GÊNERO E SEGREGAÇÃO URBANA: REFLETINDO POSSIBILIDADES PARA O DESENVOLVIMENTO REGIONAL

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Transcrição:

GÊNERO E SEGREGAÇÃO URBANA: REFLETINDO POSSIBILIDADES PARA O DESENVOLVIMENTO REGIONAL Mariana Barbosa de Souza SOUZA, Mariana Barbosa de: Doutoranda, mestra em Desenvolvimento Regional e bacharela em Direito, todos pela UNISC Universidade de Santa Cruz do Sul; Pesquisadora-membro do OBSERVA-DR; e pesquisadora-membro do GEPEUR-Cnpq: Grupo de pesquisa em estudos urbanos e regionais. Endereço eletrônico: marisouza_10@hotmail.com. Verenice Zanchi ZANCHI, Verenice: Doutoranda e mestra em Desenvolvimento Regional pela UNISC Universidade de Santa Cruz do Sul; Especialista em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas FGV; Administradora pelo Centro Universitário UNIVATES; Pesquisadoramembro do OBSERVA-DR. Endereço eletrônico: verenice.zanchi@gmail.com. João Paulo Reis Costa COSTA, João Paulo Reis: Doutorando, mestre em Desenvolvimento Regional, Especialista em História do Brasil e licenciado em História, todos pela UNISC Universidade de Santa Cruz do Sul; Endereço eletrônico: joao.efasc@gmail.com. Bibiana Barbosa de Souza SOUZA, Bibiana Barbosa de: Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Exatas da Universidade Federal do Rio Grande-FURG. Pós-graduada em Supervisão educacional pela Universidade Leonardo da Vinci-UNIASSELVI, Pedagoga formada pela Faculdade Cenecista de Osório-FACOS. Endereço eletrônico: bibiannabs@hotmail.com. Tuize Silva Rovere Hoff HOFF, Tuize Silva Rovere: Mestra em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do Sul - Unisc. Arquiteta e Urbanista pela Universidade Federal de Pelotas e especialista MBA em Gestão Ambiental pela Universidade do Oeste de SC -Unoesc. Atualmente é pesquisadora membro do GEPEUR - Grupo de Estudos em Planejamento Urbano e Regional, CNPQ e do GEDEPP - Grupo de Estudos em Democracia e Políticas Públicas - CNPQ. Endereço eletrônico: tuize.hoff@gmail.com.

RESUMO Este artigo tem o propósito de oferecer um contato com o tema da segregação que atinge algumas parcelas da sociedade, como a população feminina e a comunidade LGBTQI+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transvesti e transgêneros, Queers, Intersexuais e outros) e, que ganha um contorno diferenciado fruto de uma realidade específica. As políticas públicas sociais acabam por (re)produzir estruturas patriarcais e capitalistas que condicionam essas parcelas sociais a um papel de subserviência social e econômica. O artigo tem o objetivo de explorar a relação entre as políticas públicas habitacionais e seus efeitos de perpetuação da segregação urbana, aprofundando-se no universo daqueles(as) que são segregados e na relação destes(as) com a cidade. A partir de levantamento bibliográfico discorre-se sobre alternativas de reação à situação de vulnerabilidade e alternativa de acesso aos bens e serviços públicos. Para tanto são utilizados argumentos que embasam tal perspectiva para enfatizar o trabalho científico e epistemológico de mapeamento das realidades como premissa para uma reflexão crítica voltada à ação transformadora da realidade, contribuindo assim para o desenvolvimento regional. Este artigo é fruto de um trabalho de pesquisa dos(as) autores(as) junto à Universidade de Santa Cruz do Sul, bem como junto à militância. Ao compartilhar as experiências com outros(as) estudantes/pesquisadores(as), espera-se incentivar e alertar os(as) interessados(as) sobre a temática. Palavras-chave: Cidade. Desenvolvimento Regional. LGBTQI+. Mulher. Segregação urbana. GENDER AND URBAN SEGREGATION: REFLECTING POSSIBILITIES FOR REGIONAL DEVELOPMENT ABSTRACT This article aims to offer a contact with the theme of segregation that affects some parts of society, such as the female population and the LGBTQI + community (Lesbian, Gay, Bisexual, Transvestite and Transgender, Queers, Intersexuals and others) a contour differentiated fruit of a specific reality. Social public policies end up (re) producing patriarchal and capitalist structures that condition these social parcels into a role of social and

economic subservience. The article aims to explore the relationship between public housing policies and its effects of perpetuating urban segregation, deepening the universe of those who are segregated and in the relationship of these, with the city. Based on a bibliographical survey, there are alternatives for reacting to the situation of vulnerability and alternative access to public goods and services. In order to do so, we use arguments that support this perspective to emphasize the scientific and epistemological work of mapping the realities as a premise for a critical reflection focused on the transforming action of reality, thus contributing to regional development. This article is the result of a research work of the authors at the University of Santa Cruz do Sul, as well as with the militancy. When sharing experiences with other students/researchers, it is hoped to encourage and alert those interested in the subject. Keywords: City. LGBTQI +. Regional Development. Urban segregation. Woman. 1 Introdução Ao desenvolver este artigo, os(as) pesquisadores(as) pretendem compartilhar as pesquisas até o momento desenvolvidas na Universidade de Santa Cruz do Sul, junto ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional, em que se buscou autores(as) e trabalhos envolvendo a segregação urbana, um assunto que desperta interesse e curiosidade e já possui consolidada pesquisa acadêmica no Brasil. Entretanto, apesar das diversas pesquisas a respeito do tema, o que se propõe de inovador é a sua relação com parcelas específicas da sociedade, que no caso em análise referem-se a recorte de gênero: mulheres e população LGBTQI+. Esta é uma das razões pelas quais acredita-se que o compartilhamento de conhecimento e experiência, bem como o fato de se oportunizar aos interlocutores um trabalho teórico com exemplos práticos, estar-se-á a contribuir para a expansão do conhecimento acerca do tema. Trabalhar temas como a segregação urbana de determinadas parcelas da sociedade, de forma crítica e levando em consideração o contexto no qual encontram-se inseridos, favorece a apreensão dos conceitos, bem como cria alternativas para combater-se o preconceito instalado, sobretudo em tempos de retrocessos e de privação de direitos como é o tempo presente. Muitos autores, apesar de trabalharem com a temática da segregação urbana, deixam de levar em consideração condicionantes importantes, como é a questão de gênero. Com a

proposta deste artigo intenciona-se permitir aos leitores o aperfeiçoamento dos seus conhecimentos acerca desta temática, ou que dela tomem ciência. Assim, este artigo tem como objetivo a apresentação de concepções, trabalhos e teorias acerca da segregação urbana e sua relação com o recorte de gênero, levando em conta a perspectiva das mulheres e da comunidade LGBTQI+, para que o(a) pesquisador(a) e o(a) estudante se aproximem, conheçam e possam vislumbrar possibilidades de reação à situação de vulnerabilidade e alternativa de acesso aos bens e serviços públicos. 2 Compreendendo o conceito de Segregação urbana A segregação é um fenômeno multifatorial e multiescalar que envolve aspectos físicos, como espaço urbano, local de moradia, condições de mobilidade e acesso à infraestrutura; e sociais, como condições de isolamento e exclusão social. Neste texto, a abordagem da segregação terá como base três autores: Flávio Villaça (2001), quanto à dimensão espacial da segregação; Roberto Lobato Corrêa (2013), quanto à relação da segregação com o local de habitação dentro da cidade e Eduardo Marques (2005 e 2015), quanto à dimensão social do mesmo fenômeno. Embora tenham enfoques diferentes quanto à segregação urbana, os autores convergem na ideia de que se refere a um fenômeno urbano e que decorre de práticas urbanas de planejamento e ocupação do espaço. Para Villaça (2001), a segregação espacial urbana seria aquela que se refere ao local de ocupação dentro do espaço urbano pelas diferentes classes sociais. Para o autor, ao ocupar o território, as classes mais ricas procuram os espaços que consideram mais convenientes, seja por proximidade com os bens e serviços, pelos atrativos naturais (clima, paisagens), por status (condomínios ou bairros considerados nobres), ou mesmo pela relação custo-benefício. Essa procura acaba por configurar a cidade dentro da dinâmica da especulação imobiliária, ao determinar indiretamente os espaços que sobram : geralmente os que proporcionam menos benefícios, ou menos providos de bens e serviços públicos e mais afastados dos espaços de trabalho, cultura e lazer. A consequência direta deste fenômeno consiste no fato de que as classes mais baixas são levadas a ocupar os espaços nos quais os mais ricos não têm interesse e por fatores alheios à vontade (menor preço, programas sociais, políticas públicas habitacionais, etc.). Villaça (2001) chama este tipo de ocupação do espaço urbano de segregação involuntária, que surgiria a partir do poder de escolha das camadas da população com maior poder aquisitivo, ou seja, a segregação de uns provoca, ao mesmo tempo e pelo mesmo processo, a segregação de outros (VILLAÇA, 2001, p. 148). Para ele,

os padrões espaciais são fruto da estrutura social, ou seja, são resultado se uma conjunção de fatores econômicos, políticos e ideológicos que se articulam para a formação desta estrutura. Já Lobato Corrêa (2013) afirma que, assim como os diferentes usos urbanos surgem a partir da ocupação social do espaço, o inverso também é verdadeiro: a partir da ocupação do espaço podem se desenvolver os diferentes usos. Um exemplo citado pelo autor é que que a concentração de indústrias em uma determinada região da cidade pode fazer surgir ali um bairro operário. Assim, as classes mais ricas acabam por determinar o uso dos espaços urbanos, ocupando-os com suas moradias. Para o autor, existe intensa relação entre o local de habitação e a segregação de classes sociais, em que as classes mais altas podem pagar pelo espaço de habitação mais caro, configurando assim o território. Lobato Corrêa (2013) trata este fenômeno por segregação residencial. Assim como Villaça (2001), Corrêa (2013) contrapõe a segregação por poder de escolha, ou autosegregação, e a segregação por imposição, ou segregação induzida. A autosegregação seria aquela onde o indivíduo tem a possibilidade de escolher os melhores locais de habitação de acordo com seus interesses, o que Villaça (2001) chama de segregação voluntária. Corrêa afirma que a autosegregação visa reforçar diferenciais de existência e de condições de reprodução desses grupos por intermédio da escolha das melhores localizações no espaço urbano e de suas amplas e confortáveis habitações. Graças aos cada vez mais eficazes meios de controle do espaço, as áreas autosegregadas fornecem segurança aos seus habitantes, ampliando o status e prestígio que possuem. Essas áreas são consideradas nobres, tendo sido criadas pelo grupo de alto status social e para ele. É, assim, uma política de classe que tem no espaço um ingrediente muito importante (CORRÊA, 2013, p. 43). Já a segregação induzida corresponderia à segregação involuntária citada por Villaça (2001), ao se referir àquela em que os indivíduos são levados por fatores externos a sua vontade, residindo onde lhes é imposto, sem alternativas de escolha locacional e de tipo de habitação e envolveria ainda aqueles que ainda têm algumas escolhas possíveis, situadas no entanto, dentro de limites estabelecidos pelo preço da terra e dos imóveis (CORRÊA, 2013, p. 43). A convergência dos dois autores se dá na interpretação da segregação como um fenômeno único, em que a segregação das classes mais ricas implica na segregação das classes mais pobres. Porém, Corrêa (2013) dá ênfase ao fator econômico e ao preço da terra como determinante para os tipos de segregação, enquanto Villaça (2011) afirma que os ricos podem também ocupar as áreas de terras mais baratas de acordo com seus interesses e

conveniências. Os autores convergem para a ideia de que a segregação é um fator único e, sendo multifatorial seria insuficiente tratar de seus possíveis efeitos levando-se em conta apenas fatores econômicos e residenciais, ou sociais e espaciais, especialmente quando relacionada às políticas públicas habitacionais. O terceiro autor utilizado afirma, assim como Villaça (2001), que a segregação urbana envolve questões de mobilidade dentro da cidade, assim como mobilidade social. Eduardo Marques (2005) considera que a dificuldade de se deslocar pelo perímetro urbano enfrentada pelas classes mais baixas é um fator fundamental para a compreensão do processo de segregação. Assim como Villaça (2001), Marques (2005) afirma que os mais pobres acabam por ocupar os lugares mais afastados, enfrentando assim dificuldades no acesso aos serviços e infraestruturas públicas e oportunidades. Os dois autores assumem o aspecto multifatorial da segregação e Marques (2005) acrescenta, ainda, a existência de diferentes graus de carências e heterogeneidade social nas periferias urbanas: partimos da convicção de que separação e desigualdade de acesso se constroem e reconstroem mutuamente, sendo, portanto, processos indissolúveis, que precisam ser pensados dinamicamente. Em nossas cidades, os grupos não apenas se localizam separados entre si em espaços homogêneos internamente e distantes uns dos outros como, por causa disso, ocorre um acesso diferente desses grupos às oportunidades e aos equipamentos vigentes na cidade, com muitas consequências negativas para os grupos sociais segregados; embora isso também ocorra, os processos parecem ser mais dinâmicos, e os diferenciais de acesso também são causa da separação. (MARQUES, 2015, p. 35) Para Marques (2015), os processos de segregação são característicos para cada local, e para que se entenda a distribuição dos diferentes grupos nas cidades se faz necessário o estudo específico desses processos de forma mais detalhada. Segundo o autor, a generalização nos padrões de segregação teria o custo da simplificação da complexidade dos seus diferentes processos. Eduardo Marques (2005) acrescenta a teoria de que a sociabilidade dos indivíduos também é intensamente afetada pela segregação urbana, uma vez que a dificuldade de acesso aumenta conforme o grau de homogeneidade presente nas regiões mais pobres da cidade. Marques (2005) considera que grupos mais homogêneos e de pior acesso às estruturas de possibilidades, tendem a formar suas redes de sociabilidade de maneira mais restrita, ajudando a perpetuar situações de pobreza e vulnerabilidade. Essas redes seriam fundamentais não apenas para a intensificação dos laços no interior das comunidades de baixa renda, mas principalmente para a construção de pontes para fora da comunidade que permitam solucionar os problemas do cotidiano

mais facilmente e viabilizar mobilidade social e oportunidades. Portanto, assim como no caso da segregação (...), a existência e a conformação das redes sociais influenciam fortemente a maneira pela qual os ativos presentes em uma dada comunidade se inserem em suas estruturas de oportunidades (MARQUES, 2005, p. 44). Assim, considera-se que os fatores de convergência entre os três autores trazem a reflexão necessária para abordar a segregação urbana e seus desdobramentos nos territórios. A segregação urbana será considerada então como um fenômeno urbano multifatorial e multiescalar, que envolve não só a classe social e o poder aquisitivo do indivíduo ou grupos de indivíduos, mas também sua localização no espaço urbano em relação aos meios de produção, seu local de moradia, além de sua possibilidade de mobilidade urbana e social. Compreender a complexidade do fenômeno da segregação urbana permite o aprofundamento em cada um de seus aspectos. Este artigo parte da premissa de que as consequências da segregação para as mulheres pobres e para a comunidade LGBTQI+ envolvem fatores específicos de gênero e de seu papel social, questão que não foi considerada pelos autores mencionados. Destaque-se, por fim, que este artigo não tem a intenção de revisar detalhadamente conceitos de gênero que já são amplamente debatidos no ambiente acadêmico, nem mesmo discutir estes conceitos em sua essência. Ao contrário, buscar-se-á demonstrar quais destes conceitos foram apropriados para melhor compreensão da abordagem de gênero dos estudos urbanos e do urbanismo em si. Entendendo que a diversidade é um elemento importante para a compreensão da construção da cidade não normativa, além de elemento fundamental para o entendimento das particularidades intrínsecas a ela. Desta forma, o trabalho é carregado de um olhar crítico para aquilo que é socialmente construído como natural para a mulher e para as pessoas LGBTQI+ e para o lugar que elas, em tese, deveriam ocupar na sociedade. Indo além, considera-se ainda de que forma estas construções sociais influenciam na produção do espaço urbano, tendo em vista que essa produção se dá diante de relações sociais que se reproduzem e são contingenciadas, mas também tensionadas e reconfiguradas a partir de diferentes realidades. 3 Gênero e Segregação Urbana No último quartel do século XX, no âmbito dos estudos urbanos, o entendimento de uma não neutralidade na compreensão do espaço tem sido adotada, principalmente por geógrafas e por urbanistas. No caso brasileiro, o debate sobre um urbanismo que verse sobre

questões relativas a gênero ainda é insípido e a sua abordagem na produção no que diz respeito à apropriação do espaço urbano começa a ganhar notoriedade nos escritos acadêmicos i. O surgimento do movimento feminista brasileiro, na década de 1960, impulsionou o aparecimento dos primeiros escritos acadêmicos sobre a temática feminina, sobretudo na área das Ciências Sociais. Todavia, foi com a chegada dos anos 1980, que a pressão exercida pelos grupos feministas alcançou maiores conquistas, inclusive na Assembleia Nacional Constituinte, ocasião em que a heterogeneidade nas relações de gênero era reafirmada, porque importava também estudar as relações sociais existentes entre os gêneros, não somente cada gênero na sua individualidade (HOFF, 2018). Assim, neste artigo adota-se o entendimento criado pela perspectiva feminista de espaço urbano, de que não existe neutralidade técnica ou científica possível (TAVARES, 2015; SILVA, 2003; MCDOWELL, 1999) e, portanto, compreende-se que há uma relação dialética entre a submissão reproduzida na produção do espaço urbano de forma normativa e racionalista, e a concepção feminista de construção e mudança da cidade, a partir das suas vivências. O entendimento oriundo da epistemologia feminista fornece subsídios para compreender-se a realidade como um todo. Utiliza-se aqui a epistemologia feminista para pensar-se a segregação urbana de todos e todas que estão excluídos dos usos e do direito à cidade, inclusive a comunidade LGBTQI+. Conforme Madariaga (2004), as demandas das mulheres colidem com as estruturas urbanas que são funcionalistas, além de normativas. As mulheres têm dupla jornada de trabalho (doméstico e remunerado) e usam o espaço das cidades de maneira complexa, conforme as atividades que necessitam desempenhar, ou seja, conciliando as suas atividades remuneradas e não-remuneradas. Noutro sentido, o homempadrão (branco e produtivo) perfaz deslocamentos pendulares, tradicionalmente em veículos motorizados, que vão da casa para o trabalho e vice-versa. Assim, as mulheres ocupam o espaço das cidades a partir de deslocamento que se dão de maneira poligonal, tendendo a saciar as demandas familiares, bem como as suas próprias: elas deslocam-se à escola para levar os filhos, aos locais que oferecem serviços de saúde, lazer e outros serviços, simultaneamente cumprem as suas jornadas de trabalho remunerado. Hoff (2018) destaca que em se tratando de mulheres em situação de vulnerabilidade, que não possuem acesso aos bens e serviços particulares, esta condição prejudica significativamente a mobilidade urbana e, consequentemente, a sua autonomia.

Las mujeres son las principales usuarias del transporte público, encadenan más viajes, viajan por más motivos diferentes, recorren distancias más cortas, realizan una gran parte de sus desplazamientos en el entorno de la vivenda y hacen muchos viajes acompañando a otras personas que carecen de autonomia personal. Aunque se muevam más, tienem menos movilidad y ésta está constreñida por su dependencia de las necesidades de los otros y de los horarios de los servicios públicos, y por su menor acesso al transporte privado. (MADARIAGA, 2004, p. 109). Utiliza-se o termo mulher neste artigo, como já dito, a partir da epistemologia feminista para contrapor o homem-médio, branco, heterossexual e produtivo. A cidade é voltada para este sujeito e não para as pessoas que historicamente estão à margem das políticas públicas urbanas. Veja-se que o termo produtivo é essencial neste entendimento, porque os deslocamentos poligonais que são realizados tradicionalmente pelas mulheres, também são realizados por outros agentes, como as pessoas com necessidades específicas (cadeirantes, cegos, etc.) e pessoas aposentadas, que também podem ter a sua locomoção reduzida. A cidade ocupada por mulheres, pela comunidade LGBTQI+ e por outros sujeitos que não se encaixam no modelo produtivo necessário à reprodução capitalista do espaço urbano, tem como resultado a exclusão social, no qual a pobreza resta fortalecida, porque as políticas públicas urbanas são pouco eficazes, sobretudo no que tange às questões relativas a gênero. Tais políticas são guiadas por uma lógica patriarcal e racionalista e universal dos planos urbanísticos, a partir de um entendimento territorial normativo, vertical, que assume uma suposta neutralidade, porém que, na prática, ignora e silencia as minorias sociais, tendo em vista que a própria possibilidade de compor um padrão universal e totalizante, de ser humano ou urbano, demonstra a predominância da concepção totalizadora modernista e a desconsideração da diversidade social, cultural, geracional, racial e de gênero (TAVARES, 2015, p. 48). As brechas têm como resultado maior desigualdade, e aniquilamento de formas essenciais para o entendimento de dinâmicas urbanas, que ultrapassam os parâmetros tradicionais da normatividade. A partir de políticas públicas específicas ou em razão da própria condição social que as acomete, as mulheres e a comunidade LGBTQI+ ocupam as periferias mais empobrecidas e restam à mercê de inúmeros tipos de violência, entendida a partir da conceituação atribuída por Saffioti (2015, p. 18), como sendo a (...) ruptura de qualquer forma de integridade da vítima: integridade física, integridade psíquica, integridade sexual, integridade moral. Nesse sentido, segundo Hoff (2018, p. 35): Essa realidade se expressa nos números da violência contra a mulher, levantados pela Agência Patrícia Galvão em setembro de 2016. Segundo dados da pesquisa sobre a percepção das mulheres quanto à violência de gênero, 85% das mulheres

entrevistadas têm medo de sofrer violência sexual, enquanto 42% dos homens acreditam que mulheres que se dão ao respeito não são estupradas. Já segundo dados do IPEA, entre os anos de 2001 e 2011, mais de 15 mulheres foram mortas por dia no Brasil, sendo que aproximadamente um terço dos crimes ocorreram no espaço domiciliar. A mesma situação de violência se estende às pessoas da comunidade LGBTQI+. O Brasil é o país que mais mata pessoas travestis e transexuais no mundo. Cotidianamente os direitos destas pessoas são ignorados, principalmente o de ser quem quiserem ser, conforme o gênero que se identificam (SOUZA e COSTA, 2016). Outra questão a ser destacada é que a expectativa de vida de travestis e de mulheres transexuais no Brasil é de 35 anos, menos da metade da média nacional, que é 75 anos ii. E chama atenção os casos de violência extrema contra essas pessoas, geralmente são noticiados episódios de violência extrema, de espancamento, de esquartejamento, entre outros, indicando um ódio significativo contra as travestis e transexuais. Neste contexto é de extrema importância determinar o que entende-se por gênero: Enquanto sexo é um conceito principalmente biológico, gênero é um conceito essencialmente social, sendo sua construção e representação apresentada das mais diferentes formas, pelas diferentes culturas. Gênero vai além dos sexos: sua definição não se restringe apenas aos cromossomos, a conformação genital ou a presença ou não de determinadas gônadas, mas principalmente através da autopercepção e da forma como a pessoa se expressa socialmente. O que importa na composição e definição do que é ser homem ou mulher, é o construto psicossocial produzido pela autodeterminação em conjunto com a normativa imposta socialmente pelo papel de gênero. (SOUZA e ZINI, 2016, p. 592). Outrossim, mesmo com constrangimentos às mulheres e preconceitos (especialmente no caso da comunidade LGBTQI+) impostos à presença dessas pessoas nos espaços públicos, elas resistem, mesmo que não possuam este entendimento, buscando melhores condições de trabalho e acesso ao mercado de trabalho formal, em muitos casos não podendo contar com transporte coletivo de qualidade, com poucos horários ou em horários noturnos, de pouco movimento, o que facilita ataques violentos contra essas pessoas. Especificamente no caso das mulheres, geralmente elas são responsáveis por buscar as crianças nas escolas, quando necessário, além de procurar os serviços de saúde em postos de atendimento. Também mantém a casa com provimentos para alimentação, que neste caso buscam em mercados. E muitas destas mulheres acessam as políticas públicas sociais junto aos órgãos públicos, que também, em grande parte são distantes de suas residências. Por meio de organização destas mulheres, frequentemente são concretizadas melhorias nas escolas dos filhos e nos arredores do local em que moram. Ademais, elas são responsáveis pela criação de

maneiras de socialização, mediadas por conversas informais, em que trocam vivencias, estabelecem vínculos e conformam redes de sociabilidade. No Rio Grande do Sul, são frequentes as chamadas rodas de chimarrão, organizadas de forma improvisada com cadeiras, normalmente ocupando os espaços públicos ou coletivos de circulação. (HOFF, 2018, p. 37). Assim, compreende-se que as mulheres elaboram experiências diárias de resistir no espaço urbano, além de transformações. Assim como Hoff (2018) compreende a vivencia da cidade a partir das mulheres, compreende-se a sua importância para este artigo e também para as pessoas da comunidade LGBTQI+. Porque as mulheres e também as pessoas LGBTQI+ são agentes sociais que estão condicionados ao espaço urbano, mas também resistem a este espaço, na medida em que conformam-no. Assim, a vivência destes sujeitos é percebida como constrangida e, simultaneamente, modificadora e (re)ordenadora do espaço urbano, adaptando-o, de maneira despretensiosa, as suas vivências únicas e necessidades particulares iii. Destaque-se que o espaço urbano é produzido a partir da ação de agentes sociais concretos que desempenham funções flexíveis, portando interesses diversos, contradições e práticas que podem ser únicas de cada um deles ou podem ser comuns a mais de um. Assim, a produção do espaço, tanto da rede urbana, quando do intraurbano, não se dá ante a ação da mão invisível do mercado, nem do capital que surge de fora das relações sociais. É resultante da ação de agentes sociais concretos, históricos, com interesses diversos, habilidades, contradições, poderes e geradores de conflitos entre si e com outra frações da sociedade. Logo, os processos sociais e os agentes sociais são indivisíveis (CORRÊA, 2014). A partir de Corrêa (1989) considera-se que os agentes sociais produtores do espaço urbano podem ser subdivididos em: proprietários dos meios de produção, os proprietários fundiários, os promotores imobiliários, o Estado e os grupos sociais excluídos. É a partir das ações destes agentes que o espaço será produzido, encharcado de materialidades, temporalidades, campos cultivados, estradas, produtos imobiliários e significados diversos, como aqueles associados a estética, status, etnicidade e sacralidade. (CORRÊA, 2014, p. 44). A cidade como hoje conhecemos, tem sido formalmente pensada para o homem e suas necessidades de reprodução do capital e pode ser interpretada normativamente como uma cidade androcêntrica e patriarcal. [...] Porém, os processos pelos quais o desenvolvimento da cidade passa, são complexos e desafiadores. O resultado é uma relação ambígua entre a cidade vista como normativa, aquela construída em função das relações capitalistas, seguindo planos urbanísticos universais e de base modernista, que se expressa em um espaço-urbano financeirizado, e a cidade informal, orgânica e em constante transformação, que se dá a partir da vivência cotidiana do espaço-urbano, mas não livre de ser condicionada pela primeira. (HOFF, 2018, p. 39-40).

A relação das mulheres e das pessoas LGBTQI+ faz parte desta dinâmica repleta de contradições do espaço urbano, a partir de realidades distintas. A práticas dessas pessoas, de ocupar os espaços e reordená-los é recorrente, embora nem sempre estes sujeitos tenham a percepção desta ação, principalmente no caso das mulheres. As pessoas constroem, ocupam e modificam o espaço urbano o tempo inteiro e também são modificadas por ele. 5 Considerações finais Com a intenção de compreender o conceito de segregação urbana a partir de uma ótica que se relacione com gênero, bem como suas relações sociais e seus reflexos espaciais, este artigo tinha como objetivo inicial descrever o conceito de segregação urbana, para em segundo momento relacioná-lo com a temática de gênero. Para tanto, se propôs a analisar o acesso aos bens e serviços públicos das mulheres e da comunidade LGBTQI+. Neste sentido, a apropriação dos conceitos necessários ao entendimento de segregação urbana mostrou-se como um estímulo a mais, porque a epistemologia feminista parte do gênero feminino (entendido aqui em uma abordagem inclusiva), sendo necessária uma nova análise de muitos conceitos, a partir deste olhar, do olhar das mulheres, da comunidade LGBTQI+. Ademais, a epistemologia adotada contribuiu para uma construção teórica que privilegiasse o surgimento de elementos e categorias inéditos, e não apenas compará-los às bases teóricas. Sendo assim, destaque-se a importância de ter-se atribuído ao espaço urbano um caráter relacional, entendendo a dialética e suas forças que o conformar, compreendendo este espaço como não normativo, a partir da elaboração de novos territórios, especialmente os que surgem das vivencias das mulheres e das pessoas LGBQI+. Compreendendo então os elementos surgidos e o objetivo geral traçado para o presente artigo, percebe-se que as mulheres e as pessoas da comunidade LGBTQI+ estão submetidas a constrangimentos que são intrínsecos à condição de pessoa segregada no espaço urbano e que está relacionado ao papel imposto a partir de condicionantes normativos do próprio planejamento urbano, com todos as suas características históricas funcionalistas. Outra questão de extrema importância é que a partir de trabalhos como de Hoff (2018), pode-se perceber que apesar da violência e do medo presentes no espaço urbano, as mulheres continuam a resistir, por meio da criação de pequenas redes de sociabilidade, como concluiu a análise de Hoff (2018) a partir do estudo realizado na cidade média de Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo, no Rio Grande do Sul.

São mulheres que pela própria forma de socialização feminina, voltada às relações de afeto e amizade, contam com as vizinhas para olharem seus filhos quando precisam dar pequenas saídas no dia-a-dia, ou até mesmo por turnos inteiros, para acessarem o mercado de trabalho. São elas que acolhem os filhos das moradoras mais vulneráveis, fornecendo alimento e cuidados, ou acolhem os filhos de suas filhas e noras, para que as mesmas possam trabalhar. Essas pequenas redes são resistência à subordinação impressa pelo espaço urbano patriarcal. Ao mesmo tempo em que são socialmente cobradas para que se incluam como força laboral no mercado de trabalho formal, são impelidas a assumirem sozinhas o cuidado com sua prole e a manutenção da salubridade de suas moradias. Dentro de suas casas, as mulheres são a autoridade máxima sobre os filhos e dependentes, empenhando-se em mantê-los na escola e longe de influências que considerem negativas. Paradoxalmente, sua maior força de reação muitas vezes consiste na manutenção do papel social a elas imposto, afastam-se do trabalho formal remunerado, contrariando as expectativas sociais, mas investem naquilo que elas enxergam como sua principal tarefa: o cuidado com os filhos. (HOFF, 2018, p. 128). Por fim, este artigo não tem a pretensão de dar por encerrada a discussão entre segregação urbana e gênero, ao contrário, entende-se que é necessário ampliar o rol de possibilidades que envolvem a temática, a fim de contribuir e enriquecer o debate acadêmico. Há uma contradição entre a base teórica escolhida, que se mostra insuficiente para dar conta do objeto empírico escolhido para o presente artigo. Isso se explica porque grande parte dos autores que são considerados cátedras no Brasil, quando se trata de segregação urbana, continuam a ignorar este recorte. Nesse sentido, aponta-se para as possibilidades futuras de investigação a partir deste artigo, com outros olhares e procedimentos metodológicos. REFERÊNCIAS CARLOS, Ana Fani Alessandri. Da organização à produção do espaço no movimento do espaço geográfico. In: CARLOS, Ana Fani Alessandri; SOUZA, Marcelo Lopes de; SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. (Orgs.) A produção do espaço urbano: Agentes e processos, escalas e desafios. São Paulo: Contexto, 2014. CORREA, Roberto L. O espaço Urbano. São Paulo: Editora Ática, 2013.. Sobre agentes sociais, escala e produção do espaço: um texto para discussão. In: CARLOS, Ana Fani Alessandri; SOUZA, Marcelo Lopes de SPOSITO, aria Encarnação eltrão. A produção do espaço urbano: agentes e processos, escalas e desafios. São Paulo: Contexto, 2014, p. 41-52. GONZAGA, Teresinha. A cidade e a arquitetura também mulher: planejamento urbano, projetos arquitetônicos e gênero. São Paulo: Annablume, 2011. HARVEY, David. A justiça social e a cidade. São Paulo: Hucitec, 1980.

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usuários da moradia; b) corretores de imóveis; c) proprietários; d) incorporadores e a indústria da construção da moradia; e) instituições financeiras; f) instituições governamentais.