Reaproveitamento de Máquinas Caça-Níqueis Gustavo Rissetti 1 1 Acadêmico do Curso de Ciência da Computação Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) rissetti@inf.ufsm.br Resumo. Este artigo trata sobre o reaproveitamento de máquinas caça-níqueis apreendidas pela polícia. Há pouco tempo, os equipamentos apreendidos eram totalmente destruídos, gerando assim uma grande quantidade de lixo eletrônico. Atualmente, instituições e organizações começaram a participar de projetos relacionados com o reaproveitamento dessas máquinas, visando diminuir a produção de lixo eletrônico e possibilitando uma maior inclusão digital, visto que com o reaproveitamento, tais máquinas podem ser transformadas em computadores de uso pessoal com grande facilidade, uma vez que são constituídas pelos mesmos componentes eletrônicos utilizados na produção dos computadores. 1. Introdução Quando se fala sobre máquinas caça-níqueis, normalmente as pessoas têm uma certa desconfiança a respeito do assunto, uma vez que há tempos a população vem enfrentando e sentindo uma grande dor de cabeça que está sendo causada por vícios e endividamentos originários do uso dessas máquinas. Quando chegaram ao Brasil, os caça-níqueis acabaram se popularizando através de sua disponibilidade em estabelecimentos destinados a jogos, e até mesmo em bares comuns, espalhados pelas cidades brasileiras. Tendo conhecimento de tal popularização adquirida pelos equipamentos e sobre os vícios causados pelos mesmos, uma atitude tinha de ser tomada para conter a disseminação indevida de tais máquinas, que estavam gerando problemas a muitas pessoas, as quais poderiam cair na tentação de fazer a primeira a aposta e iniciar um possível vício causador de seu futuro endividamento. A solução para deter o processo de disseminação dessas máquinas foi a criação da lei de proibição dos caça-níqueis no Brasil. Com a chegada da nova lei [Garcia 2007] e o não cumprimento desta, milhares de máquinas foram apreendidas e começaram a ser acumuladas em depósitos da polícia. O destino dessas máquinas era a destruição, o que implicava na geração de grandes quantidades de lixo eletrônico, podendo causar sérios problemas à comunidade a curto e longo prazo, devido aos metais pesados e outras substâncias tóxicas contidas em seus componentes. Com a destruição também era retirada a oportunidade de muitas pessoas carentes terem acesso ao mundo digital. Se tais máquinas fossem reaproveitadas, elas poderiam ser utilizadas como um computador, afinal, os caça-níqueis na verdade são um tipo de computador, e, para usá-lo como tal, basta fazer o devido reaproveitamento de seus componentes. Trabalho apresentado à Prof a Andrea Schwertner Charão, como requisito parcial da disciplina de Computadores e Sociedade do Curso de Ciência da Computação da UFSM, em setembro de 2008.
2. Contextualização De acordo com [Rosa 2001], o primeiro registro histórico que se tem de loteria no Brasil data de 1784, quando foi realizada a primeira extração de loteria de bilhetes, tendo por objetivo a obtenção de fundos para a construção do prédio da Câmara de Vila Rica, hoje Ouro Preto, em Minas Gerais. Loteria, que tem sua origem no vocábulo italiano lotteria, significa, segundo o professor Aurélio Buarque de Holanda, toda espécie de jogo de azar em que se tiram à sorte prêmios aos quais correspondem bilhetes numerados. Após esse fato, começaram a surgir os famosos cassinos, oferecendo diversas modalidades de jogos, que envolviam uma grande quantidade de dinheiro. Mais tarde, os mesmos cassinos resolveram inserir uma nova modalidade em seus estabelecimentos que até então era desconhecida no país. Um jogo em que o apostador não precisasse saber as regras para jogar, bastando apenas fazer uma aposta inicial, com uma pequena quantidade de dinheiro, e se divertir tentando ganhar da máquina. Essa nova modalidade de jogo ficou conhecida como Caça-Níqueis. Inicialmente as máquinas eram inteiramente mecânicas, com bobinas cilíndricas que continham diversas figuras. Para o apostador ganhar ele tinha de puxar uma alavanca, fazendo com que as bobinas girassem, e quando elas parassem era necessário que uma linha horizontal com figuras idênticas tivesse sido formada. Posteriormente, os caçaníqueis eletrônicos começaram a ser produzidos, sendo então formados pelos mesmos componentes utilizados na fabricação de computadores de uso pessoal, como placas-mãe, fontes, processadores e memória. Porém, apenas foi mudado o material utilizado para a produção das máquinas, mas o jogo continuara o mesmo, tendo como objetivo a formação de linhas horizontais com figuras iguais. Também foi constatado que com as máquinas eletrônicas era mais difícil de o apostador ganhar o prêmio, visto que era mais fácil para os donos dos dispositivos trapassearem nos jogos, uma vez que esses eram programados via software. 3. Proibição dos Caça-Níqueis Como os caça-níqueis são compostos por componentes eletrônicos, que custam muito pouco e podem ser facilmente contrabandeados de outros lugares, tornou-se fácil sua construção de modo artesanal. Deste modo, muitas pessoas começaram a fabricar caçaníqueis em suas garagens e distribuí-los em bares e outros estabelecimentos assemelhados, a fim de garantir sua própria renda com a exploração ilegal de jogos de azar. Mesmo após a proibição por lei do uso de caça-níqueis isso continua sendo feito, segundo a reportagem publicada por [Poitevin 2008]. Para consolidar a proibição dos caça-níqueis foi criada a Lei n. o 12.519, de 2 de janeiro de 2007. Esta Lei proíbe a instalação, utilização, manutenção, locação, guarda ou depósito de máquinas caça-níqueis, de vídeobingo, vídeo-pôquer e assemelhadas, em bares, restaurantes e similares [Garcia 2007], permitindo assim, se ter um maior controle sobre a situação e poder apreender as máquinas que estavam se espalhando ilegalmente e de forma incontrolável. 4. Destino dos Caça-Níqueis Apreendidos Com a vigoração da Lei dos caça-níqueis, através de ações da polícia, inúmeras apreensões de máquinas caça-níqueis foram efetuadas.
O resultado da aplicação da lei foi o esperado, havendo um grande índice de apreensões e diminuindo significativamente a quantidade desses dispositivos espalhados pelo país. Apesar disso, o destino dos equipamentos apreendidos até então se mostrou pouco eficiente, e até mesmo prejudicial à população, quando considerada a poluição e contaminação do meio ambiente devido à produção de lixo eletrônico. 4.1. Destruição das Máquinas Depois de apreendidas, as máquinas caça-níqueis eram armazenadas em depósitos da polícia para aguardar o julgamento. Depois de efetuá-lo, todas as máquinas eram destruídas de alguma forma, seja por rolos compressores ou até mesmo a machadadas, como pode ser visto na noticia publicada por [Faro 2008]. Esse ato de destruição das máquinas apreendidas se mostrou bastante ineficiente, pois sempre se soube que esses equipamentos poderiam ter outro destino, uma vez que são formados por componentes que poderiam ser reaproveitados para outras finalidades, evitando assim a geração de mais problemas sociais como o vício e o endividamento dos indivíduos. 4.2. Reaproveitamento das Máquinas - Inclusão Digital Há pouco tempo o governo começou a perceber que poderia dar outro destino às máquinas apreendidas, reutilizando seus componentes eletrônicos. Atualmente várias instituições estão ligadas à projetos que visam reaproveitar os caça-níqueis apreendidos, sendo que alguns desses visam reutilizar as máquinas preservando sua aparência física, e utilizando o mínimo de material extra para o reaproveitamento. Um exemplo disso pode ser visto na Figura 1, onde é mostrado um caça-níquel que foi reaproveitado pela UNISUL, tendo grande parte de suas características físicas mantidas [Cathy 2008]. Figura 1. UNISUL-Caça-Níquel reaproveitado Como as máquinas caça-níqueis são compostas por componentes utilizados em computadores, fica bastante fácil transformá-las em um computador de uso pessoal. Isso torna viável a criação de projetos que visam a inclusão digital, visto que a maioria dos
projetos existentes tem por objetivo beneficiar escolas públicas que não possuem infraestrutura informatizada nem condições para adquirir computadores. O reaproveitamento dos equipamentos é bastante interessante também devido às configurações de hardware existentes nos mesmos. Como a maioria dos componentes é contrabandeado e as máquinas são montadas artesanalmente, pouco importa a configuração dos equipamentos para quem está montando, visto que a confecção de tais equipamentos não tem por objetivos altos investimentos. Muitas vezes um processador recente, mais veloz custa mais barato que um modelo ultrapassado, e como o que importa é o preço final das máquinas, algumas possuem configurações excelentes e custam mais barato para quem está produzindo. Um exemplo de como o reaproveitamento funciona e proporciona a inclusão digital é um projeto que está sendo realizado no Rio Grande do Sul. Para se ter uma idéia, de primeiro de janeiro até a primeira quinzena de julho deste ano, foram recolhidas 2.231 máquinas e um montante de R$ 245 mil em dinheiro no Rio Grande do Sul. Destas, 500 acabaram destruídas. As demais serão transformadas em computadores e distribuídas em escolas públicas gaúchas, por meio do projeto Alquimia - Transformando Caça-Níqueis em Inclusão Social, do Ministério Público [Poitevin 2008]. Como pode ser observado, a grande maioria das máquinas apreendidas atualmente estão sendo reaproveitadas e, além de contribuírem para o aumento da inclusão digital, fica clara a diminuição da produção de lixo eletrônico, pois a tendência é que não sejam mais publicadas notícias relatando que milhares de máquinas caça-níqueis foram destruídas por um rolo compressor, e sim, ficar sabendo que milhares dessas máquinas foram transformadas em computadores e estão sendo usadas em escolas, promovendo uma melhor qualidade educacional em instituições que não tinham condições de adquirir computadores para auxiliar nas atividades dos alunos. 5. Considerações Finais De acordo com as seções 4.1 e 4.2, pode ser constatado que existe uma grande preocupação em diminuir o lixo eletrônico produzido e em aumentar a inclusão digital no país. A reutilização das máquinas caça-níqueis é uma grande oportunidade de se alcançar tal objetivo, e, além disso, o reaproveitamento desses equipamentos significará que muitas pessoas poderão ser beneficiadas com os projetos, e não serão prejudicadas com as substâncias tóxicas presentes no lixo eletrônico que antes era produzido com a destruição dos dispositivos. Muitos projetos estão surgindo enquanto a matéria prima, os caça-níqueis, estão disponíveis. Nesses projetos muitas idéias podem surgir para dar um destino melhor aos componentes eletrônicos provenientes das máquinas apreendidas, sendo que a maior parte das idéias tem como objetivo principal o auxílio à escolas públicas, podendo assim melhorar as condições de ensino público do país. Referências Cathy, T. (2008). Receita federal recicla caça-níqueis. Disponível em: http://cathy.spaceblog.com.br/117583/ Receita-Federal-recicla-caca-niqueis/. Acesso em: setembro de 2008.
Faro, F. R. (2008). Caça-níqueis são destruídos a machadadas em londrina. Disponível em: http://www.bonde.com.br/bonde.php?id_ bonde=1-3-23-884-20080729. Acesso em: setembro de 2008. Garcia, R. (2007). Lei dos caça-níqueis. Disponível em: http://buenoecostanze. adv.br/index.php?option=com_content&task=view&id= 239&Itemid=68. Acesso em: setembro de 2008. Poitevin, D. (2008). Caça-níqueis viram computadores para as escolas. Disponível em: http://www.ziptop.com.br/jornalnh/noticias/noticias_ interna.asp?canal=8&ed=149&ct=730&cd=130282. Acesso em: setembro de 2008. Rosa, D. D. (2001). Legalidade da exploração econômica das máquinas denominadas caça-níqueis. Disponível em: http://www.advogado.adv.br/artigos/ 2001/denersondiasrosa/legalidademaquinasniqueis.htm. Acesso em: setembro de 2008.