UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO A INFLUÊNCIA DO TREINAMENTO DE USUÁRIOS NA ACEITAÇÃO DE SISTEMAS ERP EM EMPRESAS NO BRASIL André Luiz Matos Rodrigues da Silva Rio de Janeiro 2005
A INFLUÊNCIA DO TREINAMENTO DE USUÁRIOS NA ACEITAÇÃO DE SISTEMAS ERP EM EMPRESAS NO BRASIL André Luiz Matos Rodrigues da Silva Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Administração. Orientador: Prof. Donaldo de Souza Dias, D.Sc. Rio de Janeiro 2005
Silva, André Luiz Matos Rodrigues da. A influência do treinamento de usuários na aceitação de sistemas ERP em empresas no Brasil / André Luiz Matos Rodrigues da Silva. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2005. xiii, 104f.: il. Dissertação (Mestrado em Administração) Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ, Instituto COPPEAD de Administração, 2005. Orientador: Donaldo de Souza Dias. 1. Aceitação de Tecnologia. 2. Sistemas de Informação. 3. ERP. 4. Administração Teses. I. Dias, Donaldo de Souza (Orient.). II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto COPPEAD de Administração. III. Título.
A INFLUÊNCIA DO TREINAMENTO DE USUÁRIOS NA ACEITAÇÃO DE SISTEMAS ERP EM EMPRESAS NO BRASIL André Luiz Matos Rodrigues da Silva Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Administração, Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Administração. Aprovada em / /, por: Presidente da Banca Prof. Donaldo de Souza Dias, D.Sc. COPPEAD/UFRJ Orientador Prof. Antônio Roberto Ramos Nogueira, D.Sc. COPPEAD/UFRJ Profª. Monica Zaidan Gomes Rossi, D.Sc. FACC/UFRJ Rio de Janeiro Setembro de 2005
À minha filha, Manuela
AGRADECIMENTOS Esta dissertação materializa, em parte, os quase dois anos dedicados ao curso de mestrado. Este longo período de estudos e, principalmente, esta dissertação, seriam impossíveis sem o apoio de diversas pessoas, cada qual com a sua intensidade e configuração, mas todas de suma importância. Antes e acima de tudo, devo meus maiores agradecimentos a Deus, pela oportunidade de mais esta vida e por todas as oportunidades nesta vida, dentre elas a de ter sido aceito e concluído este curso. Aos meus pais (in memoriam), agradeço por todo amor, carinho, alegrias, educação e orientações de vida que me deram. À minha esposa, Andréa, pelo incentivo em todo o percurso, e mais ainda pela paciência nos momentos de tensão e mau humor. À Manuela, minha querida filha, que veio completar a família durante o curso, agradeço por sua doçura, alegria e sorrisos incondicionais, que sempre me renovavam os ânimos. Ao meu orientador, professor Donaldo de Souza Dias, sou imensamente grato. Em primeiro lugar por me abrir os olhos e nutrir a curiosidade para um outro lado da tecnologia o humano e social, incluindo os benefícios, mudanças e demais conseqüências de sua adoção que acabou sendo a área de estudo de minha dissertação. Além disso, agradeço muitíssimo pelos ensinamentos referentes à metodologia e prática da pesquisa, pelo aclarar dos melhores caminhos a serem trilhados e, especialmente, pela preocupação, compreensão e amizade que me dedicou, tendo sempre a palavra certa para cada momento, sabendo dosar a motivação e os puxões de orelha.
A fase de seleção do tema da pesquisa de dissertação é uma das mais difíceis, pois são muitas as possibilidades e normalmente queremos abraçar o mundo, levando à indecisão, insegurança, inércia e angústia. Pelo auxílio fundamental e decisivo nesta fase, agradeço à professora e colega Mônica Silva, pois foi ela a grande incentivadora do tema que escolhi para minha dissertação. Ao professor Roberto Nogueira, agradeço pelo rico conteúdo e forma de suas aulas, que trouxeram grandes e essenciais conhecimentos sobre o par tecnologiaestratégia, e também sobre as diversas maneiras de tratar e analisar os dados de uma pesquisa de campo, bem como interpretar e representar os resultados. À professora Teresa Carneiro, registro meus agradecimentos pelo apoio na fase de prospecção de participantes para a pesquisa. Por fim, expresso minha gratidão aos colegas de curso, e grandes amigos, Juliana Coutinho, Fabiano Lanini e Fábio Meletti, por todo o empenho que tiveram em me ajudar na verdadeira caça a respondentes para o questionário da pesquisa e nas análises estatísticas dos resultados. Agradeço, ainda, à amiga Georgea do Nascimento, pela busca de contatos com as empresas e, principalmente, pela força e torcida que sempre me dedicou. Àqueles que, em cada empresa, me ajudaram na dura tarefa de coletar os dados, mas optaram por manter seus nomes em sigilo, deixo também minha sincera gratidão.
RESUMO SILVA, André Luiz Matos Rodrigues da. A influência do treinamento de usuários na aceitação de sistemas ERP em empresas no Brasil. Orientador: Donaldo de Souza Dias. Rio de Janeiro, 2005. Dissertação (Mestrado em Administração) Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005. Esta pesquisa examina qual a influência do treinamento de usuários na aceitação de tecnologia, mais especificamente os sistemas integrados de gestão empresarial (ERP). O estudo utilizou como fundamentação teórica o Modelo de Aceitação de Tecnologia (TAM), idealizado por Fred Davis, e avaliou o impacto do fator treinamento nos fatores centrais deste modelo utilidade percebida, facilidade de uso percebida e atitude em relação à tecnologia. Partindo de uma abordagem quantitativa, foi realizada uma pesquisa de campo com a aplicação de questionários. A amostra foi composta por 90 usuários diretos de sistemas ERP, funcionários de seis empresas operando no Brasil, na maioria de grande porte e de manufatura. No tratamento dos dados e teste das hipóteses foram aplicadas técnicas de análise estatística multivariada. Os resultados mostraram que o treinamento influenciou positivamente na aceitação dos sistemas ERP. O treinamento no sistema ERP teve um efeito direto na facilidade de uso percebida, e esta afetou diretamente a utilidade percebida. Verificou-se que a utilidade percebida foi o único e grande determinante da atitude positiva em relação ao sistema ERP. Estes resultados permitiram rejeitar total ou parcialmente as três hipóteses referentes ao modelo da pesquisa, e confirmar resultados de pesquisas anteriores. Também foi observado que, em geral, o treinamento não atendeu às expectativas e necessidades dos usuários notadamente com relação ao seu tipo, duração e detalhamento e que nem todos receberam treinamento formal. Adicionalmente, foi possível identificar três grupos de usuários estatisticamente diferenciados. O primeiro foi composto por usuários que apresentaram uma grande aceitação do sistema ERP, especialmente por entenderem a sua utilidade para a organização. O segundo grupo reuniu aqueles com maior predisposição tecnológica, tendo uma boa aceitação do sistema ERP a despeito da grande insatisfação com o treinamento. O terceiro grupo, em contrapartida, foi constituído por usuários que mostraram elevada resistência ao sistema ERP. Além disso, duas das seis empresas se destacaram. Uma por não ter nenhum dos seus respondentes no terceiro grupo (resistente), e ao mesmo tempo ser a maior participante (35,7%) do segundo grupo (predispostos), o que de certa forma indica que a empresa foi bem sucedida na adoção do ERP. A outra empresa destacou-se negativamente: 55% dos seus respondentes foram classificados como resistentes o que equivale a 61,1% do terceiro grupo sugerindo que houve problemas na implementação do ERP. Esta pesquisa contribuiu teórica e empiricamente ao testar o modelo TAM em um novo contexto: no Brasil (uma cultura diferente da sua original); examinando o treinamento como variável antecedente; investigando profissionais em seus ambientes de trabalho; e focando em sistemas ERP (uma tecnologia complexa e de uso obrigatório). E seus resultados confirmaram a validade do treinamento como ferramenta de apoio à aceitação de sistemas ERP.
ABSTRACT SILVA, André Luiz Matos Rodrigues da. A influência do treinamento de usuários na aceitação de sistemas ERP em empresas no Brasil. Orientador: Donaldo de Souza Dias. Rio de Janeiro, 2005. Dissertação (Mestrado em Administração) Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005. This research analyses the influence of training end users in technology acceptance, specifically focusing on Enterprise Resource Planning systems (ERP). This study utilized the Technology Acceptance Model (TAM), idealized by Fred Davis, as theoretical foundation, and evaluated the impact of the training on TAM s core constructs perceived usefulness, perceived ease-of-use and attitude towards technology. Following a quantitative approach, a survey was applied using questionnaires. The sample was composed of 90 end users of ERP systems, employees of six companies operating in Brazil, most of them large-sized and from manufacture sector. Multivariate statistical analysis was used to investigate the collected data and to test the hypotheses. The results showed that training positively influenced the acceptance of ERP systems. The training on ERP systems had a direct effect on the perceived ease-of-use, and the perceived ease-of-use had a direct effect on perceived usefulness. It showed that the perceived usefulness was the greatest and the only factor to determine the positive attitude towards ERP system. These results allowed the total or partial rejection of the three hypotheses related to the research model, and confirm the results of previous researches. It was noticed that, in general, the training did not reach the expectations and the needs of the users, especially regarding the kind, length and detail of training. More than this, not all end users had a formal training. In addition, it was possible to identify three statistically differentiated groups of users. The first one was formed by users that demonstrated a great acceptance of the ERP system, especially because they understand its usefulness for the organization. The second group was composed by people that revealed a technological predisposition, having a good acceptance of the ERP system in spite of the high dissatisfaction with the training. The third set, on the other hand, was built of end users that showed a high level of ERP system rejection. Besides that, two of the six companies stood out. One of them for not having none end users in the third group (resistant), and at the same time to be the major participant (35.7%) of the second group (predisposed), which to a certain extent demonstrates that the company was successful in the ERP implementation. The other corporation had a negative result, with 55% of its participants classified in the third group (resistant), representing 61.1% of this group, which suggests that this company had problems in the ERP implementation. This research offers theoretical and empiric contributions. It tested and reinforced the validity of an existent theory, the TAM model, on a different context: in Brazil a culture which is different from the original one; evaluating the training as antecedent variable; investigating professionals in their workplaces; and focusing in ERP systems a complex and mandatory technology. Besides that, its results confirmed the importance of the training as a tool to motivate the acceptance of ERP systems.
LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Modelo de Aceitação de Tecnologia (TAM) (DAVIS, 1986)...13 Figura 2 - Modelo Motivacional de Uso de Microcomputadores...17 Figura 3 - Motivação para o uso de TI (Dias, 1998)...18 Figura 4 - Modelo causal de treinamento de usuários...22 Figura 5 - Modelo Teórico dos Determinantes da Facilidade de Uso Percebida...25 Figura 6 - TAM estendido para ambiente ERP...28 Figura 7 - Modelo da Pesquisa...47 Figura 8 - Modelo Final da Pesquisa...71 Figura 9 - Dendograma utilizando o método Ward...73 Figura 10 - Modelo Final da Pesquisa...88
LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Distribuição dos respondentes por Área Funcional...57 Gráfico 2 - Quantidade de Respondentes x Nível de Habilidade...58 Gráfico 3 - Respondentes por Grupo...72 Gráfico 4 - Disposição dos Grupos de acordo com as Funções Discriminantes...77 Gráfico 5 - Média dos Construtos por Agrupamento...78 Gráfico 6 - Média dos Construtos por Empresa...83
LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Respondentes por Empresa...50 Quadro 2 - Questionários por Forma de Retorno...51 Quadro 3 - Itens utilizados para medir o modelo da pesquisa...53 Quadro 4 - Perfil das Empresas Participantes...56 Quadro 5 - Estatística dos Itens por Construto...59 Quadro 6 - Coeficientes de Confiabilidade dos Construtos...63 Quadro 7 - Matriz de Correlações...64 Quadro 8 - Resultados das Regressões Lineares...65 Quadro 9 - Testes Multivariados de Significância (Agrupamentos)...74 Quadro 10 - Testes F Univariados (Agrupamentos)...75 Quadro 11 - Coeficientes das Funções Discriminantes Derivadas...75 Quadro 12 - Classificação dos Respondentes em Grupos pelas Funções Discriminantes...76 Quadro 13 - Matriz de Estrutura das Funções Discriminantes...76 Quadro 14 - Média dos Construtos por Agrupamento...77 Quadro 15 - Distribuição de Sexo por Agrupamento...79 Quadro 16 - Distribuição de Treinamento Formal por Agrupamento...80 Quadro 17 - Distribuição de Empresa por Agrupamento...81 Quadro 18 - Testes Multivariados de Significância (Empresas)...82 Quadro 19 - Testes F Univariados (Empresas)...82
SUMÁRIO 1 O PROBLEMA...1 1.1 INTRODUÇÃO...1 1.2 OBJETIVO...3 1.3 PERGUNTA DA PESQUISA...5 1.4 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO...5 1.5 RELEVÂNCIA DO ESTUDO...6 2 REFERENCIAL TEÓRICO...8 2.1 SISTEMAS DE INFORMAÇÃO E A ORGANIZAÇÃO...8 2.2 SISTEMAS DE INFORMAÇÃO E O INDIVÍDUO...10 2.3 TAM, O MODELO DE ACEITAÇÃO DE TECNOLOGIA...11 2.4 ESTUDOS EMPÍRICOS SOBRE ACEITAÇÃO E USO DE TI...16 2.5 APLICABILIDADE DO MODELO TAM EM DIFERENTES CULTURAS...29 2.6 SISTEMAS INTEGRADOS DE GESTÃO EMPRESARIAL, OU ERP...31 2.6.1 Conceitos Gerais...31 2.6.2 Breve Histórico...34 2.6.3 Benefícios, Problemas e Mudanças...35 2.6.4 Dois Estudos de Caso...40 3 METODOLOGIA...44 3.1 TIPO DE PESQUISA...44 3.2 QUESTÕES DA PESQUISA...46 3.3 MODELO DA PESQUISA...47 3.4 HIPÓTESES DA PESQUISA...47
3.5 UNIVERSO E AMOSTRA...48 3.6 SELEÇÃO DOS SUJEITOS...50 3.7 COLETA DE DADOS...50 3.8 TRATAMENTO DOS DADOS...53 4 ANÁLISE DE RESULTADOS...56 4.1 PERFIL DA AMOSTRA...56 4.1.1 Variáveis Demográficas...56 4.1.2 Experiência Prévia...57 4.2 ANÁLISE DOS ITENS DOS CONSTRUTOS...58 4.3 TESTE DO MODELO DA PESQUISA...62 4.3.1 Análise de Confiabilidade...62 4.3.2 Análise de Correlação...63 4.3.3 Análise de Regressão Linear...64 4.4 SEGMENTAÇÃO DA AMOSTRA...71 4.4.1 Análise de Agrupamentos (Cluster)...71 4.4.2 Análise Discriminante...75 5 CONCLUSÃO...84 5.1 VISÃO GERAL...84 5.2 LIMITAÇÕES DO ESTUDO...93 5.3 SUGESTÕES PARA PESQUISAS FUTURAS...94 REFERÊNCIAS...96 APÊNDICE A QUESTIONÁRIO...100
1 1 O PROBLEMA 1.1 INTRODUÇÃO O volume de transações realizadas e de informações que circulam na maioria das empresas atualmente é tão grande que é praticamente impossível operar sem utilizar a Tecnologia da Informação para automatizar as tarefas e apoiar as decisões. Os constantes avanços tecnológicos alcançados nas últimas décadas têm implicado em uma considerável queda de preços de computadores, periféricos e, em menor escala, de softwares. O advento dos microcomputadores disseminou e popularizou a Tecnologia da Informação (TI) e os Sistemas de Informação (SI) em todas as organizações, grandes e pequenas. Em 1986 Fred Davis já ressaltara que o uso direto de sistemas de informação pelos usuários finais, em todos os níveis organizacionais, vinha se expandido rapidamente, e era esperado um crescimento contínuo nas décadas seguintes, o que pode ser facilmente constatado atualmente. Entretanto, ele também advertiu que os ganhos reais de performance organizacional resultado desejado do uso de novos sistemas de informação não seriam obtidos se os usuários por algum motivo não adotassem os novos sistemas disponibilizados. Apesar da significativa evolução tecnológica e dos crescentes investimentos das organizações nessas tecnologias, o problema de sub utilização de sistemas afeta vários negócios. Como bem observa Venkatesh (2000), investimentos bem sucedidos em tecnologia podem levar a um substancial aumento de produtividade, e conseqüentemente a um aumento de lucratividade. Por outro lado, problemas com os SI e seu uso podem implicar em resultados indesejados, como perdas financeiras e insatisfação dos funcionários.
2 Uma das barreiras para que uma organização possa usufruir plenamente os benefícios que os seus investimentos em TI podem trazer é a resistência dos usuários para aceitar e usar os sistemas disponíveis (DAVIS, 1989; DIAS, 1998; IGBARIA, PARASURAMAN e BAROUDI, 1996; VENKATESH, 2000). Assim, entender a aceitação de sistemas pelos usuários, bem como os fatores que podem influenciar positivamente nesta aceitação é um assunto de grande importância, tanto para pesquisadores como para profissionais da área de TI. A década de 90 foi marcada pelo surgimento e expressiva difusão dos sistemas ERP (Enterprise Resource Planning), ou Sistemas Integrados de Gestão Empresarial. A principal motivação para as organizações implementarem os sistemas ERP está nos seus recursos de integração e padronização de informações e processos (AL-MASHARI, 2003). Para Davenport (1998) não foi uma surpresa que muitas companhias tenham batido às portas dos fornecedores de sistemas ERP, afinal estes pacotes de software prometem a completa integração de toda a informação que flui por uma organização, sendo a verdadeira realização de um antigo sonho. É verdade que os sistemas ERP podem trazer grandes recompensas, mas os riscos envolvidos são igualmente grandes. Estes sistemas são profundamente complexos, e sua instalação requer grandes investimentos de dinheiro, tempo e conhecimento. Não foram poucas as histórias de problemas, fracassos e projetos fora de controle. Mas apesar dos grandes desafios técnicos, a principal razão de falha dos sistemas têm cunho organizacional.
3 1.2 OBJETIVO Vários estudos têm sido realizados com o intuito de identificar fatores intrínsecos e extrínsecos envolvidos nas decisões, intenções e satisfação dos indivíduos quanto à aceitação e ao uso de TI e de SI. Grande parte deles se baseia no modelo conhecido como TAM Technology Acceptance Model, idealizado por Fred Davis (1986) em sua tese de doutorado. Este modelo propõe que duas variáveis a utilidade percebida e a facilidade de uso percebida influenciam diretamente na atitude e na intenção de uso de tecnologia. Um dos fatores mais citados nestes estudos como potencial facilitador no processo de aceitação e uso de SI, é o treinamento de usuários (BROWN et al., 2002; IGBARIA, PARASURAMAN e BAROUDI, 1996; LEE, KIM e LEE, 1995; VENKATESH, 1999). Fred Davis (1986) incentivou o desenvolvimento de extensões, refinamentos e elaborações do modelo, com o propósito de se alcançar um maior e melhor entendimento dos processos envolvidos na aceitação de tecnologias pelos usuários, e conseqüentemente gerar subsídios para um melhor planejamento de intervenções que aumentem esta aceitação. Venkatesh (1999) sugeriu que sejam realizados estudos em tecnologias mais complexas. Outros autores recomendaram que os sistemas de uso obrigatório carecem de mais investigação (DAVIS, BAGOZZI e WARSHAW, 1992; VENKATESH, 2000). Legris, Ingham e Collerette (2003) reforçam a necessidade de implementar estudos sobre o TAM com foco em aplicações mais relevantes, de uso obrigatório, envolvendo processos de negócios e a realidade dos profissionais em seus ambientes empresariais. Amoako-Gyampah e Salam (2004) notaram que a maioria dos estudos anteriores foi realizada em ambientes tradicionais e relativamente simples, ainda que importantes, tais como computação pessoal,
4 correio eletrônico, editores de texto e planilhas eletrônicas. Mas com o advento e adoção de complexos sistemas de informação, que atravessam limites funcionais e mesmo organizacionais, por vezes forçando a reengenharia de processos durante sua implementação, surge a necessidade de estudos que examinem o TAM neste cenário mais complexo da TI. A profusão dos sistemas ERP é notável, como também é a quantidade de problemas vivenciados pelas empresas na implementação desses sistemas. De acordo com Davenport (1998), tais problemas são principalmente devidos ao impacto direto que o ERP tem na estrutura e cultura organizacionais, e conseqüentemente nos indivíduos. Souza e Zwiker (2000) verificaram, por exemplo, que a integração proporcionada pelos sistemas ERP talvez o benefício mais valorizado e procurado pelas empresas traz maiores exigências e responsabilidades para os usuários e, por conseguinte, geram resistências. Também constataram que, nas empresas que pesquisaram, o usuário final não foi envolvido no processo de implementação e nem recebeu treinamento a respeito das novas exigências trazidas pela visão de processos. Motivado por estas considerações, o objetivo a que se propõe o presente trabalho é, baseado em uma revisão bibliográfica da literatura acadêmica referente à aceitação e uso de SI, e fundamentado nos pressupostos do modelo TAM, realizar uma pesquisa em empresas atuantes no Brasil para investigar a influência que o treinamento de usuários tem sobre a aceitação de sistemas de informação de uso obrigatório, mais especificamente de Sistemas Integrados de Gestão Empresarial. Com esta pesquisa pretende-se identificar fatores positivos e negativos na relação usuário-sistema e, à luz da teoria, sugerir ações que possam promover uma maior aceitação da tecnologia da informação pelos indivíduos.
5 1.3 PERGUNTAS DA PESQUISA Em conjunção com o objetivo acima descrito, a principal pergunta que se pretende responder é: Qual a influência do treinamento de usuários na aceitação de Sistemas Integrados de Gestão Empresarial (ERP) em companhias atuantes no Brasil? Decorrente desta, e buscando ampliar o entendimento sobre os indivíduos e suas percepções a respeito dos aspectos investigados, uma segunda pergunta foi proposta: É possível segmentar os participantes da pesquisa de acordo com suas percepções sobre o Treinamento no sistema ERP, a Facilidade de Uso, a Utilidade, e a Atitude em relação ao sistema ERP? 1.4 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO O foco da pesquisa é essencialmente o indivíduo e as suas percepções a respeito dos sistemas de informação e do treinamento nestes sistemas. Não são analisadas as características técnicas dos sistemas, nem a sua adequação às necessidades operacionais e estratégicas das organizações. Também não é medido o retorno sobre o investimento em TI, nem o aprendizado decorrente do treinamento oferecido aos usuários. Por fim, não se pretende propor soluções referentes à avaliação de programas de treinamento, nem ao desenvolvimento, aquisição, ou metodologias de implantação de softwares.
6 1.5 RELEVÂNCIA DO ESTUDO A necessidade de organizar e controlar melhor e mais eficientemente os processos, inclusive para manter a competitividade frente ao mercado, tem levado cada vez mais empresas a investir na implantação de sistemas de informação. Contudo, nem sempre esses sistemas de informação ajudam a alcançar os resultados esperados. Uma das causas de fracasso, parcial ou total, das implementações de sistemas de informação é a sua não aceitação pelos usuários, bem como a sua sub utilização ou uso inadequado. A importância desta pesquisa reside, antes de tudo, no fato de analisar o componente humano dos sistemas de informação, não somente como a parte que recebe os impactos resultantes da tecnologia, mas também, e principalmente, como um agente ativo e indispensável para o êxito desta tecnologia e, conseqüentemente, para o sucesso da organização. Na esfera acadêmica, esta pesquisa é relevante porque estende os estudos sobre o modelo TAM, reforçando sua validade teórica e empírica, e aprofundando em um fator antecedente específico o treinamento de usuários em sistemas de informação. Um outro ponto importante, de relevância tanto acadêmica quanto prática, é que esta pesquisa buscou seguir as sugestões de outros autores (LEGRIS, INGHAM e COLLERETTE, 2003; VENKATESH, 1999, 2000), investigando o modelo TAM com profissionais em seus ambientes de trabalho, e com foco em uma tecnologia mais complexa e de uso obrigatório os sistemas ERP ou Sistemas Integrados de Gestão Empresarial. Além disso, grande parte dos estudos apoiados no modelo TAM foi realizada nos EUA, sendo que alguns autores têm pesquisado, e até questionado, a sua aplicabilidade em outras culturas
7 (STRAUB, KEIL e BRENNER, 1997). O presente estudo, do ponto de vista acadêmico, também serve como teste da validade dos pressupostos do modelo TAM em relação à cultura organizacional brasileira. Do ponto de vista prático, sua relevância está em investigar e sugerir ações para aumentar a aceitação e o uso de sistemas de informação pelos usuários nas empresas, o que poderá contribuir significativamente para a obtenção de sucesso na implementação de SI.
8 2 REFERENCIAL TEÓRICO Este capítulo contém uma compilação da teoria utilizada para contextualizar e fundamentar o desenvolvimento da pesquisa. Primeiramente buscou-se investigar os sistemas de informação e suas relações de causa e efeito, tanto com a organização quanto com o indivíduo. No passo seguinte é apresentado o modelo TAM, seus elementos e conceitos básicos. A seguir são examinados alguns estudos empíricos sobre aceitação de tecnologia, cujas conclusões e sugestões trazem idéias e suporte para a pesquisa. Por fim, são vistos alguns conceitos e análises sobre os sistemas ERP. 2.1 SISTEMAS DE INFORMAÇÃO E A ORGANIZAÇÃO De acordo com Bio (1985), existem relações de interdependência entre os sistemas de informação e a organização que os tornam inexoravelmente interligados, de forma que a alteração, a mudança e o replanejamento de um deles afetará o outro. De fato, a implementação de sistemas de informação pode levar a repercussões expressivas na estrutura da organização, como transferências e/ou eliminação e/ou criação de funções, mudanças na natureza de funções, e a revisão de autoridade e/ou responsabilidades. Por outro lado, problemas organizacionais como agrupamento inadequado de funções, indefinição de autoridade/responsabilidades, inexistência de funções importantes para a consecução dos objetivos, e duplicidade de funções, entre outros, afetam sensivelmente a implementação de sistemas de informação adequados e eficazes. Em função do avanço tecnológico dos computadores, os fabricantes têm colocado à disposição dos usuários equipamentos cada vez menores, de maior capacidade, com maior flexibilidade e potencialidade de uso, e a preços mais reduzidos. Esse fato não só amplia o número de empresas que podem dispor desses recursos, mas também tem despertado maior
9 criatividade e permitido o desenvolvimento de sofisticadas tecnologias na concepção dos sistemas de informação que, até há algum tempo, não era sequer possível imaginar (BIO, 1985). Tapscott e Caston (1995) sugerem que um novo paradigma na situação geopolítica mundial está se transformando em realidade, criando um novo modelo no ambiente empresarial internacional, constituído pela ascensão de uma nova empresa, atuante em rede e aberta. Essas mudanças globais também estão provocando alterações na tecnologia da informação: as barreiras de tecnologia estão sendo desmanteladas, antigas arquiteturas de computação estão sendo deixadas de lado, e a natureza e o propósito da computação estão sendo radicalmente alterados. Segundo os autores, durante as primeiras décadas de sua existência (1950-1970), a TI era buscada basicamente como meio de redução de custos administrativos. Atualmente vive-se uma segunda era da TI, a qual passou para a linha de frente na maioria das organizações, tornando-se estratégica à medida que foi transformada em componente necessário para a execução de estratégias empresariais. É difícil estimar a significância estratégica da nova tecnologia da informação. Ela vem promovendo profundas transformações na natureza dos produtos, processos, empresas, indústrias, e até mesmo da competição. Até recentemente muitos executivos tratavam a TI como uma atividade de suporte, e delegavam-na aos departamentos de processamento de dados. No entanto, agora toda a empresa deve entender os amplos efeitos e implicações da nova tecnologia, e como ela pode criar vantagens competitivas substanciais e sustentáveis (PORTER e MILLAR, 1985).
10 Parece não haver dúvidas de que a gestão eficiente de informações em uma organização pode ser uma fonte de vantagem competitiva, contudo nem sempre isso acontece e muitos investimentos em TI falham em seus objetivos estratégicos. A (falsa) idéia de que problemas complexos podem ser rapidamente resolvidos com investimentos em tecnologias e sistemas sofisticados é bastante sedutora. Porém, esta visão reducionista pode levar a grandes prejuízos e a conseqüências até mesmo mais desastrosas. A implementação de sistemas, na verdade, pode envolver amplas transformações de processos organizacionais, com significativas implicações no modelo de gestão, na estrutura organizacional, no estilo e cultura gerenciais, e, particularmente, nas pessoas (WOOD JR e CALDAS, 2000). 2.2 SISTEMAS DE INFORMAÇÃO E O INDIVÍDUO Bio (1985) chama atenção para a importância de se pensar a empresa como uma organização social, humana, e não como um conjunto de máquinas e equipamentos, ou como uma estrutura formal que distribui funções, procedimentos, sistemas e computadores. Muitos administradores e especialistas estão progressivamente mergulhados em soluções técnicas e racionais, ao mesmo tempo em que o clima, do ponto de vista humano, parece estar cada dia mais tenso, desgastante e pouco motivador. Na área de sistemas de informação, especificamente, os problemas tendem a ser analisados e interpretados à luz de conceitos e técnicas de sistemas, projetos e processamento de dados, freqüentemente implicando em soluções que não se efetivam, seja por dificuldades de entendimento, comportamentos contrários ou obstáculos políticos. É fundamental, portanto, a conscientização de que qualquer mudança organizacional ou de sistemas é antes de tudo um fato humano, envolvendo assim, inevitavelmente, aspectos psicológicos, sociais e políticos.