XIX CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA 27 de setembro a 01 de outubro de 2010



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Transcrição:

CARACTERIZAÇÃO DA ANUROFAUNA DA ÁREA DO INSTITUTO DE PERMACULTURA CERRADO-PANTANAL E MATA ATLÂNTICA, NO MUNICÍPIO DE CARRANCAS, MG. FELIPE FERNANDES 1 & MARCELO PASSAMANI 2 RESUMO Este trabalho foi realizado com o objetivo de caracterizar e diagnosticar a anurofauna da área onde está sendo instalada a sede do IPCP-MA, avaliando também a sua distribuição nos diferentes tipos de ambiente encontrados na região. Ao longo de uma campanha em Outubro de 2008, foram amostrados ambientes diversificados quanto ao tipo de corpo d água, fitofisionomia e altitude, utilizando a metodologia convencional para observação e coleta de anfíbios. Foram registradas para a região 15 espécies, distribuídas em seis famílias. Em geral, pode-se afirmar que grande parte da anurofauna da área do IPCP-MA é composta principalmente por espécies típicas de áreas de Cerrado. Foram observadas poucas espécies consideradas generalistas ou de ampla distribuição geográfica, o que sugere um baixo grau de modificação antrópica nos ambientes amostrados. Palavras-chave: Anfíbios, Inventário, Conservação INTRODUÇÃO O município de Carrancas está situado na região do Campo das Vertentes, estado de Minas Gerais (IBGE 2010), em uma área de transição entre os biomas Cerrado e Mata Atlântica. Dentre as diversas formações vegetacionais encontradas no município, há grandes áreas de campo rupestre, matas de galeria e campos naturais de gramíneas, bem como outras fisionomias típicas de Cerrado (IBGE 2010). Segundo maior bioma do Brasil em área de abrangência, o Cerrado conta com somente 1,2% de área protegida legalmente sob a forma de Unidades de Conservação. O bioma distribui-se por doze estados brasileiros, apresentando uma alta heterogeneidade ambiental (IBGE 2010). A intensa pressão antrópica a que o Cerrado vem sendo submetido confere ao bioma o status de hotspot de biodiversidade, o que indica uma demanda de ações urgentes para conservação (MYERS et al., 2000). Existem cerca de 141 espécies de anfíbios no Cerrado, sendo 47 endêmicas (BASTOS- 2007). Entretanto, o conhecimento sobre a história natural, distribuição geográfica, histórias de vida e aspectos ecológicos de muitas destas espécies ainda são desconhecidos. Muitas áreas ainda não foram inventariadas ou foram sub-amostradas e a maioria dos dados não são publicados em periódicos e revistas científicas, apesar da clara necessidade de informações básicas para subsidiar ações conservacionistas (SILVANO & SEGALLA, 2005). Os estudos mais detalhados concentram-se no Brasil Central, e ainda assim o conhecimento da fauna de anfíbios do Cerrado é extremamente limitado (BRASILEIRO et al., 2005). Em Minas Gerais existem poucos estudos sobre a anurofauna do cerrado mineiro, apesar do estado ser predominantemente ocupado por este tipo vegetacional. Na região do Campo das Vertentes, especialmente na microrregião de Lavras, os trabalhos publicados até o presente momento são pouco representativos quanto à diversidade anurofaunística, uma vez que deram foco a aspectos ecológicos e abrangeram áreas relativamente restritas (CEREZOLI-2008). O conhecimento dos grupos de anfíbios que compõem as comunidades, bem como a compreensão de suas inter-relações, dinâmica de organização e características da história natural das espécies são ferramentas importantes para o delineamento de estratégias de manejo sustentável de ecossistemas (SILVANO & SEGALLA, 2005). Os anfíbios possuem a pele permeável e dependem da água para sua reprodução e por isso são apontados como 1 2 Graduando em Ciências Biológicas (Bacharelado) UFLA - felipeufla@gmail.com Professor Adjunto - Setor de Ecologia, DBI/UFLA - Orientador

possíveis indicadores de qualidade ambiental. Algumas espécies são extremamente exigentes no que diz respeito à integridade ambiental (qualidade da água, vegetação do entorno, sombreamento e manutenção da umidade), sendo que sua presença pode indicar ambientes bem preservados. Por outro lado, espécies generalistas e/ou oportunistas são bem tolerantes às alterações do ecossistema, colonizam rapidamente ambientes degradados e são pouco exigentes quanto aos parâmetros supracitados (BEEBEE-1996). Desta forma, a presença destas espécies pode indicar uma área degradada, inclusive muitas delas chegam a ocorrer em áreas urbanas. A carência de estudos básicos sobre a estrutura e organização das comunidades de anuros do Cerrado é alta, existindo uma enorme demanda para subsidiar a elaboração de listas de espécies ameaçadas de extinção, estratégias de manejo sustentável e conservação das áreas remanescentes de Cerrado em Minas Gerais (SILVANO & SEGALLA, 2005). Neste contexto, o presente trabalho pretendeu responder às seguintes questões: - Quais espécies de anfíbios anuros ocorrem na área pertencente ao Instituto de Permacultura Cerrado-Pantanal e Mata Atlântica, no município de Carrancas-MG? - Como as espécies estão espacialmente distribuídas nos diferentes ambientes dentro da área? MATERIAL E MÉTODOS Área de estudo A área onde está sendo implementado o Instituto de Permacultura Cerrado-Pantanal e Mata Atlântica (Figura 1) está situada ao norte da zona urbana do município de Carrancas, e é delimitada pelo Córrego da Bexiga (ao leste) e Córrego da Cachoeira (a oeste). Abrange parte da Serra de Carrancas, numa área de aproximadamente 300 hectares de extensão, e é coberta em sua maior parte por campos naturais de gramíneas, afloramentos rochosos e matas de galeria. Figura 1 - Unidades amostrais distribuídas na área de estudo. Os pontos amostrais foram determinados em função de características ambientais propícias à ocupação de anfíbios, como presença de corpos d água. A distribuição dos pontos na área de estudo também foi considerada, para que a amostragem abrangesse a maior diversidade ambiental possível.

Coleta e análise de dados O estudo foi executado com base na metodologia da Avaliação Ecológica Rápida (AER), publicado pela The Nature Conservancy (TNC) em 2003, cujo objetivo é coletar e analisar o maior número de informações em um curto espaço de tempo. Entre doze e dezenove de outubro de 2008 foi realizada uma única campanha de campo para amostragem da anurofauna. No primeiro dia foi feito o reconhecimento da área, a definição dos pontos de coleta e o início das amostragens. As coletas de dados consistiram principalmente de buscas visuais em sítios favoráveis à ocupação de anfíbios, como brejos, poças e riachos, dentro da mata e em ambientes de formação aberta, incluindo áreas relativamente bem preservadas e também aquelas com algum grau de atividade humana. O acesso aos pontos de observação se deu por intermédio de estradas e trilhas já existentes. Uma vez que a maioria das espécies de anfíbios apresenta atividade mais intensa durante a noite, as amostragens foram concentradas no período noturno, iniciando-se pouco antes do entardecer e estendendo-se até aproximadamente 23:00h (em média 6 horas). As buscas foram realizadas sempre em duplas, com auxílio de lanternas de mão. Os anfíbios observados foram registrados para cada ponto amostral, e foram anotadas informações sobre abundância relativa e atividade reprodutiva das espécies. Alguns animais foram capturados manualmente, sendo então acondicionados em sacos plásticos contendo vegetação local, para evitar o ressecamento e compressão dos espécimes. Estes foram posteriormente fotografados e, no caso daqueles facilmente identificáveis, foram libertados. Os espécimes de difícil identificação foram coletados, mortos com pomada de Xilocaina 5% e fixados em formol 10% (as coletas foram autorizadas pelo IBAMA através da licença 10704-1). Os exemplares foram montados em posição padrão, em bandejas plásticas e posteriormente conservados em álcool a 70%. Para auxiliar o trabalho taxonômico foram feitas consultas a bibliografias e publicações específicas. Também foram realizadas consultas a especialistas e comparações com material depositado em coleções, o que permitiu a correta identificação dos espécimes. Todo o material testemunho (29 espécimes adultos) foi depositado na Coleção Herpetológica da Universidade Federal de Alfenas - MG. Foram registrados ainda o esforço amostral (30x2 horas/homem), aspectos gerais da vegetação em cada ambiente estudado e informações sobre micro-ambientes ocupados pelos anuros. Os procedimentos acima seguem, com variações e adaptações, as metodologias Complete Species Inventories, Visual Encounter Surveys e Audio Strip Transects, citadas em Heyer et al. (1994). RESULTADOS E DISCUSSÃO Tabela 1 Lista de espécies, pontos amostrais em que foram registradas (AB= Afluente do Córrego da Bexiga; CA= Campo Alagado; CB= Córrego da Bexiga; NB= Nascente do Córrego da Bexiga; NC= Nascente do Córrego da Cachoeira; RT= Riachos Temporários e Alagado) e abundância relativa em cada ponto (I= 1-5 indivíduos; II= 6-10; III= >10). Espécie Família AB CA CB NB NC RT Ischnocnema juipoca Brachycephalidae - - - I - - Rhinella rubescens Bufonidae I - - I - - Vitreorana uranoscopa Centrolenidae - - - I I I Bokermannohyla cf. luctuosa Hylidae - - - I - - Hypsiboas albopunctatus Hylidae I I - - - - Hypsiboas lundii Hylidae - I II I - - Phyllomedusa ayeaye Hylidae II - - I - III Scinax longilineus Hylidae III - III II - II Scinax squalirostris Hylidae - III - - - - Physalaemus cuvieri Leiuperidae - III II II - - Pseudopaludicola saltica Leiuperidae I III - II - III

Leptodactylus cunicularius Leptodactylidae I - - - I II Leptodactylus furnarius Leptodactylidae - III - - - III Leptodactylus labyrinthicus Leptodactylidae - - - I - - Leptodactylus ocellatus Leptodactylidae - - I - - - Ao longo das 60 horas/homem de busca, foram registradas 15 espécies de anfíbios, distribuídas nas famílias: Brachycephalidae (1), Bufonidae (1), Centrolenidae (1), Hylidae (6), Leiperidae (2) e Leptodactylidae (4). A relação destas espécies e as unidades amostrais em que foram encontradas estão apresentados na Tabela 1. A riqueza de espécies registrada neste estudo (N =15) pode ser considerada baixa devido ao fato da campanha ter sido realizada bem no início da estação chuvosa, época esta em que muitas espécies ainda não iniciaram sua atividade de reprodução, e também pelo curto período de amostragem, resultando em baixo esforço amostral. Figura 2 Progressão do número total de espécies registradas ao longo do estudo. A composição da comunidade anurofaunística da área de estudo assemelha-se à registrada em outros trabalhos realizados na região, nos municípios de Luminárias (FERREIRA et al., 2007) e Lavras (GEDRAITE et al., 2008). Cerezoli (2008) registrou 17 espécies de anfíbios para o município de Carrancas, sendo 11 encontradas nas florestas montanas da Chapada das Perdizes, e outras 6 amostradas ocasionalmente na área do município. Se somadas as espécies encontradas fora da área do IPCP-MA (N=4), mas ainda no município de Carrancas, a riqueza encontrada no presente estudo atinge um valor próximo daquele registrado por Cerezoli (2008). No entanto, 7 das 17 espécies encontradas nesse estudo anterior não foram registradas no presente trabalho, o que corrobora a necessidade de amostragem mais extensa, para que se possa conhecer melhor a anurofauna da região. Em geral, pode-se afirmar que grande parte da anurofauna da área do IPCP-MA é composta principalmente por espécies típicas de áreas de Cerrado, como Ischnocnema juipoca, Rhinella rubescens, Hypsiboas albopunctatus, Hypsiboas lundii, Pseudopaludicola cf. saltica, Leptodactylus cunicularius e Leptodactylus furnarius. Foram observadas poucas espécies consideradas generalistas ou de ampla distribuição geográfica (Scinax squalirostris, Physalaemus cuvieri e Leptodactylus ocellatus), o que sugere um baixo grau de modificação antrópica nos ambientes amostrados. A existência de populações numerosas de Phyllomedusa ayeaye na área de estudo também deve ser ressaltada, uma vez que este se constitui em um novo registro para a espécie, bem como a ampliação da sua distribuição geográfica conhecida até o momento. Além disso, a espécie é considerada como criticamente em perigo pela IUCN (CARAMASCHI et al., 2008), o que torna a

manutenção das populações de P. ayeaye no IPCP-MA uma importante ferramenta para a conservação da espécie. Dentre as demais espécies registradas, também destacam-se aquelas pouco abundantes e especialistas na ocupação ambiental, como Vitreorana uranoscopa, Bokermannohyla cf. luctuosa e Scinax longilineus, encontradas apenas em matas de galeria com altitude acima de 1000m. Os ambientes temporários amostrados se mostraram extremamente relevantes para algumas espécies, sendo que somente em riachos temporários foi observada atividade reprodutiva de Leptodactylus cunicularius e Phyllomedusa ayeaye. Pseudopaludicola saltica e Leptodactylus furnarius também ocorreram apenas em ambientes temporários, sendo abundantes em alagados nas áreas de campo limpo. Desta forma, deve-se enfatizar a relevância das matas de galeria e dos ambientes temporários em áreas de campo para a manutenção de espécies raras ou ecologicamente restritas da anurofauna do município de Carrancas. Considerando as diferenças nas comunidades de anuros observadas em cada um dos pontos amostrais (Tabelas 1 e 2), foi possível inferir, ainda que superficialmente, a importância de cada uma das áreas para a manutenção da diversidade local. Tabela 2 Riqueza total e nº de espécies exclusivas, espécies raras ou especialistas e espécies generalistas / de ampla distribuição, para cada um dos pontos amostrais (AB= Afluente do Córrego da Bexiga; CA= Campo Alagado; CB= Córrego da Bexiga; NB= Nascente do Córrego da Bexiga; NC= Nascente do Córrego da Cachoeira; RT= Riachos Temporários e Alagado). Ponto Data da Riqueza de Espécies Spp raras/ amostragem spp exclusivas especialistas AB 16/10 6 0 3 0 CA 12/10 e 16/10 6 1 0 2 CB 14/10 4 1 1 2 NB 15/10 10 3 4 1 NC 17/10 2 0 2 0 RT 15 e 18/10 6 0 4 0 TOTAL 12-18/10 15-5 3 Spp de ampla distribuição A nascente do Córrego da Bexiga (NB) aparece como o ponto de maior riqueza de espécies, além de apresentar mais espécies raras ou especialistas e também o maior número de espécies encontradas exclusivamente nesta área. Dessa forma, a região pode ser considerada como a mais relevante para a anurofauna, devendo ser preservada integralmente. O campo alagado adjacente ao córrego da bexiga (CA), apesar da aparente perturbação ambiental sofrida e da ocorrência de espécies bastante generalistas, aparece como uma área razoavelmente importante para a anurofauna da região, tendo em vista a riqueza de espécies observada e principalmente a alta abundância de espécies observadas em atividade de reprodução no local. O topo do morro, onde são encontradas as ravinas (RT), além de ter apresentado riqueza relativamente alta, abriga várias nascentes que abastecem o Córrego da Bexiga. Nessas ravinas, foram observadas várias populações de Phyllomedusa ayeaye, em intensa atividade reprodutiva. Dessa forma, a preservação dessas ravinas, bem como do campo em seu entorno, se torna indispensável para a conservação desta espécie. O riacho afluente do Córrego da Bexiga (AB) também apresentou razoável riqueza de espécies, provavelmente devido à existência de ambientes mais diversificados (poças e pequenas lagoas, adjacentes ao riacho). Foram registrados poucos anfíbios na parte mais baixa do riacho, mais próxima ao encontro com o Córrego da Bexiga. Adultos e girinos de Phyllomedusa ayeaye foram observados na nascente. A nascente do Córrego da Cachoeira foi o transecto que apresentou menor riqueza de espécies. A região não aparenta ter sofrido grandes impactos ambientais, e o registro de espécies raras

neste ponto amostral sugerem que o mesmo pode ter sido sub-amostrado. É necessário um maior esforço amostral para que se possa conhecer melhor a anurofauna do local. Por fim, o transecto percorrido na parte mais baixa do Córrego da Bexiga, além de apresentar uma baixa riqueza de espécies, conta com duas espécies de ampla distribuição geográfica, observadas em associação com ambientes consideravelmente degradados. Dessa forma, esta área foi considerada como a de menor importância para conservação da diversidade anurofaunística. CONCLUSÃO A diversidade da anurofauna encontrada na área de implementação da sede do Instituto de Permacultura Cerrado-Pantanal e Mata Atlântica, a despeito do baixo esforço amostral e da época pouco propícia, sugere um bom estado de conservação dos ambientes e recursos importantes para essa fauna. Para a minimização do impacto que a construção da sede do Instituto pode acarretar na área, é recomendada a ocupação das áreas mais baixas, na porção sul do terreno, onde o impacto sobre as comunidades de anfíbios certamente será menor. REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO BASTOS, R.P. Herpetologia no Brasil II. Sociedade Brasileira de Herpetologia, 2007. 354 p. BEEBEE, T.J.C. Ecology and Conservation of Amphibians. Londres, Chapman&Hall, 1996. 214 p. BRASILEIRO, C. A.; SAWAYA, R.; KIEFER, M. & MARTINS, M. Amphibians of an open Cerrado fragment in Southeastern Brazil. Biota Neotropica, v.5 n. 2 2005. CEREZOLI, J.P.M. Anurofauna em riachos de fragmentos florestais na Chapada das Perdizes, Serra de Carrancas, Sul de MG. 2008. 63p. Dissertação (Mestrado em Ecologia Aplicada) Universidade Federal de Lavras, Lavras, 2008. FERREIRA, P. L.; FERNANDES, F.; SILVA, G. F. F.; GEDRAITE, L. S. Anfíbios anuros do município de Luminárias, sul de Minas Gerais. In: III Congresso Brasileiro de Herpetologia, 2007, Belém. Resumos do III Congresso Brasileiro de Herpetologia, Belém: SBH, 2007. GEDRAITE, L. S.; FERNANDES, F.; SILVA, G. F. F.; CASTRO, L. E.; COUTO, M. H. G.; ROCHA, D. G. ; POMPEU, P. DOS S. ; SILVA, V. X. Diversity, ecological aspects and ecotourism influence on the anurofauna from Parque Ecológico Quedas do Rio Bonito, Lavras - MG. In: 6th World Congress of Herpetology, 2008, Manaus. Proceedings of the 6th World Congress of Herpetology, Manaus, 2008. HEYER, W.R.; DONNELLY, M.A.; MCDIARMID, R.W.; HAYEK, L.A. & FOSTER, M.S. (eds.) Measuring and Monitoring Biological Diversity - Standard Methods for Amphibians. Smithsonian Institution Press, 1994. 364 p. IBGE. Cidades; Mapa dos biomas do Brasil. http://www.ibge.gov.br. Acessado em 25/07/2010 MYERS, N.; MITTERMEIER, R.A.; MITTERMEIER, C.G.; FONSECA, G.A. & KENT, J. Biodiversity hotspots for conservation priorities. Nature, n. 403 p. 853-858, 2000. SILVANO, D. L. & SEGALLA, M. Conservação de anfíbios no Brasil. Megadiversidade, vol. 1, no 1 p. 79-86 2005.

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