ZECA CAMARGO Jornalista e Apresentador Rede Globo de Televisão Zeca Camargo foi o convidado da segunda edição do RBS Debates, dia 23 de Julho, em Florianópolis. O evento reuniu mais de mil estudantes e profissionais de comunicação e fez parte do Festival Multimeios. Neste Especial, publicamos os pontos principais da palestra realizada na capital catarinense para você conhecer um pouco mais das idéias de um dos mais destacados jornalistas brasileiros. Saiba Mais Sobre Zeca Camargo Zeca Camargo estreou em 1987, na Folha de São Paulo, saindo de lá para trabalhar na então recém-criada MTV. De apresentador do MTV no Ar, Zeca chegou a diretor de jornalismo da emissora. De lá pra cá, trabalhou na TV Cultura, comandando o programa de auditório Fanzine, foi editor da revista Capricho, apresentou vários quadros no Fantástico, da Rede Globo, e conduziu o reality show No Limite em suas três edições. Hoje, Zeca Camargo apresenta o Fantástico e desenvolve reportagens especiais. Confira o debate com Zeca Camargo Abertura Boa Noite! É um prazer estar numa formatura (brincadeira), a gente faz tanto. Eu sei muito bem que estou participando, com muito prazer, do Festival Multimeios e feliz da vida com o convite. Mais feliz ainda por essa união do Festival Multimeios com o RBS Debates. Sou muito grato às duas instituições que me convidaram. Basicamente é isso, alguém tem alguma pergunta? Estou brincando!. A gente tem que se manter fixo ao tema, então vamos lá. A gente estava numa coletiva que funcionou como um belo aquecimento para eu saber o que se passa na cabeça de vocês sobre Reality Shows. Me deixou muito
contente saber que uma dúvida que vocês têm é se as pessoas realmente comiam aquilo tudo. É, elas comeram aquilo tudo. Elas passam fome? Passam. Passam frio? Passam. Elas brigam de verdade? Brigam. Elas namoram de verdade? Namoram. Chama-se Reality Show. A gente não acrescenta nada ali, nada que não exista ao que vocês acabam vendo lá. O que a gente vê aí é realmente um fenômeno. Não tem nenhum segredo. Não é uma conspiração do mal, que vai acabar com o formato do jornalismo ou enterrar para sempre as novelas brasileiras. Acontece que chegou no Brasil com um certo atraso, mas é uma coisa que na Televisão Mundial já tem 4 anos. Foi extremamente creditado em qualquer lugar que passou, e mesmo em países, como vocês imaginam, tão intelectualizados como a França, um programinha chamado Loft Store, numa televisão que não era nem uma das três primeiras televisões francesas, foi o assunto de 2001. Mexeu com o comportamento daquela cidade. As críticas Agora vocês podem dizer, como as críticas - que a gente gosta e ri delas, que é o fim da televisão, que o nível está baixíssimo. Isso é feito, ao contrário do que vocês podem achar, não para baixar o nível da televisão, pelo contrário, é um exercício de narrativa. É maluquice vocês acharem que existe um departamento na televisão de abaixamento de nível. Você faz um piloto, apresenta, tá legal, mas esse é muito cabeça, vamos baixar o nível. Quando você lê essas críticas, parece que aquilo passou por certa diretoria, uma cúpula, que diz Isso aqui é um programa super intelectual, alto nível. Quero a coisa baixa. Não existe isso, pelo contrário. Então essas críticas falsas de um Reality Show, de que é a exploração dos limites do ser humano, a humilhação de seres humanos num nível abaixo do animal, soam como críticas que já estavam escritas antes de a pessoa assistir o programa - o tipo de crítica fácil de fazer. Eu sempre brinco que o problema do No Limite I foi o sucesso estrondoso que virou uma maldição. A atenção do país inteiro, sabendo quem vai ser eliminado no portal, se perguntando quem tinha roubado aquela balinha. Gente, o que era isso? Vocês lembram? A gente tem pouquíssima memória. Eu também, não tenho muita memória. Mas eu sou chato, eu guardo as coisas, eu guardo o jornal. Logo que saiu o No Limite I estava lá: que absurdo, acabou, isso não tem nada a ver, que loucura.... Quando No Limite II estreiou, obviamente, não foi um sucesso tão grande como o primeiro. Mesmo ganhando no horário, com uma bela audiência, novamente uma audiência que no domingo à noite era totalmente surpreendente, não teve a
mesma audiência que o primeiro. Aí saiu na capa do suplemento dominical de TV de um jornal de grande circulação: O Fim do Reality Show. Isso saiu em janeiro de 2001, mal sabiam eles que o próprio ano de 2001 causaria outras surpresas na área de Reality Shows e, melhor ainda, que o Big Brother chegaria. Ficção x Realidade Não é à toa que temos muitos jornalistas envolvidos (na produção). Talvez vocês façam referência a mim e ao Bial, que somos os apresentadores desses programas, mas toda a edição é feita por uma equipe de jornalistas e editores do programa. Tem uma coerência aí, uma solidez de intenções. A gente sabe o que tá fazendo. Ninguém tá ali pra ganhar a guerra sangrenta da audiência, como eles adoram escrever, ou que isso é uma coisa fácil, que é só pra conquistar o público e recuperar a audiência. Não, a gente tá fazendo um programa que todo mundo acredita que foi e que é de qualidade, sim, e é uma maneira diferente de entretenimento e de informação. Há pouco tempo, numa faculdade de São Paulo, eu fui falar para uma turma de jornalismo - acho que tem bastante gente de jornalismo aqui, bastante estudante - e aí vem aquela pergunta: você pode dizer se o Reality Show decretou o fim da ficção na televisão? Aí eu faço essa pergunta pra vocês: vocês sabem qual foi o programa de maior audiência esse ano, com picos de audiência que não se via há 15 anos na TV? O Clone. Era uma ficção enlouquecida, que tinha mil e uma noites, cavalo alado, fuso horário do Brasil igual ao de Marrocos, uma maluquice maravilhosa. É um trabalho de ficção que a Glória Peres sabe fazer com uma maestria maravilhosa e que é o que dominou a audiência brasileira. Então, eu não vejo nenhuma ameaça, eu não vejo nenhum desgaste de fórmula. Eu vejo mais um gênero que chegou para ficar. Inclusive não é nem meu, eu tenho que falar é do Boninho, o diretor que trouxe esse gênero para cá, primeiro com o No Limite, agora com o Big Brother, o Hipertensão e o Fama. Jornalista ou Apresentador? Só para concluir, a gente discutiu na coletiva, em várias outras praças e também nessa faculdade em São Paulo, o papel do Zeca. Um cara que apresenta um jornal estaria perdendo a credibilidade? Ele está querendo ser ator? Ele está querendo ser animador de auditório? São críticas freqüentes que as pessoas fazem para quem se expõe numa coisa dessas. Eu digo com a maior segurança e tranqüilidade que, ao contrário, eu estou experimentando uma outra coisa e em nenhum momento elas se confundem.
Eu sou uma pessoa que já fez bastante coisa, eu tenho 39 anos, trabalhei em vários veículos. Trabalhei na MTV, onde aprendi a fazer televisão, um lugar onde se tem uma liberdade enorme, e você pode usar como tubo de ensaio. E, se eu fui feliz em uma série de projetos, foi porque eu dei o carão para bater. Eu fiz umas coisas ruins também, no currículo a gente só fala das boas, mas tem umas meio esquisitas. Antes de abraçar o jornalismo, viajei, fui bailarino, trabalhei em galeria de arte, fui professor particular, fui guia de turismo, servi mesa, aquelas coisas que a gente faz. Enfim, nada disso é menor ou maior, mas pessoas acham que agora você chegou ao topo. Topo do quê? Eu juro por Deus, quando eu estava servindo mesa, mochileiro, com 21 anos em Amsterdam, eu achava Tô no topo da minha carreira, com 21 anos. O que mais que eu quero? Quando eu estreiei um espetáculo, o último espetáculo de dança profissional, em 91, nossa, esse aqui é o topo da minha carreira. As pessoas interessantes que eu conheço, e não estou falando só de artista, nem celebridade, elas não têm um topo. É uma pessoa que quer simplesmente fazer um trabalho rico, que a alimente, que acrescente alguma coisa. Voltando para fechar esse discurso que já está comprido, é a mesma coisa com o Reality Show. Quando a gente fez o No Limite, ele foi feito em três semanas, foi uma loucura. Aí você vê a maravilha que é trabalhar na TV Globo, de ter a possibilidade de colocar um projeto maluco como esse, no ar, em três semanas. Para vocês terem uma idéia, o No Limite envolve trezentas pessoas entre montagem, edição, acompanhamento, reportagem essa coisa toda. Durante a gravação a gente trabalha com cento e vinte pessoas. Todos com a certeza de estar fazendo um programa que era bacana, que era legal, que iria entreter. O poder da Televisão A gente ganhou um prêmio da APCA como melhor programa. É um programa maravilhoso que, apesar das críticas, mostrou que as pessoas comuns têm histórias fascinantes para contar. A Elaine era uma coisa fascinante, o Bam- Bam, a Vanessa Jackson. E não foi ficção, isso saiu da vida de vocês. Eu acho que isso é parte do fascínio desse programa. Essa identificação. Tudo isso é feito num veículo ultrapoderoso chamado televisão, que eu respeito. Eu reverencio televisão, sem nenhum deslumbramento. Eu não reverencio televisão como olha que massa eu apareço todo domingo a noite. Não. Eu reverencio como um veículo que tem a capacidade de fazer a pessoa parar para ver uma imagem chocante do atentado ao World Trade Center. Eram 17 minutos
sem narração. Que tem o poder de impactar e ao mesmo tempo de provar que é possível, numa universidade privada brasileira, um analfabeto entrar. E ao mesmo tempo em que é capaz de dar um alegria infinita, quando a gente faz um programa anunciando que o Brasil é Penta.Campeão.