V ENCONTRO PARAIBANO DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 2008, Campina Grande. Anais... A MODELAGEM COMO INSTRUMENTO MOTIVADOR À APRENDIZAGEM Resumo Jozeildo José da Silva 1 MECM/UEPB Neste trabalho será relatada uma experiência através da abordagem da modelagem na educação matemática como ferramenta que facilita a aprendizagem do aluno, tornando-o um sujeito ativo do processo ensino-aprendizagem em três turmas da 8ª série do Ensino Fundamental da Escola Municipal Leonardo de Araújo Pimentel, Orobó-PE. Com a experiência pôde-se perceber que o trabalho através da modelagem desenvolve no aluno o senso crítico-argumentativo, por meio da busca de informações, do questionamento, da experimentação, etc., sem deixar de lado o rigor da matemática. Além disso, os alunos foram estimulados ao trabalho em equipe e socialização de informações, valorizando o conhecimento prévio que eles possuíam, adquirido em seu convívio social e sua relação com o conhecimento científico adquirido na escola. Palavras-chave: Modelagem, educação matemática, instrumento motivador. 1. Introdução Este artigo proporcionará aos educadores matemáticos uma visão acerca da metodologia utilizada em sala de aula e sua relação com o aprendizado do aluno. Em seu decorrer, serão retratados assuntos referentes à modelagem, sua relação com o ensinoaprendizagem e sua função como recurso à educação matemática. É importante destacar que, em seu decorrer, a modelagem matemática, para evitar expressões repetitivas, passará a se chamar apenas modelagem. Para tanto, faz-se necessário um esclarecimento sobre o que vem a ser modelagem e qual a sua função como prática pedagógica. Para Barbosa, (2004) a modelagem pode ser entendida como um elo ligado à pedagogia de projeto, em que os alunos são organizados em grupos e orientados pelo professor para a realização das atividades, sendo essas, na maioria das vezes, ligadas ao seu cotidiano ou mesmo a assuntos que condizem com fatos atuais. Além da pedagogia de projetos, a modelagem também serve como instrumento ligado a vários conteúdos didáticos, através da resolução de problemas e da investigação a cerca de uma situação, fenômeno, etc. Dessa forma, sua introdução na educação proporciona uma alternativa ao ensino tradicional, pois, muitas vezes, a matemática é encarada pela sociedade como um bicho papão. Há quem argumente até que, só quem sabe matemática são os intelectuais, pessoas que já nasceram com tal dom. É sabido que existem sim, pessoas que desenvolvem com mais rapidez um tipo de inteligência do que outra, mas isso não significa que determinada inteligência seja impossível de ser desenvolvida para as demais pessoas (Travassos, 2001). Assim, a modelagem se traduz em uma pedagogia que insere o aluno como um sujeito ativo da aprendizagem, englobando um ambiente motivador, através da experimentação, da 1 Mestrando em Ensino das Ciências e Matemática / Educação matemática UEPB. Email: jozeildo@bol.com.br
V ENCONTRO PARAIBANO DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 2008, Campina Grande. Anais... 2 pesquisa, da manipulação de objetos, sendo então um recurso que contribuiu para a redução de traumas causados pelo ensino tradicional de matemática, resumindo-se em uma ferramenta motivadora no processo, uma vez que quando é inserido no contexto de um problema, o aluno é instigado a procurar meios para a descoberta de sua solução (Moura, 2007). 2. Por que usar a modelagem? O trabalho teve inicio a partir da necessidade de ligar o ensino de matemática ao contexto social em que o aluno está inserido, através da modelagem na educação matemática. Pois, os alunos estavam sendo submetidos ao estudo dos conteúdos matemáticos, sem ao menos saber o porquê e para que estavam os estudando. Nessa concepção, o ensino de matemática torna-se um mero mecanismo de decodificação de algoritmos em que o aluno é levado a memorizar fórmulas, decorar tabuada, etc., ou seja, absorver uma aprendizagem fruto da repetição e da mecanização. Sendo assim, com os avanços tecnológicos e as exigências impostas pela sociedade, foi indispensável que se usasse uma metodologia que contribuísse com a formação de indivíduos pensantes, frutos de uma aprendizagem pautada na experimentação, na argumentação, na pesquisa e na resolução de problemas reais presentes no meio social. Contudo, apesar de seus avanços e contribuições, é importante destacar que a abordagem de modelagem possui, como qualquer outra metodologia de ensino, suas limitações, pois há dificuldades na contextualização de alguns conteúdos típicos da matemática, como por exemplo, polinômios, e sua relação com as atividades reais. Mas essa questão pode, em parte, ser resultado de uma exploração excessiva de uma metodologia pautada no ensino tradicional em que o aluno é um mero expectador e que a disciplina é algo a ser vivenciado apenas no ambiente escolar, sendo essa concepção relacionada com a cultura presente no ensino de matemática tradicional. Em contrapartida, sendo a matemática uma ciência típica da sociedade, é conveniente que seja encarada como uma ferramenta que visa a solução de situações-problemas. Nessa linha de pensamento, a experiência trouxe uma abordagem inovadora ao ensino de matemática, por meio da modelagem, em que os trabalhos foram desenvolvidos em equipes envolvendo a turma inteira e a escola, perpassando ainda para espaços fora do ambiente escolar. Em concordância a essas idéias, Moura (2007) em seu artigo Resolver problema: o lado lúdico da matemática também defende que o ensino não deve caminhar de maneira
V ENCONTRO PARAIBANO DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 2008, Campina Grande. Anais... 3 isolada da realidade do aluno. Para ele, o aluno deve ser deparado com problemas reais, tomar consciência do mesmo e ser movido pela necessidade ou desejo e procurar solucioná-lo, tendo para isso que dispor de uma atividade mental no processo de planejamento, execução e avaliação de suas ações. Todavia, é preciso que se tomem alguns cuidados ao propor pesquisas aos seus alunos. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), ao propor o trabalho com pesquisas é necessário definir com clareza o problema, indicando a população a ser envolvida e observar os aspectos relevantes para a realização do cálculo e representação mais convenientes para comunicar e interpretar os resultados, obter conclusões e levantar hipóteses. Fazendo uma ligação entre a matemática do cotidiano e a matemática vivenciada no ambiente escolar, Carraher & Schliemann (2006), argumentam que alguns alunos desenvolvem aprendizagens significativas que muitas vezes não são aproveitadas pela escola. Em seu livro: Na Vida Dez, na Escola Zero, as autoras relatam uma experiência envolvendo dois tipos de testes com as mesmas pessoas (alunos do ensino fundamental). Um deles é o teste informal 2, em que os alunos colaboradores conseguiram resolver a maioria dos problemas orais típicos de: feiras livres, barracas de coco, etc. Já no teste formal 3, foram utilizados problemas similares, mas dessa vez, escritos e, como resultado foram encontrados diversas dificuldades pelos participantes causadas pelo erro encontrado no algoritmo das operações. Assim, pode-se observar que, mesmo os participantes da pesquisa sendo estudantes, houve um afastamento entre a matemática do cotidiano e a matemática abordada em sala de aula. Partindo dos argumentos das autoras, nota-se a importância de interligar a escola e a sociedade; além disso, é importante destacar que algumas das atividades com modelagem exigem conhecimentos prévios dos alunos, que devem ser adquiridos em sala de aula antes de suas realizações e/ou com ajuda dos próprios membros das equipes, através da socialização de idéias e que o trabalho com modelagem exige do professor: esforço, empenho, tempo para planejamento, elaboração e seleção de materiais, que podem ser reduzidos se as tarefas forem distribuídas entre os discentes. Nessa concepção, é de grande importância esclarecer que essas atividades proporcionam uma ponte entre o aprender por fazer e o aprender por prazer, condizendo com as idéias de Maher, Pace & Pancari (1995), que argumentam que o aluno aprende melhor 2 No teste informal os colaboradores resolveram problemas oralmente, sem o registro numérico. 3 No teste formal os colaboradores resolveram problemas através de registro numérico.
V ENCONTRO PARAIBANO DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 2008, Campina Grande. Anais... 4 quando é estimulado a resolver situações reais e ainda complementam que nessa perspectiva o professor deve se comportar como incentivador e orientador do processo. Pois, como aponta Barbosa (2004), a modelagem convida os alunos a discutir a matemática no contexto do dia-adia e/ou da realidade. Além disso, é importante que o professor tenha em mente que atividades com modelagem não deve ser encarada como algo que atrapalha o andamento do currículo. Para isso, basta que haja um bom planejamento e escolha das atividades que sejam relacionadas aos conteúdos que se deseja abordar, pois em uma mesma atividade podem ser explorados vários deles, dependendo de sua criatividade. E, quanto ao tempo gasto em atividades, o professor não deve esperar que elas devam preencher poucos momentos, pois, em alguns casos elas podem preencher cerca de duas semanas ou mais. 3. Etapas da experiência A experiência foi realizada em 3 turmas da 8ª série do ensino fundamental da Escola Municipal Leonardo de Araújo Pimentel Orobó-PE, com base em temas atuais e/ou cotidianos, no caso, Números sobre o Folclore, em que os alunos puderam eleger algumas questões a serem investigadas sobre o conhecimento que os demais alunos da escola possuem acerca de algumas lendas do folclore brasileiro. Na turma da 8ª série B, com 25 aluno, eles escolheram 5 perguntas; a turma foi, então, dividida em equipes de 5 alunos. Cada equipe ficou responsável por realizar uma entrevista, sendo as perguntas: Você conhece a lenda do Guaraná? Você conhece a lenda da Mãe Dágua? Você conhece a lenda do Curupira? Você conhece a lenda da Mandioca? Você conhece a lenda do Bôto? Após isso, a turma elegeu como alternativas de resposta: ( ) conheço e sei contar ( ) nunca ouvi falar ( ) não conheço, mas já ouvi falar. Os alunos entrevistadores percorreram todas as salas de aulas. Em outra etapa, os dados obtidos nas entrevistas foram contabilizados e distribuídos por cada equipe que ficou responsável pela elaboração de um gráfico de barras e/ou setores, referente a uma das cinco questões. Durante a construção do gráfico de setores, os alunos precisaram utilizar materiais, como: régua, compasso e transferidor. Nesse momento, foram prestadas orientações sobre o uso desses materiais. Além disso, nesse trabalho foi abordado o cálculo de porcentagem, em que pôde ser utilizada uma calculadora, como também ser explorada a relação entre porcentagem e graus para demarcação no gráfico de setores. Para finalizar a atividade, foi
V ENCONTRO PARAIBANO DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 2008, Campina Grande. Anais... 5 pedido aos alunos que montassem um painel, como pode ser observado acima, para exposição e apresentação dos resultados. Fig 1: alunos sendo consultados Fig 2: Alunas da 8ª B apresentando painel Uma outra atividade desenvolvida, mas dessa vez na 8ª série D através da modelagem foi: Medindo a Minha Escola, onde os alunos foram divididos em grupos, como no exemplo anterior e com o uso de uma trena e planilha para anotações, percorreram toda a escola realizando medições. Cada grupo ficou responsável por uma ou mais salas. Eles mediram as dimensões das salas de aula, além de secretaria, diretoria, etc. Seguindo com o trabalho, um dos alunos da equipe se encarregou de anotar os dados, enquanto os outros realizaram as demais atividades, a partir daí, calcularam a área de cada sala, do pátio, como também a área total (aproximada) ocupada pela escola, além de seu perímetro. Fig 3: Alunos da 8ª D medindo a escola Fig 4: Alunos da 8ª D construindo maquete Nessa atividade os alunos necessitaram do uso de régua, pois, para dar uma visão geométrica, eles elaboraram uma planta do terreno da escola, levando em questão que precisaram aplicar conhecimentos sobre razão e proporção ao adotar uma escala. Ao final, os alunos, construíram um painel contendo uma tabela informativa sobre dados referentes à área ocupada pela escola e seus compartimentos, perímetro, etc., e com o uso de: isopor, cola e tinta, elaboraram uma maquete, como vista ai lado, que foi apresentada aos demais alunos da escola. Outra atividade desenvolvida para 8ª C foi: Verificando a velocidade média dos veículos, em que, como nas outras atividades citadas, a turma de 20 alunos foi dividida em 2 grupos de 10 alunos, o grupo A e o grupo B. Essa foi uma atividade em que uma parte foi realizada em campo e a outra na sala de aula e sua necessidade se deu pelo fato de que no
V ENCONTRO PARAIBANO DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 2008, Campina Grande. Anais... 6 trecho em estudo, houve alguns acidentes, inclusive com vítimas fatais. Portanto a turma estava investigando se esse fato tinha relação com a velocidade usada pelos motoristas. Para isso, foi necessário percorrer um trecho de 900 metros da PE-88 que liga a cidade de Orobó- PE a cidade de Umbuzeiro-PB. Um grupo fixou-se em um ponto da rodovia, enquanto que o outro grupo seguiu adiante com uma trena de 50 metros realizando medições, até chegar no ponto estratégico. Foram utilizados dois aparelhos celulares para manter contato sobre o momento em que um veículo cruzava o ponto marcado para o estudo. Também foram utilizadas calculadoras para se calcular a velocidade média de cada veículo. Como já mencionado, as equipes ficaram distantes 900 metros; quando o veículo cruzava o ponto onde se encontrava o grupo A, um de seus integrantes ativava o cronômetro e após 30 segundos outro dos integrantes desse grupo fazia uma ligação telefônica para um dos integrantes do grupo B, mantendo o contato até de que fosse informado o momento exato em que o veículo cruzava aquele ponto. Em outro momento, desta vez na sala de aula, os alunos elaboraram uma tabela, como a que aparece na figura 3, com os dados obtidos pelos nove veículos envolvidos na experiência, em que calcularam suas velocidades médias e a média aritmética da velocidade média naquele treco que, através da conversão de unidades de medidas, resultou em 51,3 km/h, que, para o trecho em estudo não é uma velocidade alta, o que significa dizer que, com os dados da pesquisa não foi possível levantar conclusões. Nessa atividade, apesar de não serem feitas conclusões relacionadas a um fato real, os alunos puderam assimilar melhor os conceitos de função, média aritmética e velocidade média introduzida na física. Dando continuidade à pesquisa, a partir da tabela foi exposto aos alunos, um diagrama de flechas em que foi possível explanar os conceitos de domínio e imagem de uma função, além do conceito de média aritmética de maneira intuitiva, desenvolvendo uma aprendizagem significativa, pois estiveram deparados com uma situação real. Fig 5: alunos da 8ª C medindo rodovia Fig. 5: Tabela construída por um aluno da 8ª D
V ENCONTRO PARAIBANO DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 2008, Campina Grande. Anais... 7 Portanto, a experiência do trabalho com modelagem colocou em questão a concepção de que o aluno deve ser sujeito de sua própria aprendizagem, sendo estimulado pelo professor à pesquisa, à busca de informações, etc. tornando a matemática uma ferramenta útil para aplicação em atividades típicas do cotidiano do aluno e/ou a fatos da realidade. 4. Considerações acerca do uso de modelagem O trabalho com modelagem é um excelente instrumento que, além de envolver toda a turma nas atividades realizadas, proporciona uma aprendizagem voltada para a investigação e desperta nos alunos o gosto pelo aprender por prazer, tornando-os mais motivados à aprendizagem. Nessa linha de pensamento, esse recurso permite fugir um pouco da prática tradicional que coloca o aluno como mero espectador e que muitas vezes acaba se tornando uma prática exaustiva. Portanto, a experiência, possibilitou o envolvimento dos alunos em atividades dinâmicas, como: pesquisa, coleta, organização de dados em tabelas e construção de gráficos, análise de velocidades de veículos, habilidade dos alunos em fazer medições e estimativas, contribuição para o desenvolvimento artístico do aluno em confecção de maquete, pinturas e painéis, uso da calculadora em situações reais, etc. de forma interdisciplinar, englobando uma visão inovadora à prática docente, como recurso que contribuiu para a aprendizagem. Referências BARBOSA, J. C. A "contextualização" e a Modelagem na educação matemática do ensino médio. In: ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 8., 2004, Recife. Anais... Recife: SBEM, 2004. 1 CD-ROM. Disponível em: <http://www.uefs.br/nupemm/enem2004_2.pdf> Acesso em: 26 de jun. 2008. Modelagem na Educação Matemática: contribuições para o debate teórico. Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/24/t1974438136242.doc> Acesso em 22 de jun. 2008. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ministério da Educação. Ensino Fundamental (5ª a 8ª série): Matemática. 2ª Edição. Brasília, 1998.
V ENCONTRO PARAIBANO DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 2008, Campina Grande. Anais... 8 CARRAHER, T.; SCHLIEMANN, Analúcia; CARRAHER, David. Na Vida Dez, na Escola Zero. 14ª Ed. São Paulo: Cortez, 2006. MAHER, C. A.; PACE, J. P. e PANCARI, J. Integrando aplicações da Estatística no aprendizado de Álgebra pela Resolução de Problemas. In: COXFORD, Arthur F; SHULTE Albert P.(orgs). As Idéias da Álgebra. São Paulo: Atual, 1995. MOURA, Anna R. L. Resolver problema: o lado lúdico da matemática. In: Pró-Letramento em Matemática: Programa de Formação de Professores das Séries Iniciais do Ensino Fundamental. Secretaria de Educação Básica, Brasília: Ministério da Educação, 2007. 308p. TRAVASSOS, L. C. Panisset. Inteligências Múltiplas. Revista de Biologia e Ciências da Terra. v. 1, n. 2, 2001. Disponível em: <http://www.uepb.edu.br/eduep/rbct/sumarios/pdf/ inteligencias_multiplas.pdf> Acesso em: 21 de jun. 2008