A esquizofrenia de um cisne: expondo as psicoses de uma bailarina 1



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Transcrição:

A esquizofrenia de um cisne: expondo as psicoses de uma bailarina 1 Rafael Sanzio Borges LIMA 2 Resumo Desenvolvemos um estudo sobre a criatividade na ótica da produção de um filme, neste caso, o objeto escolhido foi o filme Cisne Negro (2010). Utilizando-se da teoria do investimento de Sternberg e Lubart, explanada no artigo de Eunice Alencar e Denise de Souza, o presente trabalho tenta caracterizar a criatividade no modo de trabalho de um cineasta e de como foi feita a transposição das psicoses da personagem principal para o visual cinematográfico. Palavras-chave: Criatividade. Cisne Negro. Cinema. Teoria de Sternberg. Introdução O processo criativo pode ser desenvolvido de diversas formas. Segundo a teoria do investimento de Sternberg, observada no texto Contribuições teóricas recentes ao estudo da criatividade, existem fatores que ajudam a percebermos as características de uma pessoa criativa. Este mesmo processo criativo pode ser visto, de forma clara, no processo de desenvolvimento de um filme. Quando a obra cinematográfica realizada compõe-se de um trabalho estético diferenciado e voltado ao terror psicológico, podemos notar que este mesmo trabalho é uma fonte rica para o estudo psicológico, tanto da forma criativa com que foi realizado o produto como da forma que as patologias das doenças mentais foram retratadas na película. Este artigo tenta demonstrar esse processo de uma realização cinematográfica criativa, bem como esclarecer, identificar termos usados na psicologia e soluções 1 Primeira versão do trabalho foi produzida para a disciplina Psicologia da Criatividade no período de abril de 2011. 2 Graduando do curso de radialismo da Universidade Federal da Paraíba. E-mail: rafael_sanzioborges@yahoo.com.br

estéticas utilizadas para transpor as psicoses de Nina para as telas do cinema com o filme do diretor Darren Aranofsky, Cisne Negro. A teoria de Sternberg no cinema A criatividade não vem do nada. Ela sempre se origina de algo que já foi criado, como Lavosier afirmou que: na natureza nada se cria, tudo se transforma. Mas segundo alguns pesquisadores o autor não é o único responsável pela criação de algo criativo, é necessário a presença do outro para que este diga que aquela coisa criada ou inventada é criativa. A produção criativa não pode ser atribuída exclusivamente a um conjunto de habilidades e traços de personalidade do criador, mas também sofre a influência de elementos do ambiente onde esse indivíduo se encontra inserido (ALENCAR & DENISE, 2003, p. 1). Segundo a Teoria do Investimento em Criatividade de Sternberg é necessário 6 recursos para a expressão criativa: inteligência, estilos intelectuais, conhecimento, personalidade, motivação e contexto ambiental. Ao discorrer sobre contexto ambiental verifica-se mais uma vez a necessidade de uma outra pessoa no contexto da criação do algo criativo para que este seja definido como um. Sabe-se que a criatividade não ocorre no vácuo e não pode ser vista fora deste contexto, especialmente porque tanto a pessoa como o produto são julgados e avaliados como criativos ou não por pessoas do seu contexto social (ALENCAR & DENISE, 2003, p. 4). Tomo como exemplo de um ambiente fértil para o exercício da criatividade o ambiente da criação de um filme. Observe como são dadas as possibilidades criativas dentro de uma equipe de filmagem. Após a escolha do filme e do diretor, começa o desenvolvimento criativo para como ficará o filme proposto nas telas do cinema. Seguindo a teoria do investimento em criatividade, o diretor do filme retém todos os recursos para expressar sua criatividade ao longo de toda a criação do filme. No cinema são feitas reuniões com todos os membros da equipe de filmagem, desde os produtores aos figurinistas e cenógrafos, todos subalternos as decisões criativas do diretor. Deixando assim, o ambiente propício para o uso da inteligência do diretor para ver o problema sobre um novo ângulo decidindo de que forma será visto aquela temática do

filme para a sociedade, tendo a habilidade prática-contextual para ser capaz de persuadir outras pessoas (no caso equipe e produção executiva) sobre o valor de suas próprias ideias. O diretor de um filme pode ter um estilo intelectual como os três ao mesmo tempo: Legislativo, executivo e judiciário. O primeiro estaria presente naquela pessoa que gosta de formular problemas e criar novas regras e maneiras de se ver as coisas (...). O segundo estaria presente naquela pessoa que gosta de implementar ideias, com preferência por problemas que apresentam uma estrutura clara e bem definida. O terceiro caracterizaria aquelas que têm preferência por emitir julgamentos, avaliar pessoas, tarefas e regras, tendo prazer em emitir opiniões e avaliar as dos demais (ALENCAR & DENISE, 2003, p. 2 e 3). O estilo intelectual judiciário caracteriza-se por aqueles diretores que se apoiam totalmente em sua equipe criativa. Dando por exemplo uma ideia inicial de figurino e deixando ao encargo do figurinista em desenvolver o resto da expressão criativa e no final julgando-a criativa ou não e condizente a proposta inicial do diretor. O conhecimento pode caracterizar-se por dois tipos: formal ou informal segundo Sternberg. No campo do formal há escolas de cinema especializadas no ensino das técnicas de filmagem, criação de roteiro e as várias subdivisões das funções dentro de um filme. Já há informal é o talento adquirido com a experiência, campo este totalmente variável entre os diretores de cinema. Da mesma forma que é variável a presença da personalidade nos diretores, apesar de poder ser boa ou ruim o traço da personalidade do diretor sempre aparece no filme como sua marca registrada, como exemplo cito as câmeras lentas nos filmes de Zack Snider (300 e Watchman). As pessoas estão muito mais propensas a responder criativamente a uma dada tarefa, quando estão movidas pelo prazer de realizá-la (ALENCAR & DENISE, 2003, P. 3). Esta é a definição do quinto recurso motivação. Podemos dizer que a maioria dos cineastas escolhem os filmes que irão fazer, se escolhem é porque estão motivados para falar sobre determinado tema ou trabalhar com determinado ator. Há sempre uma motivação envolvida nos projetos de um diretor, da mesma forma que um residente em um hospital que fica motivado ao saber de um paciente com uma doença nova e ele quer participar dessa cirurgia ou um advogado que vê um cliente em potencial, com um caso desafiador e exigente de sua criatividade para superar aquele problema.

Por último, como já citei o contexto ambiental, o ambiente criado pela equipe de filmagem pode acarretar na técnica chamada tempestade de ideias onde membros da equipe soltam ideias que podem vir a contribuir ao desenvolvimento do filme e na criação de soluções criativas para problemas surgidos durante a produção. Então a definição de Sternberg e Lubart encaixa-se perfeitamente nesse contexto da equipe de um filme: (a) grau em que favorece a geração de novas ideias; (b) extensão em que encoraja e dá suporte necessário ao desenvolvimento de ideais criativas, possibilitando a geração de produtos tangíveis; e (c) avaliação que é feita do produto criativo (ALENCAR & DENISE, 2003, p. 4). Com base nesses preceitos de criatividade e no ambiente criado para o desenvolvimento da mesma, utilizei o diretor Darren Aranofsky como suporte para demonstrar sua criatividade em algumas cenas do filme Cisne Negro (2010). A História do Cisne O filme Cisne Negro foi realizado em 2010, com direção de Darren Aranofsky, história de Andrés Heinz e roteiro de Mark Heyman, Andrés Heinz e John McLaughlin. Na trama a bailarina Nina, uma mulher de 28 anos que vive com mãe e é tratada ainda como criança. Delicada e rígida pelo zelo da progenitora, Nina consegue o papel principal do balé Lago dos Cisnes, contudo, seu papel principal é necessário compor dois personagens antagônicos, tanto o Cisne Branco como o Cisne Negro. As pressões envolvendo o fato de ser a bailarina principal, o péssimo desempenho em desenvolver a personagem Cisne Negro liberam o estresse emocional em Nina que traz de volta seu histórico de esquizofrenia. Com isso, a personagem do filme começa a ter alucinações tanto sensoriais como visuais e mania de perseguição característicos desse quadro psicótico. Sobre psicose James Whitaker explica seus sintomas: Grande prejuízo das funções psicológicas resultando numa incapacidade de satisfazer as necessidades comuns da vida; grave alteração da percepção (alucinações, delírios); profundas alterações do humor: marcado prejuízo do pensamento e memória (WHITAKER, 1977, p. 495).

No caso de Nina vemos uma rigidez em suas atitudes e um recalque quanto a sua sexualidade. Ao existir a pressão por parte do diretor do balé para que Nina relaxe, liberando sua sexualidade para atingir a personagem Cisne Negro vai acentuando-se durante o filme os sintomas da Psicose Maníaco Depressiva, as alternâncias desses sintomas criam até a perspectiva de que Nina está construindo uma outra personalidade. Contudo, para não devanearmos em suposições vamos nos ater as psicoses: Os sintomas podem constituir-se em hiperexcitabilidade, depressão grave, ou alternância de ambos. (WHITAKER, 1977, p. 513). Como é transferido essa realidade para a tela do cinema? As cenas a seguir demonstram bem as patologias inerentes ao psicótico maníaco depressivo, que caracteriza o estado da personagem Nina. Vamos observar a forma como o diretor do filme recria cenas e introduz à elas traços dos sintomas da psicose, tanto utilizando-se criativamente de simbologias, como de som e imagem. Alucinações e Vozes O que é característico do filme são as alucinações da personagem, geralmente constituídas em vislumbres de si mesma em vários momentos. Esses vislumbres confundem-se com a visualização de outra personalidade, pois caracterizam sempre em imagens antagônicas da Nina controlada e reprimida. Ou seja, ela vê a si mesma refletida em espelhos movimentando-se além do seu reflexo, também se vê nas ruas ou no metrô e em nessas cenas destaca-se a coloração de sua roupa, cores escuras contrastando drasticamente com as roupas claras da personagem. Com a chegada da personagem Lily no grupo de balé (Mila Kunis), Nina vê nela o que deveria ser para se tornar o Cisne Negro, independente, relaxada e sedutora. O que acontece é a apropriação da imagem de Lily nas alucinações de Nina. Na cena da festa Nina libera-se com Lily e mistura realidade com alucinação, apresentando a fase maníaca de seu estado e confrontando a mãe ao chegar em casa: Exaltação do humor ou euforia, hiperatividade, como andar de um lado para outro, cantar, e assim por diante, e a fuga de ideias, durante a qual a conversa do paciente muda de um tópico a outro com pouca conexão aparente. (WHITAKER, 1977, p. 513)

Outra alucinação são as sensoriais, a cada passo que Nina sente prazer ela sente o corpo arrepiar-se e mais tarde verificaremos que essa libertação deve-se ao fato que a esquizofrenia da personagem está transformando-a em um Cisne Negro. Então sua liberação do recalque sexual para compor a personagem indica o que chamamos de sublimação. Contudo, sublimação explicarei no outro tópica, aqui a alucinação visual e sensorial é a cena no qual Nina transforma-se por completo em um Cisne Negro, chegando ao ápice de sua psicose. A trilha sonora também é usada como chave para a percepção do público para o início de uma alucinação. Como por exemplo as risadas no BG do filme, exatamente quando Nina percebe que a realidade está misturando-se com as ilusões. Sublimação Criação dos objetos para a satisfação erótica do sujeito que pudessem ser, ao mesmo tempo, partilhados culturalmente (KRUTZEN, 2008, p. 129). Ou seja, a liberação das psicoses de Nina transferidas para a criação criativa da personagem Cisne Negro, ao invés de causarem repulsa por serem os desejos sexuais expostos da bailarina, nesse caso são aprovados pela plateia. Outro exemplo de sublimação é a mãe de Nina, frustrada por ter abandonado a carreira de bailarina para dar à luz a Nina, a mãe possui um recalque dessa frustração, culpa e raiva contra a própria filha. A mãe sublima esses recalques em forma de arte, com várias pinturas de Nina e dela mesma, mostrando desespero e tristeza neles. Mas só constituirá como sublimação se houver a reação do outro, neste caso há na cena que Nina vê as obras e as destrói, a mãe capta essa reação ao aparecer de surpresa. A reação do outro pode ser tanto negativa como positiva. O que é observado no livro Oficinas Terapêuticas é o perigo existente na criatividade, no seu limiar entre o aproveitamento da loucura para o bem. No caso de Nina essa psicose a ajudou a criar um personagem perfeito, representando seu papel e sendo ovacionado pelo público como algo criativo (contexto ambiental). Contudo, sua representação foi tão perfeita que, para ser perfeito era preciso que a personagem Cisne Branco morresse ao final da peça e Nina com sua psicose levou isso literalmente em prática. Atividades artísticas, então, podem ser consideradas tão perigosas quanto a

ciência, o trabalho, o esporte, até o amor, tudo dependendo da forma de combinar: da distância entre o sujeito e suas construções (KRUTZEN, 2008, p. 12). Luz, Sombra e Fronteira de Contato Há uma cena em Cisne Negro que me despertou emocionalmente que caracterizouse na teoria da Luz, Sombra e fronteira de contato explanada na aula de Psicologia da Criatividade. Próximo ao final do filme, a personagem Nina finalmente encarna a personagem Cisne Negro e a atuação de Natalie Portman confere a Nina quase uma possessão durante cada passo e respiração da personagem. Naquela cena, todo filme ficou representado para mim, o momento de sombra foi a representação do que o filme representava antes, um filme de balé que eu não achava que não passaria de um drama de amor, a fronteira de contato foi a interpretação de Natalie Portman durante a dança do Cisne Negro, a Luz é representada pela minha percepção de que era algo mais que um filme sobre balé, mas ia além, um filme com uma interpretação maravilhosa e como ator eu soube reconhecer isso muito mais. Podemos ver o processo criativo de Nina também, com sua busca pela perfeição, a criação da personagem perfeita e a busca do julgamento do outro no caso o diretor da companhia de balé e a própria plateia. E a aceitação vêm com os aplausos no final da apresentação. Considerações finais Darren Aronfsky compõe em sua obra cinematográfica um filme criativo com representações das psicoses de uma bailarina, transformando o longa metragem em um trhiller psicológico extraordinário. Com possibilidades de análises fílmicas e psicológicas. As alucinações compõe uma oportunidade de construções criativas visuais para o desenvolvimento do filme. A própria produção do fazer cinema liberta a possibilidade da expressão criativa, com cada membro da equipe compondo uma peça para a formulação da coisa criativa e esta

coisa criativa sendo julgada por cada membro, sendo assim o ser criativo tendo a resposta de sua criação imediatamente após revelada e criada. Cisne Negro foi agraciado com um Oscar de Melhor Atriz, mas constitui-se num campo cheio para a psicologia e nesse caso para demonstrações do campo da Psicologia da Criatividade. Referências ALENCAR, Eunice M. L. S, FLEITH, Denise de Souza. Psicologia: Teoria e Pesquisa: Contribuições Teóricas Recentes ao Estudo da Criatividade. Vol. 19, n.1, (2003). KRUTZEN, Eugênia Correia. Oficinas Terapêuticas: Na interface Arte e Psicanálise. Rio de Janeiro: T+8 Ltda, (2008). WHITAKER, James. Psicologia. Interamericana, Rio de Janeiro: P. 495 513, (1977). Filmes ARONOFSKY, Darren (2010). Cisne Negro. EUA: 108 minutos.