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Transcrição:

ÓRGÃO ESPECIAL Direta de Inconstitucionalidade nº 51/2009 Representante: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO INFANTIL-ASBREI Representada: ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Legislação: Lei nº 5488/09 do Estado do Rio de Janeiro art. 1º Relator: Des. SÉRGIO VERANI DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ESTADUAL Nº 5488/2009, ART. 1º: DISPÕE SOBRE O DIREITO À MATRÍCU- LA NO 1º ANO DO ENSINO FUNDAMEN- TAL DE NOVE ANOS, DE CRIANÇA QUE COMPLETAR SEIS ANOS ATÉ 31 DE DE- ZEMBRO DO ANO EM CURSO. PRELIMI- NARES REJEITADAS. INOCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 306; 307, I E II; 308, VI, DA CONSTITUIÇÃO ESTA- DUAL. Improcedem as preliminares, pois as entidades de classe de âmbito nacional existem para atender às necessidades e interesses de seus associados em todo o território nacional. A Lei Estadual nº 5488/2009, que estabelece, no art. 1º, o direito à matrícula no 1º ano do ensino fundamental de nove anos, de criança que completar seis anos até 31 de dezembro do ano em curso, é constitucional. Inocorrência de violação aos artigos 306 e 307, I e II, da Constituição Estadual, de conteúdo exclusivamente principiológico, em consonância com os ditames contidos nos artigos 205 e 206, da Constituição da República. O art. 308, VI, da Constituição Estadual, tem simetria ao art. 208, IV, da Constituição da

República, alterado pela Emenda Constitucional 53, de 19.12.2006, que garante a educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 anos de idade. Não há proibição para a criança de 5 anos ingressar no 1º ano do Ensino Fundamental. A matrícula estará subordinada ao desenvolvimento e a capacidade de cada um (art. 208, V, da CRFB). O que é inconstitucional é a ausência da alfabetização. Representação improcedente. ACORDAM os Desembargadores do Órgão Especial, por unanimidade, em rejeitar as preliminares e julgar improcedente o pedido, na forma do voto do Relator. Rio de Janeiro, 06 de agosto de 2012 SÉRGIO VERANI Des. Relator ACÓRDÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2009.007.00051 pág. 2

DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 51/2009 RELATÓRIO E VOTO A Associação Brasileira de Educação Infantil ASBREI propõe Representação por Inconstitucionalidade do art. 1º, da Lei 5488, de 22.06.2009, que dispõe: Terá direito à matrícula no 1º ano do ensino fundamental de nove anos, a criança que completar seis anos até o dia 31 de dezembro do ano em curso. Alega-se que o referido dispositivo violou os artigos 306, 307 e 308, inciso VI, da Constituição deste Estado, pois permite que se antecipe a alfabetização e que as matrículas no ensino fundamental sejam permitidas mesmo às crianças que não concluíram a importante etapa de educação infantil, que consiste em creche e pré-escola para idade de zero a 6 anos, ainda que estejam dentro da idade limite, vale dizer, com 5 (cinco) anos (fls. 03). Para tanto, traz à colação outros diplomas legais que tratam da matéria, como a Deliberação nº 308, de 23.10.2007, do Conselho Estadual de Educação, Deliberação n 15, de 29/05/2007, do Conselho Municipal de Educação da Cidade do Rio de Janeiro e Lei nº 9394/96 Diretrizes e Bases da Educação Nacional. O pleito de liminar, no sentido de que fosse permitida a idade limite de 6 anos completos para a matrícula no ensino fundamental ou a matrícula no 1º ano do ensino fundamental, da criança com 5 anos de idade, a completar 6 anos até o final do ano em curso e que tivesse concluído a educação infantil, foi indeferido, por maioria (fls. 116/119 e 120). Manifesta-se a Procuradora Geral do Estado, a fls. 127/130, pela intimação do Governador deste Estado, na qualidade de litisconsorte passivo necessário, para prestar as informações pertinentes. Diz, ainda, que a hipótese é de inadmissibilidade da representação de inconstitucionalidade por ausência de qual- ACÓRDÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2009.007.00051 pág. 3

quer ofensa clara e direta ao texto constitucional estadual. No mérito, afirma que inexiste inconstitucionalidade na lei atacada, uma vez que, apenas, complementa o sistema já disposto na Constituição Estadual, que permite ao legislador optar pelo ingresso no ensino fundamental de todas as crianças que completarem 06 (seis) anos de idade até o dia 31 de dezembro do ano em curso. A Assembléia Legislativa, a fls. 132/145, argúi preliminar de ilegitimidade ad causam, ao argumento de que a Representante não se enquadra no requisito constitucional de entidade de classe de âmbito estadual (art. 162, da Constituição Estadual), pois se trata de associação civil de âmbito nacional. Diz, ainda, que a necessidade de se invocar legislações infraconstitucionais torna inadmissível o pretendido controle abstrato de constitucionalidade, uma vez que o assunto demanda uma análise criteriosa e não pode ser apreciado confrontando-se apenas e exclusivamente a Constituição Estadual. No mérito, diz que os artigos 306 e 307 são de conteúdo exclusivamente principiológico e que se encontram na Carta Magna (arts. 205 e 206), os quais não se encontram absolutamente feridos pela norma estadual atacada (fls. 71), e que o inciso VI do art. 308 estabelece a obrigatoriedade ao Estado e Municípios de acolherem gratuitamente as crianças em creches e pré-escolas, restando evidente que tal dispositivo se dirige especificamente à educação pública e não à rede privada de ensino, cujos interesses tutela a Requerente (fls. 137). Afirma que o raciocínio exposto pela Representante, cujos interesses econômicos seriam prejudicados, só reforça o fato de que a norma impugnada apenas consolida, em nível estadual, as determinações constantes da legislação nacional acerca da nova sistemática adotada para o ensino fundamental, dentre elas, a de que deve ser iniciado aos 6 anos de idade. Transcreve dispositivos de outras normas favoráveis à sua tese e diz que o assunto enseja amplo debate a respeito da capacidade e maturidade para o ingresso de crianças no ensino fundamental, o que não é compatível com o rito excepcional do controle abstrato ACÓRDÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2009.007.00051 pág. 4

de constitucionalidade, no qual o Poder Judiciário declara que determinada norma viola dispositivo constitucional pelo simples e direto confronto de textos (fls. 144). Instado a manifestar-se, porque sancionou a lei atacada, o Sr. Governador deste Estado, a fls. 161/170, suscita preliminar de ilegitimidade ativa e afirma que as alegações feitas pela Representante demonstram que a discussão diz respeito à compatibilidade da Lei nº 5488/2009 com normas infraconstitucionais, como a Lei Federal nº 9394/1996, incabível na ação direta de inconstitucionalidade. Aduz que o art. 308, inciso VI, da Constitucional Estadual, utilizado como fundamento das normas infraconstitucionais, além de ser direcionado aos responsáveis pelo ensino público, não mais reproduz o conteúdo normativo da redação original do art. 208, IV, da Constituição da República, uma vez que, após o advento da Emenda Constitucional nº 53/2006, passou a ter outra redação. Afinal, diz que a discussão sobre a maturidade e a capacidade das crianças ingressarem no ensino fundamental enseja dilação probatória incompatível com o rito de controle abstrato da constitucionalidade. A Procuradoria Geral do Estado, a fls. 172, reporta-se aos termos da petição de fls. 127/130 e às informações supra mencionadas, de fls. 161/170. Parecer da Procuradoria Geral de Justiça, a fls. 174/189, no sentido da procedência do pedido inicial, para declarar inconstitucional a lei estadual n. 5.488/2009, por desconformidade com o art. 308, IV, Constitucional estadual, com a dicção decorrente da nova redação do art. 208, IV, Constituição Federal, instituída pela emenda n. 53/2006. Alternativamente, pugna pela improcedência do pedido, para declarar constitucional a lei n. 5.488/2009, desde que, numa interpretação conforme a Constituição, a aplicação da lei seja precedida de comprovação de conclusão do ensino infantil pela criança que completar seis anos até o dia 31 de dezembro do ano letivo em curso. É o relatório. ACÓRDÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2009.007.00051 pág. 5

Rejeitam-se as preliminares de ilegitimidade ad causam, suscitadas pela Assembléia Legislativa e pelo Governador do Estado. Como bem sustenta a Procuradoria de Justiça: [...] a entidade de classe de âmbito nacional tem representação também no âmbito regional, já que visa a atender os reclamos e interesses dos associados em todo o território nacional. Não seria razoável que se limitasse a legitimidade apenas às entidades de classe que tivesse sua representação restrita aos limites territoriais do Estado, quando as entidades de classe nacionais podem representar seus associados em qualquer parte do território nacional. Demais, os interesses da classe de que é representante a autora guarda pertinência temática com a matéria tratada na lei sob ataque. (fls. 181/182). O art. 1º da Lei nº 5488/2009 autoriza a matrícula no ensino fundamental de crianças que completarem seis anos até 31 de dezembro do ano em curso: Art. 1º Terá direito à matrícula no 1º ano do ensino fundamental de nove anos, a criança que completar seis anos até o dia 31 de dezembro do ano em curso. Com efeito, não se verifica nenhuma violação aos artigos 306 e 307 da Constituição Estadual, de conteúdo exclusivamente principiológico, em consonância com os ditames contidos nos artigos 205 e 206, da Carta Magna: Art. 306 A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visa ao pleno desenvolvimento da pessoa e a formação do cidadão; o aprimoramento da democracia e dos direitos humanos; a eliminação de todas as formas de racismo e de discriminação; o respeito dos valores e do primado do trabalho; à afirmação do pluralismo cultural; a convivência solidária a serviço de uma sociedade justa, fraterna, livre e soberana. Art. 307 O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: ACÓRDÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2009.007.00051 pág. 6

I igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber, vedada qualquer discriminação; O art. 308, VI, da Constituição Estadual, está em conformidade com o texto original do inciso IV do art. 208 da Constituição da República: Art. 308 O dever do Estado e dos Municípios com a educação será efetivado mediante garantia de: (...) VI atendimento obrigatório e gratuito em creches e préescolas às crianças de zero a seis anos de idade, mediante atendimento de suas necessidades biopsicossociais, adequando aos seus diferentes níveis de desenvolvimento, com preferência à população de baixa renda; Art. 208 O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: (...) IV educação em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade. Contudo, a redação deste inciso foi alterada pela Emenda Constitucional nº 53, de 19.12.2006: Art. 208 O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: (...) IV educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; A Representante faz considerações sobre a importância da educação infantil, destinadas às crianças de zero a seis anos e argumenta que a idade cronológica 6 (seis) anos para o ingresso no Ensino Fundamental não foi fixada ao acaso, ao contrário, levou-se em consideração o tempo exato e necessário para que a criança, através da Educação Infantil, desenvolva integralmente os aspectos físico, psicológico, emocional, intelectual e social, a fim de que tenha igual- ACÓRDÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2009.007.00051 pág. 7

dade de condições com as demais no processo de conhecimento e aprendizagem. (fls. 12). Ora, ao permitir o ingresso no ensino fundamental de crianças que irão completar seis anos, ao longo do ano, não fez a lei impugnada, qualquer tipo de referência restritiva à prévia etapa da educação infantil, que, aliás, integra o sistema municipal de ensino (art. 211, 2º, da CRFB; art. 18, da Lei 9394/96). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, inclusive, não fixa limite mínimo de idade para ingresso no ensino fundamental, apenas dispõe que é dever dos pais matricular os filhos a partir dos seis anos de idade (art. 6º). Ao estabelecer-se que é, igualmente, dever do Estado garantir o atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade (art. 308, inciso VI, da Constituição Estadual) ou até cinco anos (art. 208, inciso IV, da CRFB, com redação atualizada), não se está vedando o acesso ao ensino fundamental de crianças menores de seis anos, mas, apenas, assegurando-lhes o direito de atendimento em creche e pré-escola. A inconstitucionalidade material se impõe sempre que houver um choque, uma incoerência entre o que determina a Constituição e o conteúdo do que determina a lei. Não trata a hipótese, como sustenta a Representante, de regra de comando do tipo tudo ou nada. Os artigos constitucionais invocados não estabelecem algo a ser cumprido que tenha sido desrespeitado pela lei impugnada. Desta forma, não se vislumbra qualquer violação aos alegados dispositivos da Carta Estadual. A questão é controvertida e muito já se discutiu, no campo da educação, sobre maturidade e capacidade das crianças para ingresso no ensino fundamental. A Lei nº 11.274/2006, ao alterar alguns dispositivos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de nº 9394/96, entre eles, o art. 32, estabeleceu dura- ACÓRDÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2009.007.00051 pág. 8

ção de 09 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 06 (seis) anos de idade. Em seu art. 5º, estabeleceu que os Municípios, Estados e o Distrito Federal, teriam prazo até 2010 para implementarem a obrigatoriedade para o ensino fundamental. O governo deste Estado, assim como o dos demais, definiu o próprio limite, interpretando a lei a seu modo. Da mesma forma, a Resolução nº 03, de 03.08.2005, do Conselho Nacional de Educação, que, posteriormente, objetivando organizar o ingresso dos alunos no ensino fundamental, editou as Resoluções n os 01 e 06, de 14/01/2010 e 20.10.2010, respectivamente, que estipulam a idade de 06 (seis) anos completos até o dia 31 de março do ano que ocorrer a matrícula. As crianças que completarem esta idade após a data definida, deverão ser matriculadas na pré-escola. A definição de uma data limite foi alvo de diversas ações individuais e coletivas, que garantiram, de forma pontual, a matrícula no ensino fundamental de crianças com menos de seis anos de idade, desde que comprovada capacidade intelectual para tanto. Em 12.04.2012, a Justiça Federal de Pernambuco, julgando procedente Ação Civil Pública proposta pelo Procurador da República Anastácio Nóbrega Tahim Júnior, determinou a suspensão das referidas Resoluções e de outras normas que a ela se seguirem, de igual conteúdo, permitindo a regular matricula no ensino fundamental, em todas as instituições de ensino do país, das crianças menores de 06 (seis) anos de idade em 31 de março do ano letivo a ser cursado. Traze-se à colação trecho da decisão proferida pelo Juiz Cláudio Kitner: No caso dos autos, as Resoluções Nºs 01, de 14/01/2010, e 06, de 20/10/2010, não possuem amparo jurídico, porque violam, a um só tempo, princípios basilares fundados na Constituição da República, mas especificamente a isonomia e a razoabilidade, bem como a legalidade, vez que, seja o dispositivo constitucional (art. 208, I, da CF, em sua redação originária), seja a Lei de Diretrizes e Bases da Edu- ACÓRDÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2009.007.00051 pág. 9

E conclui: cação (art. 32 a Lei nº 9.394/96-LDB), os quais fundamentaram, em tese, a elaboração dos supracitados instrumentos normativos, estabelecem, na verdade, prestações mínimas que podem ser exigidas do Poder Público, dado o seu caráter de direito subjetivo (art. 208, parágrafo primeiro, da Constituição Federal). As resoluções em destaque põem por terra a isonomia, deixando que a capacidade de aprendizagem da criança individualmente considerada seja fixada de forma genérica e exclusivamente com base em critério cronológico que na tem qualquer cientificidade comprovada. Afinal, permitir que seja matriculado um menor de seis anos de idade completados até 31 de março do determinado ano letivo que se inicia e deixar de fazê-lo em relação a outro educando que completaria a referida idade um dia ou um mês depois, por exemplo, redunda em patente afronta ao princípio da isonomia, sustentáculo da sociedade democrática informada pela Constituição da República, além de macular a dignidade da pessoa humana, ao obrigar crianças que não se incluam na faixa etária definida no critério das destacadas Resoluções a repetirem de ano, obstando o acesso ao ensino fundamental, nível de ensino mais elevado, ainda que seja capacitado para o novo aprendizado. Constitui, portanto, violação expressa ao preconizado no art. 208, V, da Constituição Federal, o qual não explicita qualquer critério restritivo em relação à idade. De mais a mais, o Estado deve munir-se de meios para avaliar as crianças, por meio de comissões interdisciplinares, que levam em conta elementos psicopedagógicos, interações sociais, fatores sócio-ambientais, entre outros, a fim de verificar se elas reúnem condições de avançar de fase de aprendizagem. O que não se admite é se estabelecer uma idade para iniciação do processo de aprendizagem e proibir as escolas que realizem matrículas no novo ciclo de crianças que já tenham maturidade, devidamente aferida por hábeis instrumentos, tão-somente em obediência a normativos que sequer encontram fundamento na LDB. Assim, com estas considerações, resta demonstrada, à saciedade, a fumaça do bom direito. ACÓRDÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2009.007.00051 pág. 10

Na data deste julgamento, o jornal O Globo publica a matéria intitulada Quando e como alfabetizar? (Caderno País, tópico Educação, pg. 6), fazendo referência ao Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, que prevê o compromisso, por parte dos governos, de alfabetizar as crianças até os 8 anos de idade, ao final do 3º ano do ensino fundamental. A instituição desse pacto já revela a preocupação com a grave questão da alfabetização. A lei impugnada tenta reforçar a eficácia da política educacional. A possibilidade de matrícula aos 5 anos dependerá, como estabelece o art. 208, V, da Constituição da República, do desenvolvimento e da capacidade de cada um. O grande educador Paulo Freire, no texto A Importância do ato de ler, ensina que A leitura do mundo precede a leitura da palavra. Se a criança de 5 anos já fizer uma adequada leitura do Mundo, nada obsta a sua matrícula no 1º ano do ensino fundamental. Por essas razões, rejeitam-se as preliminares e, no mérito, julga-se improcedente a representação. Rio de Janeiro, 06 de agosto de 2012 SÉRGIO VERANI Des. Relator ACÓRDÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2009.007.00051 pág. 11 Certificado por DES. SERGIO DE SOUZA VERANI A cópia impressa deste documento poderá ser conferida com o original eletrônico no endereço www.tjrj.jus.br. Data: 13/08/2012 11:28:59Local: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Processo: 0034724-16.2009.8.19.0000 (2009.007.00051) - Tot. Pag.: 11