TITULO: DIÁLOGOS SOBRE GÊNERO E DIREITOS HUMANOS NA ESTRUTURAL EJE:



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Transcrição:

TITULO: DIÁLOGOS SOBRE GÊNERO E DIREITOS HUMANOS NA ESTRUTURAL EJE: Mesa de Trabajo 3. Extensión, docencia e investigación AUTORES: NASCIMENTO, Fernanda Silva; FREITAS, Suzany Araújo de; BRITO, Natássia Caroline de Q. REFERENCIA INSTITUCIONAL: Dra. Ana Tereza Reis - Universidade de Brasília (UnB) CONTACTOS: tapajuara@gmail.com ; fefoxy@hotmail.com. RESUMEN Em meados da década de 60/70, a capital do Brasil, Brasília, deu início ao chamado Lixão da Estrutural onde começou serem depositados os resíduos produzidos pelos moradores do Distrito Federal. Atraídos pela possibilidade de tirar do lixo um sustento, vários catadores foram firmando seus barracos em torno do lixão o que fez desenvolver uma cidade com uma área de cerca de 150 hectares. Área essa considerada imprópria para habitação, os moradores sofrem com a escassez do serviço público e a forte diferença regional entre o centro de Brasília e a região que se localiza a 15 minutos do Planalto Central. O projeto Diálogos sobre Gênero e Direitos Humanos na Estrutural é uma iniciativa do grupo PET-Educação da Universidade de Brasília em parceria com a Organização Não Governamental Viver e com os movimentos sociais Marcha Mundial das Mulheres e Fórum de Monitoramento da Estrutural, ambos constituídos por moradores da referida cidade. O projeto constitui um espaço de diálogo com militantes e moradores da cidade da Estrutural sobre temas relacionados às questões de gênero e aos direitos humanos. Tendo como foco metodológico as práticas de educação popular, a proposta objetiva: fomentar ações solidárias de luta pela melhoria das condições de vida da comunidade; fortalecer a atuação da comunidade para a promoção dos direitos humanos; humanizar as relações pela via do reconhecimento do direito à diversidade. Em termos abrangentes, a proposta também se presta ao propósito de fortalecer e ampliar a atuação do Núcleo de Extensão da Universidade de Brasília na comunidade em questão. O projeto insere-se no conjunto das ações de extensão desenvolvidas pelo grupo PET-EDU na comunidade da Estrutural-DF, orientados pela indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Além do debate epistêmico que se avoluma em torno das questões de gênero, diversidade e direitos humanos, também se constata o desenvolvimento de projetos de extensão e iniciativas militantes com o propósito de expandir as discussões e as ações voltadas a essas temáticas. Conduto, apesar da ampliação das ações e dos debates nesse campo, bem como das conquistas alcançadas, constata-se que uma grande parcela da população continua a ter seus direitos violados. Esse quadro sugere que os conhecimentos relativos aos direitos humanos e às relações de gênero necessitam ser propagados para além dos espaços acadêmicos no sentido de popularizar e fazer valer as políticas que se prestam a resguardar e garantir a dignidade da pessoa humana. 1

No âmbito acadêmico constata-se igualmente que apesar dos avanços em termos de democratização do acesso para negros e classes populares, a universidade não se universalizou para todos. Noutros termos, a universidade pouco avançou na construção de uma cultura política da diversidade e dos direitos humanos e isso se deve, dentre outras coisas, a ausência de uma formação humana pela diversidade, na diversidade e para a diversidade. Nesse sentido, é com o intuito de ampliar e fortalecer as iniciativas no campo das relações de gênero e dos direitos humanos na cidade da Estrutural que o grupo PET- Educação propõe o desenvolvimento do projeto Diálogos sobre Gênero e Direitos Humanos na Estrutural. Importa dizer por fim que para os estudantes e professores da UnB envolvidos no projeto, essa iniciativa constitui também um momento oportuno de vivência de uma educação em direitos humanos, comprometida com a construção de uma cultura participativa que capacite os sujeitos para uma leitura crítica e transformadora do mundo. Logo, trata-se de um espaço privilegiado de ação-reflexão coletiva que incorpora a um só tempo de formação acadêmica e humanização. DESARROLLO A construção de um projeto de extensão em Gênero e Direitos Humanos A popularização do debate sobre Gênero e Direitos Humanos tem se apresentado como uma prerrogativa de sensibilização e conscientização acerca da diversidade, da alteridade, da promoção da igualdade e da garantia de direitos humanos de grupos sociais historicamente vulneráveis. O debate sobre os direitos humanos e a formação para a cidadania, no Brasil, alcançou significativa relevância a partir dos anos 80 e 90 pela via do engajamento e da participação popular. O teor reivindicativo dos Movimentos Sociais Populares fez emergir políticas públicas afirmativas de Estado com vistas à equidade das oportunidades e à melhoria das condições de existência de todo homem e de toda mulher. A exemplo, graças a mobilização dos movimentos feministas temos presenciado alguns avanços no sentido de resguardar os direitos das mulheres em consonância com os ideais das principais convenções das quais o Brasil é signatário. Tais convenções, como o Combate a Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres (CEDAW) e a Convenção de Belém, dão visibilidade à problemática da mulher e forçam o estado brasileiro a assumir um papel efetivo e propositivo no que concerne a criação de políticas de prevenção e de enfrentamento das discriminações contra às mulheres. Dentre as conquistas mais recentes, está à criação da Lei Maria da Penha, em 2006; as cotas voltadas para a 2

ampliação do número de mulheres dentro do espaço político e a inserção da temática de gênero nos Parâmetros Curriculares Nacionais. A partir dessas iniciativas, a temática de gênero começa a se inserir em espaços reprodutores das desigualdades de gênero como, por exemplo, nas escolas, nos partidos políticos e nos espaços domésticos. Além do debate epistêmico que se avoluma em torno das questões de gênero, diversidade e direitos humanos, também se constata o desenvolvimento de projetos de extensão e iniciativas militantes com o propósito de expandir as discussões e as ações voltadas a essas temáticas. Conduto, apesar da ampliação das ações e dos debates nesse campo, bem como das conquistas alcançadas, constata-se que uma grande parcela da população continua a ter seus direitos violados. Esse quadro sugere que os conhecimentos relativos aos direitos humanos às relações de gênero necessitam ser propagados para além dos espaços acadêmicos no sentido de popularizar e fazer valer as políticas que se prestam a resguardar e garantir a dignidade da pessoa humana. No âmbito acadêmico constata-se igualmente que apesar dos avanços em termos de democratização do acesso para negros e classes populares, a universidade não se universalizou para todos. Noutros termos, a universidade pouco avançou na construção de uma cultura política da diversidade e dos direitos humanos e isso se deve, dentre outras coisas, a ausência de uma formação humana pela diversidade, na diversidade e para a diversidade. Pelo dito, nas mais diversas instâncias sociais, ainda há muito a ser feito se quisermos assegurar a dignidade da pessoa humana, sem distinção de raça, nacionalidade, etnia, gênero, classe social, região, cultura, religião, orientação sexual, identidade de gênero, geração e deficiência. Ou seja, ainda há um longo caminho a ser percorrido a fim de minimizar as discrepâncias entre os marcos normativos do Estado Democrático de Direito e as reais condições de vida da população no que diz respeito à qualidade de vida, à saúde, à educação, à moradia, ao lazer, ao meio ambiente saudável, ao saneamento básico, à segurança pública, ao trabalho (PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS, 2006). Nesse sentido, é com o intuito de ampliar e fortalecer as iniciativas no campo das relações de gênero e dos direitos humanos que o grupo Programa de Educação Tutorial-Educação, com membros bolsistas e não bolsistas financiados pelo FNDE, propõe o desenvolvimento do projeto Diálogos sobre Gênero e Direitos Humanos na Estrutural. O caminhar das questões de Gênero e Direitos Humanos 3

Na década de 80 do século XX, o termo gênero foi adotado pelos movimentos feministas como forma de demarcar o espaço de problematização e teorização das desigualdades sociais entre homens e mulheres. A partir de então a categoria gênero passa a ser utilizada nos estudos feministas para afirmar o caráter social dos papéis sexuais em contraposição ao determinismo biológico. Segundo Connel (apud LOURO, 2001), não são as características sexuais (biofísicas) que constituem o masculino e o feminino, mas as representações sociais que são feitas sobre os sujeitos, suas identidades de gênero e suas orientações sexuais em um dado contexto histórico. Nesse sentido, para Scott (1995), gênero é uma categoria relacional que ajuda a compreender as relações de gênero e as representações sociais que delimitam as possibilidades dos corpos e das identidades dos sujeitos. Por outro lado, gênero também pode ser entendido como uma categoria de análise na medida em que busca conhecer a forma como as relações de gênero são estruturadas e reproduzidas ao longo da história, bem como os significados e a funcionalidade das representações sexuais num determinado contexto social. Com efeito, uma vez que as relações de gênero estão presentes nos diversos espaços sociais os estudos de gênero devem tratar tais relações de forma ampla, para além dos espaços privados, levando em consideração sua influencia na organização do estado, da política, da economia, da estética, do trabalho e das relações humanas de um modo geral. Dessa forma, contribuem para desconstruir e desnaturalizar os discursos e as práticas que opõe mulheres e homens, sexualidade e política, corpo e subjetividade. É preciso dizer que o referencial teórico das discussões de gênero sinaliza para uma significativa pluralidade das abordagens, dentre as quais citamos: a teoria do patriarcado, a teoria marxista e a teoria pós-estruturalista. A teoria do patriarcado parte do pressuposto de que as desigualdades de gênero têm como base as particularidades físicas dos sexos. Segundo esse entendimento, é com base nas diferenças ditas naturais e biofísicas que são geradas as relações de dominação masculina que coloca a mulher na condição de objeto sexual, que reduz seu papel social à reprodução humana e relega sua sexualidade à condição de subsidiária da sexualidade masculina. Para Scott (1995), a perspectiva do patriarcado, apesar de trazer contribuições para a análise das relações de gênero, é limitada por se ater a uma crítica da visão essencialista dos corpos deixando de levar em consideração que os corpos adquirem 4

significado no social. Por outro lado, a teoria marxista considera que as relações de gênero são estabelecidas na interação entre patriarcado e capitalismo; logo sugere que são os fatores econômicos que orientam as relações de gênero e a divisão sexual do trabalho. Nessa perspectiva, o matrimônio, a heterossexualidade e a família são elementos chave do processo de manutenção e reprodução do modelo de produção capitalista (HARTMANN apud SCOTT, 1995). Embora avance na crítica, a teoria marxista se atém aos aspectos materialistas e estruturais das relações de poder; isso significa a ausência de uma análise das dimensões subjetivas e micro relacionais que também conformam as relações de gênero. Diferentemente das correntes acima citadas, a teoria pós-estruturalista faz uma análise das relações de gênero a partir da leitura foucaultiana de poder. Essa vertente contribui para desconstruir a dicotomia dos conceitos que predominaram na modernidade como a oposição entre masculino/feminino, homem dominador/mulher dominada, racionalidade/subjetividade, cultura/natureza. De acordo com essa visão, o poder se dá em diversas direções, é fluido, perpassa diversas dimensões e, portanto, não pode ser possuído, pois reside na relação (LOURO 2001). A questão dos direitos humanos comporta igualmente disputas de sentidos e está longe de ser um campo teórico e prático consensual. Ademais, existe um rol de objeções que, em síntese, sugerem que o campo dos direitos humanos constitui uma retórica vazia, um modismo ou mesmo um discurso ideológico de grupos políticos. Apesar de não concordarmos plenamente com essa objeção, é preciso admitir que a universalização indiscriminada de uma retórica em nome da dignidade humana corre o risco de se perder num relativismo de interesses que dificilmente poderia ser unificado. Contudo, existem dois argumentos relevantes quando se trata de construir com grupos sociais vulneráveis alguns caminhos possíveis de luta por condições dignas de existência. O primeiro diz respeito ao paradoxo entre a proliferação das políticas e dos parâmetros legais que buscam preservar minimamente a dignidade humana e o aumento das práticas que violam e desrespeitam os direitos humanos. O segundo refere-se a necessidade de superar os discursos em nome da democracia e da paz sem levar em conta as condições materiais de existência e as guerras travadas no cotidiano em consequência da desigualdade de acesso aos direitos constituídos (trabalho, renda, saúde, educação, direito à diversidade) (TOSI, 2010). 5

Nesse sentido, concordamos com Giuseppe Tosi (2010) quando sugere que, para além dos embates teóricos, o campo dos direitos humanos deve ser encarado como um debate ético sobre a dignidade humana e como um debate político sobre as possibilidades de sua efetivação. Coerente com essa perspectiva os direitos humanos convertem-se em orientações jurídicas e éticas do Estado para implementação de políticas públicas que garantam justiça social e equidade de condições de vida. É nesse contexto que a mobilização da sociedade em torno dessa questão pode levar os direitos fundamentais ao cotidiano das pessoas. A Educação popular como prática pedagógica no projeto A despeito da pluralidade das abordagens de gênero e direitos humanos é preciso considerar que o debate dessas questões implica uma mudança no enfoque pedagógico. Ou seja, discutir a dignidade humana, a equidade social, o direito à diversidade, a emancipação de todo homem e de toda mulher, implica por a prova o projeto hegemônico de civilidade, o ideário de justiça, bem como os modelos de masculinidade e de feminilidade historicamente impostos. Evoca, por isso mesmo, outro jeito de ensinar e aprender com o outro. Nesse sentido, o enfoque metodológico aqui proposto se pauta nos acúmulos da educação popular. A Educação Popular, fundada na proposta da pedagogia emancipadora, é reconhecida por seu caráter político, engajado e problematizador das situações de opressão e por conceber os indivíduos como sujeitos de transformação social. A educação libertadora consiste em resgatar a condição de ser humano dos sujeitos imersos num contexto de opressão a partir de uma prática educativa crítica e problematizadora da realidade e dos mecanismos de dominação. Logo, é através do pensar crítico que os sujeitos libertaram-se a si mesmos e uns aos outros (FREIRE, 1996). Consoante com esse entendimento, a aprendizagem no âmbito do projeto constituirá um processo dialógico mediado pelo contexto social no qual os sujeitos estão inseridos. Aprender deixa de ser uma prática cumulativa de saber para se converter numa leitura crítica do mundo; o sujeito deixa de ser o objeto da prática pedagógica para se converter em sujeito que constrói entendimentos sobre a realidade com vistas a sua 6

transformação; o conhecimento deixa de ser o objetivo da aprendizagem para se converter em ferramenta que ajuda a ler o mundo desde uma perspectiva crítica, profunda, radical. Tendo isso em vista, a Educação Popular se apresenta como instrumento de humanização ao comprometer-se com a emancipação humana na medida em que os sujeitos, coletivamente engajados e historicamente atuantes, superam a condição de ser em si e assumem à condição de ser para si. Assim, o diálogo e a solidariedade ajudam a subverter as hierarquias, a reconhecer as narrativas e as identidades e a valorizar os saberes constituídos na experiência vivida. Do mesmo modo, a valorização do espaço de fala e o reconhecimento dos saberes coletivos e individuais contribui para que o sujeito se empodere de sua realidade e de sua história. Porquanto, não é a educação em si que transforma o mundo, mas os seres humanos enquanto sujeitos históricos e emancipados que na sua ação no mundo o alteram (FREIRE, 1996). Nesse contexto, os movimentos sociais que emergem na e da realidade da Estrutural terão papel preponderante na mobilização da comunidade, na reflexão sobre a realidade e, consequentemente, no debate sobre as relações de gênero e os direitos humanos no âmbito do projeto. Os movimentos sociais como ações coletivas, aglutinam sujeitos sociais em torno da luta por objetivos comuns: conformam identidades coletivas unificando as múltiplas identidades individuais em um nós. Ou seja, constroem identidades coletivas que adquirem sentido pelo compartilhamento de interesses comuns. As ações coletivas dos movimentos provocam processos de formação humana e política e propiciam a vivência de práticas educativas. Assim, é no agir coletivo que buscaremos construir um processo de aprendizagem coletiva manifesta pelo e no caráter político-cultural da educação popular. A experiência, o dinamismo e as novas projeções A escolha da cidade para intervenção se deu através do contato prévio com o histórico de condições precárias nas diversas instâncias dentro da cidade. Em meados da década de 60/70, a capital do Brasil, Brasília, deu início ao chamado Lixão da Estrutural onde começou serem depositados os resíduos produzidos pelos moradores do Distrito Federal. Atraídos pela possibilidade de tirar do lixo um sustento, vários catadores foram firmando seus barracos em torno do lixão o que fez desenvolver uma cidade com uma área de cerca de 150 hectares. Área essa considerada imprópria para 7

habitação, os moradores sofrem com a escassez do serviço público e a forte diferença regional entre o centro de Brasília e a região que se localiza a 15 minutos do Planalto Central. A precariedade nos diferentes espaços sociais revela a lacuna e distanciamento entre o normativo e o real. O início das atividades na Estrutural se deu por meio de reuniões e diálogos com membros da comunidade na comunidade, que orientaram a construção do projeto original. O movimento dinâmico permitiu levantarmos as demandas da comunidade, até mesmo quando não podíamos realizar os encontros por questões como: não ter um lugar, o acesso, e a violência que não nos permitiam adentrar a cidade em determinados momentos. Após a participação em alguns espaços da comunidade como o Fórum de Monitoramento Social da Estrutural, a escola pública, o Sarau Cultural que realizamos para as crianças e adolescentes da cidade, rádio comunitária, entre outros, levantamos algumas demandas que nos fizeram organizar o início do projeto com cursos de extensão baseados nos princípios da educação popular e as temáticas de Direitos Humanos, Movimentos Sociais, desigualdades e diferenças, Direito das mulheres e violência de gênero. Em paralelo, daríamos continuidade a uma parceria com o Centro Educacional Fundamental 1 da Estrutural com a realização de oficinas nas áreas de: artes visuais, teatro, musicalidade, contação de histórias e danças populares. Além das oficinas, um projeto de Educação de Jovens, Adultos e Idosos no exercício da alfabetização. O fórum de monitoramento da cidade Estrutural visa discutir questões políticas e de Direitos Humanos relativas a cidade como habitação, segurança, saneamento entre outras questões. A Associação Viver que faz trabalhos sócioeducativos com as crianças e adolescentes da cidade. A marcha mundial das mulheres, a qual discute sobre as necessidades e direitos das mulheres, inspirou as demandas das questões de gênero, dando ao projeto o título Diálogos sobre Gênero e Direitos Humanos na Cidade Estrutural. O resultado do Sarau Cultural nos fez investir na prática contínua de atividades globais e lúdicas nas escolas da cidade. A expectativa prematura nos fez esperar por uma média de 74 crianças pelo espaço de divulgação, mas contabilizou-se cerca de 200 crianças em uma tarde de sábado no espaço escolar, fazendo atividades que para muitos são esporádicas, distante do cotidiano na escola e na comunidade. A extensão nos permite o contato com a diversidade da prática. Crianças chegavam e eram direcionadas de acordo com seus interesses as oficinas propostas, permitindo-nos o exercício das múltiplas linguagens tão importante para a formação do ser único e diverso, ser de sonhos, direitos, 8

etc. As oficinas foram repensadas e no exercício de rever a prática anterior a oficina de musicalidade foi unida a oficina de dança, dando espaço para a criação de uma oficina na área de Filosofia e Educação, Filosofia com crianças. Esse espaço de ação-reflexão-ação, trouxe a concretude de mais um espaço para o projeto: o grupo de costura de mulheres da cidade. Neste espaço, mulheres estão trabalhando questões de Gênero, Direitos Humanos e EJA com reflexões do grupo PET Edu que direcionam as discussões e atividades a partir do método Paulo Freire, de educação popular. Considerações Finais Através da experiência na indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, foi possível compreender e vivenciar a importância do trabalho coletivo, do diálogo através das diversas práticas pedagógicas, compreendendo que é possível ser agente dos Direitos Humanos e a Educação em Direitos Humanos é um direito humano. Diante do contexto histórico da problemática relacionada às relações de gênero e Direitos Humanos citadas no trabalho, o projeto Diálogos sobre Gênero e Direitos Humanos na Estrutural, visa trazer a discussão sobre a temática de acordo com a realidade da comunidade, no sentido de popularizar as políticas que se prestam a garantir a dignidade da pessoa humana, de forma que seja construído o pensamento crítico do seu contexto e a visão de sujeitos que possuem direitos que podem ser alcançados por meio da luta, a favor de políticas públicas que contemplem as necessidades e interesses da comunidade. Importa dizer por fim que para os estudantes e professores da UnB envolvidos no projeto, essa iniciativa constitui também um momento oportuno de vivência de uma educação em direitos humanos, comprometida com a construção de uma cultura participativa que capacite os sujeitos para uma leitura crítica e transformadora do mundo. Logo, trata-se de um espaço privilegiado de ação-reflexão coletiva que incorpora a um só tempo formação acadêmica e humanização. Referências Bibliográficas FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. 9

GOHN, Maria da Glória. Movimentos Sociais e Educação. São Paulo: Cortez, 1994. SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise história. Porto Alegre: Revista Educação e Realidade, 1995. LOURO, Guacira. O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.. Corpo, gênero e sexualidade: um debate contemporâneo na educação. Petrópolis: Vozes, 2005. PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS. Brasília: Ministério da Educação, 2006. SEMINÁRIO NACIONAL: FEMINISMO E PRÁTICAS EDUCATIVAS NO MOVIMENTO DE MULHERES. Disponível em: <http://www.soscorpo.org.br/adm/userfiles/experiencias.pdf> Acesso em: 19 de outubro de 2010. TOSI, Guiseppe. O que são esses tais direitos humanos? In Direitos Humanos na Educação Superior: subsídios para a educação em direitos humanos na filosofia. João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2010. 10