O EDUCADOR DO CAMPO NA ÁREA DE LINGUAGENS E CÓDIGOS

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Transcrição:

O EDUCADOR DO CAMPO NA ÁREA DE LINGUAGENS E CÓDIGOS Maurício Teixeira Mendes 1 1 Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri Resumo: O presente trabalho tem por objeto descrever a trajetória escolar de um educador do campo como também apresentar de forma resumida o que se espera desse educador com habilitação em linguagens e códigos. Brevemente será apresentado uma atividade gramatical que é fruto da observação durante o estágio supervisionado. Em seguida a análise da atividade tendo como fundamentação teórica conceitos que fazem parte da formação desse educador. Palavras-chave: Educador do campo, gramática, análise linguística. 1. INTRODUÇÃO A educação no meio rural durante muitas décadas esteve vinculada a um modelo importado de educação, denominado Educação Urbana. A partir da luta de movimentos sociais ligados ao campo, principalmente o Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST), partindo do princípio de que o campo não é apenas um espaço geográfico. Sendo campo também espaço de lutas pela terra, pela sobrevivência, onde seus sujeitos possuem cultura própria e modos de vida específicos. Surgem articulações que clamaram por uma educação de qualidade no território campesino. A I Conferência Nacional Por uma Educação Básica do Campo 1, aconteceu em Luziânia, GO, entre os dias 27 e 31 de junho de 1998, e teve apoio de Pastorais ligadas a Igreja Católica, Fundo das Nações Unidas para a Infância e a Universidade de Brasília. Nessa conferência surge a Articulação Nacional Por uma Educação Básica do Campo. A partir de então percebe-se que cada vez mais o campo vem conquistando novos espaços, dentre esses, o acesso à educação como um direito, tanto na educação básica com um ensino de qualidade no campo, quanto na educação superior onde surgem cursos de licenciatura específica para o campo. Na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), o curso de Licenciatura em Educação do Campo (LEC), surge dessas políticas públicas em prol 1 Cf. <http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/educacaodocampo/edbasicapopular.pdf> 1

do sujeito do campo. Sendo incipiente a Educação do Campo como também a formação por área de conhecimento percebemos a necessidade de produzirmos materiais falando desse local. Diante disso, objetiva-se com esse trabalho apresentar o percurso formativo de um educador do campo com habilitação em linguagens e códigos e, de forma resumida, uma análise linguística do ensino de gramática em uma escola do campo 2. PERCURSO EDUCATIVO DE UM EDUCADOR DO CAMPO Minha trajetória escolar, na educação básica, foi marcada pelo ensino tradicional com a visão de etnocentrismo invertido 2 onde acreditava que para ser alguém na vida teria que deixar o campo e ir para a cidade. Aconteceram várias coisas que me fazia enxergar o espaço escolar como uma prisão. Dessa forma, não me imaginava sendo um educador. Tanto é que depois que concluí o Ensino Médio fiquei 10 anos sem estudar. Minha primeira motivação a ingressar em um curso superior foi ao tomar conhecimento do curso da LEC que tinha em sua pedagogia a valoração do sujeito campesino e seu contexto. A segunda motivação foi a modalidade do curso que se dá em regime de alternância que é dividido em Tempo Universidade e Tempo Comunidade 3. Dessa forma conseguiria estudar sem ser desvinculado da comunidade. A terceira motivação foi por ser um curso gratuito devido não ter condições de pagar por um curso superior. Quando se fala em educação do campo, como aponta Caldart (2004, p.18), trata de construir uma educação do povo do campo e não apenas com ele, nem muito menos para ele. Assim, o ideal é que seja uma educação que não se separe a relação escola e comunidade, mas que valorize os diferentes saberes existentes na comunidade. 2 Cf. < https://dricamillo.wordpress.com/tag/etnocentrismo-invertido> 3 Na UFVJM tem dois Tempos Universidades no ano letivo, sendo: primeiro semestre com aproximadamente cinco semanas entre Janeiro e Fevereiro e o segundo semestre com outras cinco semanas que inicia na última semana de Junho até a primeira semana de agosto. O Tempo Comunidade também é dividido por semestres sendo: primeiro semestre entre março e maio, e o segundo semestre entre agosto e novembro. Os meses de junho e dezembro são férias. 2

Nesse sentido, acredito que meu foi foco durante a graduação foi mais voltado para observar os espaços formativos fora dos muros da escola. Tendo um pensamento na: (...) concepção interacionista, funcional e discursiva da língua, da qual deriva o princípio geral de que a língua só se atualiza a serviço da comunicação intersubjetiva, em situações de atuação social e através de práticas discursivas; materializadas em textos orais e escritos. (ANTUNES, 2003, p.43) Isso implica levar em consideração suas culturas e tradições, a fim de para o espaço educativo algo que realmente faça sentido na vida de tais sujeitos. O que se torna uma responsabilidade do educador do campo que deve estar atento aos espaços que permeiam a escola e comunidade podendo selecionar conteúdos de ensino de língua portuguesa ou inglesa pensado na aplicabilidade no cotidiano dos estudantes. Durante a graduação, discutimos sociolinguística, preconceito linguístico, linguística aplicada, a linguagem como espaço de disputa, quem comunica mais ocupa mais espaço, o papel de um professor de linguagens e códigos em uma comunidade campesina, dentre outros. Dessa forma, acredito ser uma formação profissional e política para atuar, nesses contextos de desigualdade, como formador de sujeitos críticos que possam fazer a diferença em suas comunidades. Há várias relações da Linguística Aplicada (LA) com a Educação do campo, Signorini (2004, p.101) afirma que o objeto da LA é voltado para o acontecimento, para o dinâmico, uma vez que se trata de (...) um estudo de práticas específicas de uso da linguagem em contextos específicos (...). A partir desse olhar, entende-se que a LA pode favorecer trabalhos sobre à área da linguagem em contextos de educação campesina. Assim sendo apresentarei uma das atividades gramaticais que observei durante meu período de estágio e farei uma breve análise com a lente teórica da LA. 3. AULA DE GRAMÁTICA NA EJA EM UMA ESCOLA DO CAMPO As atividades a seguir são observações durante o estágio supervisionado que acorreram durante o primeiro semestre de 2018 em uma turma de Educação de Jovens e Adultos (EJA) que estavam cursando o 2º ano do Ensino Médio. As aulas 3

tinham como conteúdo a colocação pronominal: próclise, ênclise e mesóclise. Na primeira aula, a professora regente da turma selecionou alguns materiais que explicava, de forma resumida, que a colocação pronominal 4 seria a posição que os pronomes pessoais oblíquos átonos ocupam na frase em relação ao verbo que se referem. E uma série de exemplos de suas aplicações: 1) próclise: pronome antes do verbo, exemplo, nada me faz querer sair dessa cama. 2) ênclise: pronome depois do verbo, exemplo, amem-se uns aos outros. 3) mesóclise: pronome no meio do verbo, exemplo, a prova realizar-se-á nesse domingo. Nas aulas seguintes a professora deu ênfase ao conteúdo com exercícios de fixação explorando vários aspectos linguísticos durante a aplicação de uma atividade a partir do texto literário Papos de Luiz Fernando Veríssimo. Nesse texto há um diálogo entre duas pessoas onde a crítica a colocações pronominais é o elemento central abordado pelo autor. O que seria o mais importante de uma língua, segundo (BAKHTIN, 1997), a interação social, a construção de sentido, entender e ser entendido. No diálogo do texto Papos o assunto principal é esquecido devido a correções no modo como se fala. Abaixo um recorte da atividade aplicada: Figura 1 Imagem da atividade aplicada na EJA. Arquivo pessoal do autor. Com frases do texto Papos como: Pronome no lugar certo é elitismo!, a professora fez uma série de críticas a grupos que se apoderam do conhecimento, a gramática normativa que é excludente e até citou o preconceito linguístico de Bagno. 4 Esse conceito foi apresentado aos estudantes da EJA pela professora, eu os retomei de forma resumida. 4

Ainda daria para fazer uma série de análises do texto como a questão da concepção interacionista e funcional de Antunes (2003). Principalmente quando no diálogo, quem está sendo corrigido diz: - Falo como todo mundo fala. O importante é me entenderem. Bezerra (2003), no texto Análise Linguística como Eixo do Ensino de Língua Portuguesa traz algumas reflexões sobre análises linguísticas partindo dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) de Língua Portuguesa. Segundo Bezerra, o que se cobra no PCN nem sempre é colocado em prática. A autora apresenta distinções entre atividades linguísticas, metalinguísticas e epilinguísticas: -- ações linguísticas que, praticadas nos processos interacionais permite a progressão do tema em pauta (...) paráfrases (...) repetições (...) atividades epilinguísticas também presentes nos processos interacionais, resultam de uma reflexão que toma os próprios recursos expressivos como objeto, suspendendo o tratamento do tema em andamento pelos interlocutores para refletir sobre os recursos expressivos que estão usando (...) atividades metalinguística em que os interlocutores tomam a linguagem como objeto, não mais como reflexão relacionada ao processo interativo entre si, mas à construção de uma metalinguagem sistemática (BEZERRA, 2003, p.35 e 36) A partir das definições de análises linguísticas de Bezerra, as atividades aqui apresentadas e analisadas possuem caráter metalinguístico, pois a professora parte de exemplos de textos que não foram produzidos pelos estudantes e atividades que talvez não façam parte do contexto dos mesmos. As atividades realizadas foram muito proveitosas, além da professora ter explorado questões sociais que envolvem a língua, que segundo Bezerra (2003) seria uma atividade epilinguística, mas outras atividades poderiam, ao meu ver, explorar ainda mais o potencial dos estudantes. Um exemplo seria a transformação das atividades em uma sequência didática. Onde imaginando que estudantes já teriam feito várias produções de texto. A professora poderia ter utilizado os exemplos de aplicação pronominal com exemplos de textos dos próprios estudantes. Outra possibilidade seria explorar questões linguísticas como gêneros literários e espaços formais ou informais de uso da língua dentre outros. 4. CONCLUSÃO 5

Possenti (1996), no livro Por que (não) ensinar gramática na escola, afirma que a língua portuguesa não é o que está nas gramáticas normativas. As variedades culturais não-padrão são línguas de pleno direito. E que as variedades não-padrão podem ser utilizadas positivamente no ensino e serem tratadas com respeito. E defende que a escola deve ensinar a língua sem que o foco seja somente na gramática. Na educação é importante que os estudantes dominem a gramática. Mas existem caminhos que podem facilitar esse processo de ensino aprendizagem. Um deles é o ensino contextualizado, como por exemplo, as atividades que foram apresentadas durante esse trabalho. E isso é uma das questões que perpassam um educador do campo na área de linguagens e códigos. Na verdade, não existe uma receita pronta, cada educador desenvolverá sua própria metodologia de trabalho, ou de estudo. Como no texto Papos, o campo é um dos espaços que sofre com o preconceito linguístico devido à variedade cultural dos povos tradicionais ser estigmatizada tal como seus sujeitos. E o ensino de uma gramática reflexiva pode contribuir para combater esse preconceito. REFERÊNCIAS ANTUNES, Irandé. Aula de português: encontro & interação. São Paulo, SP: Parábola, 2003. BAKHTIN, Michael. Marxismo e filosofia da linguagem. 10.ed. São Paulo: Huditec, 1997. BEZERRA, M. A; REINALDO, M. A. Análise linguística: afinal, a que se refere? São Paulo: Cortez, 2013. p. 33-52. CALDART, Roseli Salete. Elementos para a construção do Projeto Político Pedagógico da Educação do Campo. In: MOLINA, Monica Castagna; JESUS, Sonia Meire Santos Azevedo (Org.). Contribuições para a construção de um Projeto de Educação do Campo. Brasília, DF, 2004. p. 13-52. POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas, ALB. Mercado de Letras, 1996, 96 p., Coleção Leituras do Brasil. SIGNORINI, Inês. Do residual ao múltiplo e ao complexo: o objeto da pesquisa em Linguística aplicada. In: Inês Signorini e Marilda Cavalcanti (orgs.). Linguística Aplicada e Transdisciplinaridade. Campinas: Mercado de Letras. 2004. 6