METODOLOGIAS PARA UM MELHOR PLANEAMENTO E GESTÃO DO USO DO SOLO AGRÍCOLA ATENDENDO À VULNERABILIDADE DOS AQUÍFEROS À POLUIÇÃO DIFUSA



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Transcrição:

METODOLOGIAS PARA UM MELHOR PLANEAMENTO E GESTÃO DO USO DO SOLO AGRÍCOLA ATENDENDO À VULNERABILIDADE DOS AQUÍFEROS À POLUIÇÃO DIFUSA Teresa E. LEITÃO Investigadora Principal do Laboratório Nacional de Engenharia Civil - LNEC, Av. do Brasil, 11 P-17-66 Lisboa, +351 21 844 382, tleitao@lnec.pt Isabel LARANJEIRA Eng.ª Agrícola da Universidade de Évora, Núcleo de Águas Subterrâneas, LNEC, Av. do Brasil, 11, 17-66 Lisboa, +351 21 844 3436, ilaranjeira@lnec.pt Maria José HENRIQUES Geóloga, Técnica Principal do Laboratório Nacional de Engenharia Civil - LNEC, Av. do Brasil, 11 P-17-66 Lisboa, +351 21 844 3443, mjhenriques@lnec.pt RESUMO As exigentes metas traçadas pela Directiva-Quadro da Água, de alcançar o Bom estado da água até 215, e os objectivos estabelecidos na recém publicada Directiva das Águas Subterrâneas implicam que sejam tomadas acções destinadas à protecção das massas de água e à redução gradual da poluição em massas de água já poluídas. Estes objectivos só serão alcançados através de medidas de gestão integrada e sustentável dos recursos hídricos que tenham uma perspectiva global, ao nível da bacia hidrográfica, onde as opções de uso e ocupação do solo tenham em consideração se a qualidade das águas geradas a jusante por esses usos são compatíveis com as imposições de qualidade pretendidas. O trabalho que se apresenta visa contribuir para os objectivos acima referidos e insere-se no âmbito do projecto POCI/AGR/57719/24, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, intitulado "Metodologias para um melhor planeamento e gestão do uso do solo agrícola atendendo à vulnerabilidade dos aquíferos à poluição difusa", em curso entre Maio de 25 e de 28. O projecto é coordenado pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil e conta com a participação do Instituto de Ciências Agrárias e Mediterrânicas, do Instituto do Mar e do Instituto Superior Técnico. O objectivo global do projecto é "Estimular a utilização futura de culturas mais sustentáveis e de melhores práticas agrícolas que possam contribuir para diminuir o risco de degradação da qualidade das águas subterrâneas protegendo-as atendendo, entre outros aspectos, à sua vulnerabilidade". Para esse efeito foram seleccionadas diversas áreas de estudo em parcelas regadas de Ferreira do Alentejo onde se está a efectuar monitorização de solos e águas (de rega, de escorrência, da zona vadosa e subterrâneas) para avaliar o efeito de diferentes culturas nas áreas de jusante das mesmas. Esses dados serão modelados e será apresentada a optimização da melhor ocupação do solo para a região estudada com recurso a modelos de apoio à decisão. Neste artigo apresenta-se uma síntese de alguns dos resultados obtidos na primeira metade do projecto que têm essencialmente que ver com o trabalho de campo desenvolvido bem como a sua interpretação preliminar. Palavras-chave: poluição difusa; sustentabilidade; Directiva-Quadro da Água; Directiva das Águas Subterrâneas. Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 1

1 INTRODUÇÃO O presente artigo tem como objectivo apresentar o estudo em curso para a FCT intitulado "Metodologias para um melhor planeamento e gestão do uso do solo agrícola atendendo à vulnerabilidade dos aquíferos à poluição difusa", a meio do seu período de vigência, no que diz respeito aos aspectos do trabalho experimental em curso. Baseia-se no relatório de Leitão et al. (27), no prelo. Os locais de estudo seleccionados foram três parcelas regadas, uma no Monte da Mancoca e as duas no Monte do Pinheirinho, onde foram monitorizados os efeitos de duas culturas, milho e girassol. A finalidade do trabalho experimental é obter parte da informação e dos conhecimentos sobre os efeitos de diferentes práticas agrícolas nos processos que interferem na migração dos poluentes de origem agrícola (fertilização de solos), para diferentes meios (solos, zona vadosa e águas subterrâneas). Estes meios foram analisados em diversas datas e a diferentes profundidades ao longo dos ensaios, de forma a acompanhar a sua evolução no espaço e no tempo. Essa análise foi complementada com análises das características físico-químicas dos solos e com análises de águas da zona envolvente às parcelas, em poços, piezómetros, água do canal de rega, entre outros. Estes últimos dados não serão apresentados neste relatório dada a limitação de espaço. Os dados obtidos em 26 permitiram verificar de forma clara a influência das práticas agrícolas na qualidade das águas e solos a jusante, com diferenças assinaláveis entre culturas e práticas associadas. 2 LOCAIS E MODALIDADES DE ESTUDO As áreas seleccionadas para os ensaios de campo localizam-se nos Montes da Mancoca e Pinheirinho (cf. Fig. 1). Os trabalhos desenvolvem-se em duas parcelas regadas por aspersão com "center pivot" na área de estudo comum ao projecto RECOQUAR "Rede de Controlo da Qualidade da Água de Rega", em curso no Centro Operativo e de Tecnologia de Regadio (COTR), entre 25 e 27, numa bacia hidrográfica situada na "Infra-estrutura 12" do perímetro de rega do Alqueva (Ferreira do Alentejo). Fig. 1 - Área de estudo, onde se assinalam a vermelho os Montes da Mancoca e do Pinheirinho Estas duas áreas têm as características necessárias pretendidas para a realização dos ensaios, designadamente: Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 2

Condições de campo em termos de culturas previstas e de apoio logístico necessário. Inserção na área de regadio do perímetro de rega de Alqueva. Inserção numa pequena bacia hidrográfica, com possibilidade de acesso a registos dos caudais de jusante da bacia (estação hidrométrica), com infra-estruturas de monitorização de águas subterrâneas (furos e poços) e onde é possível ter acesso aos caudais de rega e fertilizantes aplicados. Solos com características de permeabilidade interessantes para o estudo da migração de iões em profundidade. Possibilidade de acesso aos registos da precipitação e da evapotranspiração na Estação Meteorológica do Outeiro, pelo COTR, a dotações de rega e a quantidade de fertilizantes aplicados. A escolha das modalidades e das culturas instaladas teve em conta as indicações da gestão da rega dadas pelos proprietários das parcelas para a campanha de rega de 26 e está descrita em maior pormenor no 2.º Relatório de Execução Material (cf. Leitão et al., 27). Foram estabelecidas três modalidades nas parcelas experimentais (Quadro 1). Quadro 1 - Modalidades ensaiadas nos trabalhos de campo de 26 Localização Designação Descrição da modalidade Monte da Mancoca MMAFC Milho, com adubação de fundo e cobertura (fertirrigação) Monte do Pinheirinho PMAFLC Milho, com adubação de fundo localizada e cobertura (fertirrigação) PGSAFC Girassol, sem adubação de fundo e sem cobertura O esquema experimental montado nas três áreas regadas, descrito nas próximas secções, teve como objectivo base a colheita de amostras de solo e de águas para análise química ao longo do período de ensaio e em vários locais, dentro e fora das parcelas, embora só as primeiras sejam referidas neste artigo. 3 MATERIAIS E MÉTODOS 3.1 Considerações gerais Os trabalhos específicos realizados neste primeiro ano e meio do projecto, correspondente a metade do tempo do mesmo, apresentados no 2.º Relatório, correspondem ao desenvolvimento das seguintes tarefas: Selecção e caracterização dos locais de estudo e instalação de ensaios de campo em 3 parcelas agrícolas (correspondendo a 2 solos) e respectiva monitorização da evolução da qualidade dos solos e das águas resultante da actividade agrícola, para a cultura do milho e do girassol. Descrição das práticas agrícolas adoptadas, nomeadamente as culturas instaladas, processos de rega e modos de fertilização utilizados. Descrição das metodologias para a caracterização físico-química das parcelas em termos de: o Solos: textura, densidades aparente e real e porosidade, teor de humidade, armazenamento de água no solo e carga hidráulica, desenvolvimento radical, curvas pf, concentração iónica e capacidade de troca catiónica. o Águas: níveis/volumes, parâmetros físico-químicos e concentrações iónicas. Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 3

Descrição do esquema experimental de colheita de dados de qualidade dos solos e das águas, tanto na área circundante às parcelas como no interior das mesmas, relativamente a águas de rega, das valas de drenagem, de escorrência, da zona vadosa e subterrâneas. Análise dos resultados obtidos e sua interpretação preliminar. 3.2 Práticas agrícolas adoptadas A cultura instalada no Monte da Mancoca foi milho para grão, em 29 de Abril, segundo práticas culturais adoptadas pelo agricultor. Para a preparação da cama da semente, o agricultor efectuou uma lavoura de duas gradagens. A cultura previamente instalada no terreno de Inverno anterior havia sido o algodão. Na parcela localizada no Monte do Pinheirinho foram instaladas duas culturas na área regada pela rampa: girassol, com sementeira em 6 de Maio, e milho para silagem com mobilização na zona, em 24 de Maio. A sementeira do milho foi efectuada sobre o restolho da aveia x vícia (cultura instalada no local durante o Inverno). O método de rega utilizado nas duas parcelas é o de aspersão com rampas rotativas (center-pivot). A área regada em cada "pivot" é de cerca de 23 hectares. A água de rega tem origem na barragem de Monte Branco. Em cada uma das parcelas foi respeitada a gestão da rega efectuada tradicionalmente pelo agricultor. No Monte da Mancoca foram realizadas, entre 24 de Maio e 11 de Setembro de 26, 62 regas, num total de 574 mm. No Pinheirinho foram realizadas 77 regas no milho até 4 de Setembro, tendo sido aplicados um total de 63 mm. No girassol, a dotação aplicada foi de 19 mm em 12 regas efectuadas. As datas de rega bem com as dotações aplicadas nas culturas são apresentadas em pormenor no 2.º Relatório. No Monte da Mancoca foi efectuada adubação de fundo aquando da sementeira e fertirega ao longo dos meses de Maio a Julho. No Monte do Pinheirinho, a área cultivada com milho foi regada e fertilizada independentemente do resto da parcela. Salienta-se que não foram aplicados directamente quaisquer produtos fertilizantes ou pesticidas à água de rega do Pinheirinho, girassol, embora tenha havido escorrência superficial da água da cultura do milho, localizada a montante em cotas mais elevadas. 3.3 Caracterização físico-química das parcelas 3.3.1 Solos e desenvolvimento radicular Antes do início dos ensaios de campo de 26 foi efectuada uma amostragem de solos ( -15 cm, 15-3 cm, 3-45 cm, 45-6 cm e 6-75 cm) que teve como objectivo recolher amostras não perturbadas, para a determinação das curvas de tensão-humidade, de densidade aparente e real do solo, de porosidade e amostras de solo perturbadas para análise textural das parcelas a estudar (Fig. 1). Os solos foram, igualmente, recolhidos a diversas profundidades e locais, antes e depois dos ensaios. Cada amostra de solo era formada por 3 sub-amostras, recolhidas em 3 locais próximos à mesma profundidade. As amostras de solos destinaram-se à análise de um conjunto vasto de elementos químicos (iões maiores, fosfatos e nitratos), ph, condutividade eléctrica, entre outros, para estudo da migração dos mesmos em profundidade. Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 4

Fig. 1 - Recolha de monolitos de solo pelos técnicos da Universidade de Évora Para observar e quantificar o desenvolvimento radical da cultura do milho, nas diferentes unidades pedológicas, comparando com a técnica de sementeira e disponibilidade de água no solo, utilizou-se o método do minirizotrão (cf. Fig. 2) utilizado pela Universidade de Évora, com o qual é possível acompanhar as variações temporais e espaciais do desenvolvimento da cultura. O método necessita de um tubo de acesso em acrílico (cf. Fig. 2) que é instalado no solo com uma inclinação de 3º, na linha de cultura. Este tubo permite a observação visual das raízes que o intersectam, recorrendo a um endoscópio (Toureiro, 23). Fig. 2 - Tubo de acesso para o minirizotrão, em acrílico e Endoscópio BTC Minirhizotron Camera Systems 3.3.2 Águas Os locais para a amostragem de águas foram seleccionados tendo em vista a análise dos efeitos dos processos culturais na evolução da sua qualidade ao longo dos ensaios. Esta análise foi efectuada à macro escala, i.e. na área circundante às parcelas e à escala local, i.e. no interior das parcelas. Neste artigo apenas a 2.ª será analisada. A qualidade das águas no interior das parcelas, foi analisada em cada um dos três casos de estudo para (Quadro 2): água de escorrência à superfície do solo (em dois anéis ou talhões de escorrência); água da zona vadosa a três profundidades diferentes (através de seis cápsulas de Teflon, duas a cada profundidade) e na zona saturada, em dois piezómetros localizado a jusante dos ensaios instalados para este estudo em cada uma das duas parcelas. As Fig. 3 a Fig. 5 ilustram a instalação desses equipamentos. Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 5

Quadro 2 - Locais de amostragem de águas no interior das parcelas LOCAL MEIO ANALISADO Mancoca (milho) Água de escorrência (3 locais) Água da zona vadosa (6 locais) Água subterrânea Água de escorrência (3 locais) Água da zona vadosa (6 locais) Água de escorrência (3 locais) Água da zona vadosa (6 locais) Água subterrânea Pinheirinho (milho) Pinheirinho (girassol) INSTRUMENTO DE MONITORIZAÇÃO Anel escorrência 1, 2 e 3 Cápsula 2 x 2; 4 x 2; 6 x 2 Piezómetro Talhão escorrência 1, 2 e 3 Cápsula 2 x 2; 4 x 2; 6 x 2 Anel escorrência 1, 2 e 3 Cápsula 2 x 2; 4 x 2; 6 x 2 Piezómetro Fig. 3 - Anel de escorrência Fig. 4 - Instalação das cápsulas de Teflon no Monte da Mancoca Fig. 5 - Piezómetro para amostragem de água subterrânea Foram registados no local os valores da condutividade eléctrica, ph, Eh e temperatura. Os parâmetros NO2, NO3, PO4, Ca, Mg, Na, K, CO3, SO4, Cl e COT foram analisados mensalmente para a água da zona vadosa através de análises químicas laboratoriais efectuadas pela EGI, Ambiente (http://www.egi.pt/index.php). Para as águas subterrâneas, foram recolhidas uma vez por mês amostras para análise química laboratorial, a maioria das quais foi realizada pelo Departamento de Hidrogeologia do INETI-DH. Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 6

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 Solos e desenvolvimento radicular 4.1.1 Características físicas do solo Os resultados da análise textural dos solos da modalidade MMAFC (Monte da Mancoca) e PMALC (Monte do Pinheirinho), recolhidos em 2 de Fevereiro, e analisados pelo Laboratórios de Hidrologia da Universidade de Évora são apresentados no Quadro 3 e na Fig. 6. Herdade da Mancoca - Monólito 1 Herdade da Pinheirinho - Monólito 4 Pro fu n d id ad e (cm ) 1 2 3 4 5 6 7 8 Granulometria (%) 1 2 3 4 5 6 7 8 Areia grossa (2-.2mm) Areia fina (.2-.2mm) Limo (.2-.2mm) Argila (<.2mm) Pro fu n d id ad e (cm ) 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1 Granulometria (%) 1 2 3 4 5 6 7 8 Areia Grossa (2-.2mm) Areia Fina (.2-.2mm) Limo (.2-.2mm) Argila (<.2mm) Fig. 6 - Percentagem granulométrica de amostras de solo colhidas a diferentes profundidades nos Montes da Mancoca e Pinheirinho Verifica-se que o solo da Mancoca apresenta uma textura essencialmente franco-arenosa nos primeiros 45 cm do horizonte do solo, profundidade a partir da qual surge uma camada mais impermeável de textura franco-argilo-arenosa que passa depois a argilo-arenosa. Esta variação tem como consequência principal a formação de um nível de água localmente muito elevado onde são retidas as águas de rega, com importantes repercussões ao nível da concentração de sais, conforme se verá mais adiante. Profundidade Quadro 3 - Densidade aparente e real do solo de amostras Densidade aparente (g/cm 3 ) Monte da Mancoca Densidade real (g/cm 3 ) Porosidade (%) Densidade aparente (g/cm 3 ) Monte do Pinheirinho (milho) Densidade real (g/cm 3 ) Porosidade (%) -15 1,82 2,49 29,76 1,79 2,59 3,8 15-3 1,8 2,51 2,34 1,8 2,26 2,35 3-45 1,8 2,58 22,24 - - - 45-6 1,78 2,32 26, 1,74 2,41 27,79 6-75 1,78 2,42 28,85 1,86 2,5 25,76 75-9 1,91 - - Em relação ao solo do Pinheirinho, regista-se estarmos em presença de um solo com textura franco- Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 7

argilo-arenoso que passa a argilo-arenoso dos 6 a 75 cm. Em termos gerais, a permeabilidade destes solos é claramente inferior aos da Mancoca, aspecto que dificulta a infiltração das águas e favorece a escorrência superficial. 4.1.2 Características químicas do solo No Quadro 4 apresentam-se os resultados obtidos para a qualidade dos solos antes do início dos ensaios, nos três locais de estudo ensaiados em 26. Quadro 4 - Resultados da qualidade das amostras de solos das três parcelas, antes dos ensaios Data da recolha UTM Prof. Análises químicas efectuadas na EGI, Ambiente mg/kg % Mancoca (milho) 18 Maio cm NO2 NO3 PO4 Ca Mg Na K SO4 Cl CO3 COT 571864-2,24 5 <5, 12 76 12 19 14 <1,35 1, 42946 2-4,28 2 <5, 17 12 16 23 28 <1,35,63 4-6,22 17,2 <5, 19 15 22 21 12 <1,35,4 Pinheirinho (milho) - 2,2 8 <5, 992 49 87 23 12 <1,53,84 2-4,2 42 <5, 52 36 74 16 184 <1,7,6 4-6,2 24 <5, 22 19 15 43 158 <1 1,2,48 Pinheirinho (girassol) 5781-2,2 36 <5, 39 27 87 11 12 <1,7,79 429458 2-4,2 26 <5, 51 32 74 11 12 <1,53,64 4-6,2 22 <5, 75 51 15 14 176 <1,35,39 A Fig. 7 apresenta um gráfico com a variação da qualidade dos solos nas três parcelas para os catiões maiores e os nitratos, para - 2 cm, 2 4 cm e 4 6 cm. 2 18 16 14 22 Profundidades analisadas: - 2 cm 2-4 cm 4-6 cm 12 mg/kg 1 8 6 4 2 NO3 Ca Mg Na K NO3 Ca Mg Na K NO3 Ca Mg Na K Mancoca Pinheirinho (Milho) Pinheirinho (Girassol) Fig. 7 - Resultados da qualidade dos solos para os catiões maiores e nitrato, nas três áreas de estudo, antes da sementeira Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 8

O solo da Mancoca apresenta-se com teores mais elevados de cálcio e magnésio que os solos do Pinheirinho, possivelmente devido ao tipo de solo argiloso original. Contudo, neste estudo não foram feitas análises do tipo de argilas em presença, uma vez que o principal objectivo destas análises prende-se com o estudo da sua evolução antes e depois da cultura. Esta última será efectuada no próximo relatório, após se obterem os resultados das análises de solos, de momento em execução. Os dois solos do Pinheirinho apresentam características diferentes dentro de uma mesma mancha de solo (cf. Fig. 7). Nos solos do Pinheirinho (milho) são notórias as maiores concentrações em catiões e um brusco aumento dos mesmos na camada mais profunda, possivelmente resultante do aumento do teor em argilas com a passagem de um solo franco-argilo-arenoso para um solo argilo-arenoso. É natural que as maiores concentrações nestes elementos se devam também a excedentes de fertilizações anteriores. De facto, os locais de estudo da Mancoca e do Pinheirinho (milho) têm sido habitualmente utilizados para fins agrícolas, pelo que as análises dos solos antes da sementeira contêm já elementos resultantes de culturas anteriores. Um outro aspecto que ressalta da análise da Fig. 7 é o maior teor em nitratos no primeiro horizonte do solo, decrescendo depois em profundidade. As concentrações antes da sementeira revelam-se já bastante elevadas com teores que oscilam entre 17 e 8 mg NO3/kg. 4.1.3 Desenvolvimento radicular Na Fig. 8 são apresentadas imagens das raízes da cultura do milho, captadas através da câmara digital de vídeo da Universidade de Évora, BTC Minirhizotron Camera Systems, a 22 de Agosto, até à profundidade de 3 cm nas modalidades MMAFC (Mancoca, milho, adubação de fundo e cobertura) e PMAFLC (Pinheirinho, milho, adubação de fundo localizada e cobertura). Milho no Monte da Mancoca Milho no Monte do Pinheirinho (mobilização na zona) Fig. 8 - Desenvolvimento radical observado no dia 22 de Agosto de 26 Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 9

Os resultados apresentados na Fig. 8 para a cultura do milho, mostram que a densidade radical verificada aos 3 cm do perfil do solo (horizonte A), se destacou na modalidade MMAFC, face à modalidade PMAFLC, onde se praticou a sementeira com mobilização na zona. A dificuldade de penetração das raízes no perfil do argiloso do solo nesta modalidade fez com que o sistema radical das plantas se desenvolvesse sobretudo na camada superficial, não havendo desta forma uma exploração adequada da água em profundidade. 4.2 Águas 4.2.1 Águas de escorrência O 2.º Relatório de Execução Material (Leitão et al., 27) apresenta os quadros dos resultados obtidos para as águas de escorrência ao longo dos ensaios efectuados em 26. Assinala-se haver diversos hiatos na informação, resultantes da ausência de água nas garrafas ligadas aos anéis de escorrência, aspecto que, em especial para o caso da Mancoca, dificulta a sua interpretação. Em muitos dos casos a ausência de água deveu-se à falta de rega, em especial para o Pinheirinho (girassol), e à rápida infiltração, mas também houve diversos casos em que a ligação entre os anéis e o recipiente para recolha das amostras apresentou problemas não permitindo a recolha de água. Todas as águas de escorrência são maioritariamente básicas. Em relação aos valores de condutividade eléctrica e de concentração em nitratos, apresenta-se a sua evolução ao longo do período de rega para os três casos de estudo: Mancoca - milho e Pinheirinho milho e girassol. Por forma a ter um termo de comparação, projectou-se no gráfico os valores destes dois parâmetros na água de rega sem adição de fertilizantes à água. 3 ms/cm 2.5 2 1.5 16 de Junho de 26 22 de Junho de 26 3 de Junho de 26 4 de Julho de 26 12 de Julho de 26 18 de Julho de 26 28 de Julho de 26 7 de Agosto de 26 18 de Agosto de 26 22 de Agosto de 26 3 de Agosto de 26 7 de Setembro de 26 1.5 Água de Rega Mancoca (Milho) Pinheirinho (Milho) Pinheirinho (Girassol) Fig. 9 - Variação da condutividade eléctrica nos anéis e talhões de escorrência, ao longo período dos ensaios, nos três casos de estudo As Fig. 9 e Fig. 1 apresentam os resultados das médias dos dois anéis ou talhões de ensaio dentro de um mesmo local. Os resultados não são muito explícitos para o caso da Mancoca, dada a falta de amostras. Contudo, para o caso do Pinheirinho é possível observar os efeitos da fertilização no aumento da condutividade eléctrica das águas de escorrência e o efeito da fertirrega aplicada na semana anterior à Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 1

recolha de 3 de Junho. O caso do Pinheirinho girassol, não houve fertilização. Contudo, observa-se, e verificou-se no terreno, haver escorrência superficial de uma parcela para a outra, registando-se alguma subida nos valores da condutividade (cf. Fig. 9). 25 2 15 16 de Junho de 26 22 de Junho de 26 3 de Junho de 26 4 de Julho de 26 12 de Julho de 26 18 de Julho de 26 28 de Julho de 26 7 de Agosto de 26 18 de Agosto de 26 22 de Agosto de 26 3 de Agosto de 26 7 de Setembro de 26 mg/l 1 5 Água de Rega Mancoca (Milho) Pinheirinho (Milho) Pinheirinho (Girassol) Fig. 1 - Resultados da variação do teor em nitratos nos anéis e talhões de escorrência, ao longo período dos ensaios, nos três casos de estudo Para o caso dos nitratos, a Fig. 1 apresenta os resultados obtidos dentro de um mesmo ensaio, também em termos dos valores médios entre os dois anéis ou parcelas. Aqui é evidente o aumento da concentração de nitratos causado pela fertilização, embora nem sempre os aumentos estejam directamente relacionados com os períodos de fertilização, como é o caso das amostras recolhidas a 22 de Agosto com as águas da semana anterior (cf. Leitão et al., 27). De referir que as águas do Pinheirinho (girassol) que apresentam valores mais elevados em nitratos são águas que foram recolhidas nas depressões deixadas pelos rodados do pivot, e não nos anéis de escorrência, pelo que as suas concentrações elevadas se podem dever a uma elevada evaporação da água com consequente concentração de sais. 4.2.2 Águas da zona vadosa O 2.º Relatório de Execução Material (Leitão et al., 27) apresenta os resultados das análises efectuadas semanalmente na água recolhida nas cápsulas instaladas na zona vadosa para os três ensaios. A água foi recolhida a três profundidades, 2, 4 e 6 cm, de acordo com o procedimento atrás referido. Em termos da qualidade global das águas, e em relação à condutividade eléctrica da água, verificase que, na modalidade Mancoca milho, os valores de CE foram os mais elevados e aumentaram ao longo do período de rega em todas as camadas do perfil do solo, atingindo o maior valor (1,79 ms/cm) no caso da amostragem realizada a 7 de Agosto, à profundidade de 6 cm. É, aliás, na camada situada a maior profundidade (6 cm) onde se verificam os valores mais elevados de CE, o que se explica pelo facto dos sais terem sido arrastados para a camada subjacente até atingirem o nível mais impermeável localizado a cerca de 6 cm (cf. Fig. 6). É, ainda, possível observar aos 6 cm uma tendência para a diminuição da condutividade eléctrica depois de 7 de Agosto, numa fase com rega mas já sem quaisquer fertilizações. Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 11

Herdade da Mancoca Cultura do milho 25 de Maio de 26 12 31 de Maio de 26 16 de Junho de 26 Condutividade eléctrica (ms/cm) 1 8 6 4 2 22 de Junho de 26 3 de Junho de 26 4 de Julho de 26 12 de Julho de 26 18 de Julho de 26 28 de Julho de 26 7 de Agosto de 26 18 de Agosto de 26 22 de Agosto de 26 3 de Agosto de 26 2 4 6 Profundidade (cm) 7 de Setembro de 26 13 de Setembro de 26 Condutividade eléctrica (ms/cm) 12 1 8 6 4 Herdade do Pinheirinho Cultura do milho 22 de Junho de 26 3 de Junho de 26 28 de Julho de 26 7 de Agosto de 26 18 de Agosto de 26 22 de Agosto de 26 3 de Agosto de 26 7 de Setembro de 26 13 de Setembro de 26 Condutividade eléctrica (ms/cm) 12 1 8 6 4 Herdade do Pinheirinho Cultura do girassol 25 de Maio de 26 31 de Maio de 26 8 de Junho de 26 16 de Junho de 26 22 de Junho de 26 3 de Junho de 26 4 de Julho de 26 12 de Julho de 26 18 de Julho de 26 28 de Julho de 26 2 2 2 4 6 Profundidade (cm) 2 4 6 Profundidade (cm) Fig. 11 - Variação da condutividade eléctrica na zona vadosa para as três parcelas de ensaio, em 26 Para as parcelas do Pinheirinho, os valores máximos registados para a condutividade eléctrica foram bastante mais baixos, oscilando entre,88 e 1,65 ms/cm, para a parcela do milho, e entre,54 e 1,26 ms/cm, para a parcela do girassol. Nesta última não houve aplicação directa de fertilizantes e/ou de rega, mas apenas as escorrências superficiais da parcela do milho localizada a montante. Observa-se que os valores de CE nestas duas parcelas são, geralmente, mais elevados nos primeiros centímetros do solo, possivelmente devido à sua menor capacidade de infiltração em comparação com os solos da Mancoca, permitindo maior disponibilidade para a evapotranspiração da água, com consequente acumulação de sais. Em relação à variação de SAR (razão adsorção sódio) e de ESP (% de sódio de troca) na Mancoca (milho), os valores obtidos variaram entre 2,54 e 6,55 meq/l, e entre 28,89 e 54,61 %, respectivamente. Para o caso do Pinheirinho (milho) estes valores oscilaram entre 1,5 e 2,89 meq/l, e entre 23,19 e 55,68 %, respectivamente. Finalmente, para a parcela de ensaio do Pinheirinho (girassol) estes valores variaram entre 1,82 e 3,1 meq/l, e entre 35,58 e 55,68 %, respectivamente. A Fig. 12 apresenta uma projecção dos valores do índice SAR para todas as águas da zona vadosa. Da análise da Fig. 12 é possível observar que as águas da zona vadosa da Mancoca são as menos adequadas em termos das características desejáveis para a água de rega. Obviamente estas águas apresentam estas concentrações em catiões por se encontrarem logo abaixo da área de rega. Nesse mesmo contexto, as águas mais adequadas à rega são as do Pinheirinho girassol, onde não foi efectuada nenhuma fertilização. Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 12

Perigo de Alcalinização do Solo 2 3 4 Baixo Médio Alto Índice de Adsorção de Sódio (SAR 32 3 28 26 24 22 2 18 16 14 12 1 8 6 4 2 C1S4 C1S3 C1S2 C1S1 C2S4 C2S3 C2S2 C2S1 C3S4 C3S3 C3S2 C3S1 1 25 75 225 5 Condutividade em µs/cm a 25ºC Perigo de Salinização do Solo C4S4 C4S3 C4S2 C4S1 1 2 3 4 Baixo Médio Alto Muito Alto Fig. 12 - Valores do índice SAR das águas da zona vadosa num diagrama de aptidão das águas para uso agrícola Em relação aos restantes parâmetros medidos na água da zona vadosa, pode dizer-se que é na cultura do milho da Mancoca que se observam maiores concentrações para as águas da zona vadosa, quer em catiões quer em aniões. A comparação da qualidade das águas dos três locais nem sempre é fácil devido à falta de amostras em diversas datas. Leitão et al. (27) apresentam de forma mais detalhada os resultados obtidos para todos os parâmetros medidos. Neste artigo, optou-se por seleccionar os nitratos para análise dessa variação. Nitratos (mg/l) 6 55 5 45 4 35 3 25 2 15 1 5 Herdade da Mancoca Cultura do milho NO3 2 4 6 Profundidade (cm) 25-5-26 16-6-26 22-6-26 28-7-26 7-8-26 3-8-26 7-9-26 13-9-26 Nitratos (mg/l) 6 55 5 45 4 35 3 25 2 15 1 5 Herdade da Pinheirinho Cultura do girassol NO3 2 4 6 Profundidade (cm) 25-5-26 16-6-26 22-6-26 18-7-26 7-8-26 3-8-26 6 55 Herdade do Pinheirinho Cultura do milho NO3 5 45 Nitratos (mg/l) 4 35 3 25 2 15 1 5 2 4 6 7-9-26 Fig. 13 - Variação das concentrações em nitratos na zona vadosa, a três profundidades, ao longo período dos ensaios, para o ensaio da Mancoca e os do Pinheirinho Profundidade (cm) Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 13

É notório o aumento de nitratos ao longo do ciclo da cultura, aspecto que não é observado nos ensaios do Pinheirinho, com base nas amostras que foi possível recolher. Nas águas da Mancoca, as maiores concentrações observam-se aos 6 cm, facto que não se observa para os ensaios do Pinheirinho (girassol) de uma forma tão clara, embora tenha sido a essa profundidade que foram registados os valores mais elevados. No ensaio da cultura do Pinheirinho, milho, apenas foi possível recolher água no final do ciclo da cultura e aos 2 cm e os resultados obtidos denotam concentrações relativamente baixas para a maioria dos iões analisados. 4.2.3 Águas subterrâneas O 2.º Relatório de Execução Material (Leitão et al., 27) apresenta em detalhe os resultados obtidos para a qualidade das águas subterrâneas nos dois piezómetros instalados a jusante das parcelas de ensaio na Mancoca e no Pinheirinho. A maioria das análises químicas dos iões maiores e nitratos foram efectuadas pelo INETI, embora se tivessem feito algumas análises extra na EGI, Ambiente, laboratório encarregue de realizar as análises nas cápsulas. Neste artigo apenas se apresentam os resultados relativos à condutividade eléctrica e aos nitratos. A Fig. 14 apresenta uma projecção dos seus iões maiores num diagrama de Piper. Tratam-se de águas com fácies cloretada sódica, mas também cálcica e magnesiana. SO 4 + 6 Cl 4 2 8 8 6 Ca + 4 Mg 2 2 2 4 4 2 Mg 4 6 8 2 Na 6 4 + K 6 8 8 8 CO 3 6 + HCO 3 4 8 6 4 2 2 4 6 8 Ca Cl 8 6 2 8 6 4 SO 4 2 Fig. 14 - Diagrama de Piper para as águas subterrâneas das duas parcelas de ensaio, na Mancoca (triângulos) e no Pinheirinho (circunferências) Como se pode verificar da análise da Fig. 15 são águas com condutividades eléctricas extremamente elevadas, denotando-se uma variação dos seus valores durante o período de ensaio no caso da Mancoca e um decréscimo dos mesmos para o Pinheirinho. Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 14

7 3 de Maio 25 de Maio de 26 6 28 de Maio de 26 31 de Maio de 26 6 de Junho de 26 5 8 de Junho de 26 16 de Junho de 26 22 de Junho de 26 3 de Junho de 26 CE (ms/cm) 4 3 4 de Julho de 26 12 de Julho de 26 18 de Julho de 26 28 de Julho de 26 1 de Agosto de 26 7 de Agosto de 26 18 de Agosto de 26 2 22 de Agosto de 26 3 de Agosto de 26 7 de Setembro de 26 1 13 de Setembro de 26 1 de Outubro de 26 16 de Novembro de 26 Mancoca Pinheirinho 17 de Novembro de 26 Fig. 15 - Variação da condutividade eléctrica nas águas subterrâneas ao longo do período dos ensaios A Fig. 16 apresenta a variação do ião nitrato ao longo dos ensaios. São claros os efeitos da variação da concentração dos nitratos por aplicação de fertilizantes, com cerca de 1 a 2 meses de tempo de chegada aos piezómetros desde a data da sua aplicação. 25 3 de Maio 25 de Maio de 26 28 de Maio de 26 2 31 de Maio de 26 6 de Junho de 26 8 de Junho de 26 16 de Junho de 26 15 22 de Junho de 26 3 de Junho de 26 NO3 (mg/l) 4 de Julho de 26 12 de Julho de 26 18 de Julho de 26 1 28 de Julho de 26 1 de Agosto de 26 7 de Agosto de 26 18 de Agosto de 26 5 22 de Agosto de 26 3 de Agosto de 26 7 de Setembro de 26 13 de Setembro de 26 1 de Outubro de 26 NO3 NO3 16 de Novembro de 26 17 de Novembro de 26 Mancoca Pinheirinho Fig. 16 - Variação das concentrações em nitrato nas águas subterrâneas ao longo do período dos ensaios 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O artigo que se apresenta sintetiza alguma da informação obtida em relação a ensaios de duas culturas, de milho e de girassol, realizados em três parcelas regadas, uma no Monte da Mancoca e as outras duas no Monte do Pinheirinho. Este trabalho insere-se nos objectivos mais vastos de um projecto POCI e visa obter a informação necessária para integrar o conhecimento dos diferentes processos que Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 15

interferem na migração dos poluentes de origem agrícola (fertilização de solos), para diferentes meios atravessados pela água de rega: solos, zona vadosa e águas subterrâneas. Estes meios foram analisados em diversas datas e a diferentes profundidades ao longo dos ensaios, de forma a acompanhar a sua evolução no espaço e no tempo. Essa análise foi complementada com análises das características físicoquímicas dos solos e com análises de águas da zona envolvente às parcelas, em poços, piezómetros, água do canal de rega, entre outros. Os dados obtidos em 26 permitiram verificar de forma clara a influência das práticas agrícolas na qualidade das águas e solos a jusante. Durante o próximo ano, essa informação e a nova informação a recolher - novos ensaios integrando novas culturas e tipos de solo, bem como outros processos de irrigação - será trabalhada com maior detalhe, designadamente através da modelação numérica dos dados e da optimização da melhor ocupação do solo para a região estudada com recurso a modelos de apoio à decisão. Do conjunto de resultados a obter e do seu tratamento, espera-se vir a poder consubstanciar informação suficiente para apontar a utilização futura de culturas mais sustentáveis e de melhores práticas agrícolas. AGRADECIMENTOS O trabalho que se apresenta foi realizado no âmbito do projecto POCI/AGR/57719/24, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia a quem se agradece. Agradece-se às várias pessoas que têm colaborado com os autores deste artigo no trabalho de campo e de laboratório, nomeadamente: (1) aos agricultores senhores Manuel Duarte e Guiomar pela autorização de utilização das suas parcelas regadas e pelo apoio prestado; (2) aos Senhores Custódio Alves e José Lobato Condeças, Técnicos da Universidade de Évora, por todo o apoio prestado na instalação dos piezómetros e na recolha de amostras de solos; (3) aos técnicos do COTR, Engenheiros Luís Miguel Boteta e Hilário Catronga pelo apoio na instalação dos piezómetros e na cedência de informação sobre as datas, dotações de rega e fertilizações; (4) aos técnicos do Laboratório de Solos e Laboratório de Hidrologia da Universidade de Évora, pela realização dos ensaios de caracterização textural, de densidades do solo, de porosidade e de teor de humidade e (5) ao Dr. Eduardo Paralta, colega do IST a colaborar neste projecto, pelo apoio de campo e acompanhamento de parte dos trabalhos de monitorização das águas subterrâneas. BIBLIOGRAFIA Leitão, T.E., Laranjeira, I., Henriques, M.J. e Paralta, E., 27 - Metodologias para um Melhor Planeamento e Gestão do Uso do Solo Agrícola Atendendo à Vulnerabilidade dos Aquíferos à Poluição Difusa. Relatório de Execução Material de 26. Projecto FCT n.º POCI/AGR/57719/24, 57 pp. Toureiro C.M., 23 - Uma estratégia para apoiar a implementação de um sistema de avisos de rega aos agricultores. Actas das comunicações apresentadas no Seminário "Conservação do solo e da água em regadio: investigação, experimentação e divulgação" no auditório do Instituto Politécnico de Beja. Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos 16