ABORDAGEM SOBRE A BIENALIDADE DE PRODUÇÃO EM PLANTAS DE CAFÉ



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Transcrição:

ABORDAGEM SOBRE A BIENALIDADE DE PRODUÇÃO EM PLANTAS DE CAFÉ Rodolfo Ferreira de Mendonça 1, Wagner Nunes Rodrigues 1, Lima Deleon Martins 1, Marcelo Antonio Tomaz 2 1 Programa de Pós-Graduação em Produção Vegetal do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Espírito Santo (PPGPV/CCA/UFES), Alto Universitário, s/nº, Cx Postal 16, Bairro Guararema, CEP: 29500-000, Alegre-ES, Brasil, rfmendonca_br@yahoo.com.br. 2 Professor do Departamento de Produção Vegetal do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Espírito Santo (CCA/UFES). Data de recebimento: 07/10/2011 - Data de aprovação: 14/11/2011 RESUMO O café é um dos produtos primários mais valiosos na economia mundial. Um conhecido problema na produção de café é a grande variabilidade espacial e temporal da produtividade das plantas. A bienalidade de produção é caracterizada pela variação de anos com alta e baixa produção. Esse fenômeno é mais pronunciado no café arábica, mas também ocorre no café conilon, normalmente com menor intensidade devido as práticas de poda e alternância de ramos plagiotrópicos produtivos. A bienalidade de produção tem sido menor nos últimos anos devido a adoção sistemática de manejo diferenciado, com adequado uso dos diferentes sistemas de poda que vem sendo desenvolvidos, a adoção de novos tipos de manejo e a renovação gradual das lavouras, que vêm minimizado a sazonalidade das safras de café. Na literatura, são citados alguns fatores que podem influenciar a bienalidade produtiva das plantas de café e algumas tecnologias que podem reduzir o efeito da mesma, como o adensamento de plantio, a adoção de um sistema de irrigação e nutrição adequado, o melhoramento genético, entre outros. Experimentos e estudos vêm sendo realizados sobre esse assunto, mensurando a magnitude e investigando os fatores que podem afetar a bienalidade, para dar respaldo a adoção ou modificação das atuais práticas de manejo empregados na produção cafeeira. A partir do exposto, conclui-se que estudos científicos devem ser realizados para a geração de novas tecnologias ou melhoria das tecnologias de produção atuais, visando à redução dessa oscilação de produtividade. PALAVRAS-CHAVE: Cafeeiro, Coffea canephora, Coffea arabica, produtividade. APPROACH ABOUT THE BIENNIALITY OF YIELD IN COFFEE PLANTS ABSTRACT Coffee is one of the most valuable commodities in the global economy. A known problem in the coffee production is the large spatial and temporal variability of the plants yield. The bienniality of yield is characterized by the variation between years of high and low production. This phenomenon is more pronounced in the arabic coffee, but also occurs in conilon coffee, usually with less intensity due to the pruning practices and the alternation of the productive primary branches. The bienniality of yield has been lower in recent years due to the systematic adoption of different

management systems, with appropriate use of the different pruning systems that has been developed, the adoption of new types of management and the gradual renewal of crops, which have minimized the seasonal yield of coffee crops. The literature cites several factors that can influence the bienniality of yield of the coffee plants and some technologies that can reduce its effect, such as the increased density of planting, the adoption of proper irrigation and nutrition systems, genetic improvement, among others. Experiments and studies are being conducted on this subject, measuring the magnitude and investigating the factors that may affect the bienniality, to support the adoption or modification of current management practices employed in coffee production. The exposed information lead to a conclusion that scientific studies should be performed for the generation of new technologies or improvement of the current production technologies, in order to reduce this oscillation of the crop yield. KEYWORDS: Coffee, Coffea canephora, Coffea arabica, crop yield. INTRODUÇÃO O café é um dos produtos primários mais valiosos comercializados no mundo. A última estimativa da Companhia Nacional de Abastecimento indica uma produção de café na ordem de 43,15 milhões de sacas do produto beneficiado em uma área total que supera dois milhões de hectares. A produção de café no Brasil é oriunda do cultivo de duas espécies: café arábica e café conilon (CONAB, 2011a). O café arábica (Coffea arabica Lineu), que é a espécie mais cultivada no país, representa 74% da produção nacional e tem no Estado de Minas Gerais o seu maior produtor. O citado Estado é responsável por 67% do café arábica produzido no Brasil (CONAB, 2011a). É nativo de sub-bosques de regiões localizadas entre 1.600 a 2.000 metros de altitude, sendo mais adaptado a clima ameno e úmido, com estação seca de dois meses. É a única do gênero Coffea que além de ser tetraplóide é autógama. É unicaule e tolerante ao sombreamento. O teor de cafeína nos frutos dessa espécie é relativamente baixo (entre 0,9% e 1,5%) e apresenta uma bebida de qualidade superior, com o maior aroma e sabor (LIVRAMENTO, 2010). O café conilon (Coffea canephora Pierre ex Froehner) contribui na produção nacional com 26% de café beneficiado e o Estado do Espírito Santo se destaca como o maior produtor nacional dessa espécie, com 75% do total produzido (CONAB, 2011a). É uma espécie mais precoce, resistente e produtiva que C. arabica. Seu cultivo é realizado preferencialmente em ambientes quentes, com alta umidade relativa e baixa altitude, embora esta espécie seja encontrada a até 1.300 m. É alógama e apresenta uma grande diversidade genética, sendo encontrada maior variabilidade em relação às características agronômicas e morfológicas. É multicaule e necessita de um sistema de poda para manter uma arquitetura adequada ao cultivo. A quantidade de cafeína é maior (entre 2% e 4,5%), e essa espécie apresenta uma bebida com mais corpo, sendo empregada na formação de blends com C. arabica e na produção de café solúvel (FERRÃO et al., 2007; RONCHI & DAMATTA, 2007). Um problema constatado nas regiões produtoras de café refere-se à variabilidade espacial e temporal da produtividade das plantas, sendo muito comum, nas lavouras cafeeiras, plantas sem produção ao lado de plantas produtivas, bem como a bienalidade da produção, caracterizada pela variação de anos com alta e baixa produção (CARVALHO et al., 2004). ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 2

O objetivo dessa revisão de literatura é agrupar informações úteis sobre as características da variação bienal de produção de plantas de café, além de abordar aspectos de manejo que podem influenciar a magnitude da mesma. BIENALIDADE DA PRODUÇÃO CAFEEIRA A bienalidade é uma constante na cultura do cafeeiro, podendo ser considerada com sendo o fenômeno da alternância de grandes e pequenas produções ao longo do tempo. Esse fenômeno é mais pronunciado no café arábica, mas também ocorre no café conilon, normalmente com menor intensidade devido às práticas de poda e alternância de ramos plagiotrópicos produtivos. Essa alternância bienal de produção é própria da natureza fisiológica do cafeeiro, que necessita vegetar em um ano para produzir bem no ano seguinte (RENA & MAESTRI, 1985). BARROS (1997) afirma que a bienalidade da produção do café está ligada à relação fonte-dreno existente ente frutos e folhas, enquanto as folhas são fontes de fotossintetizados, os tecidos em crescimento atuam como drenos dos mesmos. Como ambas as fases reprodutiva do ano corrente e vegetativa para o ano seguinte ocorrem de maneira simultânea, a planta tende a balancear a partição de fotossintetizados. Nos anos de alta carga pendente, a planta direciona a produção de fotossintetizados para a formação e crescimento dos frutos. Nos anos de baixa carga pendente, estes são direcionados à formação de novas gemas vegetativas que gerarão novos ramos. Desse modo, a alta produção de um ano causa uma redução do crescimento vegetativo, em virtude do direcionamento das reservas metabólicas para a produção de frutos, e da consequente restrição do crescimento e redução da emissão de novos ramos laterais (PICINI, 1998). FAHL et al. (2003) afirmam que o crescimento dos novos ramos depende da quantidade de frutos em desenvolvimento nos ramos do ano anterior, e os volumes da produção são proporcionais ao número de nós ou gemas formadas na estação vegetativa anterior. Segundo GOUVEIA (1984), fatores de origem hormonal e nutricional que ocorrem em virtude de uma alta produtividade também podem atuar atrasando e restringindo a diferenciação das gemas em botões florais. PICINI et al. (1999) obtiveram resultados de produtividade do cafeeiro altamente dependentes da produtividade do ano anterior e particularmente sensíveis ao estresse hídrico durante o estádio fenológico do "final da dormência das gemas/florescimento" e do estádio "final do florescimento/início da formação do grão". A dimensão dessa oscilação de produção do cafeeiro pode ser medida matematicamente, como propôs STEVENS (1949), ao discutir as análises estatísticas em ensaios de variedades de cafeeiros. Esse autor sugeriu que a magnitude dessa bienalidade poderia ser medida pela subtração da média da produção dos anos de baixa da média dos anos de alta produção, sempre trabalhando com um número par de anos. Na Figura 1, são apresentadas as variações de produtividade ao longo dos últimos anos em alguns estados brasileiros em comparativo com a produtividade nacional, considerando ambas as espécies de café. Nota-se facilmente as oscilações entre anos de baixa produção (2001, 2003, 2005, 2007, 2009, 2011) e anos de alta produção (2002, 2004, 2006, 2008, 2010) na maioria dos estados, logo, a tendência nacional também se apresenta com comportamento bienal (Figura 1E). ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 3

* estimativa, Fonte: adaptado de CONAB, 2011b Figura 1. Variação temporal da produtividade da cultura do café nos estados de Minas Gerais (A), Espírito Santo (C), São Paulo (C), Paraná (D) e no Brasil (E) ao longo dos últimos 10 anos, em sacas de 60 kg do produto beneficiado por hectare (sc ha -1 ). ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 4

O estado do Espírito Santo tem apresentado uma evolução de produtividade ao longo dos últimos anos, com crescimento no total de café beneficiado produzido e uma redução na área de seu parque cafeeiro, com consequente aumento de produtividade (Figura 1D). A bienalidade de produção, notável nos demais estados, não se apresenta bem definida na média estadual do Espírito Santo. Esse comportamento pode ser explicado devido à grande proporção com que o café conilon contribui na produção total desse estado (73,4% do total de café produzido), sendo a citada espécie menos susceptível ao efeito da bienalidade do que o café arábica (que apresenta maior contribuição para a média dos demais estados). Além disso, no estado do Espírito Santo, o Programa de Renovação e Revigoramento do Café tem mitigado o efeito da bienalidade nos cultivos capixabas de café arábica, através da substituição de lavouras depauperadas, da adoção do adensamento de plantio, do uso de cultivares melhoradas e da adoção de novas tecnologias (CONAB, 2011c). Em geral, observando a Figura 1, nota-se que a bienalidade de produção tem sido menor nos últimos anos. Alguns fatores que podem explicar esse fato são a adoção sistemática de manejo diferenciado, com adequado uso dos diferentes sistemas de poda que vêm sendo desenvolvidos e a renovação gradual das lavouras, que vêm minimizando a sazonalidade das safras de café. FATORES QUE AFETAM A BIENALIDADE DE PRODUÇÃO Diversos fatores podem influenciar a bienalidade produtiva das plantas de café. A partir de práticas de manejo cultural adequadas, pode-se reduzir o efeito da mesma, a partir da adoção de uma série de medidas e tecnologias de cultivo que modificam alguns fatores no agroecossitema e predispõe as plantas de café a uma produção mais estável ao longo do tempo. A bienalidade é comumente atribuída à diminuição das reservas das plantas em anos de safra com altas produtividades, o que faz com que, em virtude do menor crescimento dos ramos plagiotrópicos, a produção no ano seguinte seja baixa (DAMATTA et al., 2007; SILVA et al., 2008). O plantio de cafeeiros no sistema adensado poderia ser responsável por uma maior estabilidade na produção, ou seja, pela diminuição do ciclo bienal, por induzir uma menor produção por planta que proporciona um menor desgaste do cafeeiro (MATIELLO, 2002; PREZOTTI & ROCHA, 2004; PEREIRA et al. 2011). Menores produções por planta em menores espaçamentos podem condicionar a redução na bienalidade de produção de cada planta, em decorrência de um menor esgotamento das plantas (DAMATTA et al., 2007). MAZZAFERA & GUERREIRO FILHO (1991) relacionaram o vigor da planta de café com os estádios vegetativos e concluíram que o vigor da planta está diretamente relacionado ao potencial de produção. Os mesmos autores afirmaram que uma boa produtividade é função da capacidade que a planta tem em alocar os produtos metabólicos diretamente para os frutos. O crescimento vegetativo pode ser influenciado negativamente pelo desenvolvimento dos frutos, limitando a formação de novos nós produtivos. A própria constituição genética das plantas pode também ter efeito sobre a bienalidade de produção. Existem genótipos de café com variadas características de vigor vegetativo, e que apresentam diferentes capacidades de recuperação de uma safra para outra; assim como genótipos com diferentes características produtivas, ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 5

alguns com menor carga pendente e maior estabilidade (Figura 2). A diversidade genética existente dentro do gênero Coffea, em espécie para a espécie Coffea canephora, é passível de exploração pelos programas de melhoramento. Logo, é possível que materiais genéticos menos bienais sejam utilizados para a formação de novas cultivares como uma medida de proteção contra os efeitos negativos dessa variação temporal da produção. Fonte: adaptado de BARROS et al., 2010 Figura 2. Produtividade de cultivares e seleções de café arábica ao longo de quatro safras na Zona de Mata-MG. O manejo da nutrição do cafeeiro também pode influenciar a bienalidade de produção, no entanto, a natureza e a magnitude dessa influência ainda carecem de esclarecimentos científicos. O que se pode afirmar é que existe alta correlação entre o manejo nutricional e a bienalidade, pois em anos de alta produção o cafeeiro se depaupera devido ao metabolismo elevado empregado pelo vegetal a fim de garantir todo o potencial da produção (MATIELLO et al., 2002). Este mecanismo aliado aos demais fatores, como a ocorrência de problemas fitossanitários, a ineficiência no manejo cultural e adversidades climáticas, acentuam a bienalidade no cafeeiro. Ainda em relação ao manejo nutricional, para reduzir a oscilação na produção de frutos de café, deve-se trabalhar com o manejo de reposição de nutrientes, com o objetivo de repor os nutrientes do solo e promover a nutrição adequada da planta. Pois, após altas produções, os cafeeiros passam por um período caracterizado por baixo metabolismo (MATIELLO et al., 2008). Desta forma, se na retomada metabólica a planta encontrar um ambiente onde a aquisição de nutrientes seja facilitada, é possível que a sua recuperação seja mais rápida do que em condições de baixa disponibilidade de nutrientes, com um possível efeito positivo na estabilidade de produção. ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 6

O efeito da bienalidade pode ser afetado ainda pelo manejo de irrigação adotado, pois o volume de água fornecido pode determinar a produtividade e a sua estabilidade ao longo do ciclo produtivo do cafeeiro. Em lavouras irrigadas, o efeito da bienalidade começa normalmente a partir do terceiro ou quarto ano de produção. No entanto, dependendo do aumento na produção, essa variação pode se acentuar e se antecipar ocorrendo ainda nos primeiros anos de produção (MATIELLO et al., 2002). O efeito de doenças e insetos-praga sobre a cultura também pode ser citado como um fator que pode alterar a oscilação de produção entre as safras. Algumas pragas e doenças causam desfolha, redução do crescimento dos ramos e perda de vigor nas plantas e, consequentemente, podem ter efeito negativo sobre a produtividade do ano seguinte. SILVA et al. (2010) afirmam que a colheita manual pode ser um dos principais fatores para a determinação da redução da produtividade de café na lavoura no ano subsequente, em função do dano físico causado pela desfolha na derriça dos frutos de café nas plantas, causando redução da radiação fotossinteticamente ativa interceptada pelo dossel e alterações fisiológicas no metabolismo dessas plantas. CONSIDERAÇÕES FINAIS Objetivando reduzir o efeito da bienalidade de produção, estudos científicos devem ser realizados para a geração de novas tecnologias ou melhoria das tecnologias de produção atuais, visando à redução dessa oscilação de produtividade. Experimentos e estudos vêm sendo realizados sobre esse assunto, mensurando a magnitude e investigando os fatores que podem afetar a bienalidade, para dar respaldo à adoção ou modificação das atuais práticas de manejo empregadas na produção cafeeira. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARROS, I. Produção das variedades Caturra e Mundo Novo de café em função do espaçamento, número de plantas por cova e condução das plantas. Piracicaba, 1997. 82 p. Dissertação (Mestrado) Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo. BARROS, U. V.; MATIELLO, J. B.; ALMEIDA, S. R. Produtividade inicial de novas seleções e cultivares de cafeeiros com resistência à ferrugem na zona da mata de minas. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PESQUISAS CAFEEIRAS, 6., 2010, Guarapari. A tecnologia floresce e o bom café aparece. Trabalhos apresentados... Varginha : MAPA/SDC/SPAE/DECAF/Fudação PROCAFÉ/CBP&D-Café/EMBRAPA- CAFÉ/INCAPER, 2010. p.10-11. CARVALHO, L. G.; SEDIYAMA, G. C.; CECON, P. R.; ALVES, H. M. R. A regression model to predict coffee productivity in Southern Minas Gerais, Brazil. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, Campina Grande, v.8, n.2/3, p.204-211, 2004. ENCICLOPÉDIA BIOSFERA, Centro Científico Conhecer - Goiânia, vol.7, N.13; 2011 Pág. 7

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