NATUREZA JURÍDICA DA RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA AMBIENTAL E OS PRINCÍPIOS DA PRECAUÇÃO E PREVENÇÃO

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Transcrição:

1 NATUREZA JURÍDICA DA RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA AMBIENTAL E OS PRINCÍPIOS DA PRECAUÇÃO E PREVENÇÃO Gilberto José de Santana Júnior¹ Bruno Torquato² RESUMO: O objetivo do presente trabalho é verificar se, a luz dos princípios da prevenção e da precaução, a natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental deve ser considerada subjetiva ou objetiva, por meio de pesquisa de jurisprudência e pesquisa bibliográfica considerando as contribuições de alguns autores, entre eles: Hely Lopes Meirelles, Paulo Affonso Leme Machado, Vladimir Passos Freitas, Edis Milaré, Ricardo Carneiro, José Rubens Moratto Leite e Annelise Monteiro Steigleder, a partir das quais serão apresentados os resultados e conclusões do trabalho. Palavras-chave: Natureza Jurídica da Responsabilidade Administrativa Ambiental, Princípio da Prevenção, Princípio da Precaução. 1. INTRODUÇÃO A RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA AMBIENTAL Há uma divergência no Direito Ambiental Brasileiro, tanto no âmbito da doutrina quanto na esfera da jurisprudência acerca da natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental do suposto infrator, ou seja, se objetiva, portanto despicienda a verificação do elemento subjetivo, ou subjetiva, portanto, sujeita à constatação da culpabilidade ou ainda ou híbrida. A situação-problema em questão é de suma importância, visto que a consideração ou não do elemento subjetivo do suposto infrator é fundamental para a caracterização da infração e, consequentemente para a aplicação da pena.

2 A importância da configuração do dolo ou culpa do agente justifica-se ainda pelo fato de que não sendo necessária tal verificação, bastará a conduta do agente, o nexo causal e o resultado para que se verifique a sua responsabilização. Noutro vértice, sendo necessária a verificação do elemento subjetivo, será necessária atividade persecutória da administração no sentido de demonstrar que o suposto infrator teve o ânimo de agir de modo contrário à legislação ambiental. 2. REGULAÇÃO JURÍDICA A responsabilidade administrativa ambiental encontra amparo nos artigos 225, 3º, da Constituição Federal e 14, 1º, da Lei n. 6.938/1981, in verbis: CAPÍTULO VI DO MEIO AMBIENTE Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. 3º - As condutas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, às sanções penais e administrativas independentemente da obrigação de reparar o dano causado. DOS INSTRUMENTOS DA POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE Art 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas

3 necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores: 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente. Neste contexto, o Artigo 3º, IV, da Lei Federal 6.938/1981 define poluidor como toda pessoa física ou jurídica responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental. Em que pese a clareza dos conceitos acima citados, a questão da natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental não se encontra explícita nos dispositivos acima citados. Assim sendo, a questão da natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental ainda apresenta certa divergência doutrinária e jurisprudencial. O conceito de infração administrativa ambiental pode ser encontrado no Artigo 70 da Lei Federal 9.605/98 e nos dispositivos do Decreto Federal 6.514/2008, bem como em leis estaduais e municipais, pois, em princípio, os três âmbitos federativos (União, Estados e Municípios) têm competência comum (cf. art. 23 da CF/1988 e art. 17 da Lei Complementar nº 140/2011) para o exercício do poder de polícia voltado a reprimir as infrações administrativas ambientais. Assim sendo, tem-se um grande número de autuações e processos administrativos que tramitam em todo o país, razão que, por si só, justifica o estudo da divergência existente na doutrina e na jurisprudência brasileiras acerca da natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental, ou seja, se é subjetiva, objetiva ou até mesmo híbrida.

4 Neste contexto, há doutrinadores que entendem que a responsabilidade administrativa ambiental seria de natureza subjetiva, ou seja, dependente da caracterização de uma conduta culposa ou dolosa por parte do agente e do nexo de causalidade entre esta e a infração ambiental. De outro lado, há doutrinadores que consideram desnecessária a verificação do elemento subjetivo, no sentido de demonstrar se o suposto infrator teve ou não o ânimo de agir de modo contrário à legislação ambiental, bastando assim a verificação da ação, omissão ou até mesmo a concorrência para ocorrência da infração para que se verifique sua responsabilização, sendo, portanto, objetiva a responsabilidade em tais casos. Importa lembrar que se tem ainda uma terceira corrente que defende a tese da responsabilidade híbrida, segundo a qual a responsabilidade administrativa ambiental seria objetiva, cabendo ao suposto infrator a prova do contrário, com base na chamada culpa presumida. Neste cenário, tem-se a lição de doutrinadores como Hely Lopes Meirelles (1), a partir da qual pode inferir que o exercício do poder de polícia repressivo pela Administração Pública poderia prescindir da verificação do elemento subjetivo da conduta do agente, bastando a constatação de houve a violação de uma regra por parte do administrado. O entendimento acima, segundo ao qual a Administração Pública Poderia impor uma sanção em tais condições, encontra esteio no princípio da supremacia do interesse público, de modo que bastaria à Administração Pública a demonstração da ocorrência de ato ilícito, sem necessidade de demonstração do aspecto subjetivo, para poder impor a sanção administrativa. Neste mesmo sentido, doutrinadores do direito ambiental, alinham-se à ideia da natureza objetiva da responsabilidade administrativa ambiental, de modo que basta a constatação da ação ou omissão contrária ao direito positivo, sem se investigar o aspecto subjetivo do comportamento do administrado. Tal entendimento encontra em Paulo Affonso Leme Machado (2) e Vladimir Passos de Freitas (3) dois dos principais defensores.

5 Noutro vértice, Edis Milaré (4) manifesta-se de modo, um tanto quanto distinto, defendendo que a responsabilidade administrativa, ora subjetiva, ora objetiva, a depender do tipo legal, ou seja, a responsabilidade administrativa ambiental seria subjetiva se o tipo legal previsse expressamente a necessidade de se verificar a culpa ou dolo do administrado ou não. Analisando a responsabilidade administrativa ambiental, Edis Milaré asseverou: (...) os pressupostos para a configuração da responsabilidade administrativa podem ser sintetizados na fórmula conduta ilícita, considerada como qualquer comportamento contrário ao ordenamento jurídico. E complementa, acerca da natureza jurídica da responsabilidade administrativa: A doutrina inclinase pela regra da objetividade para definir a natureza jurídica da responsabilidade administrativa, Hely Lopes Meirelles, por exemplo, sempre sustentou que a multa administrativa é de natureza objetiva e se torna devida independentemente da ocorrência de culpa ou dolo do infrator. Neste contexto, entende-se que o estudo dos Princípios da Prevenção e da Precaução podem colaborar para a solução da divergência acima apontada, na medida em que tais princípios contêm diretrizes fundamentais para a proteção e defesa do meio ambiente. A divergência verificada no Direito Ambiental Brasileiro, tanto no âmbito da doutrina quanto na esfera da jurisprudência acerca da natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental do suposto infrator, ou seja, se objetiva, portanto despicienda a verificação do elemento subjetivo logo, sujeita à constatação da culpabilidade ou ainda ou híbrida, pode ser percebida na Lição de Ricardo Carneiro: Não obstante seu papel marcadamente preventivo, aliado aos inúmeros benefícios procedimentais a ela inerentes, tais como maior celeridade e menor formalismo, o agigantamento desmedido do papel conferido à responsabilidade administrativa

6 ambiental, em comparação com outras formas de resposta jurídica às atividades atentatórias ao equilíbrio ecológico, acabou por induzir concepções dogmáticas imperfeitas acerca dos exatos contornos dados a essa matéria, subvertendo sua correta utilização como ferramenta punitiva, além de obstaculizar uma adequada compreensão sobre seus pressupostos e princípios fundamentais. A partir desta observação de Ricardo Carneiro (5), infere-se a questão a ser aqui discutida: a natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental e sua possível influência pelos Princípios da Prevenção e da Precaução. 3. PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO E PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO Conforme acima expendido, entende-se que o estudo dos Princípios da Prevenção e da Precaução podem colaborar para a compreensão da natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental, visto que tais princípios contêm diretrizes fundamentais para a avaliação de condutas lesivas ao meio ambiente, notadamente nas questões relativas à avaliação do risco ao meio ambiente. A partir da análise da natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental, poder-se-ia verificar se a definição de tal natureza jurídica sofreria a influência do Princípio da Prevenção e da Precaução e, em caso positivo, se esta influência poderia determinar se a natureza jurídica da responsabilidade administrativa ambiental seria objetiva ou subjetiva. A ideia de prevenção e precaução no direito ambiental brasileiro encontra-se insculpida na Constituição Federal, Artigo 225, 1º, V e ainda na Lei Federal 9.605/98, Artigo 54, 3º. Em linhas gerais, segundo o princípio da precaução, nas situações que haja perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não poderá servir de

7 fundamento para se protelar a tomada medidas eficazes, com o fito de impedir a ocorrência de danos ao meio ambiente. O princípio da precaução é importante para o estudo da responsabilidade ambiental, na medida em que tal princípio corrobora a ideia de que as agressões ao meio ambiente, quando perpetradas, via de regra, são, de difícil, incerta e onerosa reparação, de modo que a análise da responsabilidade ambiental a luz de tal princípio pressupõe uma conduta genérica in dubio pro ambiente. Pelo exposto, vê-se que, sob a luz do princípio da precaução, a proteção do meio ambiente deve se sobrepor às atividades de perigo ou risco, ainda que não haja certeza da prova científica sobre o nexo de causalidade e seus efeitos, de modo que a responsabilização ambiental deve considerar não apenas os riscos ambientais iminentes, mas também os perigos futuros, decorrentes das atividades humanas e que podem comprometer uma relação intergeracional e de sustentabilidade ambiental (6) Corroborando o entendimento acima tem-se o princípio da prevenção, comumente aplicado em caso de impactos ambientais já conhecidos e que sobre ao quais já se tenha um histórico de informações (7). Assim sendo, tem-se que o princípio da prevenção pressupõe a ideia de riscos já conhecidos, ou porque já foram previamente identificados, ou porque, em tais casos, os danos já ocorreram antes. Insta registrar que em tais casos o perigo abstrato foi verificado, convertendo-se em perigo concreto, de maneira que a decisão pela assunção do risco já foi tomada, de modo que a responsabilização ambiental se faz necessária de fim de se evitar a ocorrência de danos ou a sua repetição (8). 4. REFERÊNCIAS

8 1 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2016. 2 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2015. 3 FREITAS, Vladimir Passos. Direito Administrativo e meio ambiente. 3ª Ed. Curitiba: Juruá, p. 8081. 4 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. 5ª Ed. Rio: RT, 2015. 5 CARNEIRO, Ricardo. Responsabilidade Administrativa Ambiental: Sua Natureza Subjetiva e os Exatos Contornos do Princípio do Non Bis In Idem. In: WERNECK, Mario. et.al. (Coord.). Direito Ambiental Visto por Nós Advogados. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, 6 LEITE, José Rubens Moratto. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. 7 LEITE, op. cit., p. 50. 8 STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2004.