MOBILIDADE E POBREZA



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Instituto de Desenvolvimento e Informação em Transporte MOBILIDADE E POBREZA Região Metropolitana de São Paulo Novembro de 2003 DOCUMENTO PARA DISCUSSÃO Sujeito a revisão e complementação Favor não publicar ou reproduzir

2 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e de inteira responsabilidade do ITRANS Instituto de Desenvolvimento e Informação em Transporte, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista dos Patrocinadores, Parceiros ou Colaboradores.

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 3 ÍNDICE SUMÁRIO EXECUTIVO... 5 1. INTRODUÇÃO... 7 2. OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS DE PESQUISA... 9 2.1 - Objetivos... 9 2.2 - Procedimentos de pesquisa... 9 3. PROBLEMAS DE MOBILIDADE DA POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA... 11 3.1 - Baixos índices de mobilidade. Características gerais dos deslocamentos... 11 3.2 - Mobilidade para procurar trabalho...15 3.3 - Mobilidade para trabalhar... 19 3.4 - Mobilidade para o lazer e a integração social... 24 3.5 - Mobilidade para escola e equipamentos de saúde... 26 3.6 - Deslocamentos para fora da Região Metropolitana... 27 3.7 - A percepção dos problemas e as soluções para o transporte... 28 ANEXO METODOLÓGICO... 30 ANEXO DE DADOS... 33

4 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 5 SUMÁRIO EXECUTIVO Este relatório apresenta uma síntese dos resultados do estudo sobre Mobilidade e Pobreza para a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Seu objetivo é caracterizar os atuais problemas de mobilidade e as condições de acesso aos serviços de transporte coletivo pelas populações de baixa renda, a fim de conscientizar as lideranças da sociedade sobre a gravidade dos problemas da mobilidade e, desta forma, induzir políticas públicas e ações sustentáveis para a sua solução. Baixos índices de mobilidade dos pobres. Os especialistas em transporte costumam medir a mobilidade das pessoas dentro de uma cidade pelo número médio de deslocamentos que elas fazem durante um dia. Na RMSP, como em outras cidades, a mobilidade guarda uma forte relação com a renda, ou seja, quanto maior a renda, maior a mobilidade da população. No caso da população mais pobre, os reduzidos índices de mobilidade observados (0,73 viagem por dia por pessoa, enquanto os não-pobres apresentam um índice médio de mais de duas viagens por dia) representam a privação de atividades importantes, como as viagens por motivo trabalho e dificuldades de acesso a serviços básicos como educação, saúde e outros. Nos dias úteis (de segunda a sexta feira) o índice de mobilidade aumenta um pouco, para 0,88, mas cai consideravelmente nos finais de semana, para 0,35. Na RMSP os mais pobres se deslocam principalmente por ônibus ou a pé e seus principais motivos de deslocamento são para o trabalho e procurar emprego. As viagens para procurar trabalho são o principal problema de mobilidade da população de baixa renda da RMSP. Em cerca de 43% das famílias pesquisadas há pessoas que declaram haver perdido oportunidades devido ao alto valor das passagens de transporte coletivo ou à insuficiência de oferta. Convivendo com taxas de desocupação muito elevadas, essas pessoas enfrentam sérias dificuldades para se deslocar na procura de emprego. As freqüentes desistências de procurar por trabalho parecem estar relacionadas também a esse fator. Por outro lado, os desocupados quase não utilizam auxílios para deslocamentos (por falta ou por dificuldade de ter acesso a eles). Além disso, os desocupados que necessitam de mais de dois vales-transporte por dia são penalizados em suas pretensões de conseguir trabalho pela exigência dos empregadores de só aceitarem candidatos que não excedam esse limite. O motivo é o custo crescente do benefício para os empregadores. Graves problemas estão ocorrendo na mobilidade para o trabalho. Como as oportunidades de trabalho estão geralmente afastadas das áreas onde residem as populações de baixa renda, os deslocamentos com motivo trabalho - que são essenciais - exigem a utilização de um meio motorizado, geralmente o transporte coletivo, uma vez que a propriedade e o uso de veículos privados são insignificantes no meio da população pobre da RMSP. Com os aumentos de tarifas observados na última década, associados à queda acentuada nos rendimentos da população a partir de 1998, o uso do transporte coletivo está comprometendo cada vez mais os minguados orçamentos familiares e levando as pessoas a andar mais a pé para economizar o valor da passagem ou a utilizar-se de vários expedientes - alguns ilegais - para enfrentar o problema. As deficiências nos serviços são fator tão ou mais importante do que o aumento das tarifas, destacando-se os longos tempos de espera nos pontos de parada e a distância excessiva destes em relação aos domicílios.os trabalhadores de baixa renda também pouco se valem dos auxílios existentes para o transporte, entre eles do vale-transporte, pois, na sua maioria, têm ocupações informais que não dá direito ao

6 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo benefício. Em outras palavras, o subsídio do vale-transporte não está sendo eficaz para minorar os gastos de mobilidade da população de baixa renda. O lazer e as relações sociais com parentes e amigos são importantes para aliviar as tensões dos grandes centros urbanos e, sobretudo, para manter as redes de solidariedade e de contatos, sem as quais as muitas pessoas de baixa renda não teriam como aproveitar as já reduzidas oportunidades de trabalho. O alto valor das tarifas do transporte coletivo e as condições inadequadas da oferta de serviços, principalmente nos finais de semana, estão impondo barreiras severas a esse tipo de mobilidade. As viagens com finalidade educacional e de atendimento ambulatorial de saúde são as que, em linhas gerais, menos apresentam problemas. Isso se deve ao fato dessas redes de serviços públicos terem se expandido, atendendo à maioria dos núcleos de população de baixa renda. Mas os problemas ainda são graves no tocante ao atendimento especializado, como, por exemplo, os atendimentos continuados e de emergência na área de saúde. A mobilidade para outras cidades fora da RMSP é pouco expressiva. Os altos valores das passagens relacionados com a baixa renda, mais uma vez, parecem ser os principais fatores desse fenômeno. Problemas e sugestões. O transporte é apontado como um dos principais problemas dos bairros onde residem populações de baixa renda na RMSP. Essa constatação foi feita também nas demais regiões metropolitanas pesquisadas. Entre as principais sugestões que a população dá para facilitar os deslocamentos, minimizar problemas ou ampliar o acesso ao transporte destaca-se o aumento da quantidade de ônibus (maior freqüência), seguida da pavimentação de ruas para que os ônibus possam entrar nos bairros carentes e da redução do preço das passagens.

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 7 1. INTRODUÇÃO Este relatório apresenta uma síntese dos resultados do estudo sobre Mobilidade e Pobreza para a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Na sua abrangência maior, a pesquisa cobre, além da RMSP, as regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife. Os estudos estão sendo realizados pelo ITRANS - Instituto de Desenvolvimento e Informação em Transporte, com colaboração de seus parceiros, desde maio de 2003, prevendo-se o término para dezembro desse ano. O ITRANS é uma organização não-governamental sem fins lucrativos, comprometida com o desenvolvimento do transporte coletivo. Sua missão é conhecer as necessidades de mobilidade das populações urbanas, principalmente as de baixa renda, e agir junto às comunidades e agências governamentais e privadas visando ao seu atendimento pelo transporte coletivo. É certificado pelo Ministério da Justiça, desde março de 2001, como uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), nos termos da Lei Federal no. 9790 de 23/03/1999. Em agosto foi divulgado um primeiro relatório sobre a mobilidade das populações de baixa renda, baseado em pesquisas qualitativas (grupos focais) e nos dados e análises de fontes secundárias como o IBGE - PNAD 2001 e o IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada 1. Na etapa atual, estão sendo realizadas análises dos problemas e padrões de mobilidade urbana das populações mais pobres separadamente para cada uma das quatro regiões metropolitanas pesquisadas. Essas análises têm como principal fonte de dados as pesquisas domiciliares por amostragem desenvolvidas entre junho e julho de 2003, mas incorporam também as informações anteriormente obtidas nas pesquisas qualitativas e em fontes secundárias, algumas mais atualizadas do que as disponíveis na etapa inicial do projeto. O foco dos estudos é a população urbana residente em domicílios com renda familiar igual ou inferior a três salários mínimos mensais, o que corresponde a R$ 720,00. Atualmente, esse segmento é minoritário no transporte coletivo das metrópoles nacionais - entre elas São Paulo - embora represente cerca de 45% da população urbana brasileira. Na RMSP, a população com renda familiar inferior a três salários mínimos representava, em 2001, cerca de 26,7% da população total da região, ou seja, em torno de 4,6 milhões de habitantes (IBGE - PNAD 2001). Dentro desse segmento, a maioria dos dados sobre mobilidade foi obtida para a população com idade acima de 9 anos, estimada em 3.455.000 habitantes (75,6%) na RMSP. 1 ITRANS - Mobilidade e Pobreza, Relatório Preliminar, Brasília, agosto de 2003. Para obter esse relatório, entre em contato com o ITRANS pelo telefone (61) 327-2178 ou pelo site http://www.itrans.org.br.

8 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo Se a pesquisa tem como referência importante a utilização do transporte coletivo e o segmento populacional nela visado é minoritário entre os usuários de sistemas desse tipo, por que focalizar a mobilidade da população de baixa renda? Há três razões para isso: a) Esse é o grupo mais vulnerável da população urbana, que dispõe de menos alternativas de transporte e que, provavelmente, é o mais afetado negativamente na sua condição de vida pelos problemas de acesso ao emprego, aos serviços públicos essenciais e às oportunidades de lazer e integração social; b) É nesse grupo que se encontra o maior potencial para o desenvolvimento do transporte coletivo, apesar de ser baixa capacidade de pagamento pelos serviços (entre as pessoas das classes B e C, que têm maior a capacidade de consumo, há uma forte propensão para o aumento da propriedade de automóveis privados e, portanto, para redução no uso do transporte coletivo); c) Melhorias nas condições de mobilidade desse grupo social têm impacto na redução da pobreza.

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 9 2. OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS DE PESQUISA 2.1 - Objetivos O objetivo desse relatório é caracterizar os problemas de mobilidade e as condições de acesso aos serviços de transporte coletivo pelas populações de baixa renda na Região Metropolitana de São Paulo. Esses resultados estão sendo levados às lideranças da sociedade por meio da mídia nacional e regional, de seminários e de documentos impressos, a fim de criar uma consciência a respeito da gravidade dos problemas da mobilidade e, desta forma, induzir políticas públicas e ações sustentáveis para a sua solução. 2.2 - Procedimentos de pesquisa O projeto Mobilidade e Pobreza é mais do que uma pesquisa. Ao lado das atividades técnicas, o projeto envolve uma série de ações ligadas à divulgação dos estudos e ao debate de suas conclusões. São notícias na imprensa em geral, veiculação de informações por meio de uma página própria do projeto na Internet (www.itrans.org.br), divulgação de relatórios técnicos e seminários. O componente de divulgação é fundamental uma vez que um dos objetivos do projeto é conscientizar a sociedade para a necessidade de ações consistentes visando a solução dos problemas de mobilidade da população de baixa renda. O público visado nessas ações vai além da comunidade técnica ligada aos transportes urbanos, compreendendo lideranças comunitárias nos planos político, sindical, social (organizações não-governamentais, entidades de defesa do consumidor, associações comunitárias etc.), judicial (Poder Judiciário, Ministério Público) etc. Para a obtenção de dados e informações, três tipos de levantamentos foram realizados: a) Pesquisas qualitativas, utilizando a técnica de grupos focais Este método consiste em reunir grupos de pessoas semelhantes às que existem na população-alvo, visando obter informações sobre um determinado tema, no caso a mobilidade urbana. Os grupos, com cerca de dez pessoas escolhidas por suas características de classe, idade, sexo, educação etc., se reúnem sob condução de um moderador. A conversa é observada e registrada. A partir da análise desses registros, os especialistas tiram importantes conclusões sobre suas opiniões, comportamentos, percepções, etc. Esses resultados permitem aprofundar o conhecimento do tema, mas não podem ser estatisticamente expandidos para toda a população. Na RMSP foram ouvidos dois grupos (um de jovens e outro de adultos), cada um com 10 a 12 pessoas, com igual número de homens e mulheres.

10 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo b) Pesquisas quantitativas, por questionário, em amostras de domicílios. Um questionário foi aplicado a amostras de domicílios representativos da população-alvo a ser estudada, com a finalidade de quantificar os padrões de mobilidade observados na pesquisa qualitativa. Esse tipo de pesquisa permite obter estatísticas com uma razoável margem de precisão. Na RMSP foram pesquisados cerca de 400 domicílios sorteados em zonas que apresentam renda média do chefe da família igual ou inferior a 2,5 salários mínimos mensais (com base nos dados do último Censo Demográfico do IBGE). Nessa amostra predominam indivíduos com renda média mensal familiar abaixo de 3 salários mínimos, segmento visado no estudo. c) Levantamentos de dados em fontes secundárias Além das fontes primárias, foram processados e analisados dados de pesquisas já realizadas, tais como a PNAD - Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar (2001) e os censos, ambos do IBGE, e a Pesquisa de Origem-Destino do Metrô de SP. Os estudos do IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada sobre pobreza e mobilidade urbana estão também entre as principais fontes de informação. No Anexo encontram-se mais detalhes sobre a metodologia de pesquisa adotada.

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 11 3. PROBLEMAS DE MOBILIDADE DA POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA 3.1 - Baixos índices de mobilidade. Características gerais dos deslocamentos Os especialistas em transporte costumam medir a mobilidade das pessoas dentro de uma cidade pelo número médio de deslocamentos que elas fazem durante um dia. Em geral essa medida é feita somente para pessoas acima de 10 anos de idade, pois os menores abaixo desse limite são dependentes dos adultos nos seus deslocamentos. Na RMSP, como em outras cidades, a mobilidade guarda uma forte relação com a renda (quanto maior a renda, maior a mobilidade da população). No caso da população de baixa renda, os reduzidos índices de mobilidade observados representam a privação de atividades importantes, como as viagens por motivo trabalho, compras e lazer, e dificuldades de acesso a serviços básicos como educação, saúde e outros. Os pobres na RMSP se deslocam principalmente por ônibus ou a pé e seus principais motivos de deslocamento são para o trabalho e procurar emprego. A mobilidade dos homens é muito mais alta do que das mulheres. A julgar pela reduzida taxa de motorização e pela quantidade pequena de deslocamentos em veículos próprios, a população com renda familiar igual ou inferior a 3 salários mínimos mensais na RMSP é fortemente dependente do transporte coletivo ou de meios nãomotorizados. Mobilidade e renda Medidas de mobilidade feitas em todo o mundo mostram que a renda (familiar ou individual) influi muito na movimentação das pessoas. Ou seja, os mais ricos se locomovem bem mais do que os pobres. Em São Paulo, por exemplo, as pessoas com renda familiar acima de 20 salários mínimos mensais faziam, em média, 3 deslocamentos por dia em 2002 (Pesquisa O-D do METRÔ-SP). A pesquisa do ITRANS 2 mostra que, no outro extremo da escala social, as pessoas com renda familiar abaixo de 3 salários mínimos mensais fazem, em média, menos de 1 deslocamento por dia (mais precisamente 0,73), ou seja, menos de 1/3 de viagens dos segmentos que detém os maiores rendimentos. Ressalte-se que, na pesquisa do Itrans, não foram apuradas as viagens a pé com duração inferior a 15 minutos. 2 Vale destacar que na pesquisa do ITRANS foram excluídas as viagens a pé com duração inferior a 15 minutos.

12 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo Gráfico 1 Região Metropolitana de São Paulo ÍNDICE DE MOBILIDADE POR MODO DE TRANSPORTE E RENDA MENSAL FAMILIAR 2002 Índice de mobilidade (viagens dia/hab) 3,5 3,0 2,5 2,0 1,5 1,0 0,5 0,0 até 1 1 a 2 2 a 3 3 a 5 5 a 8 8 a 12 12 a 20 m ais de 20 Individual A Pé Coletivo Renda Mensal Familiar (em salários mínimos) Fonte:M etrô-sp(pesquisa Origem e D estino,2002) Evidentemente, o excesso de movimentação não é um objetivo social e individualmente desejável. Mas, no caso da população de baixa renda, os reduzidos índices de mobilidade quase sempre representam privação de atividades importantes, como as viagens para o trabalho, procura de emprego, compras e lazer, e de acesso aos serviços básicos como educação, saúde e outros. A Tabela 1 apresenta alguns índices de mobilidade da população de baixa renda constatados pela pesquisa. Tabela 1 REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO População com renda familiar abaixo de 3 SM mensais Índices de mobilidade Número médio de deslocamentos por habitante/dia 1 Especificações Índice de mobilidade Por dia da semana Dias úteis (seg. a sex.) 0,88 Sábados e domingos 0,35 Por gênero (dias úteis) Ambos 0,88 Homens 1,12 Mulheres 0,65 Por faixa etária (dias úteis) 10 a 15 anos 0,58 16 a 24 0,92 25 a 65 0,98 acima de 65 0,38 Por condição de ocupação (dias úteis) Sem ocupação 0,47 Trabalha - ocupação formal 1,91 Trabalha - ocupação informal 1,17 Estudantes 0,74 (1) População com 10 anos e mais de idade. Excluídos deslocamentos a pé com duração inferior a 15 minutos

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 13 Os dados permitem concluir que, em primeiro lugar, os índices de mobilidade da população estudada são muito baixos e, conforme o que se apurou nas pesquisas qualitativas, eles significam a privação de necessidades sociais importantes, como se verá ao longo deste relatório. O índice médio de mobilidade de 0,73 significa menos de uma viagem por pessoa ao dia. Nos dias úteis (de segunda a sexta feira) esse indicador aumenta para 0,88, mas cai consideravelmente nos finais de semana, para 0,35. Ressalte-se que, na pesquisa, não foram apuradas as viagens à pé com duração inferior a 15 minutos. Mobilidade, gênero e idade A mobilidade média das mulheres (0,65 nos dias úteis) é muito inferior à dos homens (1,12). Isso reflete, em parte, o fato de muitas mulheres ainda estarem fora da população economicamente ativa. Mas, reflete também o alto índice de desocupação entre as mulheres que estão procurando trabalho, contingente que vem crescendo muito nas últimas décadas. Enquanto os homens se deslocam mais por motivo trabalho (ida ao trabalho e procura de emprego), as mulheres apresentam maior incidência de respostas nos motivos estudo, saúde e cultos religiosos. As mulheres, em seus deslocamentos cotidianos, também andam mais a pé do que os homens. Ressalte-se que as mulheres são maioria na população pesquisada (cerca de 52%) e também um dos segmentos mais vulneráveis à situação de pobreza extrema, já que elas têm menos oportunidades de trabalho e menores rendimentos, quando comparadas aos homens, e por acumularem a responsabilidade pelas crianças. A mobilidade por faixa etária obedece ao padrão esperado, crescendo dos mais jovens até os 64 anos de idade e diminuindo entre os idosos. Por sua vez, os idosos, acima de 65 anos, representam menos de 4% do total. Entre os motivos de deslocamento para os adolescentes (de 10 a 15 anos), prevalece a escola, onde a maioria das viagens é feita a pé. Para a faixa de 16 a 24, predominam a procura de trabalho, pois esta faixa é a mais vulnerável ao desemprego. Para os adultos, entre 25 e 64 anos, o principal motivo de viagem é para o trabalho. Para os idosos, predominam as viagens por motivo saúde e culto, estas acontecem, principalmente, nos finais de semana. Distribuição dos deslocamentos por motivos A distribuição dos deslocamentos por motivos, apresentada no Gráfico 2 3, revela ao menos uma característica diferente das que se observa para a população urbana como um todo. A quantidade de viagens para procurar trabalho é elevada, embora o número absoluto de deslocamentos com essa finalidade esteja muito aquém do que se poderia esperar, tendo em vista o alto índice de desocupação da população em estudo. Isso se deve às dificuldades financeiras que as pessoas sem ocupação encontram para sair à procura de trabalho. 3 O dados relativos aos gráficos constam das tabelas no Anexo de Dados

14 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 60,0% Gráfico 2 Região Metropolitana de São Paulo DISTRIBUIÇÃO DOS DESLOCAMENTOS POR MOTIVO NOS DIAS ÚTEIS (EM %) DA POPULAÇÃO COM RENDA FAMILIAR INFERIOR A TRÊS SALÁRIOS MÍNIMOS 50,0% 40,0% 30,0% 20,0% 10,0% 0,0% Trabalhar Estudar Procurar trabalho Visitar parentes ou amigos Ir ao médico ou posto de saúde Fazer compras de alimentação Ir à igreja ou culto Levar filhos na escola ou creche Outros motivos Distribuição de deslocamentos por modos Conforme se vê no Gráfico 3, os principais modos de deslocamento desta população são o ônibus e as caminhadas (com duração acima de 15 minutos), seguido do uso dos lotações (vans e peruas) e trens. A utilização do metrô e da bicicleta é quase insignificante. As principais razões para o uso dos ônibus são: rapidez; falta de opção e segurança. Para os deslocamentos a pé, as principais razões são fazer economia e falta de dinheiro. 60,0% Gráfico 3 Região Metropolitana de São Paulo DISTRIBUIÇÃO DOS DESLOCAMENTOS POR MODO DE TRANSPORTE NOS DIAS ÚTEIS (EM %) DA POPULAÇÃO COM RENDA FAMILIAR INFERIOR A TRÊS SALÁRIOS MÍNIMOS 50,0% 40,0% 30,0% 20,0% 10,0% 0,0% Ônibus municipal A pé (mais de 15 minutos) Lotação (van, kombi ou perua) Trem Carro próprio Metrô Ônibus metropolitano Integração ônibus-ônibus Bicicleta Integração metrô-ônibus Motocicleta própria Outros

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 15 Propriedade de automóveis e mobilidade Nos domicílios de baixa renda da RMSP, a propriedade de automóveis é muito baixa. A taxa de motorização (veículos por habitante) está em torno de 0,15, mas, ainda assim, coloca-se bem acima das outras regiões metropolitanas estudadas. Na Região Metropolitana de Recife (RMR), por exemplo, a taxa de motorização não passa de 0,01 e na Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ) ela está em torno de 0,06. Tendo em vista essa taxa, a participação insignificante dos deslocamentos por veículos próprios na distribuição modal sugere que muitas famílias usam seus carros (geralmente com idade avançada) apenas nos finais de semana, para passear com a família, uma vez que, por transporte coletivo, esse tipo de viagem em grupo sairia bem mais cara. Habitantes de favelas e áreas informais Os favelados e moradores de áreas informais (setores subnormais), são o grupo da população que mais viaja a pé, tanto pela carência de oferta de serviços nestas áreas, quanto pela dificuldade de arcar com os custos das tarifas. Das viagens a pé apuradas na pesquisa, 61,3% são de moradores em habitações subnormais e 38,7% de moradores em residências normais. 3.2 - Mobilidade para procurar trabalho Estão nessa área, sem dúvida, os principais problemas de mobilidade da população de baixa renda da RMSP. Convivendo com taxas de desocupação muito elevadas, as pessoas enfrentam sérias dificuldades para se deslocar na procura de emprego. As freqüentes desistências de procurar por trabalho parecem estar relacionadas também a esse fator. Por outro lado, os desocupados quase não utilizam auxílios para deslocamentos (por falta ou por dificuldade de ter acesso a eles). Além das dificuldades para se deslocar - que têm muito a ver também com a oferta de transporte, além das altas tarifas - os desocupados que necessitam de mais de dois vales-transporte por dia são penalizados em suas pretensões de conseguir trabalho pela exigência dos empregadores de só aceitarem candidatos que não excedam esse limite. O motivo é o custo crescente do benefício para os empregadores. Alta taxa de desocupação A taxa de desocupação da população com renda familiar inferior a 3 salários mínimos mensais é alta, acima que na média de todas as classes de renda: 27,8% da população economicamente ativa da RMSP nessa classe de renda não têm uma ocupação, seja formal ou informal 4 (ver Tabela 2). 4 Os conceitos relacionados a trabalho e ocupação na pesquisa Mobilidade e Pobreza são semelhantes aos usados pelo IBGE na PNAD (Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar). Entretanto, como a pesquisa do ITRANS não foi dimensionada especificamente para esse tipo de levantamento, deve-se evitar comparações dos resultados obtidos com os do Instituto governamental. Além do mais, os dados sobre trabalho e ocupação da PNAD-2002 não são apresentados por faixas de renda mensal familiar, o que dificulta uma comparação precisa (os dados do ITRANS referem-se à população com renda mensal familiar inferior a 3 salários mínimos). Para o conjunto da população urbana e rural do Brasil, como um todo, a PNAD - 2002 revela taxas de desocupação que variam entre 6,3% (Região Sul) e 10,8 (Região Sudeste).

16 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo Tabela 2 REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO População com renda familiar abaixo de 3 SM mensais Dados relativos a trabalho e ocupação Informações % Indicadores de condição de atividade (%) Taxa de atividade 1 55,2 Taxa de desocupação 2 27,8 Distribuição da população ocupada (%) 100,0 Empregado 56,2 Com carteira assinada 41,6 Sem carteira assinada 14,6 Conta própria + autônomo com INSS 2,5 Conta própria + autônomo sem INSS 40,3 Funcionário público 1,0 Empregador (1) Relação entre a população economicamente ativa (PEA) e a pop. de 10 anos e mais. A PEA é a soma da população ocupada e da população desocupada. (2) Relação entre a população desocupada e a PEA. População desocupada: pessoas sem trabalho que tomaram alguma providência efetiva de procura de trabalho (não foi especificado o período de referência da procura) Essa condição de elevada desocupação da população ativa faz com que a procura de trabalho seja o segundo motivo de deslocamentos da população de baixa renda (ver Gráfico 2). Ainda assim, o índice de mobilidade dos desocupados é extremamente baixo, em torno de 0,47 deslocamento por dia, em média (ver Tabela 1). Num mercado que já oferece poucas oportunidades de trabalho, uma pessoa desocupada e que estivesse procurando emprego precisaria realizar deslocamentos freqüentes para conseguir uma colocação. Um índice de mobilidade tão baixo, como o constatado, não mostra isso. Por conta das altas despesas com o pagamento de tarifas, muitas pessoas desocupadas - e, por isso, sem remuneração - ficam impossibilitadas de sair à procura de trabalho. Desocupados não recebem auxílios e fazem deslocamentos demorados Em sua maioria, os que estão procurando trabalho (cerca de 25% da população desocupada pesquisada) não recebem qualquer tipo de auxílio para transporte, o que torna os gastos com transporte proibitivos para essas pessoas. Muitas dessas viagens acabam sendo feitas a pé, com grande desgaste físico e consumo de tempo. Isso pode explicar, em parte, o elevado número de pessoas desocupadas que desistem de procurar trabalho. Essa desistência se reflete em uma taxa de atividade relativamente baixa, da ordem de 55,2%, da população de baixa renda na RMSP (ver Tabela 2).

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 17 Tabela 3 REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO Famílias com renda abaixo de 3 SM mensais Deslocamentos feitos com auxilio-transporte (dias úteis, em %) Especificações % Não recebe auxilio 67,4 Recebe auxílio Vale-transporte 19,6 Dinheiro 7,7 Isenção, gratuidade 3,8 Desconto 1,2 Condução do empregador 0,3 Base de modos de deslocamento 1167 Além do custo monetário, os deslocamentos para procurar trabalho são penalizados pela sua duração, a mais alta entre todos os motivos de deslocamentos, como se pode observar na Tabela 4. Em média, eles duram 1 hora e 27 minutos, contra uma viagem média por motivo trabalho que tem duração de pouco mais de uma hora (62 minutos). Tabela 4 REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO Famílias com renda abaixo de 3 SM mensais Tempo médio de deslocamento por motivo (minutos) Dias úteis (2a. a 6a. feira) Motivo de deslocamento Minutos Trabalho 62,0 Procurar trabalho 87,4 Estudo 28,2 Compras de alimentação 33,4 Saúde 49,5 Lazer 22,5 Visita a parentes e amigos 37,5 Igreja ou culto 37,5 Outros 41,6 Em cerca de 43% das famílias pesquisadas há pessoas que declaram haver perdido oportunidades devido ao alto valor das passagens de transporte coletivo (Gráfico 4). A maioria dessas oportunidades perdidas está relacionada com a procura de trabalho. Entre os problemas que o transporte acarreta para a procura de trabalho as famílias citam as altas tarifas, a demora em passar, os pontos de parada distantes, além de citarem não ter transporte disponível e ter que pegar duas conduções (Gráfico 5).

18 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo Gráfico 4 Região Metropolitana de São Paulo PROBLEMAS COM OS MEIOS DE TRANSPORTE PARA TRABALHAR OU CONSEGUIR TRABALHO (EM %) DA POPULAÇÃO COM RENDA FAMILIAR INFERIOR A TRÊS SALÁRIOS MÍNIMOS Tem problema 43,0% Não tem problema 55,1% Não sabe/não opinou 1,9% 60% Gráfico 5 Região Metropolitana de São Paulo PROBLEMAS COM OS MEIOS DE TRANSPORTE PARA TRABALHAR OU CONSEGUIR TRABALHO (EM %) DA POPULAÇÃO COM RENDA FAMILIAR INFERIOR A TRÊS SALÁRIOS MÍNIMOS 50% 40% 30% 20% 10% 0% Pagar o preço da passagem Demora a passar Ponto de parada distante Não tem transporte disponível Tem que pegar duas conduções Viagem demorada Condução lotada, desconfortável Atraso ou horário irregular É perigoso Nova regra dos empregadores O transporte impõe um outro tipo de restrição aos desocupados que procuram trabalho. Devido ao alto custo do vale-transporte (valor da tarifa mais despesas administrativas para comprá-lo), muitos empregadores limitam suas contratações a candidatos que não exigem vale-transporte ou que necessitem de apenas um vale para fazer o trajeto domicílio-trabalho. Além desse limite, as chances de emprego diminuem muito para o pessoal não qualificado. Referindo-se a essa situação, quase generalizada no mercado de trabalho da RMSP, uma senhora desocupada diz tratar-se de uma nova regra dos empregadores : pagar no máximo duas passagens por dia para cada trabalhador e rejeitar os candidatos a emprego que necessitem de mais. Segundo as pesquisas qualitativas, as formas de lidar com essa dificuldade vão desde mentir sobre as necessidades de transporte, até andar longos trechos a pé para não perder o emprego, passando por pagar do próprio bolso a diferença da passagem, alternativa que menos agrada pela falta de recursos financeiros.

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 19 Localização residencial e transporte A julgar pela importância que a distância entre o domicílio e o local de trabalho tem no processo de recrutamento de trabalhadores, era de se esperar que a escolha do local de moradia fosse influenciada pelas condições de transporte. A pesquisa mostrou que isso não ocorre com a população de baixa renda (Gráfico 6). Os fatores mais considerados na escolha do local de moradia são a necessidade ou não de pagar aluguel, o valor deste e a proximidade de parentes e amigos. 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% Gráfico 6 Região Metropolitana de São Paulo MOTIVOS PARA ESCOLHA DO LOCAL DE MORADIA (EM %) DA POPULAÇÃO COM RENDA FAMILIAR INFERIOR A TRÊS SALÁRIOS MÍNIMOS 0% Não pagar aluguel, aluguel mais barato Proximidade de parentes e amigos Existência de infra-estrutura Proximidade de comércio, trabalho Segurança ou local tranqüilo Outros Não sabe, não opinou 3.3 - Mobilidade para trabalhar Os deslocamentos para o trabalho são essenciais, entre outros motivos porque deles depende a remuneração que sustenta os membros da família. Como as oportunidades de trabalho estão geralmente afastadas das áreas onde reside a população de baixa renda, esses deslocamentos exigem a utilização de um meio motorizado, geralmente o transporte coletivo, uma vez que a propriedade e o uso de veículos privados são insignificantes no meio da população pobre da RMSP. Com os aumentos de tarifas observados na última década, associados a queda acentuada nos rendimentos da população a partir de 1998, o uso do transporte coletivo está comprometendo cada vez mais os minguados orçamentos familiares e levando as pessoas a andar mais à pé para economizar o valor da passagem ou a utilizar-se de vários expedientes - alguns ilegais - para enfrentar o problema. As deficiências nos serviços são um fator tão ou mais importante do que o aumento das tarifas, destacando-se os longos tempos de espera nos pontos de parada e a distância excessiva destes em relação aos domicílios. Os trabalhadores de baixa renda pouco se valem dos auxílios existentes para o transporte, entre eles do vale-transporte, pois, na sua maioria, têm ocupações informais que não dá direito ao benefício. Em outras palavras, o subsídio do vale-transporte não está sendo eficaz para minorar os gastos de mobilidade da população de baixa renda. Os tempos de viagem e as condições de conforto do transporte coletivo são problemas que - embora efetivos - são latentes e afetam pouco as condições de deslocamento das pessoas mais pobres.

20 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo Ocupação e mobilidade nas famílias de baixa renda Nas famílias com renda inferior a três salários mínimos, apenas 39,9% da população entrevistada com 10 anos de idade e mais estava ocupada na época da pesquisa. O restante não tinha nenhuma ocupação remunerada. Entre a população ocupada, predomina amplamente o trabalho informal, sem carteira assinada ou por conta própria. Apenas 41,6% 5 das pessoas ocupadas incluídas na pesquisa tinham carteira assinada. Do total de desocupados, apenas 25% estavam procurando trabalho. Pela pesquisa, observa-se que a mobilidade está fortemente associada ao fato da pessoa estar ocupada ou não. Apesar do índice médio de mobilidade para a população pesquisada nos dias de semana ser de 0,88 6 viagens/pessoa/dia, os ocupados no mercado formal de trabalho apresentam um índice duas vezes maior (1,91). O índice para os desocupados (sem trabalho), por sua vez, é de 0,47, menos de meia viagem, em média, por dia útil (ver Tabela 1). Duração das viagens Por razões metodológicas, ligadas à amplitude das classes de renda e ao fato de não terem sido registradas as viagens a pé com duração inferior a 15 minutos, a Pesquisa Mobilidade e Pobreza não ofereceu dados muito significativos sobre os tempos de viagem da população de baixa renda na RMSP. Os tempos gastos no deslocamento para o trabalho variam muito, distribuindo-se nos intervalos de até 30 minutos (22,1%), de 30 minutos a 1 hora (34,1%) e de 1 hora a 1,5 hora (30,5%). Informações mais elucidativas vêm da Pesquisa O/D da RMSP de 2002. Pelo Gráfico 7 verifica-se que, ao contrário do que se imagina, as populações mais pobres da RMSP são as que menos tempo gastam em seus deslocamentos diários para o trabalho. Gráfico 7 Região Metropolitana de São Paulo DURAÇÃO DAS VIAGENS A TRABALHO POR FAIXA DE RENDA MENSAL FAMILIAR 2002 100% Porcentagem 80% 60% 40% mais de 120 61 a 120 31 a 60 até 30 20% 0% até 1 1 a 2 2 a 3 3 a 5 5 a 8 8 a 12 12 a 20 m ais de 20 Renda Mensal Familiar (em salários mínimos) Fonte: Metrô-SP (Pesquisa Origem-Destino, 2002) 5 Ver Tabela 2 6 Ver Tabela 1

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 21 Enquanto entre 60% das pessoas pertencentes às famílias com renda familiar até um salário mínimo (os muito pobres) gastam até ½ hora para chegar ao trabalho, este índice não ultrapassa a casa dos 50% para as pessoas com faixa de renda familiar entre 3 e 12 salários mínimos. Note-se que a curva dos menores tempos (até ½ hora) quando relacionadas à renda tem um formato de um U, ou seja, o tempo de deslocamento para o trabalho aumenta com a renda até a faixa de 3 a 12 salários mínimos, e volta a diminuir com o aumento da renda. Para as pessoas mais pobres, as curtas durações de viagens podem ter dois motivos: ou elas moram perto de seus locais de trabalho (como no caso das favelas centrais) ou, por terem sua mobilidade restringida, não conseguem arcar com os custos de deslocamentos para os locais mais distantes (já que a maioria não recebe auxílio para transporte) e arrumam alguma ocupação remunerada perto da moradia, onde podem se deslocar a pé. Já para os mais ricos (renda familiar a partir de 12 salários mínimos), os tempos também são menores, mas, provavelmente, devido à utilização intensiva do transporte privado, com predominância dos automóveis que proporcionam maiores velocidades médias. Auxílios e gastos com transporte Menos de 20% do total da população com renda inferior a três salários mínimos é beneficiária do vale-transporte (número correspondente ao pessoal ocupado com carteira assinada). Por outro lado, mais de 2/3 da população estudada não recebem qualquer auxílio para os seus deslocamentos. As informações disponíveis (ver Gráfico 8) mostram que os mecanismos de subsídios diretos, como o vale-transporte ou o pagamento da passagem em dinheiro pelos empregadores, não estão sendo eficazes em atingir a população de mais baixa renda, principalmente nos deslocamentos para o trabalho. Ao trabalhador de baixa renda sobra a alternativa de ter de arcar com todos os gastos de seus deslocamentos para o local de emprego do próprio bolso ou burlar o pagamento. 80,0% Gráfico 8 Região Metropolitana de São Paulo DESLOCAMENTOS FEITOS COM AUXILIO-TRANSPORTE (DIAS ÚTEIS, EM %) DA POPULAÇÃO COM RENDA FAMILIAR INFERIOR A TRÊS SALÁRIOS MÍNIMOS 70,0% 60,0% 50,0% 40,0% 30,0% 20,0% 10,0% 0,0% Não recebe auxilio Valetransporte Dinheiro Isenção, gratuidade Desconto Condução do empregador

22 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo De acordo com a pesquisa, na RMSP, para as famílias que apresentam gastos com transporte 7, estes chegam a atingir, em média, cerca de 22% da renda familiar e foram relacionados como o 3 o principal item de despesa familiar, antecedido somente pelas despesas com alimentação e telefone. Uma possível explicação para os baixos gastos com moradia está relacionada com o fato de um grande número de famílias ocupar habitações inadequadas em áreas informais (invasões e favelas), pelas quais nada pagam. Tabela 5 REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO Famílias com renda abaixo de 3 SM mensais Ordem de importância das despesas mensais por tipo de gasto 1 Tipo de gasto % Alimentação 1 Telefone 2 Transporte 3 Luz 4 Água 5 Vestuário 6 Aluguel, prestação de casa 7 (1) 1 = mais importante; 7 = menos importante Benefício pouco eficaz Dados da PNAD 2001 (IBGE) mostram que os trabalhadores da RMSP incluídos nas faixas de renda familiar per capita abaixo de três salários mínimos recebem proporcionalmente menos auxílios para transporte quando comparados às demais faixas de renda (Gráfico 9). Desta forma, uma parte dos vales-transporte distribuídos pode estar sendo destinada a trabalhadores que não utilizam freqüentemente o transporte coletivo e que, por isso, vendem o benefício, com deságio, no mercado paralelo, para a população de baixa renda que não tem direito a ele. Outra parte dos vales que chegam às mãos da população de baixa renda através desse mercado pode ser proveniente de falsificações, muito comuns em algumas cidades. 7 Esse cálculo exclui as pessoas que se utilizam do vale-transporte e outros tipos de auxílio para deslocamento. Como esses auxílios são pouco utilizados pela população de baixa renda, o comprometimento do orçamento familiar com os gastos de transporte não deve estar longe dos 22% mencionados, ficando possivelmente acima de 15% caso se considere os que se valem de auxílios transporte.

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 23 Gráfico 9 Região Metropolitana de São Paulo DISTRIBUIÇÃO DO TOTAL DE PESSOAS OCUPADAS E DAS PESSOAS OCUPADAS QUE RECEBEM AUXÍLIO TRANSPORTE, POR CLASSE DE RENDA MENSAL FAMILIAR 2001 40% 35% % de pessoas ocupadas 30% 25% 20% 15% 10% TOTAL DE PESSOAS OCUPADAS PESSOAS OCUPADAS QUE RECEBEM AUXÍLIO TRANSPORTE 5% 0% ATÉ 1 SM 1 A 2 SM 2 A 3 SM 3 A 5 SM 5 A 8 SM 8 A 12 SM 12 A 20 SM 20 A 30 SM ACIMA DE Renda Mensal Familiar (em salários mínimos) 30 SM Fonte: IBGE - Pesq. Nac. por Amostragem Domiciliar, 2001 Maneiras de economizar no transporte Com tais níveis de comprometimento da renda familiar nas despesas com transporte, cerca de 30% dos entrevistados responderam que utilizam maneiras não-convencionais para economizar com transporte. As principais são a compra de passes ou a aquisição de vales-transporte mais baratos no comércio paralelo, de segunda mão. Tabela 6 REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO Famílias com renda abaixo de 3 SM mensais Utilização de maneiras para economizar dinheiro com transporte (Respostas múltiplas e estimuladas em "maneiras citadas") Maneiras de economizar % Posição Utilizam 32,3 Não utilizam 67,7 Base de famílias 263 Maneiras citadas Compram passes mais baratos 70,6 1 Compram vale-transporte de segunda mão 40,0 2 Andam de carona 22,4 3 Passam por baixo da roleta 15,3 4 Andam a pé 7,1 5 Outros 2,4 Base de famílias 85

24 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo Problemas nos deslocamentos para o trabalho Entre os problemas de transporte citados (Gráfico 5), destacam-se o alto preço das passagens, as baixas freqüências e o fato de não terem serviços disponíveis ou de os pontos de parada serem distantes. Fica claro, assim, que os problemas do transporte coletivo não se restringem ao preço, estando também relacionados à oferta inadequada dos serviços. As questões relativas ao conforto e segurança aparecem em último plano. Isso não significa, por sua vez, que estas não sejam importantes para esse segmento da população, mas sim que as questões de preço e oferta são mais prementes. Pessoas que dormem fora de casa e voltam no fim de semana Nos domicílios entrevistados, é pouco significativo o número de pessoas que dormem fora de casa durante os dias úteis e que retornam nos finais de semana: cerca de 4,2% 8. Entre as pessoas que têm este hábito, os principais motivos são: economia, existência de quarto no local onde trabalha e moradia longe. Entretanto, ao que tudo indica, se fossem pesquisadas as pessoas que dormem na rua, o percentual delas que têm domicílio, mas dormem fora de casa durante os dias úteis, por não terem dinheiro para a condução diária, seria maior. 3.4 - Mobilidade para o lazer e a integração social O lazer, quase sempre associado ao relacionamento social com parentes e amigos, é importante para aliviar as tensões dos grandes centros urbanos e, sobretudo, para manter as redes de solidariedade, fundamentais na estratégia de sobrevivência das populações de baixa renda. O alto valor das tarifas do transporte coletivo e as condições inadequadas da oferta de serviços estão impondo barreiras severas a esse tipo de mobilidade, tão importantes quanto a mobilidade para o trabalho. A mobilidade média da população de baixa renda cai significativamente nos finais de semana. (ver Tabela 1). Esse fenômeno tem conseqüências nas atividades de lazer e de integração social (visitas a amigos e parentes) desse segmento que são fundamentais para a manutenção e ampliação da rede de solidariedade dessas populações. O relacionamento social, de convivência com parentes e amigos cria redes de apoio sem as quais as muitas pessoas não teriam como encontrar uma oportunidade de trabalho, por exemplo. Além disso, não se pode esquecer que as atividades de lazer são fundamentais para o equilíbrio psico-social dos indivíduos, continuamente ameaçados pelas tensões e pela violência dos grandes centros urbanos. Há três motivos principais para a redução dos deslocamentos com finalidade de lazer nos finais de semana. Primeiro: muitos desses deslocamentos precisam ser feitos pela família, em grupo, o que, diante das altas tarifas do transporte coletivo, implica gastos incompatíveis com o orçamento doméstico. Segundo, a oferta de serviços costuma cair drasticamente, o que acarreta tempos de espera muito longos. Por fim, como são mantidos os itinerários dos dias úteis e os destinos dos deslocamentos mudam substancialmente nos fins de semana, as pessoas precisam usar mais de um modo de transporte ou completar as viagens com extensos percursos a pé. 8 Ver Tabela A5 no Anexo de Dados

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 25 Cerca de 73% dos indivíduos entrevistados na RMSP não se deslocam nos finais de semana. Dos poucos que se deslocam (cerca de ¼ dos entrevistados), os principais motivos foram: trabalhar, visitar parentes e amigos, lazer e participação em cultos religiosos (ver gráficos 10 e 11). Os jovens, de 16 a 24 anos, por sua vez, são o grupo etário que mais se desloca nos finais de semana. Gráfico 10 Região Metropolitana de São Paulo DISTRIBUIÇÃO DOS DESLOCAMENTOS NOS FINAIS DE SEMANA (EM %) DA POPULAÇÃO COM RENDA FAMILIAR INFERIOR A TRÊS SALÁRIOS MÍNIMOS Indivíduos que não se deslocam 73,5% Indivíduos que se deslocam 26,5% Gráfico 11 Região Metropolitana de São Paulo DISTRIBUIÇÃO DOS DESLOCAMENTOS POR MOTIVO NOS FINAIS DE SEMANA (EM %) DA POPULAÇÃO COM RENDA FAMILIAR INFERIOR A TRÊS SALÁRIOS MÍNIMOS 40% 35% 30% 25% 20% 15% 10% 5% 0% Trabalhar Visitar parentes e amigos Sair (bar, dançar, festa, baile, forró etc.) Ir à igreja ou culto Praticar esportes Ir ao shopping Fazer compras de alimentação Outros

26 Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo Como as igrejas e templos estão fisicamente acessíveis para estas populações (ver Gráfico 12), muitas destas viagens estão sendo feitas a pé, por economia ou proximidade. Além das viagens a pé, o ônibus é o modo mais utilizado 9. A utilização da bicicleta é estatisticamente insignificante. 90% 80% 70% Gráfico 12 Região Metropolitana de São Paulo LOCAIS QUE PODEM SER ALCANÇADOS À PÉ NUMA CAMINHADA DE, NO MÁXIMO, 15 MINUTOS A PARTIR DO DOMICÍLIO (EM %) DA POPULAÇÃO COM RENDA FAMILIAR INFERIOR A TRÊS SALÁRIOS MÍNIMOS 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Igreja Escola Posto de saúde, dentista, hospital Quadra esportiva, parque, clube, piscina Outros 3.5 - Mobilidade para escola e equipamentos de saúde A mobilidade da população com finalidade educacional e de atendimento ambulatorial de saúde é a que, em linhas gerais, menos apresenta problemas. Isso se deve ao fato dessas redes de serviços públicos terem se expandido, atendendo à maioria dos núcleos de população de baixa renda. Mas os problemas ainda são graves no tocante ao atendimento especializado e de emergência na área de saúde. Os motivos estudo e saúde aparecem como os mais freqüentes na distribuição dos deslocamentos depois de trabalhar e de procurar emprego (ver Gráfico 2). O acesso à escola, sobretudo as de ensino fundamental e médio, melhorou significativamente nos últimos anos. Cerca de 35% 10 da população com renda familiar mensal inferior a três salários mínimos na RMSP estava estudando na época da pesquisa, em particular os mais jovens, de 10 a 15 anos de idade. O nível de escolaridade 11 atinge patamares razoáveis, considerando as dificuldades que a população pobre enfrenta para estudar. Embora 9,2% permaneçam sem estudo, 77% da população completou o ensino fundamental e 13,7% o ensino médio. Nesse ponto, chama a atenção o grupo de jovens entre 16 e 24 anos. De acordo com os dados oficiais, este é o mais susceptível ao desemprego, ao mesmo tempo em que possui um considerável 9 Ver Tabela A2 no Anexo de Dados 10 Ver Tabela A7 no Anexo de Dados 11 Nível de ensino completado, considerando a última série concluída com aprovação.

Mobilidade e Pobreza Região Metropolitana de São Paulo 27 nível de escolarização (a maioria freqüenta a escola). Isso acarreta, freqüentemente, um grau de consciência social e de expectativa acima da média da população estudada. O alto nível de desocupação deste grupo associado à escolaridade crescente pode ocasionar frustração de expectativas, acumulando tensões sociais latentes. Esta pode ser uma das explicações para o alto envolvimento de jovens pobres nos movimentos de rua contra o aumento da tarifa de ônibus em Salvador (outubro de 2003). A distribuição das escolas no espaço urbano, como também a dos postos de saúde e hospitais, melhorou significativamente nas últimas décadas, de forma que a maioria da população de baixa renda pode ter acesso a eles a partir do domicílio com uma caminhada curta. Isso fica evidente no Gráfico 12. Assim, grande parte dos deslocamentos para escolas e postos de saúde está sendo realizada a pé e com duração inferior a 15 minutos. Esse fato talvez ajude a explicar o baixo nível de utilização do passe estudantil entre a população pobre, conforme se verifica no Gráfico 13. Gráfico 13 Região Metropolitana de São Paulo INDIVÍDUOS QUE UTILIZAM E NÃO UTILIZAM O PASSE ESTUDANTIL (EM %) DA POPULAÇÃO COM RENDA FAMILIAR INFERIOR A TRÊS SALÁRIOS MÍNIMOS Utilizam 8,5% Não utilizam 91,5% Os problemas de mobilidade para equipamentos de saúde ainda persistem e assumem muita gravidade no caso dos atendimentos médicos especializados e continuados (normalmente centralizados em grandes unidades de atendimento) e do atendimento aos casos de urgência (acidentes, partos etc.). Dada a precariedade do atendimento governamental, esses casos são, cada vez mais, resolvidos pela rede de solidariedade dos próprios moradores ou pelas viaturas da polícia. 3.6 - Deslocamentos para fora da Região Metropolitana A mobilidade da população de baixa renda pesquisa para outras cidades fora da RMSP é pouco expressiva. Os altos valores de tarifas relacionados com a baixa renda, mais uma vez, parecem ser os principais fatores dessa ocorrência. Na pesquisa constatou-se que a população estudada não viaja freqüentemente para fora da Região Metropolitana, sendo que mais de 90% dos indivíduos não viajaram nos últimos 12 meses da