendido como uma resposta necessária à manutenção da vida do organismo (Sardá et al., 2004). Conforme os estudos de Selye, o estresse pode ser dividido em três fases: a Fase de alerta, que ocorre quando os estímulos estressores iniciam e há resposta rápida do organismo como preparo para luta ou fuga. Esta fase termina com a restauração da homeostase, porém este estado de alerta não pode ser mantido por muito tempo; a Fase de resistência, que é onde aparecem as primeiras conseqüências mentais, físicas e emocionais, pois o organismo tenta restabelecer o equilíbrio interno para resistir ao estressor. Nesta fase, o organismo pode ficar mais desgastado e mais suscetível a doenças, tendo um desgaste generalizado e dificuldades de memória. O

indivíduo precisa utilizar mecanismos para controle do estresse a fim de conseguir sair desta fase, caso isso não ocorra, o estresse pode chegar a sua fase crítica; e a Fase de exaustão, que é quando começam os sintomas de irritabilidade, dificuldades para relaxar, isolamento social, alterações do sono, dificuldades sexuais, queda de cabelo, baixa autoestima, aumento da glicose circulante e colesterol. Com a permanência dessa fase, podem aparecer patologias mais graves como úlceras gástricas, doenças cardiovasculares, depressão, entre outras. De fato, o estresse prolongado pode afetar o crescimento corporal e o metabolismo, pode causar depressão da atividade da glândula tireóide e redução da função reprodutiva, incluindo distúrbios do ciclo menstrual. Também influencia nos aspectos motivacionais e cognitivos da aprendizagem (CHROUSOS; GOLD, 1992). Lazarus apud Straub (2005) desenvolveu o modelo transacional do estresse, no qual ele define que o impacto sobre a saúde provocado pelos problemas do cotidiano, depende da freqüência, intensidade e duração, como também são mediados pela personalidade e estilo individual de enfrentamento de cada indivíduo. Assim, alguns pesquisadores acreditam que indivíduos que apresentem um nível maior de ansiedade irão identificar mais estresse nos problemas do cotidiano (STRAUB, 2005). Desse modo, a personalidade ansiosa pode desencadear tanto estresse quanto os problemas enfrentados, pois o indivíduo irá reagir de forma exagerada aos eventos do dia-a-dia, ampliando o impacto das situações. Ao estudarmos a natureza de um evento estressor podemos defini-lo como quaisquer circunstâncias que ameaçam ou são percebidas como ameaçadoras do bem-estar do indivíduo. Tais ameaças podem ser relacionadas à segurança física imediata, à segurança em longo prazo, à autoestima, à reputação e demais comportamentos e ações que a pessoa valorize (WEITEN, 2002). Torna-se importante compreender que o estresse não é uma doença, ao contrário, em seu estado natural, proporciona ao indivíduo, defesa física e mental para reagir aos estímulos do ambiente de forma que se adapte às novas circunstâncias. Entretanto, em excesso, diminui a capacidade imunológica do indivíduo deixando-o vulnerável a várias doenças. É importante considerar que a avaliação e a identificação de uma situação estressora

ocorrem de forma subjetiva, ou seja, determinadas situações podem ser estressantes para uma pessoa e rotineiras para a outra. Resposta ao Estresse A resposta ao estresse, que permite a um organismo enfrentar situações ameaçadoras, consiste de uma rede complexa de sistemas biológicos, que incluem componentes neurovegetativos, endócrinos e comportamentais (CHARMANDARI et al., 2005; CHROUSOS & GOLD, 1992). A ação coordenada desses componentes, que atuam em conjunto, providencia a sobrevivência dos seres vivos devido à manutenção de um equilíbrio complexo no organismo, dinâmico e harmonioso, denominado de homeostase. A homeostase é ameaçada quando os organismos são expostos a situações de perigo. Nestas situações, ocorre uma série de respostas adaptativas, físicas e mentais, que se contrapõem aos efeitos dos estímulos estressantes na tentativa de restabelecer o equilíbrio (CHARMANDARI et al., 2005; CHROUSOS & GOLD, 1992; LÓPEZ et al., 1999). Sabe-se que a responsividade adequada do sistema de estresse é um pré-requisito crucial para a ocorrência da sensação de bem-estar e de interações sociais positivas. Em contraste, a responsividade inapropriada desse sistema pode causar uma série de alterações endócrinas, metabólicas, auto-imunes e psiquiátricas (CHARMANDARI et al., 2005). O sistema nervoso parece responder ao estresse de maneira complexa e organizada (KAUFMAN et. al., 2000). Há o estímulo do ambiente que o indivíduo recebe através de seu sistema sensorial. Esses estímulos dirigem-se até o encéfalo, onde serão traduzidos em percepções, ou seja, terão significados diferentes, conforme a interpretação que o organismo dará para eles. Isso dependerá das experiências anteriores com o mesmo evento ou com um evento parecido, do contexto e das características de personalidade do indivíduo. Caso o estímulo seja considerado um perigo, ou seja, uma ameaça, começa a resposta de luta ou fuga, que se dará da seguinte maneira: com a chegada do estímulo ao córtex cerebral, há liberação do hormônio liberador de

corticotrofina (CRH), sintetizado no hipotálamo, dando início à resposta ao estresse (CHARMANDARI et al, 2005). O CRH é secretado pela parte medial parvicelular do núcleo paraventricular do hipotálamo (PVN) e, de acordo com Elias e Castro (2005), recebe aferências noradrenérgicas que são importantes para a síntese e liberação do mesmo. Então, o CRH liga-se aos receptores na adeno-hipófise aumenta a liberação de peptídeos como o hormônio adenocorticotrófico (ACTH) e a β-endorfina (peptídeo opióide). Através da circulação sanguínea, o ACTH atinge o córtex da glândula adrenal, que está localizada acima do rim. Em seres humanos, a ação do ACTH no córtex da adrenal promove a liberação de um glicocorticóide denominado cortisol, que ativa mecanismos catabólicos, para lançar na corrente sanguínea uma grande quantidade de glicose necessária para a resposta ao estresse (ELIAS e CASTRO, 2005). É importante ressaltar que a parte medular da adrenal libera catecolaminas (adrenalina e noradrenalina) devido à ativação simpática do sistema neurovegetativo. Em conjunto, as ações das catecolaminas e dos glicocorticóides induzem alterações em mecanismos vegetativos, como a função cardiovascular, que dão o suporte necessário para o organismo restabelecer o equilíbrio. Também há mobilização da produção e distribuição de substratos energéticos durante a resposta ao estresse (KOPIN, 1995). Essas ações asseguram a manutenção do organismo durante situações adversas, principalmente por disponibilizar tais substratos. Assim, a resposta de emergência ocorre devido à ação integrada do sistema nervoso simpático, do hipotálamo e do sistema límbico que controla as emoções. Hormônios e neurotransmissores atuam em conjunto para modificar as funções viscerais e fornecer ao organismo a reação adequada para o retorno ao equilíbrio perdido (FRANCI, 2005). As ações compartilhadas desses sistemas mobilizarão respostas fisiológicas como: aumento e extensão de batimentos cardíacos; oxigênio mais rapidamente bombeado; respiração profunda; aumento da capacidade da visão pela dilatação das pupilas; contração do baço para liberar estoque de células sanguíneas mais rapidamente, para transportar o oxigênio; liberação de glicose a partir do fígado, que será usada pelos músculos; redistribuição de sangue para músculos e sistema nervoso; aumento de linfócitos para reparar danos

que podem ocorrer aos tecidos (GRAY, 1988). Todas essas reações são necessárias para que o organismo possa se adaptar a novas situações, ou mudanças. Porém, se exageradas em tempo de duração e intensidade, podem levar a um desequilíbrio interno (BALLONE, 2005). Os estudos de Selye (1956) com animais demonstraram que a exposição a fatores estressantes era acompanhada de aumento na liberação de corticosteróides, aparecimento de úlceras pépticas, no estômago e duodeno, involução de órgãos imunes como o timo e o baço, e hipertrofia do córtex das glândulas adrenais (ZIGMOND et. al. 1999). Sabe-se que os glicocorticóides acabam por inibir a resistência a infecção, segundo Gray (1988). No homem moderno, a resposta ao estresse ocorre da mesma forma como nos outros animais. Porém, a maioria dos animais tem os perigos que os cercam já reconhecidos, e os seres humanos, na maioria das vezes, não sabem exatamente sobre quais estímulos terão que dar conta no seu dia-a-dia, como trabalho, crises econômicas, engarrafamentos de trânsito, entre outros tantos, enfrentados no cotidiano (SARDÁ et al., 2004). Sabe-se que o estresse pode se tornar patológico como uma conseqüência dos esforços que o indivíduo realiza para a sobrevivência. Segundo Selye (1956) há dois tipos de estresse, que provocam conseqüências fisiológicas e patológicas diferentes, o positivo e o negativo. O estresse positivo foi denominado de eutresse, e seria a resposta adequada aos estímulos estressores. Já o estresse negativo, chamado por ele de distress, ou estresse excessivo, ocorreria quando o organismo entra em debilidade física e psicológica e não tem a resposta ideal, conduzindo a uma deficiência comportamental. Estresse e Trabalho Conforme Rossi (2004), pode-se dizer que é impossível viver sem estresse, pois em algum ponto da vida ele vai aparecer. Porém, deve-se ter atenção para a sobrecarga, devido aos danos emocionais e físicos que podem aparecer. Certo nível básico, chamado de estresse positivo, é necessário e

eficiente para que se possa ter prontidão para agir (ENGLERT, 2008). Para Trucco e colaboradores (1999), a presença de estresse se manifesta através de sintomas, e os prováveis casos levantados no seu estudo com profissionais de saúde indicam que os sintomas manifestos se mostram através de transtornos ansiosos, depressivos, entre outras alterações emocionais. As maiores queixas dos funcionários se encontram em relação à insatisfação quanto à participação e influência no local de trabalho, bem como a falta de controle sobre o seu próprio desempenho e, também, a questão de se sentir pouco valorizado. As causas de maior tensão e que mais acometem os trabalhadores são: sobrecarga, condições físicas inadequadas e o fato de ter que satisfazer a muitas pessoas. O estresse no trabalho pode ser definido com base nos fatores da ocupação que excedem a capacidade da pessoa de enfrentar os estressores organizacionais ou nas respostas fisiológicas, comportamentais e psicológicas dos indivíduos aos estressores (PASCHOAL e TAMAYO, 2005). De acordo com Straub (2005), quase todas as pessoas enfrentam, em algum momento, um determinado nível de estresse relacionado ao trabalho. Se esse for breve, pode não apresentar riscos, porém quando o estresse torna-se crônico, as conseqüências podem ser danosas. Conforme Sardá e colaboradores (2004), o caráter destrutivo do estresse promove uma série de problemas e danos às empresas, pois os funcionários atingidos tendem a faltar mais, se envolver com abuso de drogas e álcool e ter rendimento mais baixo. Tudo isso ocasiona um prejuízo geral para a organização. As mudanças econômicas, sociais, da tecnologia, enfim, as bases para a globalização que a sociedade tem enfrentado nos últimos anos acabam por gerar novos rumos e sentidos para o trabalho. Assim, provocam um forte impacto na vida dos trabalhadores (SARDÁ et al.,2004). Sabemos que o ambiente de trabalho se modificou para acompanhar as mudanças e isso se deu em uma velocidade maior que a capacidade dos trabalhadores de se adaptarem a essas novas condições de trabalho. Os profissionais, além de passar pelo estresse gerado a partir do trabalho, convivem com o estresse gerado pelo dia-a-dia, como segurança social, manutenção da família, exigências culturais, etc. (COLEMAN, 1992).

Com o desenvolvimento da Psicologia Organizacional e do Trabalho surgiram vários estudos relacionados à área da saúde, e o estresse passou a ser cada vez mais pesquisado. Tais abordagens permitiram que fossem observadas as relações de problemas emocionais e reações fisiológicas como conseqüência do ambiente profissional (ROSSETI et al. 2008). Segundo Paschoal e Tamayo (2005), o estresse ocupacional deveria ser visto através de variáveis interligadas, tais como estímulos do ambiente de trabalho e respostas não saudáveis das pessoas expostas a eles. Desse modo, o estresse ocupacional ocorre quando o indivíduo percebe as tarefas no trabalho como excessivas para a capacidade que possui em enfrentar, corroborando com os estudos de Straub (2005), que acredita que indivíduos com um nível maior de ansiedade irão identificar mais estresse nos problemas do cotidiano. Execução de atividades sem muita significação, repetitivas e desinteressantes, ou seja, a falta de estímulo no trabalho pode também resultar em estresse patológico. Outro fator importante como desencadeador de estresse é a carga horária trabalhada. Segundo pesquisas, mudanças de turnos e muitas horas seguidas podem causar riscos para a saúde, como alterações de sono, disfunções gastrointestinais e redução da atividade do sistema imunitário. (BALLONE, 2005). Estresse e o Sistema Imunitário Vários estudos indicam que o estresse devido à secreção dos glicocorticóides, exerce supressão da resposta imunizadora, aumentando a possibilidade de ocorrência de doenças infecciosas. Kiecolt-Glaser e colaboradores (1987) verificaram que as pessoas que cuidavam de membros da família portadores da doença de Alzheimer, que certamente eram submetidas a um estresse considerável, apresentavam uma debilidade em seu sistema imune. Já Knapp et al. (1992) observaram que quando pessoas saudáveis se imaginavam revivendo situações emocionais desagradáveis, ocorria uma supressão das respostas imunes, medidas em amostras de sangue. Ressalta-se que o estresse crônico é mais efetivo que o estresse agudo em causar uma supressão da resposta imunizadora (Dhabar e McEven, 1997). A interação entre atividade imunitária com o sistema de estresse pode

ser ilustrada, por um dado de que a vacinação pode não ser completamente efetiva em estabelecer a defesa imunológica se ocorrer em situações de estresse (Fridman e Irwin, 1995). Conforme Stone et al. (1987) há um aumento da incidência de infecções respiratórias em indivíduos que vivenciaram um maior número de eventos desagradáveis e um menor número de eventos agradáveis em seu cotidiano. Foi sugerido que esse efeito era causado por uma redução na produção de imunoglobulina A que está presente nas secreções das membranas mucosas, incluindo aquelas do nariz, boca, orofaringe e pulmões. Sabe-se que essa imunoglobulina funciona como a primeira defesa contra os microorganismos infecciosos que penetram pelo nariz e boca. Salienta-se que os efeitos imunológicos do estresse emocional podem ocorrer, em parte, independentes dos glicocorticóides, envolvendo uma cadeia mais complexa de eventos. Há evidências de que neurotransmissores e hormônios como catecolaminas, prolactina e hormônio do crescimento (GH) podem mediar efeitos imunes independentemente de glicocorticóides (FRANCI, 2005). Referências Bibliográficas BALLONE, G. J. Síndrome de Burnout. Disponível em: <http://virtualpsy.locaweb.com.br/index.php?art=311&sec=27>, revisto em 2005.Acesso em 17 de março de 2009. CHARMANDARI, E.; TSIGOS, C.; CHROUSOS, G.. Endocrinology of the stress response. Annual Review of Physiology, 2005. CHROUSOS, G. P.; GOLD, P. W. The concepts of stress and stress system disorders - Overiew of physical and behavioral homeostasis. The Journal of the American Medical Association, 1992. COLEMAN, V. Técnica de Controle do Estresse: Como administrar a saúde das pessoas para aumentar os lucros. Rio de Janeiro: Imago, 1992. DHABHAR, F.S.; McEWEN, B.S. Acute stress enhances while chronic stress suppresses cell-mediated immunity in vivo: a potential role for leukocyte trafficking. Brain, Behavior, and Immunology 11: 286-306, 1997. ELIAS, L. L.; CASTRO, M. Controle neuroendócrino do eixo-hipotálamohipófise- adrenal. In: ANTUNES-RODRIGUES J.; MOREIRA A. C.; ELIAS L. L.

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