ILUSTRAÇÃO DE MODA E DESENHO DE ESTAMPARIA TÊXTIL: INTERCONEXÕES COM O DESIGN DE MODA. Luciana Gragnato e Miriam Levinbook 1



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Transcrição:

ILUSTRAÇÃO DE MODA E DESENHO DE ESTAMPARIA TÊXTIL: INTERCONEXÕES COM O DESIGN DE MODA. Luciana Gragnato e Miriam Levinbook 1 RESUMO Tanto o desenho de estamparia têxtil como o desenho de ilustração de moda, assumem vários papéis no processo do Design de Moda: participam na concepção, na expressão, na proposição de idéias e conceitos, na materialização dos produtos e finalmente na interpretação dos mesmos. Por meio de formas, volumes, texturas, movimentos e suas inúmeras inter-relações, o Design de Moda incorpora valores culturais nos objetos que produz e gera canais de identificação social e comunicação não-verbal de realidades e tendências comportamentais. Por intermédio destas constatações, tratamos neste artigo de propor uma reflexão a respeito deste desenho de ilustração para a moda, que pode utilizar o desenho de estamparia como um diferencial para a divulgação dos produtos de moda. Palavras chave: Ilustração de moda; desenho de estamparia têxtil; design de moda ABSTRACT Fashion illustration and textile print design participates both in Fashion Design, considering the processes of creation, including concepts and ideas, development of products and finally its interpretation. While explaining forms, volumes, textures, movement and its many interrelationships, the Fashion Design incorporates cultural values on its products and establishes a social identification with a non-verbal communication of behavioral trends. By those references, this article proposes a reflection about the fashion illustration, which can use the textile print design to disseminate a fashion message in fashion products. Key words: Fashion Illustration; textile prints; fashion design 1 Luciana Gragnato Mestre em Design e graduada em Negócios da Moda, ambas pela Universidade Anhembi Morumbi. É professora titular da Universidade Anhembi Morumbi e também atua como consultora em estilo e desenvolvimento de produto para empresas do segmento de uniformes profissionais. Tem experiência na área de Moda e Educação com ênfase em desenho de vestuário. Miriam Levinbook - Graduada em Artes Plásticas pela Fundação Armando Álvares Penteado e pósgraduada em Moda e Comunicação pela Universidade Anhembi Morumbi. É especialista em design de superfícies têxteis com foco em estamparia, promovendo workshops e palestras na área. Atua como docente, consultora e designer no desenvolvimento de projetos e experimentos para a área têxtil.

O Design de Moda e a mensagem de moda A moda segundo alguns estudiosos (LIPOVETSKY, 1989; BRAGA, 2005) é reconhecida como sistema e apreciação pela troca periódica do traje, a partir do final da Idade Média. Neste momento acentua-se ainda o traje como forte diferenciador social, acelerando estas mudanças. De acordo com João Braga, (...)um gosto durava enquanto não era copiado, pois, se assim acontecesse, novas propostas suplantariam as, então, vigentes (2005, p. 40). Pelas palavras destes autores, podemos dizer que a moda tem um caráter de mudança em sua própria natureza. A cada lançamento de coleção, movimentos são apontados como difusores de tendências em busca de novas oportunidades de mudanças e assim sucessivamente já que a moda é nossa lei porque toda a nossa cultura sacraliza o Novo e consagra a dignidade presente (LIPOVETSKY, 1989, p. 269). Esta efemeridade da moda acaba por requerer em sua organização, de métodos e processos, aqui podendo ser configurados por intermédio do design. Löbach (2001, p.11) afirma que com tantos pontos de vista diferentes em relação às questões que envolvem o design, e pela expansão do termo design, ficamos confrontados com inúmeros conceitos tais como projeto, plano, esboço, desenho, croqui, construção, configuração, ou modelo. Cardoso (2004) acredita que para entender o sentido da palavra design, deve-se justamente partir de sua origem na língua inglesa onde: (...)Percebe-se que, do ponto de vista etimológico, o termo já contém nas suas origens uma ambigüidade, uma tensão dinâmica, entre um aspecto abstrato de conceber / projetar / atribuir outro conceito de registrar / configurar / formar. (CARDOSO, 2004, p. 19) Neste sentido, quando pensamos em Design de Moda, todo um processo de criação, desenvolvimento e comercialização de roupas e acessórios vem à nossa mente, nitidamente envolvidos, portanto, em uma atividade projetual. No contexto apresentado, a principal força que pode ser considerada, é a relação entre o usuário e o produto de moda, seja ele qual for. Por isso, o design gira em torno do eixo produto versus

consumidor, e todos os elementos e ações que compõem o processo do design, voltamse para essa relação, objetivando-a e reforçando-a. Em seu livro Observatório de Sinais, CALDAS (2004, p. 113-114), afirma que para uma tendência de moda existir, ela depende da crença naquilo que se quer fazer crer e que, para tanto, o processo comunicativo que veicula essa tendência é constituído por dois pólos: o emissor da mensagem e o receptor da mensagem. Podemos entender o pólo receptor como o individuo que consome objetos e produtos de moda e o pólo emissor como o designer de moda, responsável pela inserção de mensagens nos objetos e produtos de moda. Estabelecidas as pontas da comunicação, entendemos que a mensagem de moda deverá seguir o caminho de um para o outro. A moda se apropria de imagens, muitas vezes criadas pela publicidade, outras vezes criadas pelos próprios designers, para a comunicação da mensagem. Assim, a forma não-verbal de expressão que se dá através de imagens é passível de ser analisada e interpretada pelo receptor/ consumidor, possibilitando o contato e a identificação entre produto e usuário. Ainda que com funções diferentes, a ilustração de moda pode ser tida como parte integrante do projeto de design do produto de moda, assim como o é, também, o desenho de estamparia têxtil. Nosso interesse, neste momento, é refletir sobre as possibilidades da ilustração de moda e da estamparia pensada pelo designer, de forma a que ambos, e juntos na mesma imagem, possam contribuir na comunicação da mensagem de moda. A ilustração de moda Uma das formas de representação gráfica que a moda possui é a ilustração, que assim como o desenho de moda, permite uma ampliação dos significados subjetivos. Entendida aqui também como linguagem de representação visual, a ilustração de moda traz elementos próprios deste universo e vai mais além, incorporando e interpretando elementos culturais e sociais. Isto significa dizer que a ilustração de moda traz o pulsar do tempo, pois carrega traços desse tempo, valores e comportamentos, mudanças e oscilações, que influenciam a percepção e a concepção de novas estéticas, bem como análise e interpretação do espírito do tempo, da época em que ela foi realizada.

A ilustração concentra-se na mensagem de moda intrínseca ao produto. A partir dessa perspectiva, podemos entender que a ilustração de moda está no campo do experimental: novas estéticas, conceitos e técnicas de comunicação tanto de moda como de estilos de vida. Estas outras informações são lidas de acordo com o repertório do espectador. De acordo com o comentário de Jonathan Tran, ilustrador de moda britânico, no prefácio de Fashionize, a ilustração de moda deve capturar idealismos e comportamentos. Elas devem comunicar tudo àquilo de inatingível e subjetivo que envolve o objeto em questão. A ilustração pode, também, fazer parte do projeto de comunicação do produto de moda, tanto para o processo de produção como para o processo de venda, exercendo influências sobre o consumidor. Quando isso acontece, a ilustração deixa de ter um caráter experimental e passa a considerar questões que envolvem a comercialização do produto de moda. Em outras palavras, a ilustração de moda pode ser uma forma de comunicação entre marcas e produtos e seus consumidores, criando e identificando códigos sociais para essa comunicação. Segundo GARCIA (2005, p.99-100), (...) a moda é um instrumento poderoso de inserção humana no contexto cultural, tornando-se também ela um sujeito ativo que detém o poder para agir de diferentes formas no processo comunicacional; (...) moda como instrumento de comunicação (...) não-verbal, ou seja, expressão do eu em interação com o mundo. Dessa maneira, as ilustrações de moda são utilizadas inclusive para transmitir valores e conceitos anteriores ao produto de moda em si. Torna-se uma imagem que pode não estar preocupada com a identificação do produto para venda direta (detalhes do modelo, por exemplo), mas sim com a identificação dos valores e referências que a marca, ou fabricante, atribui a seus produtos de forma geral.

Design de superfície em estamparia têxtil No design de superfície, nos deparamos com um corpo ou objeto, que será manipulado independentemente de ser uma produção em série que visa um grupo de consumo, ou uma peça única produzida artesanalmente. Em qualquer dos casos parte-se de um projeto que transformará através de seus desenvolvimentos técnicos e criativos, a área de suporte disponível para tratamento, a qual se denomina de superfície, ou seja, o primeiro contato exterior, a parte externa, visível e tátil dos corpos, sua aparência, que emerge de uma estrutura recoberta por ela mesma ou por algo que é aderido a um corpo em sua parte externa (MACIEIRA;RIBEIRO, 2007 p.15). Nas palavras de Saltzman (2004, p. 49), a superfície é uma zona limite de uma forma e que como tal, rodeia, circunda, cobre e envolve algo, sendo por sua vez o plano de contato entre este objeto (o sujeito) e o entorno. Abordando aspectos relacionados às matérias têxteis, estas formas relacionam-se com as texturas, diretamente conectadas com a linguagem visual e tátil produzindo criações por intermédio destas intervenções sensoriais. Para Pompas, (1994, p. 03), uma superfície do tipo têxtil é constituída de um conjunto de propriedades subdivididas em dois componentes principais: de um lado a peculiaridade da matéria, que depende da composição e da estrutura técnico-construtiva especificando o tecido do ponto de vista sensorial e tátil; do outro lado, trata dos requisitos formais, estilísticos e cromáticos, o que determina a qualidade estéticoexpressiva do tecido. Reforçando as questões que envolvem o projeto para posterior tratamento em uma superfície, e relacionando-o com a criação de imagens, Evelise Anicet Rüthschilling, afirma que o design de superfície: (...) é uma atividade técnica e criativa cujo objetivo é a criação de imagens bidimensionais (texturas visuais e tácteis), projetadas especificamente para a constituição e/ou tratamento de superfícies, apresentando soluções estéticas e funcionais adequadas aos diferentes materiais e processos de fabricação artesanal e industrial. (RÜTHSCHILLING, 2006) 1 1 Disponível em: www.nds.ufrgs.br/novo/index.html Acesso em: 08/06/2008

Dentre outras atividades projetuais relacionadas aos métodos e processos do design de superfície em estamparia têxtil, tais como o planejamento estrutural, as pesquisas em áreas diversas, o processo de criação, as variações de cor e o acompanhamento da produção industrial, encontra-se a composição do desenho. A composição de uma estampa, seja ela corrida (caracteriza a repetição dos módulos no tecido a metro) ou localizada (aonde o desenho é aplicado em uma área isolada sem repetição), diz respeito à distribuição e organização de motivos, que formam a parte mais proeminente de um desenho. Por meio do tamanho, cor e textura, que sugiram ou incorporem plano e/ou volume dos elementos visuais, das relações entre eles, e da direção em que serão dispostos, é o que determinará o conteúdo final do processo de criação visual que constitui a melhor expressão visual possível da essência de algo, ou seja, o desenho de estamparia. Será este, o resultado visual geral obtido com a disposição de formas no interior de uma moldura de referência, a borda circundante de uma composição. Esta pode ser a margem do papel que contém o desenho ou uma moldura linear especialmente traçada para definir a área do desenho. O desenho de estamparia pode ser considerado então, como uma imagem, que reflete por meio de sua constituição visual, aspectos que se relacionem com o projeto de design de moda, em suas estruturas visuais e táteis. Veremos a seguir, de que forma o desenho de estamparia inserido no contexto da ilustração de moda, se mostra como mais um elemento diferenciador do design de moda. A ilustração de moda e o desenho de estamparia para o design de moda: interconexões Para o Design de Moda, a construção do produto requer um processo de planejamento que antecede seu desenvolvimento, e que eventualmente pode se configurar como uma questão metodológica bastante especifica. Segundo CALDAS (2004, p. 96), existem regras de observação e decifração de sinais, tanto mercadológicos, como de tendências de moda e de comportamento sociais, que são de extrema valia para o designer de moda planejar, desenvolver, lançar e comunicar produtos e objetos de moda no mercado. É neste sentido que podemos observar a ilustração de moda como parte integrante do projeto de design do produto de moda e também como uma face do design gráfico,

quando identificamos ambos como uma imagem, que na moda, também pode ser entendida como instrumento de comunicação, que acontece ao longo de todo o processo de criação, desenvolvimento e comercialização do produto de moda. As imagens gráficas (livros, impressos em geral, placas, embalagens, ilustrações entre outros) também contêm elementos característicos do design de superfície, visto que, antes de se tornarem mensagens visuais, eram originariamente pensados de forma a recobrir determinada superfície. Reforça esta constatação, a afirmação de Flüsser (2007) que considera: Uma imagem é, entre outras coisas, uma mensagem: ela tem um emissor e procura por um receptor. Essa procura é uma questão de transporte. Imagens são superfícies. Como elas podem ser transportadas? Depende dos corpos em cujas superfícies as imagens serão transportadas. (FLÜSSER, 2007, p. 152) Assim, podemos refletir a respeito do processo de interferência visual em uma superfície. Um papel em branco, texturado ou não, é uma superfície. Na medida em que esta folha de papel recebe informações impressas em sua superfície, ou ainda, através de texturas diversas que compõe sua aparência e característica visual tátil, o projeto vai se configurando por meio de uma determinada representação visual, aonde ilustração de moda e desenho de estamparia se encontram e tem a possibilidade de dialogar. A partir dos elementos que constituem o design gráfico tais como, desenhos, texturas, formas, cores, ilustrações e diversos tipos de composições visuais entre outros, encontramos uma aproximação entre esta área, a ilustração de moda e o desenho de estamparia. De acordo com SANTAELLA, há outra classificação possível para uma imagem: a imagem simbólica. Este tipo de imagem seria um meio termo, uma ou muitas nuances entre a idéia de temporalidade e de atemporalidade. O simbolismo na imagem também pode ser determinado a partir de regras culturais, onde os elementos que constituem a imagem são passíveis de interpretações que vão além de seu significado comum ou

imediato, e que dependem de referências culturais e de valores atribuídos a objetos ou representações, códigos culturais: já as imagens simbólicas, embora possam sugerir a temporalidade de possíveis referentes, essa temporalidade é sempre tão geral e vaga quanto é genérica e universalizante a função referencial desse tipo de imagem (p.84). Gilda Chataignier (2006) reforça esta idéia quando salienta, que por meio de seus signos, o tecido utilizado em roupas, trajes, moda e utilitários é um dos mais fortes e antigos meios de comunicação. (p.20) Neste sentido, podemos pensar na ilustração de moda e no desenho de estamparia como uma forma de induzir e documentar comportamentos e valores, além de simplesmente refleti-los ou caracterizá-los. Dessa forma, podemos ainda perceber mensagens de moda implícitas em uma ilustração que carrega o desenho de estamparia por meio dos elementos que a compõem, ou seja, formas, cores e arranjos compositivos, como explica DONDIS (2003, p. 16-18), Se um meio de comunicação (verbal) é tão fácil de decompor em partes componentes e estrutura, por que não o outro? Qualquer sistema e símbolos é invenção do homem (...) A sintaxe visual existe. Há linhas gerais para a criação de composições. Há elementos básicos que podem ser aprendidos e compreendidos por todos os estudiosos dos meios de comunicação visual, (...) para a criação de mensagens visuais claras. O conhecimento de todos esses fatores pode levar a uma melhor compreensão das mensagens visuais. A partir das constatações acima, podemos considerar a ilustração de moda e o desenho de estamparia, como possíveis suportes ao design de moda, que comunicam mensagens por meio de suas imagens, aspectos relacionados ao corpo, ao tecido, às texturas, formas e cores, à seus usuários. Considerações Finais Estabelecer relações entre a ilustração de moda e o desenho de estamparia têxtil, nos fez refletir a respeito das possibilidades destas específicas áreas de conhecimento, no que se refere às suas inter-relações. Estas se manifestam por intermédio de imagens, que

sobrepostas, se colocam como suporte ao design de moda, em sua comunicação com o usuário. Desenho de ilustração de moda e desenho de estamparia para a moda, dialogando entre si, torna-se uma poderosa ferramenta de divulgação e comunicação dos produtos relacionados aos processos em design de moda. Referências BRAGA, João. Reflexões sobre moda. v. 2. São Paulo: Editora Anhembi Morumbi, 2005. CALDAS, Dario. Observatório de Sinais: Teoria e prática da pesquisa de tendências de moda. Rio de Janeiro: Editora Senac, 2004. DENIS, Rafael Cardoso. Uma introdução á história do design / Rafael Cardoso Denis. São Paulo: Edgard Blucher, 2000. DONDIS, Donis A. Sintaxe da linguagem visual / Donis A. Dondis ; tradução Jefferson Luiz Camargo. 2ª edição São Paulo : Martins Fontes, 1997. FANTUZZI, Gabriele. VALENTINI, Cristiana. FASHIONIZE The Art of Fashion Ilustration selected by Delicatessen. Ed. Happy Books, Italia. 2ª edição, 2005. FLUSSER, Vilém; CARDOSO, Rafael. (Org.). O mundo codificado: por uma filosofia do design e da comunicação. São Paulo: Cosac Naify, 2007. GARCIA, Carol. Moda e comunicação: experiências, memórias, vínculos / Carol Garcia e Ana Paula de Miranda. São Paulo : Editora Anhembi Morumbi, 2005. (Coleção moda e comunicação / Káthia Castilho, coordenação) LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. MACIEIRA, Cássia; RIBEIRO, Juliana Pontes (Orgs). Na rua: pós-grafite, moda e vestígios. Belo Horizonte, 2007. POMPAS, Renata. Textile Design: Ricerca Elaborazione - Progetto. Milano: Edimatica,1994. RÜTHSCHILLING, Evelise Anicet. Design de Superfície 2008. Disponível em: <http://www.nds.ufrgs.br>. Acesso em 11/03/2008. SANTAELLA, Lucia. WINFRIED, Noth. Imagem, cognição, semiótica, mídia. Ed. Iluminuras, São Paulo - 4ª edição, 2005.