Turma e Ano: MASTER A- 2015 Matéria / Aula: ADMINISTRATIVO Professor: LUIZ OLIVEIRA JUNGSTEDT Monitora: Tatiana Carvalho Aula 16 Temas da aula: Controle do ato administrativo discricionário. Argumentos para controle do mérito administrativo pelo Judiciário. Extinção do ato administrativo. Como realçado na aula passada, existem teorias minoritárias, mas já cobradas em concurso, que entendem possível o controle do mérito de um ato administrativo discricionário dentro da conveniência e oportunidade (e não somente em seus limites, como a doutrina majoritária vem permitindo). Três argumentos podem ser utilizados para permitir essa invasão, sendo que a terceira é a que possui maior suporte doutrinário, mesmo que minoritário. 1) Argumento processual Alguns doutrinadores entendem que tendo a jurisdição como uma de suas características a substitutividade, ou seja, o juiz substitui a vontade das partes e determina a solução do problema apresentado, seria permitido ao juiz, substituindo-se ao autor e ao réu, invadir o mérito, pois ao lhe ser entregue a solução do problema, inclusive a análise do ato lhe foi entregue. É um dos argumentos mais fracos. 2) Pilares do mérito Esse argumento reúne a noção de controle da eficiência de Jessé Torres (visto na aula passada como uma análise dos limites do mérito), com a noção de mérito do ato administrativo concebida por Hely Lopes Meirelles, de que o mérito do ato administrativo se compõe, além da conveniência e oportunidade, de resultado e eficiência. Portanto, se eficiência integra o mérito, e após 88, podemos controlar um ato tendo a eficiência como parâmetro, invadimos o mérito. O cuidado que se deve tomar com esse argumento é indicar Hely como criador do argumento. Isso não é verdade! Hely faleceu antes da EC 19/98, que introduziu a eficiência como princípio da Administração. A diferença prática entre este argumento e a teoria do Jessé Torres é que, enquanto na teoria de Jessé analisamos somente os limites do mérito, utilizando o argumento poderemos analisar a conveniência e oportunidade do ato discricionário.
3) Teoria dos graus de vinculação Essa teoria tem amparo, minoritário, em Gustavo Binenbojm, Procurador do Estado. Em seu livro Teoria do ato administrativo, publicado pela Ed. Renovar, Binenbojm entende que desde a Constituição de 1988 não existem mais atos administrativos discricionários, mas somente vinculado, com graus de vinculação (da mais forte à mais fraca). O autor estudou nos Estados Unidos, e traz muito do direito americano em sua doutrina, mas como o direito administrativo brasileiro possui raiz romano-germânica, a teoria tem problemas nessa adaptação. Seria três os graus de vinculação: a) a vinculação propriamente dita; b) o chamado conceito jurídico indeterminado (que como vimos na aula passada, é mais determinado no direito administrativo do que o nome faz parecer)- lembrem-se da discricionariedade técnica dos atos das agências reguladoras; c) vinculação aos princípios- essa é maior crítica à teoria, pois ao mencioná-la, o professor Binenbojm acaba por dizer que o administrador, neste caso, possui margem de escolha, o que é o mesmo que dizer que um ato é discricionário. O professor Luiz critica essa teoria, por entender que o professor Gustavo usa uma matriz diferente da brasileira e tenta fugir da ideia de discricionariedade no terceiro grau. Mas lembra que a matéria vem caindo em concursos públicos, inclusive múltipla escolha, como ocorreu na última prova para Delegado de Polícia do Rio de Janeiro (2012), e na banca CESPE (uma vez, pelo menos, em 2006). Na doutrina, no entanto, esse posicionamento é minoritário. EXTINÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO Possui duas formas: extinção e revogação. O resto, de acordo com Cretella Jr., são sutilezas sem amparo doutrinário. Alguns doutrinadores criam outras formas de extinção, que são apenas variações de uma dessas formas, mas como tudo que se poderia perguntar sobre extinção do ato administrativo, mesmo sendo matéria importante, foi cobrado, examinadores se utilizam dessas nomenclaturas para evitar a repetição. Celso Antônio Bandeira de Mello, por exemplo, e Diogo de Figueiredo, elencam oito formas de extinção do ato. José dos Santos Carvalho Filho, por sua vez, elenca seis. A CESPE, inclusive, usou uma das formas que somente Celso Antônio elenca, a contraposição, em questão de prova. Contraposição seria a forma de extinção do ato pela prática de ato posterior que a ele se contrapõe, como por exemplo do autor, a nomeação, que é extinta por seu contraposto, a demissão. Professor Luiz critica essa forma, porque o professor Celso Antônio não usa os termos extinção ou anulação. Outra expressão muito utilizada é a cassação, que é, para boa parte da doutrina, variação da anulação. A diferença é que, na cassação, a ilegalidade é praticada pelo administrado, e não pela Administração Pública. Mas cuidado. Digo de Figueiredo usa o termo de forma diversa.
Para ele, cassação é ligado à reavaliação do mérito, servindo para retirar do mundo jurídico um ato irretratável. Outra expressão é a caducidade. Seria a extinção do ato pela revogação ou retirada do mundo jurídico da norma que lhe dá suporte. Essas três podem, e costumam cair em prova, inclusive múltipla escolha. As duas principais, no entanto, são mesmo a revogação e a anulação. Para estuda-las, o fundamental é entender três questões, que servirão para responder as demais questões que podem surgir. São elas: a) o que pode ser objeto de anulação ou revogação?; b) de quem é a competência para anulação e revogação?; c) quais são os efeitos temporais da realização da anulação ou revogação? O seguinte quadro ilustra as respostas: ANULAÇÃO REVOGAÇÃO OBJETO Atinge ato administrativo Ligada à ilegalidade- atinge lícito, sendo ligada à ato administrativo ilícito. reavaliação de mérito. O Judiciário não pode COMPETÊNCIA invadir o mérito para Poder Judiciário (com base revogar ato administrativo no princípio da jurisdição do Executivo e do uma) e a própria Legislativo. Pode, no Administração Pública (com exercício de sua função base no princípio da atípica, revogar atos autotutela), podem anular. administrativos por ele praticados. EFEITOS Ex tunc- vide En. 473, STF. Ex nunc Complementando esse quadro, temos que trazer as seguintes informações. O enunciado 473 da súmula do STF e o art. 53, L. 9784/99 trazem, com tranquilidade, a resposta sobre o objeto da anulação e o objeto da revogação. Com isso, pode-se responder também qual seria a natureza jurídica da revogação e da anulação. Vejamos os dispositivos: 473. A ADMINISTRAÇÃO PODE ANULAR SEUS PRÓPRIOS ATOS, QUANDO EIVADOS DE VÍCIOS QUE OS TORNAM ILEGAIS, PORQUE DELES NÃO SE ORIGINAM DIREITOS; OU REVOGÁ-LOS, POR MOTIVO DE CONVENIÊNCIA OU OPORTUNIDADE, RESPEITADOS OS DIREITOS ADQUIRIDOS, E RESSALVADA, EM TODOS OS CASOS, A APRECIAÇÃO JUDICIAL.
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos. A natureza jurídica da revogação é amplamente trazida pela doutrina como ato administrativo discricionário, por haver a reavaliação do mérito. Diogo de Figueiredo amplia, dizendo que se trata de ato discricionário desconstitutivo. No entanto, ao tratar da natureza jurídica da anulação, a doutrina acaba por passar a questão em branco por esbarrar no pode previsto no enunciado 473. Esse pode existe em razão da possibilidade de convalidação (sanatória) do ato. Você pode anular, ou corrigir o defeito, se a anulação do ato será pior para o interesse público. Então, se considerarmos que há uma alternativa, temos que entender a anulação como ato administrativo discricionário. No entanto, o único autor que fala sobre o assunto, José dos Santos Carvalho Filho, diz, no entanto, que o ato é vinculado, pois a convalidação é uma exceção, e não uma alternativa. O art. 55, L. 9784/99 também trata como exceção: Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração. Com relação à competência, o enunciado também ajuda a responder. Mas é preciso se fazer uma observação com relação à atuação do Judiciário na revogação. É muito comum se falar que o Judiciário não pode revogar, somente anular atos. A afirmativa está certa, porém incompleta. Não podemos nos esquecer que o Judiciário também pratica funções atípicas, legislando e praticando atos administrativos, como remoção de serventuário, designação de férias etc. Esses atos administrativos por ele praticados podem ser por ele revogados. Pergunta do aluno: possibilidade de o Tribunal de Contas anular atos- vide Enunciado 347, STF: O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder público. O professor alerta que alguns Ministros do STF vem entendendo que o Tribunal de Contas não possui tanta força assim. Gilmar Mendes, inclusive, deferiu liminar à PETROBRAS para que ela pudesse utilizar o processo administrativo simplificado, contra decisão do TCU. Mas o TCU pode, por exemplo, desconsiderar a personalidade jurídica de empresa (vide MS 32494- transcrição do voto do relator, Ministro Celso de Mello, no Informativo 732, STF). Com relação aos efeitos, também é tranquilo. O Enunciado 473, do STF, entende que do ato administrativo ilegal não se originam direitos, então, em regra, a anulação possui eficácia ex tunc, retroagindo à época do fato. A revogação, por sua vez, como é uma reanálise do mérito administrativo, possui eficácia ex nunc. No entanto, precisamos complementar com algumas informações. A primeira é que, no Estado do Rio de Janeiro, a lei de processo administrativo (Lei 5427/2009) permite, em seu art. 53, 3º, que o administrador, por questões de excepcional interesse público e segurança jurídica, possa modular os efeitos da anulação, fixando uma data certa a partir da qual o ato não mais produzirá efeitos, mantendo-se os efeitos anteriores a essa data. Isso é inédito em legislação de direito administrativo. Portanto, cuidado! A legislação federal não permite essa modulação.
Art. 53. (...) 3º. Os Poderes do Estado e os demais órgãos dotados de autonomia constitucional poderão, no exercício de função administrativa, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, restringir os efeitos da declaração de nulidade de ato administrativo ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de determinado momento que venha a ser fixado. Pergunta do aluno: um juiz poderia controlar esses efeitos. Segundo o professor, não, pois o ato de modulação seria discricionário, e se ele tentasse por via transversa ingressar no mérito, anulando o ato, não poderia fazer, pois o ato já foi anulado pela Administração, não havendo objeto. A segunda informação é que a eficácia da revogação e da anulação também nos ajuda a responder outra questão. É possível indenização ao particular quando o ato que lhe beneficie for anulado ou revogado? Quando o ato é revogado, a doutrina é pacífica em reconhecer a inexistência do dever de indenizar, uma vez que o ato era discricionário e os efeitos são ex nunc. Entende-se que não há prejuízo ao administrado. Na anulação, essa questão se complica, pois pode haver prejuízo ao administrado e até a terceiro de boa-fé. A doutrina, por isso, se cala. Para o professor, prejudicados de boa-fé (seja o terceiro, seja o cidadão envolvido no ato) devem ser indenizados. O fundamento pode ser encontrado no art. 59, par. un., L. 8666/93: Art. 59. A declaração de nulidade do contrato administrativo opera retroativamente impedindo os efeitos jurídicos que ele, ordinariamente, deveria produzir, além de desconstituir os já produzidos. Parágrafo único. A nulidade não exonera a Administração do dever de indenizar o contratado pelo que este houver executado até a data em que ela for declarada e por outros prejuízos regularmente comprovados, contanto que não lhe seja imputável, promovendose a responsabilidade de quem lhe deu causa. Podemos utilizar o dispositivo como fundamento, mesmo falando de contratos administrativo, pois este nada mais são do que atos administrativos bilaterais. E reparem que o efeito da anulação do contrato é ex tunc, mesmo efeito da anulação do ato administrativo. Por fim a última informação: atos administrativos vinculados podem ser revogados? A doutrina entende que não, porque não há mérito no ato vinculado, e revogação envolve reanálise do mérito. No entanto, pode ocorrer de um ato administrativo ser licitamente editado (não podendo ser anulado), mas depois se tornar inconveniente. Neste caso, o que fazer? Isso já caiu em prova da PGM e até do MP. A solução pode ser encontrada em Diogo de Figueiredo, que utiliza o termo cassação expropriatória. Com isso, o ato vinculado é reanalisado e, sendo modificado, surge o dever de indenizar. A professora Lúcia Valle Figueiredo utilizava outro termo, que era a desapropriação do direito. Com isso, modifica-se o ato vinculado, mas como ele era vinculado, indeniza-se. Essa parece ser a mais técnica. Cuidado! Hely Lopes Meirelles utilizava a expressão revogar com indenização. Não parece ser a mais técnica.