Arquivos Catarinenses de Medicina. Comportamento sexual de estudantes do ensino médio de escolas públicas e particulares de um município catarinense



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Arquivos Catarinenses de Medicina ISSN (impresso) 0004-2773 ISSN (online) 1806-4280 ARTIGO ORIGINAL Comportamento sexual de estudantes do ensino médio de escolas públicas e particulares de um município catarinense Sexual behavior among students from public and private high school of a city in the state of Santa Catarina Camila Rosso Neto 1, Anna Paula Piovezan 1,2, Dayani Galato 1,2 Resumo O estudo teve como objetivo investigar o comportamento sexual de estudantes do ensino médio e o seu conhecimento sobre diferentes aspectos do tema. Foi desenvolvido um estudo transversal com preenchimento de questionário pelos estudantes de diferentes escolas de uma cidade catarinense. Os resultados foram analisados por estatística descritiva e testes de associação (p 0,05). Foram investigados 533 estudantes, sendo que 36,8% já iniciaram a vida sexual e 42,8% destes já utilizaram anticoncepção de emergência. A média de idade da primeira relação foi de 14,8 (±1,6) anos, ocorrendo principalmente com o namorado (62,6%) e com uso de preservativo (77,2%). Preservativo masculino (98,5%), feminino (91,9%) e pílula anticoncepcional (88,2%) foram os contraceptivos mais conhecidos. Houve associação entre ser de escola pública e já ter iniciado a vida sexual (p = 0,002) e ser de escola particular e utilizar preservativo na primeira relação (p = 0,026). Apesar de referirem conhecimento, os comportamentos dos estudantes não refletem a prevenção contra doenças, mas apenas contra a gravidez não planejada. Abstract The present study aimed to investigate high school student s sexual behavior and their knowledge around different aspects of the subject. A cross-sectional study was conducted with application of a questionnaire to students belonging to the different school of the selected city. Descriptive statistics and tests of association (p 0.05) were used to analyze the results. In total, 533 students were investigated, of which 36.8 percent had already started their sexual activity, and 42.8 percent had used emergency contraception. The average age at first intercourse was 14.8 (±1.6) years; sex occurred mostly between boyfriend and girlfriend (62.6%) and condom use was reported by 77.2 percent. The most common contraceptives known were male condoms (98.5%), female condoms (91.9%), and contraceptive pills (88.2%). There was an association between studying at a public school and having started sexual activity (p=0.002), and between studying at a private school and condom using at first intercourse (p=0.026). Despite demonstrating knowledge of the subject, students behavior does not reflect the prevention of diseases, but only against unintended pregnancy. Descritores: Comportamento sexual. Estudantes. Doenças Sexualmente Transmissíveis. Gravidez. Key-words: Sexual Behavior. Students. Sexually Transmitted Diseases. Pregnancy. 1. Curso de Farmácia e Núcleo de Pesquisa em Atenção Farmacêutica e Estudos de Utilização de Medicamentos (NAFEUM). 2. Programa de Mestrado em Ciências da Saúde, Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL). 38

Introdução As questões da sexualidade na adolescência manifestam-se como tema pouco debatido pela sociedade e pelos serviços de saúde (1). Está entre adolescentes a maior incidência de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e gravidez não planejada, pelo fato destes estarem iniciando cada vez mais cedo suas relações sexuais. O desconhecimento de métodos contraceptivos, a irregularidade no uso do preservativo e a prática de relações sexuais com maior número de parceiros aumentam essa incidência (2-4). Estes dados apontam para a vulnerabilidade dos adolescentes em relação às DST. Tal fato resulta de um conjunto de fatores individuais, programáticos, sociais e culturais, interdependentes e mutuamente influenciáveis, assumindo pesos e significados diversos (5), dependendo da população estudada. Estudos realizados em nosso país ou internacionalmente revelaram algumas destas características (6-11). Fatores como não adoção de comportamentos de prevenção, bem como as desigualdades de renda e comportamentos estabelecidos culturalmente ao papel masculino e feminino na relação sexual foram identificados como determinantes à vulnerabilidade para DST e ao contágio com o Vírus da Imunodeficiência Adquirida (HIV) entre indivíduos de 18 a 49 anos no Distrito Federal (6). A falta de informação sobre o tema também pode ser um fator que aumenta a vulnerabilidade, tendo sido esta identificada entre estudantes de escolas públicas e particulares do terceiro ano do ensino médio de um município catarinense, que investigou o comportamento sexual e conhecimento sobre o Vírus Papiloma Humano (7). Os adolescentes estudados também apresentaram conceitos equivocados a respeito desta DST e, apesar dos alunos da escola particular terem demonstrado um conhecimento maior sobre esse assunto, o nível de informação observado ainda foi inferior ao desejável. Outros autores também revelaram maior prevalência no uso de preservativo na primeira relação sexual e maior conhecimento sobre DST e a Aids pelos adolescentes das escolas particulares em relação aos de escola pública; sendo que, no entanto, essa compreensão foi escassa e insuficiente para promover um comportamento sexual seguro (8). Nesta mesma linha, foi demonstrado que o uso regular de preservativo, com parcerias fixas e casuais, diminuiu, sobretudo entre os jovens do sexo masculino com baixo grau de escolaridade (4). Alterações no comportamento quanto ao uso de métodos de prevenção de DST também podem resultar em gravidez não planejada, sendo que o grau de instrução e a idade podem influenciar nesta conduta. Entre jovens do estado de São Paulo, observou-se que a utilização de métodos contraceptivos esteve fortemente relacionada com o nível de instrução, sendo que a taxa de fecundidade foi maior entre as adolescentes e jovens que apresentam menor escolaridade (9). A idade também influenciou o comportamento de uso de preservativos em jovens nos Estados Unidos da América; entre adolescentes grávidas atendidas em serviço de atenção pré-natal registrou-se que somente 46,0% das adolescentes entre 12 e 15 anos utilizavam contracepção, enquanto, na idade entre 18 e 19 anos essa porcentagem aumentou significativamente para 66,0% (10). Estes resultados podem ser decorrentes do desconhecimento acerca da forma correta de utilização dos métodos contraceptivos, que foi demonstrado entre adolescentes latinas grávidas, entre as quais 11,0% afirmaram que não sabiam como usar o preservativo e mais de 50% não explicaram corretamente o procedimento de uso (11). Finalmente, a utilização de métodos anticoncepcionais por parte dos jovens é inconsistente e pode ser definido principalmente pelo envolvimento afetivo- -amoroso. Em diferentes países observou-se que no namoro ou em um relacionamento estável, os jovens não sentem a necessidade de negociar o uso de preservativos, já que existe um vínculo entre o casal (12,13). Além disso, enquanto no início do relacionamento é comum à utilização de preservativo masculino, este método é abandonado posteriormente quando são priorizados os métodos hormonais (14). No município do presente trabalho, em um estudo realizado com universitários entre 18 a 25 anos de idade (12), registrou-se que a anticoncepção de emergência e o preservativo foram os métodos mais difundidos entre os jovens. Contudo, os resultados apontaram para uma maior preocupação dos sujeitos em relação à gravidez não planejada do que com as DST. Tendo em vista a importância do tema, bem como o início da vida sexual mais precoce entre adolescentes, este estudo teve como objetivo avaliar aspectos do comportamento sexual de estudantes do ensino médio e o conhecimento dos mesmos sobre o tema. Métodos Realizou-se um estudo epidemiológico de delineamento transversal através da aplicação de questionários de autopreenchimento. A população do estudo foi caracterizada por estudantes matriculados no ensino médio de duas escolas públicas e duas escolas particulares do município de 39

Tubarão/SC, selecionadas por conveniência. Os critérios para a participação dos estudantes foram: ser aluno do ensino médio das escolas selecionadas; estar presente na sala de aula no dia de coleta de dados e; aceitar participar do estudo. Para a coleta de dados, foram realizadas duas visitas às escolas. Na primeira, agendada previamente com a direção das mesmas, houve a apresentação dos objetivos do estudo e do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) aos estudantes, sendo que para aqueles com idade inferior a 18 anos foi solicitada assinatura do TCLE também por seus responsáveis. Posteriormente realizou-se novo encontro para aplicação do instrumento de coleta de dados. Este instrumento foi desenvolvido na forma de questionário contendo perguntas abertas e fechadas que visaram caracterizar o perfil dos estudantes (sexo, idade, classificação econômica segundo a Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa, tipo de escola, ano escolar, com que moram e se trabalham) e seu conhecimento sobre métodos contraceptivos e DST. Além disso, entre aqueles que já haviam iniciado a vida sexual, foi investigado também o comportamento sexual através das seguintes variáveis: idade da primeira relação sexual, tipo de parceiro na primeira relação, tipo de proteção utilizada na primeira relação, número de parceiros, tipo de método adotado na última relação e uso de métodos contraceptivos (preservativo masculino, preservativo feminino, anticoncepcionais hormonais, em especial da anticoncepção de emergência entre outros métodos). A legibilidade deste instrumento de coleta de dados foi avaliada por meio de um pré-teste realizado com dez estudantes de mesma faixa etária, pertencentes a escolas que não foram selecionados para o estudo, sendo o instrumento considerado adequado nesta etapa. Os dados coletados nesta etapa não foram inclusos na pesquisa. Os dados coletados a partir das respostas ao questionário foram tabulados em um banco de dados no programa EpiData 3.0. As variáveis nominais foram apresentadas em números absolutos e proporções e as variáveis numéricas em medidas de tendência central e de dispersão. Dependendo a variável apresentada, o número de observações foi diferente, pois nem todos os estudantes responderam a todas as questões. Para comparação de proporções realizou-se análise por qui-quadrado no programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) 19.0, adotando-se o nível de significância de 5% (p 0,05). Para as associações, quando necessário, as variáveis nominais foram re-categorizadas em dicotômicas e as variáveis numéricas foram categorizadas através da mediana. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Sul de Santa Catarina, sob número de registro 09.498.4.03.III. Resultados Foram entrevistados 533 dos 765 estudantes que preencheram critério de inclusão no estudo, representando 69,7% do total. Destes, 280 pertenciam às escolas públicas e 253 às escolas particulares, estando distribuídos entre o primeiro (33,0%), segundo (25,5%) e terceiro (41,5%) anos do ensino médio e apresentando idades entre 12 e 21 anos de idade (15,8 ± 1,3) com mediana de 16 anos. Outros dados de caracterização do perfil sócio demográfico estão apresentados na Tabela 1. A Tabela 2 apresenta os dados obtidos sobre o conhecimento referido e uso de métodos contraceptivos pelos estudantes entrevistados. Destaca-se que 98,7% dos estudantes afirmaram que podem ser transmitidas doenças por meio de relações sexuais, sendo que as mais conhecidas pelos mesmos foram: Aids (97,7%), gonorreia (80,9%), sífilis (71,5%) e herpes (58,5%). O comportamento sexual dos estudantes que já iniciaram a vida sexual está descrito na Tabela 3. Para estes sujeitos, a idade da primeira relação variou entre 10 e 20 anos, com média de 14,8 (±1,6) anos de idade sendo que o número médio de parceiros relatados até o momento da entrevista foi de 2,7 (±3,7). Comparando os alunos dos diferentes tipos de escola com o comportamento sexual referido, observou-se associação entre já ter vida sexualmente ativa e pertencer à escola pública (p=0,002), bem como entre ter usado preservativo na primeira relação e pertencer à escola particular (p=0,026). No entanto, não foi observada diferença na prevalência de uso do preservativo na última relação entre escolas públicas e particulares (p=0,143). Outros dados que chamam a atenção, contudo, dizem respeito ao fato de não ter sido encontrada diferença (p=0,250) entre a proporção de indivíduos que utilizaram preservativo na primeira relação (78,5%, n=149) e na última relação (73,3%, n=178). Da mesma forma, não houve diferença (p=0,963) entre a proporção de indivíduos que utilizaram preservativo na última relação sexual e referiram apenas um (72,0%, n=82) ou mais de um parceiro sexual (71,6%, n=74) até o momento. Quando se investigou o uso de preservativo na última relação sexual em relação à idade não se observou diferença (p=0,762) entre os mais jovens (até 16 anos, 74,5%) e os mais velhos (17 anos ou mais, 72,5%). Também não foi encontrada diferença entre o uso de 40

algum método contraceptivo e a idade da primeira relação (p=0,622), neste caso observando-se que entre os estudantes que tiveram a primeira relação até os 15 anos a frequência de uso foi de 77,1% contra 80,4% naqueles cuja primeira relação foi com 16 ou mais anos de idade. O uso de proteção na última relação também não foi diferente entre os alunos do terceiro ano em relação aos dois anos anteriores (p=0,707), demonstrando não haver diferença entre estas escolaridades. Discussão O estudo do comportamento sexual de jovens é relevante, já que é neste grupo que a incidência de HIV tem apresentado maior elevação (4,15). Os resultados do presente estudo sobre conhecimento dos métodos contraceptivos entre estudantes do ensino médio demonstram que ainda ocorrem muitas dúvidas em relação a métodos, tais como a tabelinha, o coito interrompido e o DIU. Além disso, mesmo que os estudantes tenham referido conhecer métodos como a pílula anticoncepcional e a anticoncepção de emergência, uma proporção importante ainda apresenta conceitos equivocados a respeito destes métodos, como a crença de estes são capazes de prevenir as DST. Os presentes achados também são consistentes com outros estudos que observaram este desconhecimento, bem como fortalecem a ideia de que a faixa etária investigada tem maior preocupação com a gravidez não planejada do que necessariamente com as DST (12,13). Para os autores destes estudos (12,13), tal fato pode ser reflexo do mito criado pelo coquetel. Ou seja, pelo conhecimento de que existem medicamentos bastante efetivos no tratamento da Aids, esta doença passe a não ser mais tão temida como era anteriormente. Observou-se ainda uma prevalência expressiva (36,2%) de estudantes que já iniciaram a vida sexual, sendo este comportamento mais prevalente naqueles das escolas públicas. Este resultado é semelhante ao descrito por outros pesquisadores (16), a partir do relatório do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) de 2005, que apresentou um registro de 46,8% para este desfecho. A alta prevalência de uso de preservativo na primeira relação sexual e o maior conhecimento sobre DST e HIV por adolescentes de escolas particulares também está em acordo com o apontado na literatura (9). No entanto, o fato de não ter sido utilizado o preservativo no último coito pode representar que nas escolas particulares a educação sexual não enfatiza a importância da continuidade do uso do mesmo. Por outro lado, seus estudantes provavelmente se comportem como adultos quando em relacionamentos ditos estáveis, já que nestes casos observou-se que o método de barreira passa a ser substituído pelos métodos hormonais (17). Na presente pesquisa a idade não interferiu com o comportamento de uso do preservativo na primeira ou na última relação sexual; no primeiro caso, este resultado difere do que foi descrito por outros autores que observaram que pessoas mais jovens utilizavam menos proteção (11,14). Já a respeito da última relação sexual, o maior grau de instrução dos estudantes também não modificou o comportamento. Isto talvez ocorra por esta diferença de instrução (um ou dois anos) não ser suficiente modificar atitudes comportamentais como foi demonstrado por pesquisadores (8) em um estudo com jovens paulistas. A falta de uso de preservativos demonstra uma questão cultural que precisa ser trabalhada de forma mais efetiva neste público, a fim de que esta seja mantida, inclusive, nos relacionamentos estáveis já que nestes as DST também incidem de forma bastante importante (15). Uma forma de atuação nestes grupos seria por meio da realização de ações de educação em saúde, em especial com o uso de ferramentas lúdicas (18), que deveriam buscar principalmente a mudança de atitudes, do que necessariamente a oferta de informação (13). Quanto ao tipo de parceiro no primeiro coito, os resultados presentes são semelhantes aos apresentados por outras pesquisas (2,12), tendo ocorrido principalmente com namorados e amigos. Ainda, o comportamento relacionado ao uso de preservativo não se associou ao número de parceiros, mesmo que seja conhecido o fato de que, quanto maior este número, maior a vulnerabilidade às DST (17). Sabe-se também que o ideal para a prevenção de DST e HIV seria o uso de preservativo em todas as relações sexuais, durante todo o ato sexual, independente do tipo de parceiro (se eventual ou fixo). No caso desta pesquisa, mesmo que o uso do preservativo tenha sido menor que o ideal, ele foi o mais empregado entre os métodos contraceptivos. Este fato, que também tem sido observado em outros estudos (14,19) no Brasil, ocorre principalmente pela facilidade de acesso através da compra em diferentes estabelecimentos comerciais e também pela distribuição gratuita no Sistema Único de Saúde. No entanto, é importante destacar que nem sempre o preservativo é utilizado de forma correta (10). Na presente pesquisa os estudantes não foram arguidos a respeito da correta forma de utilização dos métodos contraceptivos, porém, quando se investigou o uso da anticoncepção de emergência observou-se que mais de um terço dos entrevistados citou que o motivo de uso 41

deste método foi o rompimento do preservativo, o que pode ter sido ocasionado pelo uso inadequado. Além disso, outras pesquisas (12,13) demonstram que muitas pessoas adotam o preservativo apenas durante a ejaculação, o que predispõe à transmissão de DST já que há contato com fluidos biológicos durante o coito. A anticoncepção de emergência é um método contraceptivo cujo uso deve ser divulgado e estimulado; no entanto, cabe destacar que o mesmo não protege os indivíduos contra as DST e inclusive pode ser considerado um fator de vulnerabilidade (17), uma vez que é utilizado na ausência ou falha do método de barreira, por um público que não planeja uma gravidez. Outro ponto que merece destaque é que em dois terços das situações o homem participou da aquisição da anticoncepção de emergência, o que pode representar uma maior participação do parceiro no planejamento familiar ou a ocorrência de uma possível negociação do parceiro no convencimento da mulher a utilizar este método em detrimento ao preservativo. Em conclusão, estes resultados demonstram que este público refere possuir informação sobre os métodos contraceptivos e também dúvidas, em especial, com aqueles menos utilizados como a tabelinha, o DIU e o coito interrompido. Mesmo que afirmem conhecer os métodos, cometem equívocos ao citar a prevenção das DST por métodos como o anticoncepcional hormonal. Além disso, destaca-se que mesmo que haja conhecimento, o comportamento dos estudantes não é modificado fazendo com que mais de um quarto dos mesmos não utilizem o preservativo. Este comportamento nesta pesquisa não teve influência da idade, do ano escolar, do tipo de escola e do número de parceiros. A adoção do uso de anticoncepcionais hormonais e de anticoncepção de emergência demonstra que os jovens preocupam-se mais com a prevenção da gravidez não planejada, do que com as DST. É necessário o desenvolvimento de estratégias educacionais voltadas à mudança destes comportamentos nesta população para reduzir a transmissão de DST e HIV. Referências 1. Longo AFB, Pereira APFV. Políticas Populacionais: Políticas de Saúde Sexual e Reprodutiva do Adolescente no Brasil [Documento na internet]. 2006 [citado 2011 jul 20]. Disponível em: www.abep.nepo. unicamp.br/docs/anais/pdf. 2. Taquette SR, Vilhena MM, Paula MC. Doenças sexualmente transmissíveis e gênero: um estudo transversal com adolescentes no Rio de Janeiro. Cad Saude Publica 2004; 20:282-90. 3. Custódio GC, Schuelter-Trevisol F, Trevisol DJ, Zappelini CEM. Comportamento sexual e fatores de risco para a ocorrência de gravidez, DST e HIV em estudantes do Município de Ascurra (SC). Arq Cat Med 2009; 38:56-61. 4. Szwarcwald CL, Andrade CLT, Pascom ARP, Fazito E, Pereira GFM, Penha IT. HIV-related risky practices among brazilian young men, 2007. Rev Saude Publica 2011; 27:S19-26. 5. Guilhem D. Escravas do Risco: bioética, mulheres e Aids. Brasília: Editora UnB/Finatec; 2005. 6. Maia C, Guilhem D, Freitas D. Vulnerabilidade ao HIV/Aids de pessoas heterossexuais casadas ou em união estável. Rev Saude Publica 2008; 42:242-8. 7. Conti FS, Bortolin S, Külkamp IC. Educação e promoção à saúde: comportamento e conhecimento de adolescentes de colégio público e particular em relação ao papilomavírus humano. J Bras Doenças Sex Transm 2006; 18:30-5. 8. Martins LBM, Costa-Paiva LHS, Osis MJD, Sousa MH, Pinto-Neto AM, Tadini V. Fatores associados ao uso de preservativo masculino e ao conhecimento sobre DST/AIDS em adolescentes de escolas públicas e particulares do Município de São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2006; 22:315-23. 9. Yazaki LM, Morell MGG. A primeira experiência sexual, conjugal e materna. In: Fundação SEADE. Vinte anos no ano 2000: estudos sociodemográficos sobre a juventude paulista. São Paulo: SEADE, 1998:149-52. 10. Phipps MG, Rosengard C, Weitzen S, Meers A, Billinkoff Z. Age group differences among pregnant adolescent: sexual behaviour, health habits and contraceptive use. J Pediatr Adolesc Gynecol 2008; 21: 9-15. 11. Nadeen E, Romo LF, Sigman M. Knowledge about condoms among low-income pregnant Latina adolescents in relation to explicit maternal discussion of contraceptives. J Adolesc Health 2006; 39:119.e9-15. 12. Souza FG, Bona JC, Galato D. Comportamento de jovens de uma universidade do sul do Brasil frente à prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e gravidez. J Bras Doenças Sex Transm 2007; 19:22-9. 13. Berten H, Rossem RV. Doing worse but knowing better: An exploration of the relationship between HIV/ AIDS knowledge and sexual behavior among adolescents in Flemish secondary schools. J Adolesc 42

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