A PESQUISA COMO PRINCÍPIO FORMATIVO NO CURRÍCULO DO CURSO DE PEDAGOGIA DA UFPA



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Transcrição:

1 A PESQUISA COMO PRINCÍPIO FORMATIVO NO CURRÍCULO DO CURSO DE PEDAGOGIA DA UFPA Angélica Cristina Bitar Miranda (UFPA) GT 02 Formação de Professores O curso de Pedagogia foi instituído no Brasil em 1939 quando foi criada a Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, através do Decreto 1.190/39, juntamente com outros cursos de licenciatura. O referido decreto delegava ao curso o direito de formar bacharéis para atuar como técnicos no Ministério da Educação e licenciados para lecionar as disciplinas pedagógicas dos cursos normais. Os cursos eram estruturados no conhecido esquema 3+1, apresentando se de forma fragmentada com três anos para formação do Bacharel e um ano para a formação do licenciado, através do curso de Didática. Após a implementação do curso, muitos foram os problemas enfrentados por seus egressos para encontrar lugar no mercado de trabalho, devido a pouca clareza sobre a função do bacharel em pedagogia e a não exclusividade que o licenciado tinha em ministrar as disciplinas pedagógicas dos cursos normais, já que a função poderia ser desempenhada por licenciados em outras áreas. Em 1962 o então conselheiro Valnir Chagas apresenta no CFE (Conselho Federal de Educação) uma proposta de regulamentação para os cursos de Pedagogia, que ao se transformar na resolução 2/62 estabeleceu currículos mínimos e tempo de duração para esses cursos, cujas funções no mercado de trabalho eram a docência nos cursos normais e funções técnicas no âmbito escolar. Após essa reformulação, mais precisamente a partir de 1964, vamos assistir a uma significativa mudança na dinâmica político social brasileira com o início do período ditatorial, que imprimiu grandes mudanças ao ensino superior brasileiro e conseqüentemente ao curso de Pedagogia. Em 1969, um ano após a promulgação da Lei de Reforma do Ensino Superior (lei nº 5.540/68), o curso de Pedagogia ganhou nova regulamentação através da resolução 2/69 do CFE, que diferente da anterior, trouxe significativas mudanças para a formação desses profissionais, instituindo as chamadas habilitações técnicas em supervisão escolar, orientação educacional, administração escolar e inspeção escolar. Segundo SILVA (1999) essa nova proposta de formação de Pedagogos foi presidida pela lógica de que existe estreita correspondência entre formação superior e a função que deverá ser desenvolvida no mercado de trabalho, que na verdade orientou a Reforma Universitária como um todo. Prova da afirmação está no fato de que foram definidas pela referida resolução as habilitações correspondentes à funções específicas dentro dos sistemas escolares, inclusive com as disciplinas que comporiam o currículo de cada uma delas. Tal reformulação, orientada pelo pensamento tecnicista, manteve e aprofundou a cisão já existente na formação de Pedagogos, pois não estabelecia qualquer tipo de relação entre a formação para docência e para a ocupação de cargos técnicos dentro do espaço escolar, visando atender os interesses do modelo econômico e de racionalidade técnica tão em voga naqueles anos.

2 Desde sua criação que o curso de Pedagogia mostrava se indefinido quanto à identidade profissional de seus egressos, que segundo SILVA (1999) deriva da própria indefinição da Pedagogia enquanto campo de saber, formulando o debate em torno da questão se a Pedagogia possui ou não conteúdo próprio, gerando diferentes respostas que vão se traduzir em diferentes concepções de formação. Historicamente, os legisladores educacionais brasileiros partiram de uma resposta negativa à questão acima apresentada, ou seja, partiram da tese de que a Pedagogia é um campo de atuação profissional, não um campo teórico de produção de conhecimento com objeto específico, sendo esta a concepção que orientou as regulamentações do curso desde o momento de sua criação e suas posteriores reformulações até o final da década de 1960, imprimindo um modelo formativo extremamente técnico. Na década de 1970 os legisladores educacionais acenaram com a possibilidade da extinção do curso de Pedagogia, através das homologações 68/1975 e 71/1976 no CFE pelo conselheiro Valnir Chagas, que pretendia reformular os cursos de formação de professores e demais profissionais da educação, propondo a formação do especialista no professor, ou seja, as tradicionais habilitações que formam para as funções não docentes na escola seriam acrescentadas às licenciaturas em geral, retirando das Faculdades de Educação a especificidade dos estudos pedagógicos. A desconfiança de que havia clara intenção dos legisladores em extinguir o curso de Pedagogia, provocou uma corrida geral de profissionais e estudantes de Pedagogia no sentido de tentar impedi la e imprimir novos rumos às discussões acerca da reformulação dos cursos de Pedagogia e da identidade profissional do Pedagogo. Era chegado o momento de não só afirmar a necessidade de sua existência, mas fundamentalmente encampar a árdua tarefa de construir uma identidade profissional que deveria ser traduzida em novas propostas de formação, até então construídas única e exclusivamente pelos legisladores, sem qualquer consulta, muito menos intervenção das pessoas que materializavam o curso de Pedagogia no dia a dia das universidades. Inicia se então no final da década de 1970, um movimento nacional pela reformulação dos cursos de Pedagogia e licenciaturas com a criação do Comitê Pro Formação dos Profissionais da Educação, que produziu uma série de ações e reflexões acerca da temática, ampliando a discussão para a formação dos demais licenciados, partindo do princípio de que a formação dos profissionais para atuar no âmbito escolar não pode se dar de maneira fragmentada como vinha sendo feito até então. O Comitê transformou se em Comissão Nacional pela Reformulação dos Cursos de Formação de Educadores (CONARCFE) e posteriormente, em 26 de julho de 1990, durante a Assembléia Geral do V Encontro Nacional, em Belo Horizonte, a Conarcfe transformou se em Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE) com reconhecida atuação no cenário das formulações das políticas de formação de educadores (BRZEZINSK: 1996, 168). Desde sua criação como comitê até sua transformação em associação, muitos foram os altos e baixos, as divergências e convergências vividas no interior do movimento de educadores, até que se chegasse a alguns princípios básicos que no atual contexto tem norteado as reformulações curriculares das agências formadoras. Apesar da diversidade de concepções e interesses que permearam as discussões na busca da tão desejada identidade, o movimento dos educadores chegou a uma definição, que de certa

3 forma sempre esteve muito próxima do curso de Pedagogia, qual seja: todo profissional da educação deve ter a docência como base de sua formação e identidade profissional. Essa tendência foi reafirmada no encontro de Belo Horizonte, considerado um marco histórico na definição dos princípios norteadores para as reformulações dos cursos de formação dos profissionais da educação, juntamente com outros princípios que deveriam ser observados pelas IES ao propor suas reformulações, que se traduz na idéia de base comum nacional. A idéia de base comum nacional caracteriza se por se constituir em um conjunto de conhecimentos que não se traduzem necessariamente em um elenco de disciplinas que deve compor os currículos de todas as licenciaturas, inclusive do curso de Pedagogia, mas que traduz uma concepção de formação do educador, entendida como uma diretriz que envolve uma concepção básica de formação do educador e que se concretiza através de um corpo de conhecimento fundamental. Devese buscar assim o domínio filosófico, sociológico, político e psicológico do processo educativo, numa perspectiva crítica e que explore o caráter científico da educação, tendo como referência o contexto sócioeconômico e político brasileiro (CONARCFE apud BRZEZINSK, 1996: 174) O movimento dos educadores, apesar das divergências que se evidenciaram ao longo dos Seminários Nacionais e Regionais, provocou significativas mudanças na concepção de formação de Pedagogos no Brasil ao inserir a idéia de que este profissional não é um mero técnico, mas é antes de tudo um educador. Como educador deve receber uma formação que lhe possibilite a percepção do fenômeno educativo em sua totalidade, o papel estratégico da escola em sociedades extratificadas, em suma, um profissional com visão crítica e capacidade de se posicionar diante das mais variadas situações. A definição de uma base comum nacional traduz um elemento extremamente interessante do movimento dos educadores que foi a percepção de que não seria possível chegar a uma unidade na definição da identidade profissional do Pedagogo e nem poderia haver urgência em fechar propostas para reformulação dos cursos. A partir dessa constatação o movimento resolveu assumir a bandeira da flexibilidade e estimular o caráter experimental de propostas de formação. Nesse sentido SILVA afirma que O que ocorreu foi que, na falta de possibilidade de resolução dos conflitos quanto às funções do curso de Pedagogia, procurou se não apenas valorizar, como também estimular as possíveis alternativas de estruturação do mesmo segundo funções priorizadas no interior de cada instituição, desde que orientadas pelos princípios indicados pelo movimento (1999:20) É importante que se diga que os princípios definidos pelo movimento e as reformulações que foram orientadas pelos mesmos, podem ser identificados com o que a mesma autora (2002) chama de fundamentos paralegais, pois legalmente ainda não se tem um documento que substitua a resolução 2/69 do extinto Conselho Federal de Educação.

4 A atuação do movimento nacional via ANFOPE tem centrado forças na aprovação das diretrizes curriculares para os cursos de Pedagogia pautadas nos princípios do movimento e que de certa forma estão contempladas no documento da Comissão de Especialistas de Ensino de Pedagogia, mas que se encontra emperrado no CNE justamente por ser objeto de intensa disputa entre projetos diferentes de formação de Pedagogos no Brasil. Um dos princípios reafirmados pelo movimento nacional diz respeito à formação dos profissionais de educação com domínio, ainda que inicial, das questões que envolvem a produção de conhecimento da problemática educacional afirmando que esses cursos de formação de educadores deverão se estruturar valorizando a iniciação científica à pesquisa em educação. Esse princípio é reafirmado na Proposta de Diretrizes Curriculares para o Curso de Pedagogia que foi endossada pela ANFOPE, quando define como uma das áreas de atuação do Pedagogo a produção e difusão do conhecimento (p.1). Segundo SCHEIB e AGUIAR (1999) a proposta de diretrizes para o curso de Pedagogia em tramitação no Conselho Nacional de Educação tendo a docência como base da formação, amplia o campo de atuação profissional do mesmo, pois a partir de sua aprovação será chamado a exercer papel importante em outras funções do campo educacional. Entende se que tal perspectiva rompe com a tradição tecnicista de separar o saber e o fazer, a teoria e a prática. E aí cabe um importante papel as instituições de ensino que poderão ofertar uma formação que respeite sua vocação, o seu interesse, a demanda local e sua função social (p.10) Baseadas nos princípios sistematizados pela ANFOPE, as Instituições de Ensino Superior brasileiras passaram a reformular seus cursos de Pedagogia, apontando prioritariamente para a necessidade de superar a fragmentação das habilitações no espaço escolar, propondo a superação das habilitações e especializações pela valorização do pedagogo escolar (LIBÂNEO e PIMENTA: 2002, p.12). Seguindo a tendência nacional e a partir da constatação de que o pedagogo especialista não atendia as demandas da sociedade em relação a esse profissional, o Centro de Educação da Universidade Federal do Pará iniciou o processo de reestruturação do curso de Pedagogia em 1994 com a realização do I Seminário de Avaliação do Centro de Educação, que resultou em mais dois ocorridos em 1996 e 1997 respectivamente e que contou com a relativa participação de alunos e professores do curso de Pedagogia. Os resultados dos seminários foram sistematizados em um relatório publicado em 1997 apontando para a necessidade de acabar com a fragmentação do curso e (...) para a importância de se formar um profissional que pudesse dar conta do processo pedagógico como um todo e que também fosse preparado para atuar em ambientes escolares e não escolares 1. A reestruturação foi concluída com a aprovação da resolução nº 2669/99 pelo Conselho Superior de Ensino e Pesquisa (CONSEP) que definiu o novo currículo do curso de Pedagogia da 1 Projeto Político Pedagógico do Centro de Educação. Belém: 2001, p. 06

5 UFPA e estruturou o curso em três núcleos, cada um com uma função específica dentro do processo de formação: Núcleo Básico: tem como objetivo capacitar o pedagogo através de uma formação teórico prática que favoreça a apropriação de fatos e teorias que servem de base para os processos educativos em seus diferentes espaços e dimensões (parágrafo 1º) 2. Núcleo Específico: visa a qualificação do pedagogo para os diferentes campos de atuação profissional, que traduzem o âmbito da especificidade da sua formação e atuação profissional (parágrafo 2º) 3 Núcleo Eletivo que visa possibilitar ao aluno a construção de um percurso acadêmico próprio, adequar o currículo às diferentes realidades regionais dos campi (...) (parágrafo 3º) 4. A proposta de formação de pedagogos do CE/UFPA define como princípio a formação de um profissional capaz de atuar nos mais diversos espaços educacionais e que tenha a compreensão da diversidade e complexidade do estado do Pará, trabalhando para a construção de relações mais dignas em nossa sociedade. Como afirmamos anteriormente, a reformulação do curso Pedagogia CE/UFPA seguiu as orientações do movimento dos educadores sistematizados pela ANFOPE, partilhando de seus princípios, o que pode ser facilmente visualizado no atual projeto político pedagógico 5 ao definir as diretrizes curriculares que são: a) O trabalho pedagógico como eixo da formação b) Sólida formação teórica c) A pesquisa como forma de conhecimento e intervenção na realidade social d) Trabalho partilhado/coletivo e) Trabalho interdisciplinar f) Articulação teoria prática g) Flexibilidade curricular Ao assumir a pesquisa como princípio formativo, o documento do CE/UFPA afirma que a universidade tem produzido conhecimentos acerca da problemática educacional, porém estes conhecimentos não tem sido utilizados na intervenção desta mesma realidade, havendo uma dissociação entre o processo de produzir conhecimento sobre uma realidade e o processo de intervir nesta 6. Acreditamos que tal afirmação precisa ser problematizada, visto que UFPA conta com algumas peculiaridades em relação ao cenário da IES brasileiras. Por atuar em um estado de grande dimensão territorial, a mesma precisou encontrar meios de atender as demandas formativas de todo estado, o que foi iniciado em 1987 com a 2 CONSEP/UFPA Resolução nº 2669 de 06 de outubro de 1999 3 Ibid 4 Ibid 5 Projeto Político Pedagógico do Centro de Educação. Belém: 2001, p. 25 34 6 idem, p. 28

6 implementação do programa de interiorização 7 em vários municípios, priorizando desde de sua implementação os cursos de licenciatura, entre eles o de Pedagogia. Os cursos de Pedagogia foram, inicialmente, ofertados de forma intervalar 8 nos campi do interior, mas com o passar do tempo e a constituição de corpo docente próprio, criou se a possibilidade de ofertar os cursos de forma regular. Quando a reformulação do curso de Pedagogia foi concluída boa parte dos campi já contava com um número de professores suficiente para ofertá lo regularmente. A reestruturação do curso de Pedagogia foi concluída e a proposta implementada em todos os campi do interior do estado. Cinco anos após a implementação da nova proposta curricular, muito são os problemas percebidos em sua materialização, especialmente por não podermos falar em curso de Pedagogia da UFPA, mas em cursos, haja vista que a mesma convive com uma diversidade social, política e econômica considerável. Os campi do interior do estado dispõem de poucas condições para ser universidade em seu sentido mais pleno, ou seja, pautar sua existência no famoso tripé ensino pesquisa extenção. Existe uma enorme distância em termos estruturais entre o campus de Belém, onde foi pensada a reforma curricular do curso de Pedagogia, e os campi do interior, que implementam a mesma proposta formativa em condições completamente diferentes. Não pretendemos atribuir todos os problemas na formação do Pedagogo da UFPA às diferenças estruturais entre os campi, mas apenas ressaltar sua importância para qualquer tipo de avaliação da proposta curricular em vigor. É importante que se ressalte que o Projeto Político Pedagógico (PPP) fala em quebrar a redoma que foi investida a pesquisa, desmistificando a, mas no CSSP praticamente inexistem projetos de pesquisa que permitam aos alunos a vivência mínima desse tipo de experiência. Mesmo que o atual desenho curricular acrescenteuma carga horária significativa às disciplinas de pesquisa, saltando de 150 h/a para 285 h/a, não nos parece ser suficiente para democratizar o acesso à pesquisa, pois a mesma continua sendo uma atividade restrita, o que ao nosso ver fere profundamente um dos princípios curriculares da proposta. O Campus do Sul e Sudeste do Pará (CSSP), situado no município de Marabá, dentro de um contexto de dificuldades estruturais citadas anteriormente, vem desde 2000 implementando a proposta curricular aprovada pelo CONSEP, assumindo os princípios curriculares acima mencionados. No que se refere ao princípio c, relativo a pesquisa, muitos são os problemas evidenciados no cotidiano do mesmo. São facilmente perceptíveis entre os alunos do CSSP imensas dificuldades na compreensão das questões básicas que envolvem o processo de pesquisar, fato que pode ser facilmente visualizado nos TCC s encontrados na biblioteca do campus, visto que os mesmos tem se constituído na única experiência de pesquisa vivenciada pelos alunos e somente no final do curso. Mesmo reconhecendo que as diferenças entre os campi sejam importantes, existem certas evidências de que é preciso olhar com mais cuidado o modelo formativo, pois segundo depoimentos de alguns professores do CE, boa parte dos problemas enfrentados pelos alunos no dos campi do interior também são vividos pelos alunos do campus de Belém. 7 Programa que levou a UFPA ao interior do estado através da criação de diversos campi nesses municípios. 8 Cursos realizados nos períodos de férias e de forma intensiva, pois os professores que davam aulas no interior eram os mesmos de Belém

7 Ao primeiro olhar poderíamos atribuir os problemas as dificuldades estruturais vividas pelos campi do interior, porém um olhar mais atento pode nos indicar que existem outras questões a serem consideradas, se desejamos compreender como vem se materializando o princípio formativo da pesquisa, sem perder de vista as relações com a proposta de formação em sua totalidade, as diferenças sócio culturais que propiciam variações em um modelo único, pensado privilegiadamente para uma realidade. Outra questão a ser considerada é que a atual proposta formação de pedagogos do CE/UFPA foi pensada a partir das diretrizes do movimento nacional que afirma a docência como base da identidade dos profissionais da educação, considerando necessário ao professor a compreensão do processo de pesquisar, apostando que esta é uma importante atividade para seu exercício profissional. Segundo LISITA, ROSA e LIPOVETSKI (2001) a concepção do professor que realiza atividades de pesquisa existe desde a década de 1940, mas foi introduzida por Lawrence Sthenhouse, nos ano de 1970 e posteriormente através dos trabalhos de Donald Shön que na década de 1980 produz o conceito de professor reflexivo, profissional produtor de saber e conhecimento sobre sua prática (p.110) que lhe permite o exercício da reflexão sobre a prática com vista ao seu aprimoramento. Logicamente que para realizar essa atividade, o professor precisa receber formação de qualidade, estudando e experenciando situações que o levem a compreender o delicado terreno da produção de conhecimento, as questões teórico metodológicas, ideológicas, políticas e sociais que envolvem o ato de pesquisar. Sabe se que esta concepção conta com boa aceitação nos meios acadêmicos e que, de certa forma, fundamenta a atual proposta do curso de Pedagogia do CE/UFPA Partindo das constatações acima é que estamos desenvolvendo uma pesquisa como aluna do Mestrado Acadêmico em Educação (CE/UFPA) que tem se debruçado sobre a seguinte questão: Como tem se materializado o princípio formativo da pesquisa no curso de Pedagogia da UFPA no CSSP a partir da reestruturação curricular implementada a partir do ano de 2000? A partir da questão investigativa central, estamos desenvolvendo no momento um estudo sobre uma das questões centrais do trabalho que é o estatuto da cientificidade da Pedagogia e a possibilidade de sua afirmação não somente como um curso de formação profissional, mas como um campo de conhecimento específico, partindo da afirmação de MAZZOTTI (2001) quando diz que apesar de a Pedagogia ser tomada ora como tecnologia, ora como ciência, ora como filosofia aplicada (p.14), acredita na possibilidade de ela se constituir numa ciência da prática educativa, pois como se sabe, o exame das formas e meios de avaliação do fazer educativo é um capítulo da Pedagogia que tem metodologia própria e razoavelmente estabelecida (p.21). Uma outra atividade atualmente desenvolvida é o levantamento de documentos de entidades envolvidas com a questão da afirmação da identidade do curso de Pedagogia e com a aprovação das diretrizes curriculares para o curso, especialmente da ANFOPE, para posterior análise de questões como: O processo percorrido até que a pesquisa fosse assumida como princípio formativo; As concepções de pesquisa, pesquisador, professor pesquisador, docência e outros que podem ser significativos para a compreensão da problemática de estudo;

8 A relação dessas idéias com o curso de Pedagogia da UFPA Sabe se que o curso de Pedagogia e os profissionais que nele são formados têm sofrido com as duras críticas em relação à sua falta de identidade, ineficácia na atuação profissional e que mais do que nunca precisamos aprofundar o debate sobre quem é o pedagogo, qual o seu papel na qualificação da educação, afirmando a Pedagogia como um campo de conhecimento e o pedagogo como ator principal de sua produção. Logicamente que existe muito a ser feito até que a sonhada identidade da Pedagogia seja alcançada, mas é justamente partindo da convicção de que a Pedagogia necessita se afirmar como algo mais que um curso que forma técnicos para ocupar determinadas posições dentro do sistema escolar, que é necessário construir o estatuto de sua cientificidade é que ressaltamos a importância de compreender como o princípio da pesquisa tem se materializado na sua formação, os problemas que enfrenta e as relações destes com os modelos formativos elaborados e implementados. Acreditamos que ao realizar este estudo, estaremos contribuindo de forma significativa com as discussões sobre a temática da formação do educador, a importância da pesquisa como um princípio formativo, as dificuldades e os melindres que envolvem o campo da pesquisa no Brasil, aprofundando o debate a partir da reflexão sobre o modelo formativo de uma instituição especificamente, sem perder de vista suas relações com um movimento de reformulação dos cursos de Pedagogia em nível nacional. BIBLIOGRAFIA: ANFOPE, Boletim da ANFOPE, Campinas, SP, ano VII N 15, Dezembro de 2001.http:://lite.fae.unicamp.br/anfope BRZEZINSK, Iria. Pedagogia, pedagogos e formação de professores: busca e movimento. Campinas: Papirus, 1996.

9 COMISSÃO DE ESPECIALISTAS DE ENSINO DE PEDAGOGIA. Proposta de diretrizes curriculares para o curso de Pedagogia. Brasília: MEC/SESu, 1999 (Mimeo). LIBÂNEO, J.C. Pedagogia e Pedagogos para que?. 6ª ed. São Paulo: Cortez, 2002. LISITA, Verbena; ROSA, Dalva; LIPOVETSKY, Noêmia. Formação de professores e pesquisa: uma relação possível? IN: ANDRÉ, M. (org.). O papel da pesquisa na formação e na prática dos professores. 2ª ed. Campinas: Papirus, 2001. MAZZOTTI, Tarso Bonila. O Estatuto de cientificidade da Pedagogia. IN: PIMENTA, S. G. (coord.) Pedagogia, ciência da educação?. São Paulo: Cortez, 2001. SILVA, C. S. B. da. Curso de Pedagogia no Brasil: história e identidade. Campinas: Autores Associados, 1999.. Diretrizes curriculares para o curso de pedagogia no Brasil: um tema vulnerável às investidas ideológicas. 24 a. Reunião Anped, Caxambu 2001.. Curso de Pedagogia no Brasil: uma questão em aberto. IN: PIMENTA, S. G. (org.) Pedagogia e Pedagogos: caminhos e perspectivas. São Paulo: Cortez, 2002. PIMENTA, S. G.; LIBÂNEO, J.C. Formação dos Profissionais da Educação: visão crítica e perspectivas de mudança. IN. PIMENTA, S. G. (org.). Pedagogia e pedagogos: caminhos e perspectivas. São Paulo: Cortez, 2002. SCHEIBE, Leda; AGUIAR, Márcia Ângela. Formação de profissionais da educação no Brasil: O curso de pedagogia em questão. Revista Educação e Sociedade. v.20, n.68. Campinas dez. 1999