Ciganos e a orientação explícita, mas não exclusiva das políticas sociais: a construção de um caminho em Portugal?

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Transcrição:

Ciganos e a orientação explícita, mas não exclusiva das políticas sociais: a construção de um caminho em Portugal? A L E X A N D R A C A S T R O D I N Â M I A / C E T I S C T E 2 5 N O V E M B R O 2 0 1 0

ÍNDICE 1. Pobreza e exclusão social entre a população cigana - o retrato possível 2. A igualdade de oportunidades comprometida causas e manifestações 3. A construção social dos problemas tradução na agenda institucional 4. A interculturalidade e a convivência na diversidade - desafios

I Pobreza e exclusão social entre a população cigana o retrato possível

Os Ciganos no Espaço de Etnicidade Novos lusoafricanos ( 2ª geração ) Minorias de contraste social Contrastes sociais + + Guineenses Caboverdianos Angolanos Santomenses CIGANOS Minorias de duplo contraste Situações de etnicidade forte [Continuidades culturais] - - Moçambicanos + + Contrastes culturais Minorias de baixo contraste Minorias de contraste cultural Lusoafricanos - Indianos Situações de não-etnicidade - - [Continuidades sociais] Fonte: Fernando Luís Machado, (2002) Contrastes e Continuidades. Migração, Etnicidade e Integração dos Guineenses em Portugal, Oeiras, Celta, p. 47

O Rendimento Social de Inserção e a População cigana Nº de famílias ciganas beneficiárias Nº estimado de indivíduos ciganos beneficiários 5.275 21.100 42,2% universo estimado de 50.000 pessoas 3,9% Face ao total de famílias beneficiárias RSI 3,4% Peso do total de beneficiários face à população residente Fonte: ISS, IP, Dez. 2008

População Cigana e Precariedade Habitacional 80 concelhos Total = 7.008 indivíduos 14% a residir em alojamentos não clássicos 66 167 214 845 96 342 480 558 764 720 328 41 444 198 300 250 265 716 Fonte: Castro, 2008, 2009

População cigana sistema de acção e de oportunidades PERTENCER Identidade cultural SER SIGNIFICADOS DA ACÇÃO TER Participação Capacitação

II A igualdade de oportunidades comprometida Causas e manifestações

Condição Periférica da população cigana Causalidades O pretenso nomadismo da população cigana Distância física Legitimidade social associada à permanência e sedentarização Dificuldades associadas à promoção de processos de enraizamento territorial e de promoção da coexistência (realojamento tardio, mobilidade forçada, barros segregados do ponto de vista social e étnico ) Entre a classe social e a discriminação cultural Proximidade física Representações sociais homogéneas Reforço dos estereótipos Modalidades de implementação de medidas e programas e de complementaridade nas políticas sociais

Responsabilidade individual/étnica da pobreza Repercussões a nível local Práticas sociais Anti-ciganismo Bloqueio no acesso a políticas públicas Mobilização de fundos públicos para convidar ciganos a abandonar território concelhio Recusa a candidaturas a projectos/programas ou à inclusão da população cigana como destinatária Práticas profissionais Processamento burocrático de medidas e programas Fraco conhecimento das necessidades, competências e expectativas face ao futuro de indivíduos e famílias Intervenção que segue a lógica dos recursos disponíveis Práticas institucionais Fechadas sobre si próprias Fraca dinâmica de parceria Fraca mobilização concertada dos recursos disponíveis Desvirtuamento da filosofia de determinadas medidas

III A construção social dos problemas tradução na agenda institucional

Processo de pobreza e exclusão social entre a população cigana Características Extensão sobre a população Intensidade do fenómeno Formas como se mobilizam e interagem entre si os actores interessados em dar crédito público ao problema Construção de um problema público Inscrição nas prioridades da agenda institucional

Formas como se mobilizam e interagem entre si os actores interessados em dar crédito público ao problema Processo Europeu de Inclusão social Quatro gerações de Planos Nacionais de Acção para a Inclusão Social (2001-2010) Porque razão nuns PNAI a população cigana é totalmente omissa e noutros avançam-se com algumas medidas pontuais? Qual o papel de determinados actores políticos, técnicos ou ligados a ONG na determinação da importância da configuração da problemática como problema público? Porque não se seguem as orientações da Comissão Europeia na utilização dos fundos estruturais em projectos destinados às populações ciganas?

A diversidade de valores e modos de vida a diferença é um dilema? Como colmatar o passado de discriminação baseado nas diferenças sem legitimar mais as diferenças? Como colocar a solução para um problema com base em categorias, utilizando-se as mesmas categorias? Como aprofundar o conhecimento sobre a discriminação e o sentido da diversidade sem medos de cristalização dos processos identitários?

Posições face aos processos de integração Universalidade da cidadania (secundarização da dimensão étnicoculural) Igualdade cívica e diversidade cultural (respeito pelos particularismos) Políticas anti-diferencialistas Políticas multiculturais / interculturais Assimilação Diferencialismo estigmatizante Aprender a combinar as duas perspectivas 10 Princípios Básicos para a Inclusão dos Ciganos 2. Medidas Explícitas, mas não exclusivas 4. Normalização e transversalidade

IV A interculturalidade e a convivência na diversidade desafios

Papéis assumidos pelos mediadores municipais Facilitador no diagnóstico e no planeamento de actividades Agente de mudança Reconstrutor do laço social Reconstrutor da capacidade de agir Acesso privilegiado às populações na construção do diagnóstico Conhecimento aprofundado das dinâmicas dos grupos para propor soluções Promoção sociocultural das comunidades ciganas Espelho revelador dos conflitos e das desigualdades sociais Mobilização dos recursos locais para melhorar as condições de inserção Promoção de interacções positivas Abertura do sistema de oportunidades Promoção da confiança nos outros e nas instituições Promoção da participação cívica Aproximação dos processos de decisão das pessoas

Efeitos positivos do projecto a voz dos destinatários Nós sentimo-nos mais livres por ele estar no sitio onde está. Quando nós temos uma dificuldade vamos ter com ele e ele tenta explicar e tenta levar-nos ao sitio que nós temos que ir. E por isso nós sentimo-nos felizes porque é uma coisa boa para todos nós e para a inclusão dos nossos filhos e também de nós próprios. (Destinatária cigana) Nós antes tínhamos mais complexos que nos rejeitássemos. E às vezes nós íamos, dizia-nos que sim e depois não se via nada. E assim já é totalmente diferente. (Destinatário cigana) Antigamente se calhava olhavam para nós e diziam: «Ali vai o cigano». Agora as pessoas pensam: Já há ciganos na Câmara, já há ciganos na junta e as pessoas começam a misturar-se umas com as outras e isso é bom. (Destinatária cigana) Confiança Conforto Liberdade Felicidade

DO REFORÇO DA COESÃO SOCIAL À NECESSIDADE DE CONTINUIDADE DA INOVAÇÃO E CONTÁGIO ENTRE TERRITÓRIOS Reforço da governação de proximidade Participação nas decisões COESÃO SOCIAL Mobilização concertada dos recursos existentes Estímulos à interacção cultural Modalidades de construir e facilitar consensos

Ou seja A PROXIMIDADE CONSTROI-SE NO COLECTIVO!