ACIDENTES NAS ESCOLAS: UM OLHAR SOBRE OS PROCEDIMENTOS ADOTADOS ANDRADE *, Eliete Aparecida dos Santos - UEPG - PR. enfeliete@gmail.com OLIVEIRA**, Rita de Cássia da Silva UEPG - PR soliviera13@uol.com.br Resumo Nas últimas décadas, observa-se uma grande ebulição de programas e pesquisas na área de educação em saúde. Isso inclui ambientes apropriados e reorientação dos serviços de saúde para além dos tratamentos clínicos e curativos, assim como propostas pedagógicas libertadoras, comprometidas com o desenvolvimento da solidariedade e da cidadania, orientando-se para ações cuja essência está na melhoria da qualidade de vida do homem. O ambiente escolar é palco de grande número de acidentes. A prevenção desses eventos e o atendimento adequado às vítimas são importantes para redução de suas conseqüências físicas, emocionais, sociais e econômicas. O profissional enfermeiro tem se mostrado de grande importância para esse cenário. As práticas que vivencia são relevantes, pois além de promoverem a saúde, ainda, possibilitam apoiar outros profissionais. Pelo exposto, a presente pesquisa teve como objetivo capacitar os profissionais da Rede Municipal de Ensino de Ponta Grossa PR sobre os primeiros socorros dentro das escolas. Trata-se de uma pesquisa predominantemente exploratória e de cunho quanti-qualitativo, utilizando-se como instrumentos questionários para a coleta de dados. O trabalho foi realizado com o apoio da Secretaria de Educação, no período de março a agosto de 2005. De acordo com a análise dos resultados, concluiu-se o despreparo dos profissionais da educação para o atendimento inicial em casos de acidentes dentro das escolas, e que após capacitação, adquiriram noções básicas. Ficou evidenciado a importância do aprendizado para todo e qualquer cidadão, não devendo ficar restrito somente aos profissionais da saúde, pois com o atendimento adequado, muitas vidas poderão ser preservadas. Palavras-chave: Educação em Saúde; Saúde do Escolar; Primeiros Socorros. Introdução Este artigo é resultado de uma investigação realizada no ano de 2005, durante o trabalho de conclusão de curso intitulado Salvando Vidas com Educação. Mais especificamente aqui será tratada a questão da capacitação dos profissionais da educação ao que concerne a importância da qualidade do atendimento dos primeiros socorros, bem como * Enfermeira, professora colaboradora da Universidade Estadual de Ponta Grossa PR, mestranda em Educação pela UEPG PR ** Doutora em Educação, Professora do Mestrado em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa PR.
898 da participação dos profissionais da enfermagem inseridos no contexto educacional. Assim, o objetivo desse estudo foi complementar a formação dos professores da Rede Municipal de Ensino de Ponta Grossa PR, para o primeiro atendimento no caso de acidentes dentro da instituição escolar. Os encaminhamentos metodológicos baseiam-se predominantemente na pesquisa exploratória (ANDRADE, 1997) e de cunho quanti-qualitativa (MINAYO, 1998), para a coleta de dados foram desenvolvidos e utilizados questionários. Os dados coletados auxiliaram no processo da capacitação. É de suma importância lembrar que qualquer pessoa que deixe de prestar ou providenciar socorro à vítima, podendo fazê-lo, estará cometendo o crime de omissão de socorro, mesmo que não seja a causadora do evento. A omissão de socorro e a falta de atendimento de primeiros socorros eficientes são os principais motivos de mortes e danos irreversíveis nas vítimas de acidentes (BRASIL, 2002). Sabe-se que, poucas pessoas têm conhecimento de como proceder em casos de emergência e que muitas técnicas são empregadas de forma errônea, agravando ainda mais o estado da vítima. É possível dizer que, infelizmente, o conhecimento sobre primeiros socorros é restrito a determinadas profissões e atividades específicas, sendo, muitas vezes procedimentos pouco utilizados por uma parcela significativa de nossa população. Se as noções fundamentais de primeiros socorros fossem mais difundidas entre as pessoas muitas vidas seriam salvas, pois o conhecimento sobre estas questões é decisivo em casos de emergência. (TOMITA, 1999, p.163). O enfermeiro tem um papel de extrema importância nessa área, pois ensinando primeiros socorros à comunidade não estará promovendo somente a saúde, mas a vida. Os acidentes ocorridos no ambiente escolar são objetos de grande preocupação, pois além de ser uma local em que passam importante parte do seu dia, a criança está sujeita aos acidentes pela motivação em realizar tarefas, muitas vezes além de suas capacidades, com tendência para imitar comportamentos adultos (OLIVEIRA; GIMENIZ-PASCOAL, 2003). Verificou-se, durante a graduação, no período de internato em saúde pública, que em muitos dos acidentes que ocorriam nas escolas, as crianças eram levadas à unidade de saúde para o primeiro atendimento. Estas unidades, geralmente são bem próximas às escolas. Notou-se também, que além de acontecer muitos acidentes dentro das escolas não havia pessoas habilitadas para atender essas crianças, ou até mesmo funcionários e pais em situações de emergência. Diante dessa problemática é questionável: por que não há
899 profissionais habilitados a prestarem atendimento em primeiros socorros em casos de acidentes dentro das escolas? Em relação a esse questionamento, o setor da saúde não pode se manter alheio. Assim, justifica-se a atuação do enfermeiro no desenvolvimento e participação ativa no processo de capacitação dos profissionais das escolas da Rede Municipal de Ensino do Município de Ponta Grossa PR, para que prestem os primeiros socorros de maneira correta e imediata às vitimas, a fim de evitar complicações futuras. Capacitação dos profissionais da Rede Municipal de Ensino de Ponta Grossa PR Cada vez mais cedo crianças ingressam na escola e, muitas vezes, passam mais tempo dentro delas do que em suas casas, como no caso de instituições de Educação Infantil que atendem crianças desde a mais tenra idade. Por isso é também de responsabilidade das instituições de ensino proporcionar ambientes seguros que permitam que as crianças desenvolvam todo o seu potencial. Quando se pensa em segurança nas escolas, o pensamento inicial refere-se à violência, no entanto, existem também outros perigos no ambiente escolar como acidentes no playground, durante as práticas esportivas e recreativas e até mesmo dentro das salas de aula, entre outros. De acordo com Schmitz et al. (2000), a declaração dos direitos humanos da criança descritos em 1959, orienta questões que enfocam proteção e segurança da criança sem discriminação, pelo seu sexo, condição socioeconômica, cultural, lingüística ou religiosa. Ainda, quanto à declaração dos direitos humanos, o segundo princípio diz que: A criança gozará proteção especial e se ser-lhe-ão proporcionadas oportunidade e facilidades por lei, e por outros meios, a fim de lhe facultar o desenvolvimento físico, mental, moral e em condições de liberdade e dignidade. Na instituição de lei, visando este objetivo levar-se-ão em conta, sobre tudo, os melhores interesses da criança. (SCHMITZ et al., 2000, p. 205). Conforme cita o mesmo autor, o oitavo princípio diz que: A criança figurará, em qualquer circunstância, entre os primeiros a receber proteção e socorro. Os acidentes na infância são muito comuns e merecem uma atenção especial dos responsáveis, que devem saber como proceder nos momentos de dificuldades. Mais de 90% dos casos que se agravam em decorrência de choques, quedas e asfixias; freqüentes entre 0 e 6 anos, poderiam ser evitados se os primeiros procedimentos de atendimento fossem corretos. Os acidentes na infância, infelizmente, são algo bastante comum, porém não devem ser encarados como fatalidade. Eles podem ser evitados se forem consideradas as
900 características físicas e psicológicas da criança e do ambiente em que ela cresce e se desenvolve. Guedes; Silva; Freitas (2004, p.662) afirmam: Prevenção é considerada como toda medida tomada antes do surgimento de dada condição mórbida ou de um seu conjunto, com vistas a que tal situação não ocorra com pessoas ou coletividades ou, pelo menos, se vier a ocorrer, que isso se dê de forma mais branda ou menos grave. A promoção da saúde, prevenção de agravos na infância e a assistência integral são indispensáveis para a redução da morbimortalidade infantil e para obter uma melhor qualidade de vida para a criança, ou seja, que ela possa crescer e desenvolver tendo uma vida saudável (BRASIL, 2005). Vieira (2004) relata que 90% das lesões em crianças de 0 a 14 anos poderiam ser evitadas através de ações educativas, modificações no ambiente escolar, criação e cumprimento de legislação e regulamentação específica. Apesar de potencialmente previsíveis e preveníveis, os acidentes na infância são responsáveis pela alta taxa de morbimortalidade, sendo necessárias ações imediatas, ou seja, primeiros socorros (BRASIL, 2005). O papel do professor na escola é muito importante para a formação intelectual do aluno, porém não possui conhecimentos científicos suficientes no que tange à promoção da saúde e prevenção de doenças e acidentes, o que não acontece com o enfermeiro, que possui preparo tanto pedagógico quanto científico contribuindo na solução de problemas que envolvem a saúde do escolar. O enfermeiro, dentre outros profissionais de saúde, é considerado aquele que mantém maior contato com a população nos diversos níveis de atendimento. Pela sua formação, o enfermeiro possui como característica o educar em saúde, tendo competência e autonomia plena de ação para sensibilizar o indivíduo, a família e a comunidade (LOPES, 2003). É também da competência do enfermeiro, através da educação em saúde preparar os demais profissionais da educação e até mesmo os pais de como procederem em casos de acidentes com as crianças. Verificou-se que nas escolas da Rede Municipal de Ensino em Ponta Grossa / PR não existem profissionais de enfermagem inseridos, ou seja, não há enfermagem escolar e nem profissionais da educação qualificados a prestarem primeiros socorros em casos de acidentes.
901 O artigo 135 do Código Penal Brasileiro é bem claro: deixar de prestar socorro à vítima de acidentes ou pessoas em perigo eminente, podendo fazê-lo, é crime. (BRASIL, 2002, p.82). Segundo Thygerson (2002, p.8), é melhor saber primeiros socorros e não precisar do que precisar e não saber. Desta forma, a capacitação de profissionais da Rede Municipal de Ensino de Ponta Grossa / PR, se deu através da educação em saúde. Procurou-se esclarecer as principais dúvidas, de acordo com o levantamento de dados, orientando sobre os procedimentos cabíveis na ocorrência de acidentes dentro das escolas. Material e Métodos Os encaminhamentos metodológicos baseiam-se predominantemente na pesquisa exploratória (ANDRADE, 1997) e de cunho quanti-qualitativa (MINAYO, 1998), para a coleta de dados foram desenvolvidos e utilizados questionários. Os dados coletados auxiliaram no processo da capacitação. Esse estudo foi desenvolvido em 112 (100%) escolas da Rede Municipal de Ensino de Ponta Grossa, através da Secretaria Municipal de Educação. Dessas, 76 escolas (68%) concordaram em participar da capacitação, através de um representante, assinando o termo de consentimento livre e esclarecido. A coleta de dados foi realizada no período de maio a junho de 2005, através de um questionário com perguntas abertas e fechadas enfocando dados relativos ao conhecimento e preparo dos profissionais da área de educação quanto ao primeiro atendimento em caso de acidentes; aos acidentes que mais ocorrem dentro das escolas, o local, horário e as medidas de primeiros socorros adotadas por esses profissionais. As perguntas abertas foram citadas na análise dos dados, obedecendo ao anonimato das participantes. As citações foram descritas em nomes de planetas e letras do alfabeto romano. Com base nos dados coletados, foi elaborada uma capacitação em primeiros socorros, juntamente com uma cartilha confeccionada pelas acadêmicas. A capacitação foi ministrada nos dias 15, 17 e 30 de agosto/2005, com carga horária de 8 horas diárias por turma, perfazendo um total de 24 horas, sendo abordados conteúdos teórico/práticos. Os representantes foram divididos em três turmas, para melhor aproveitamento. Inicialmente seriam 76 participantes, mas houve sete desistências.
902 Na capacitação em primeiros socorros, compareceram 69 escolas, sendo seus representantes: 18 diretoras (26%), 33 pedagogas (48%), 5 professores (7%), 5 escriturarias (7%) e 8 auxiliares de serviços gerais (12%). Utilizaram-se como material didático multimídia, boneco para ressuscitação, placas emborrachadas de queimaduras, cobras e aranhas em formol. Para avaliar o aproveitamento dos profissionais foi realizado um pré-teste no início e um pós-teste no final da capacitação, contendo dez perguntas de múltipla escolha, com apenas uma alternativa correta. Não foi solicitada a identificação dos participantes. Considerações Finais Segundo Minayo (1998), a análise e discussão dos resultados possuem três finalidades: estabelecer uma compreensão dos dados coletados, confirmar ou não os pressupostos da pesquisa e ampliar os conhecimentos sobre o assunto pesquisado, unindo-o ao contexto cultural do qual faz parte. Desse modo, a partir das respostas do questionário, tentou-se extrair os dados mais significativos para esta pesquisa procurando atingir os objetivos que foram propostos. Observou-se que, ao serem indagados quanto ao procedimento tomado quando um acidente ocorre dentro das escolas, os profissionais têm diferentes atitudes: [...] acalmo a criança, chamo os pais e levo ao Pronto Socorro. (Sol) [...] fazemos encaminhamento para a Unidade de Saúde. (Lua) [...] a criança é atendida pelas pedagogas, se necessário, chamamos a família e em casos extremos o SIATE. (Marte) [...] quando é simples, lavamos os ferimentos e aplicamos remédio. (Vênus) [...] o responsável é chamado e dependendo do acidente recorremos ao Pronto Socorro. (Júpiter) [...] em caso de ferimento leve é feito curativo na própria escola, caso contrário o aluno é levado ao posto de saúde próximo. (Saturno) [...] ligar para o SIATE pedindo informações. (Urano) Diante dessas falas pode-se constatar que os profissionais da Educação não estão preparados para enfrentar os problemas levantados pelo estudo em questão. Durante o contato com os profissionais da Educação teve-se a oportunidade de constatar as dificuldades que enfrentam e ouvir dos mesmos, queixas sobre não saber o que fazer diante de situações
903 emergenciais, acentuando sua falta de preparo para tais atividades e a necessidade de existir presente um profissional da área de saúde orientando-os. Os pós-testes revelaram que houve um aproveitamento significativo, e que a capacitação ajudou os profissionais da educação a esclarecerem suas dúvidas, a desmistificar conceitos errados, e até mesmo tranqüilizá-los perante as situações de emergência em relação à forma de proceder. Ressalta-se que o enfermeiro ocupa um espaço importante na promoção de saúde e prevenção de acidentes dentro das escolas, atuando como educador junto à família, à escola e à comunidade. Desse modo, fica evidenciada a importância do profissional enfermeiro em buscar seu espaço em lugares onde ainda não há a inserção da enfermagem, para garantir melhorias na qualidade de vida da população. Observa-se, através da literatura consultada, (VIEIRA, 2004) que há um consenso do benefício que a assistência de enfermagem pode trazer para a população escolar, ocupando um espaço importante por atuar como educador junto à família, escola e comunidade. No Brasil, pelo fato de haver poucas pesquisas científicas produzidas, há uma lacuna de informações em relação aos acidentes ocorridos nas escolas. Portanto, são valiosos estudos que se voltem especificamente para estes acidentes, já que ocorrem com freqüência e implicam em prejuízo ao aluno, bem como os profissionais destas instituições podem atuar prevenindo estes acidentes e promovendo a segurança do ambiente, ao mesmo tempo em que trabalham a formação dos alunos neste aspecto. Em suma, pretende-se com este trabalho ter contribuído de alguma maneira com reflexões a respeito dos acidentes ocorridos nas escolas entre profissionais da área da saúde e da educação no sentido de desencadear ações educativas que promovam a segurança e proteção das crianças e a prevenção de acidentes na escola e fora dela. Por tratar-se de um estudo pioneiro no Município de Ponta Grossa / PR, este servirá de base para indicar novos rumos e sustentar estratégias de trabalho, como programas educativos na área de prevenção e primeiros socorros, contribuindo para o aparecimento de uma realidade bem diferente da qual vivemos. REFERÊNCIAS ANDRADE, M. M. Introdução à metodologia do trabalho científico. In:. Pesquisa científica: noções introdutórias. 2 ed. São Paulo: Atlas, 1997. p.101-107.
904 BRASIL. Código Penal Brasileiro: Decreto-lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940. São Paulo: Saraiva, 2002. art.135. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ação Programática Estratégicas. Agenda de Compromissos para a Saúde Integral da Criança e Redução da Mortalidade Infantil. Brasília, 2005. GUEDES, M. V. C.; SILVA, L. F.; FREITAS, M. C. Educação em Saúde: objeto de estudo em dissertações e teses de enfermeiras no Brasil. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, v.57, n.6, p. 662-665, nov./dez. 2004. LOPES, G. T. A formação do enfermeiro e o fenômeno das drogas no Brasil e na Colômbia: conhecimentos, atitudes e crenças. A realidade do Rio de Janeiro. Ribeirão Preto: USP, 2003. MINAYO, M. C. S. O Desafio do Conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 5. ed. São Paulo: Hucitec-Abrasco, 1998. OLIVEIRA, R. A.; GIMENIZ-PASCHOAL, S. R. Acidentes em escolares e pré-escolares: subsídios para ações educativas do fonoaudiólogo com professores da educação infantil. In: JORNADA DO NÚCLEO DE ENSINO DE MARÍLIA, 2., 2003, Marília. Resumos... Marília: Universidade Estadual Paulista, 2003. p. 29-30. SCHMITZ, E. M. R. et al. A Enfermagem em Pediatria e Puericultura. São Paulo: Atheneu, 2000. THYGERSON, ALTON E. D. Primeiros Socorros. 4.ed. São Paulo: Randal Fonseca, 2002. TOMITA, R.Y. Atlas compacto do corpo humano. São Paulo: Rideel, 1999. VIEIRA, S. C. Prevenção de Acidentes com Crianças. In: Fórum de Prevenção de Acidentes com Crianças,1., 2004, São Paulo. Anais eletrônicos... São Paulo: ABIB, 2004. Disponível em<http://www.criancasegura.org.br/crianca_dados.asp>. Acesso em 05 set. 2005.